Discurso durante a 172ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise das declarações do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso.

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Análise das declarações do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso.
Aparteantes
Ideli Salvatti, José Agripino, Tião Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 01/12/2004 - Página 39383
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, DECLARAÇÃO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, AVALIAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, FALTA, QUALIDADE, DEBATE.
  • DETALHAMENTO, CRITICA, GOVERNO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ADESÃO, LIBERALISMO, ECONOMIA, DESEQUILIBRIO, CONTAS, DIVIDA, PAIS, DEFICIT, BALANÇA COMERCIAL.
  • JUSTIFICAÇÃO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO FEDERAL, MELHORIA, SITUAÇÃO, DIVIDA, EFEITO, RETOMADA, CRESCIMENTO ECONOMICO, SAUDAÇÃO, CRESCIMENTO, INDUSTRIA, IMPORTANCIA, ATENÇÃO, MANUTENÇÃO, INDICE, CONTINUAÇÃO, DEBATE, CAMBIO, JUROS.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ser ex-Presidente é uma condição política única em uma sociedade democrática, não só pela riqueza da experiência de exercer o maior cargo da República, mas também pelo peso político que a condição de quem já o exerceu possui. Por isso mesmo, sempre se espera de um ex-Presidente a majestade do cargo; espera-se de um ex-Presidente conselhos, críticas, ponderações, equilíbrio e recomendações que ajudem a Nação a se desenvolver, a superar suas dificuldades e a buscar uma agenda de Estado.

Não foi isso o que li nos jornais, nas últimas declarações do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso. Ao contrário. Para quem conhece sua biografia, sua vida acadêmica, sua excelência universitária, seu apreço para as análises sociológicas mais qualificadas, eu diria que é difícil reconhecer a figura do ex-Presidente nas declarações que estão hoje nos jornais brasileiros. Afirmações do tipo: "O rei está nu". "O Governo é incompetente". Quando fala do PPP, ele diz: "Reparem como alguns setores empresariais vão ficar nervosos. Meu Deus! Vamos ter uma boquinha aí, mas ela é pequenininha, pequenininha e não vai ser suficiente para os apetites". E outras passagens em relação as quais eu não gostaria de me aprofundar. Creio que elas agridem a imagem, a majestade da função que foi exercida pelo ex-Presidente e o papel político que essa condição lhe impõe.

Eu esperava mais - e ainda espero: um debate qualificado que permitisse, sim, uma comparação entre os quase dois anos de Governo Lula com os oito anos de Governo Fernando Henrique Cardoso. Creio que esse é o debate que ajuda a democracia, realizado cotidianamente aqui, pela Oposição, e que, seguramente, pode ser feito pelo ex-Presidente. E é sobre esse debate que eu gostaria de me referir, esse é o debate que eu esperava encontrar na reflexão do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso. Porém, lamentavelmente, encontrei expressões que estão longe de permitir essa discussão.

Qual é o centro da nossa crítica ao governo Fernando Henrique Cardoso? O centro da nossa crítica é que aquele governo aderiu a uma agenda neoliberal no momento em que o chamado Consenso de Washington se impunha ao pensamento econômico dominante em toda a região, e ele combina uma série de reformas, basicamente marcadas por uma abertura comercial e financeira radical, uma âncora cambial prolongada por quatro anos e meio, que, junto com a abertura comercial, como eu demonstrarei, vão desequilibrar profundamente as contas externas do País, agravar o passivo externo dolarizado e expor o País a uma vulnerabilidade a toda e qualquer turbulência que venha a ocorrer no cenário internacional - como, de fato, aconteceu. O financiamento dessa política vai se dar a partir de juros elevadíssimos. Chegamos a ter juros de 45% - ao final do Governo os juros eram de 25 % - e esses juros elevados impulsionaram um brutal endividamento do setor público.

Basta lembrar que, de Pedro Álvares Cabral ao Governo Itamar Franco, a dívida pública do Estado brasileiro estava em aproximadamente 30% do PIB - Produto Interno Bruto. Uma dívida que permitiu construir Brasília; uma dívida que fez um setor de mineração, como a Vale do Rio Doce, a partir da Segunda Guerra Mundial; que fez todo um setor elétrico de distribuição e geração de energia; que fez parte do sistema financeiro público, bancos como o Banespa, Banerj e tantos outros; uma dívida que fez o setor siderúrgico, o setor de telecomunicações, empresas como Embratel, Telebrás, Telefônica.

Sr. Presidente, em oito anos, o Presidente Fernando Henrique Cardoso dobra a dívida pública para 61,6% do PIB, em setembro de 2002. Em oito anos, praticamente se gerou uma dívida na relação com o PIB - não falo em termos absolutos, porque é muito mais do que isso -, na sua relação com a produção do País, praticamente equivalente a 499 anos da história do Brasil. E essa dívida vai ser administrada por meio de um processo violento de privatização de todo aquele patrimônio - 76% do patrimônio público foi privatizado - e de uma carga tributária que aumenta em 8 pontos do PIB nesses oito anos, passando de 28%  para 35,8% do PIB. Ora, âncora cambial, juros altos, carga tributária elevada impedem o crescimento econômico do País.

Do ponto de vista das contas externas, que é a origem de todo esse desequilíbrio, ao que assistimos no Governo anterior? Ao déficit comercial. Um País como o nosso, que tem uma dependência financeira e uma dívida externa elevadas, não pode ter déficit comercial. Em oito anos, o déficit comercial acumulado foi de U$8,7 bilhões. Nos últimos doze meses, para fazer a comparação, que é o que interessa a este País e a este Plenário, estamos com um superávit comercial de U$32,6 bilhões - recorde histórico, em termos de superávit comercial. E o mais importante: um superávit comercial que decorre de uma política externa ao diversificar nossos mercados e buscar novos parceiros. Basta olhar a agenda dos últimos 15 dias.   Estiveram aqui o Presidente da China, o Presidente da Rússia, o Primeiro-Ministro do Paquistão, do Vietnã, do Canadá e de tantos outros países, mostrando o prestígio, o interesse comercial, numa estratégia que está dando resultados substanciais. Refiro-me ao superávit de U$32,6 bilhões, que é a âncora para começarmos a reduzir a vulnerabilidade externa.

Vou pegar um outro indicador mais importante do que este. Em oito anos do Governo Fernando Henrique Cardoso, o déficit de transações correntes com o exterior atingiu U$186,2 bilhões - U$186 bilhões de déficit, exatamente produto da insistência em uma âncora cambial e de uma abertura comercial precipitada e ingênua.

Nesses quase dois anos de Governo Lula, já temos um superávit em transações correntes de U$ 14,6 bilhões. O Brasil está se desendividando externamente; está deixando de acumular um passivo externo dolarizado; está, ao contrário, aumentando a sua resistência às turbulências financeiras internacionais.

A relação entre a dívida externa e o Produto Interno Bruto caiu de 35,9% para 25%. Esse é o indicador mais importante do processo de desendividamento externo que o Brasil está passando, aumentando as suas reservas cambiais e mantendo um superávit comercial vigoroso, o que nos dá uma certa tranqüilidade em relação à fragilidade estrutural das contas externas, agravadas no período anterior.

Essa melhora nas contas externas permitiu ao País recuperar o crédito. A taxa risco-país, no Governo anterior, esteve em torno de 800 pontos, quer dizer, oitos pontos percentuais para os financiamentos de 10 anos em dólar. Hoje, está em torno de quatro pontos. Barateamos o custo do financiamento externo, permitindo que o setor privado alongasse o seu financiamento e, por meio da retomada do crédito, estimulamos investimentos que são indispensáveis à sustentabilidade da economia brasileira.

Houve melhora nas contas externas e nas contas públicas - porque saíram, hoje, os dados do IBGE. Por favor, não me venham dizer que estamos manipulando dados estatísticos, pois estamos tratando de dados oficiais. A série histórica serve para o governo anterior, para o anterior do anterior, para este e para os próximos governos. Houve uma redução da dívida pública líquida do setor público de 61,6% do PIB para 53,7%, de setembro de 2002 para o mês de setembro deste ano. Sabem o que significa isso? Menos R$15 bilhões de juros neste ano, em relação ao ano passado. Estamos economizando R$15 bilhões para o pagamento de juros da dívida pública, reduzindo não apenas o seu estoque, mas alongando o seu perfil, desdolarizando-a. Assim, estamos melhorando a qualidade do crédito e a capacidade de investimento do setor público.

O Brasil começa a colher os resultados de medidas duras, indispensáveis, que tomamos e que permitiram exatamente esse resultado nas contas externas, nas contas públicas. Qual o indicador mais importante? É o Produto Interno Bruto.

O IBGE acaba de concluir a contabilidade de 2003. O Brasil cresceu 0,5% em meio à moratória da Argentina e a Guerra do Iraque, com toda a herança que herdamos. Isso é mais do que o Brasil cresceu no Governo anterior, na crise da Rússia, que foi 0,13%. Hoje, saíram os dados do IBGE de crescimento do Produto Interno Bruto: 5,3% de crescimento do PIB, nesses nove meses de 2004 - mais do que qualquer ano do Governo Fernando Henrique Cardoso. O Brasil já cresce, neste momento, mais do que em qualquer um dos oito anos do Governo anterior, cujo melhor indicador foi 4,3%. Estamos crescendo mais e mesmo que o último trimestre seja zero, vamos crescer mais que 5%. E o mais importante: quem puxa esse crescimento, hoje, é a indústria brasileira, com 9% de crescimento nesses nove meses. Há muitos anos não víamos uma taxa de crescimento dessa magnitude.

Senador Fernando Bezerra, ex-Presidente da Confederação Nacional da Indústria, estamos vivendo a maior produção industrial de toda a História econômica do Brasil, com recorde de produção das indústrias automotiva, siderúrgica e de papel e celulose, além do maior nível de ocupação da capacidade produtiva instalada desde que o índice foi criado, em 1991. A indústria volta a produzir e a crescer, inclusive a da construção civil, gerando, portanto, um cenário de estímulo ao investimento.

A agenda que eu esperava do debate, e que acredito que o Brasil deva fazer, é em saber que medida somos capazes de dar sustentabilidade a esse resultado absolutamente fantástico para as condições históricas que estamos carregando há tantas décadas neste País. Crescer 5,3% em nove meses é um resultado muito bom. A questão é a sustentabilidade. Esse é um debate em que um ex-Presidente poderia oferecer alternativas, não com essas palavras de ódio, pequenas, que não o engrandecem e nem a sua biografia, e muito menos melhoram a qualidade do debate na democracia.

Precisamos, sim, estar muito atentos à taxa de câmbio para podermos manter o saldo exportador e comercial. Precisamos, por isso, criar condições, passado esse choque externo que absorvemos muito bem do ponto de vista da inflação, porque a inflação está em 7,3%, de retomar uma trajetória de queda na taxa básica de juros, para que a taxa de câmbio possa ser mais competitiva e não prejudique o esforço de combate à inflação.

Câmbio e juros - esse é um debate permanente. Aumentar as reservas cambiais para ajudar a manter um câmbio competitivo é um debate absolutamente relevante, assim como reduzir o spread bancário com políticas e reformas, como a Lei de Falências e outros instrumentos.

A SRª Ideli Salvatti (Bloco/PT - SC) - Permite-me um aparte, Senador?

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Por favor, Senadora Ideli, com muita honra.

A Srª Ideli Salvatti (Bloco/PT - SC) - Senador Mercadante, V. Exª, como não poderia deixar de ser, traz a esta tribuna os indicadores, os números incontestes de todo o esforço do Governo Lula para retomar o crescimento do nosso País, diminuir a vulnerabilidade da nossa economia às turbulências internacionais e permitir - e é isso o que gostaria de reforçar na sua fala - que tudo isso se traduza em condições de melhores dias para a população brasileira. Juntamente com os números tão significativos que V. Exª está apresentando nesta tarde, é muito importante registrarmos, também, situações do cotidiano das pessoas, que estão encontrando emprego, que estão tendo acesso ao crédito com desconto em folha, que estão procurando o crédito para poder implementar o seu negócio, desenvolver a agricultura familiar e ter perspectivas concretas de vida para si e sua família. Todos esses números, tão bem colocados, que são os indicadores econômicos, é muito importante que sejam traduzidos no cotidiano das pessoas, porque é isso que estamos vivenciando e acompanhando. Quero dizer, Senador Aloizio Mercadante, que, quando determinadas frases, adjetivos e locuções são usados por um ex-Presidente da República, diminuímos o debate que, muitas vezes, esta Casa tem sido demonstradora da capacidade de fazer em alto nível, inclusive aperfeiçoando propostas, aprovando determinadas legislações e avançando, efetivamente, para que todos nós não sejamos coletivamente incompetentes de não aproveitarmos este momento da retomada do crescimento, para torná-la sólida e consistente e algo que beneficie a todos os brasileiros, não, infelizmente, como temos assistido durante muitas décadas, beneficiando apenas uma parcela da população. Quero parabenizar V. Exª pelo pronunciamento. Efetivamente, queremos manter o debate de alto nível nesta Casa, no sentido de continuarmos construindo um Estado capaz de garantir o desenvolvimento sustentável para todos os brasileiros e brasileiras.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Agradeço o aparte, Senadora Ideli.

O indicador social mais importante, em um País como o nosso, é o emprego. A criação de 1,796 milhão de novos empregos com carteira de trabalho assinada, indicador que já tem mais de uma década e que percorreu todo o Governo anterior, é recorde histórico de criação de empregos em um único ano. É o maior volume de empregos criados em todo o período em que esse indicador foi constituído, entre outras informações que poderíamos analisar.

Vejam uma expressão, por exemplo, do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, quando fala da perspectiva em relação à eleição presidencial de 2006:: "O que poderia ser maior ameaça do que estar lá?", retomando um discurso que a Oposição usou na campanha eleitoral, de que o Brasil iria tornar-se uma Argentina, de que iria entrar em um processo de instabilidade, de que não haveria governabilidade. Em que se sustenta esse discurso com os indicadores que estamos expressando, hoje, de redução do risco-país, queda da taxa de juros, de recorde de geração de emprego, de produção industrial, de exportação e de saldo comercial? Será que o terrorismo político vai continuar fazendo parte de uma sociedade democrática? Reivindico, deste plenário, o Fernando Henrique que vi na transição entre os dois Governos. Reivindico o intelectual que contribuiu para a democracia brasileira. Reivindico a majestade do cargo de um ex-Presidente que o Presidente José Sarney soube exercer ao longo dos quase 18 anos em que está fora da Presidência da República. A majestade de quem aconselha, pondera, propõe, constrói e traz a sua experiência e a sua força para ajudar na agenda da democracia, e não apequenar o debate político que temos de cotidianamente enriquecer no mandato que aqui exercemos.

O Sr. José Agripino Maia (PFL - RN) - V. Exª me permite um aparte, Senador Aloizio Mercadante?

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/ PT - SP) - Primeiro, ouço o Senador Tião Viana, depois o Senador José Agripino; em seguida, ouvirei os Senadores Fernando Bezerra e Hélio Costa.

            O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Senador Aloizio Mercadante, serei breve. Acho que V. Exª fala por todos nós, do Partido dos Trabalhadores e do Governo. Fala com lucidez e com a segurança inquestionável de quem conhece em profundidade toda a evolução do processo econômico brasileiro. O Presidente Fernando Henrique é bem-vindo quando traz um debate para a sociedade, para os partidos políticos. É inquestionável a contribuição que sempre dá à democracia brasileira quando emite sua opinião. Só me causa estranheza o fato de que, toda vez que chega de viagem, o ex-Presidente Fernando Henrique vem com uma crítica. Parece que encontra tantos elogios ao Presidente Lula fora do Brasil, que volta com dor-de-cotovelo e precisa fazer uma crítica ácida ao atual Governo. Causa-me certa preocupação isso, pois poderia contribuir mais num debate de teses e entendimentos sobre o desenvolvimento nacional. Gostaria que V. Exª comparasse um pouco mais a crise do desemprego gerada nos oito anos de Governo do ex-Presidente Fernando Henrique, que, no segundo mandato, dizia: “quem venceu a inflação vencerá o desemprego”. Deixou o País com mais de 10 milhões de desempregados. E o nosso Governo, nesses 10 meses, gera quase 2 milhões de empregos formais. V. Exª poderia dar mais ênfase a esse assunto. Tenho certeza de que o Brasil acompanha e aprova toda manifestação de solidez intelectual de V. Exª.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Agradeço a intervenção do Senador Tião Viana. Considero que as viagens internacionais são muito importantes para se ter uma visão abrangente do mundo, trazer informações, buscar contribuir para a reflexão e para o debate.

Analisando a democracia americana -- em sua última viagem, o Presidente Fernando Henrique Cardoso esteve na convenção do Partido Democrata e acompanhou a eleição nos Estados Unidos e, infelizmente, não pôde estar no segundo turno das eleições do Brasil; é uma opção que cada um deve fazer -, vemos o papel dos ex-presidentes como estadistas. O papel de Jimmy Carter, por exemplo, na contribuição da agenda dos direitos humanos e da democratização, para analisar e avalizar eleições em outros países. Bill Clinton escreveu agora Minha Vida, excelente obra, mostrando um pouco a sua vida, a reflexão, o cuidado de tratar os temas contemporâneos. Então, essa maturidade democrática temos de reivindicar, temos de construir, inclusive para preservar a condição de ex-Presidente, do ponto de vista do processo político.

O que mais me preocupa - e aí, Senador José Agripino, já passo a palavra a V. Exª - é que precisamos descer do palanque. A época da eleição municipal foi há alguns meses. O Presidente Fernando Henrique Cardoso não quis participar, ou não quiseram que participasse das eleições - não vi nenhum panfleto, material ou propaganda - mas é um direito legítimo. No entanto, terminada a campanha, este País precisa ser governado em todos níveis. Prefeitos vão tomar posse, os governadores de Estado, o Governo Federal. Precisamos ter uma agenda de crescimento, de desenvolvimento e não antecipar 2006, que é um calendário eleitoral, que deve vir no seu tempo, na sua oportunidade.

Devemos tratar da agenda do desenvolvimento, das reformas estruturais, de impulsionar o crescimento da geração de emprego no Brasil. Esse é um grande desafio.

Concedo um aparte ao Líder José Agripino.

O Sr. José Agripino (PFL - RN) - Senador Aloizio Mercadante, estimulo o debate que estamos praticando neste momento. Não tenho procuração do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso para manifestar opinião em seu nome. Mas, até ancorado na pertinente observação do Senador Tião Viana, de que o ex-Senador e ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, cada vez que chega do exterior, critica o Governo, quero não concordar com isso. Eventualmente, até pode acontecer, e aí encontro as razões. O ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, patriota acima de tudo, é um homem maduro e reconhecido no plano internacional. Tenho a impressão, Senador Aloizio Mercadante, de que, quando vai à França, aos Estados Unidos, ao exterior, S. Exª percebe a realidade que qualquer homem do nível dele percebe e que nós temos de perceber: o mundo todo está crescendo. Talvez essa fosse a razão fundamental da percepção que se tinha de que o Governo Lula seria uma tragédia. V. Exª se lembra de que, em novembro e dezembro, o risco Brasil chegou a 2.700, o dólar passou de R$3,50, em função de uma perspectiva de Governo que se anunciava e que, graças a Deus, não aconteceu, porque o Governo, no campo da economia, agiu com responsabilidade. Louve-se a equipe econômica, que tem o Ministro Antonio Palocci a sua frente. O sucesso deveu-se à rigidez com que a equipe econômica conduziu a economia do País, mas também em função do panorama externo que o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso enxerga, de crescimento do mundo, que está comprador, do preço das commodities, da valorização cambial, que - é verdade - é um mérito do Governo. Isso produziu o aumento nas exportações, que está levando a indústria brasileira a crescer em grandes níveis. São exportações compradas por um mundo comprador, diferente do mundo que Fernando Henrique Cardoso encontrou, da crise da Rússia, da crise do México, da crise da Argentina, o que criou turbulência o tempo todo ao Governo de S. Exª. Tenho a impressão, Senador Aloizio Mercadante, de que a crítica do Presidente Fernando Henrique Cardoso move-se muito mais pelo seu desejo - patriota que é, como nós também o somos - de que o Brasil pegue a onda de crescimento de países como o México, a Indonésia, a Coréia, a Tailândia e as Filipinas. Estão crescendo muito mais do que o Brasil. Quando dá a pitada de crítica é porque deseja que o Governo acorde. O que S. Exª não deseja - nem eu, nem V. Exª, nem nenhum de nós - é que aconteça no Brasil o contrário. Por isso, refere-se à incompetência. No campo econômico, em que pouco se esperava do Presidente Lula, Sua Excelência está tendo sucesso, o que é devido, em grande parte, ao que o mundo solicita do Brasil.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O Sr. José Agripino (PFL - RN) - Entretanto, no plano interno, aquilo que se esperava do Presidente Lula não está acontecendo: a obra social. O Fome Zero, o Bolsa-Família e o Primeiro Emprego são programas frustrados. O que incomoda o Presidente FHC também incomoda a mim, que sou brasileiro como o Presidente Lula, que quero ver o Brasil com um ícone, com metas.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O Sr. José Agripino (PFL - RN) - Que grande obra de infra-estrutura está projetada ou acontecendo? Isso é o que nos causa frustração e que leva à crítica do Presidente Fernando Henrique Cardoso, que, em minha opinião, é um patriota, um estadista que merece o respeito que tenho por S. Exª e que, tenho certeza, V. Exª também o tem.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Senador José Agripino, para concluir...

O SR. PRESIDENTE (José Sarney. PMDB - AP. Fazendo soar a campainha.) - O tempo de V. Exª está esgotado.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Perfeito. Quero concluir, só ponderando duas coisas. Primeiramente, peço desculpas aos dois Senadores, pois a Mesa está impedindo a concessão dos apartes. Lamento muito, Senador Hélio Costa, gostaria muito de ouvi-lo e ao Senador Fernando Bezerra.

Concluo dizendo ao Senador José Agripino que entendo a lealdade que S. Exª tem ao ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso e tenho grande respeito pelas pessoas leais. Entretanto, há um outro fator junto com a lealdade, que é o diálogo franco - tenho certeza de que V. Exª o fará. Não vejo esse espírito nas declarações apresentadas.

Aqui, ele não fala de onda de crescimento, mas na onda política que está passando, e que ele sabe surfar, que é carioca. Menciona exatamente isso. Posso até ler:

Tem que aproveitar a janela de oportunidades e se jogar de cabeça na onda boa. Eu nasci no Rio de Janeiro. Então onda eu sei pegar. É só o que eu sei. Tem que pegar.

(...)Quando a onda é muito grande, abaixa a cabeça, senão ela te quebra. Ela pode ser muito grande e você pegar de jeito, de lado, assim, você pode, vem, é bonito, faz o jacaré e aporta na areia.

A onda do crescimento é evidente, e temos interesse em ver quais são as sugestões para crescermos mais. Mas o Brasil está crescendo bem acima da média. O Brasil está crescendo mais do que o dobro do período do Governo de S. Exª, que foi um período de crescimento exuberante, os melhores oito anos da economia americana. A China já crescia a 8%, 9% ao ano. É verdade que houve turbulências, como, no ano passado, a moratória da Argentina, que se arrastava, e a guerra do Iraque. O Brasil está crescendo, também pelo trabalho que foi feito anteriormente. Penso que o Governo anterior ofereceu contribuições. O País está crescendo, porque tem uma política correta e segue o caminho sólido de gerar recorde de exportação e saldo comercial; porque está estimulando os investimentos privados e públicos, com o PPP, e possibilitando a melhora da dívida pública.

O crescimento da receita tributária vai permitir fazer os investimentos estruturantes. Estamos economizando recursos, melhorando o perfil e desendividando o Brasil.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Termino, Sr. Presidente, dizendo que tenho grande interesse em ouvir as críticas da Oposição. Acho que a condição e a estatura de um ex-Presidente ajudam muito um observador atento, sobretudo com a formação intelectual do Presidente Fernando Henrique Cardoso, mas não foi isso que foi exposto ao País nesta oportunidade. Ele está longe do Presidente que patrocinou a transição e muito longe da majestade do cargo que essa condição impõe.

Espero, sinceramente, que não aprofundemos o debate por essa entrevista, mas, sim, pela qualidade da análise, da observação atenta, das recomendações construtivas, das propostas de desenvolvimento que, evidentemente, temos todo o interesse em acolher, discutir e enfrentar, como sempre fizemos nesta tribuna, nesta Casa.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/12/2004 - Página 39383