Discurso durante a 167ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Importância mundial da última eleição para Presidente dos Estados Unidos.

Autor
João Ribeiro (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: João Batista de Jesus Ribeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Importância mundial da última eleição para Presidente dos Estados Unidos.
Publicação
Publicação no DSF de 24/11/2004 - Página 37555
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, REELEIÇÃO, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), AMPLIAÇÃO, INTEGRAÇÃO, COMERCIO, CRESCIMENTO, ECONOMIA, BRASIL.

O SR. JOÃO RIBEIRO (PFL - TO. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nos últimos meses, o mundo se viu diante de uma escolha cujas repercussões são planetárias: a eleição presidencial nos Estados Unidos. Claro está que o pré-requisito para participar das eleições norte-americanas é possuir a cidadania daquele país.

Nem por isso, porém, a campanha eleitoral dos Estados Unidos foi acompanhada com menos interesse em outros cantos do mundo, desde brasileiros no interior do meu querido Tocantins até africanos e asiáticos em cyber cafés no Cairo ou em Pequim. A ansiedade por notícias sobre o dia-a-dia da disputa eleitoral se acentuou, é claro, nas últimas semanas de campanha.

A imprensa mundial registrou o grande interesse pelas eleições norte-americanas, mas, na realidade, o fato que gerou tamanho envolvimento - inclusive no Brasil - não nos é de forma alguma estranho. Os Estados Unidos, na condição de hiperpotência solitária, possui influência decisiva em quaisquer aspectos que pensemos abordar: questões militares, econômicas, políticas, sociais e culturais.

Detentor da maior população no continente e de um mercado consumidor que é maior do que todos os países da América somados, fazem com que os rumos políticos dos Estados Unidos interessem, com particular intensidade, aos países de nosso hemisfério, entre eles, obviamente, o Brasil.

            Passadas as agitações eleitorais, vemo-nos diante do fato consumado: George W. Bush foi reeleito e será o Presidente dos Estados Unidos por mais quatro anos. O novo mandato, a ele conferido pela maioria do colégio eleitoral, além de uma margem de pouco mais de 3 milhões e setecentos mil eleitores, concede a Bush legitimidade e uma certeza sobre a vontade popular norte-americana que em nenhum momento houve nas eleições do ano 2000.

O resultado inequívoco das urnas deu margem, bem sabemos, a alívio para alguns, mas também a inúmeros desapontamentos, manifestados, por exemplo, nas primeiras páginas e em editoriais de renomados periódicos europeus.

As razões para tal o desânimo são conhecidas, mas sua complexidade faz com que deixemos sua análise para outra ocasião, visto que não dispomos de tempo suficiente para abordá-las com a profundidade necessária.

Feitas essas ressalvas, chego ao ponto principal deste discurso, com as inevitáveis perguntas em relação ao Brasil: teria sido melhor para nós a eleição de John Kerry? Podemos esperar tempos ainda mais difíceis nesses próximos 4 anos de mandato republicano?

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, responder a essas perguntas implica, no mínimo, em vasculharmos as relações bilaterais Brasil - Estados Unidos no passado mais recente, para apurarmos os prós e os contras da continuidade das linhas mestras que têm norteado o governo republicano sob a liderança de George W. Bush.

Preliminarmente, é relevante ressaltar que a visível empatia que há entre os Chefes de Estado do Brasil e dos Estados Unidos, a despeito de trajetórias e estilos de vida absolutamente diferentes, é um patrimônio que não pode ser desprezado.

Aliás, essa afinidade e a disposição para o trabalho em conjunto ficaram evidenciadas já na primeira visita de trabalho a Washington, realizada em 10 de dezembro de 2002, quando o líder da maior potência mundial encontrou o então Presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.

A reunião de cúpula realizada em 20 de junho de 2003, com a ida à capital norte-americana do Presidente Lula e uma comitiva de 10 Ministros de Estado, deixaram claro o patamar elevado em que se encontra o relacionamento bilateral, fruto de parceria madura, baseada na reciprocidade e no respeito mútuo.

Aliás, o respeito ao posicionamento político brasileiro que a Casa Branca demonstrou ter durante todo o Governo Bush permite-nos inferir que nossos inúmeros interesses em comum jamais serão afetados por discordâncias pontuais, ainda que profundas. Para ilustrar o que acabo de dizer, vale lembrar que a visita de Lula a Washington foi a primeira de um Chefe de Estado que se havia oposto oficialmente contra a guerra do Iraque.

Nossas diferenças não param por aí: os Estados Unidos foram inicialmente contra a formação do ‘Grupo de Amigos da Venezuela’, liderado pelo Brasil e destinado a solucionar de forma pacífica e democrática o conflito político criado pelos opositores de Hugo Chávez.

O êxito dessa iniciativa mereceu, posteriormente, elogios e posterior apoio por parte da diplomacia norte-americana. Por sua vez, no plano comercial não faltam disputas com os Estados Unidos, inclusive no âmbito da OMC.

Porém, é preciso ter bem claro, Sr. Presidente, que as diferenças que acabo de apontar são, ao contrário do que pode parecer à primeira vista, a prova cabal da intensidade de nossos interesses. Manifestar discordâncias de forma franca, direta, só é viável no contexto de relacionamentos maduros, consolidados, a partir do momento em que ninguém mais duvida que um país é indispensável para o outro.

Esse é o caso do Brasil e dos Estados Unidos. Se a interseção de interesses em comum é muito grande, é claro que haverá conflitos. Será que o fato de a Inglaterra possuir uma lista imensurável de contenciosos comerciais com os Estados Unidos faz dela uma nação inimiga? Ou, ao contrário, demonstra a necessidade de tê-la como fortíssima aliada?

A continuidade de George W. Bush à frente dos Estados Unidos, somada ao capital político internacional conquistado pelo Presidente Lula, permitem-nos almejar renovadas possibilidades na criação de uma Área de Livre Comércio das Américas. Mas uma área de livre comércio equilibrada, que contemple as evidentes assimetrias que há entre a América do Norte e a América Latina.

O comércio aproxima os povos, faz-nos ver que somos, de fato, interdependentes. Mas o comércio deve ser livre, isto é, deve estar expurgado de subsídios, cotas e barreiras que escamoteiam o mais puro protecionismo. É isso o que queremos, e estou certo de que é isso o que os Estados Unidos também buscarão. Nesse sentido, nossa tradição multilateralista reforçará o entendimento mútuo e a busca de soluções satisfatórias e democráticas.

O pragmatismo que tem pautado o diálogo governamental Brasil - Estados Unidos, sem deixar que diferenças ideológicas interfiram em nossa imensa agenda em comum, é um alento para os empreendedores privados. O momento é mais que propício para o empresariado brasileiro estreitar os laços com o maior mercado mundial.

Aliás, como afirmou recentemente a ex-Embaixadora dos Estados Unidos Donna Hrinak, se as alianças entre setores da economia forem suficientemente fortes, não há nacionalismo ou protecionismo que resista. Ilustra esse ponto, Srªs e Srs. Senadores, a venda de jatos da Embraer para o Pentágono na hipersensível área da segurança nacional norte-americana.

Nesse contexto, nosso Embaixador em Washington, Roberto Abdenur, alerta que o empresariado brasileiro poderia aproveitar melhor as brechas tributárias que o mercado norte-americano oferece em vários setores de sua economia. Participamos relativamente pouco em nichos de mercado em que as tarifas de importação norte-americanas são extremamente baixas ou, mesmo, inexistentes. Mais recentemente, Sua Excelência, no artigo “Brasil e EUA: refletir, dialogar e avançar”, publicado pela imprensa nacional, reforça a posição de se trabalhar a parceria com os norte-americanos de maneira mais consistente quando afirma que “Os EUA e o Brasil foram parceiros-chave no acordo sobre a moldura das negociações da Rodada Doha, e continuaremos a trabalhar juntos para uma reforma efetiva dos mercados agrícolas internacionais, em especial com vistas ao corte dos inaceitáveis subsídios bilionários concedidos pelos países ricos.”

Enquanto isso, continuamos a lutar - tanto em âmbito regional quanto na esfera global, na OMC - pelo fim dos pesados subsídios que incidem sobre produtos considerados sensíveis pelos poderosos lobbies norte-americanos.

O atual Embaixador dos Estados Unidos, John Danilovich, destacou com muita propriedade, em artigo intitulado “Vitórias da democracia”, publicado na Folha de São Paulo no último dia 14 deste mês, que, “passadas as eleições, Estados Unidos e Brasil já podem voltar a atenção aos objetivos comuns que traçamos para nossos países”. Destacou o Embaixador que “temos uma agenda bilateral ambiciosa e produtiva que abrange negociações de comércio nos âmbitos mundial e regional, cooperação para combate à Aids, segurança da região e iniciativas para aliviar a fome”.

Essa postura construtiva do Governo Bush para com nosso País, refletida nas palavras de seu Embaixador no Brasil, me traz uma boa dose de otimismo, Sr. Presidente. Até porque o que tem norteado a política externa do Governo Lula é um pragmatismo lúcido, que, ao mesmo tempo em que não abre mão de suas convicções políticas, é capaz de se mostrar aberto ao diálogo e ao entendimento mútuo, é preciso reconhecer.

Portanto, intensificarmos a cooperação e o comércio em bases eqüitativas significa ensaiarmos os primeiros passos rumo à diminuição da pobreza, da insegurança e do desequilíbrio social, fontes primárias de tantas guerras internas e externas. O Presidente Lula e o Presidente Bush sabem disso.

É por tais razões que devemos buscar um entrosamento cada vez mais forte entre as duas maiores democracias do hemisfério ocidental para que se aperfeiçoe, ainda mais, esse relacionamento que promete ganhos substanciais para ambas as partes.

Era o que eu tinha a dizer.

Obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/11/2004 - Página 37555