Discurso durante a 175ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre o projeto que regulamenta as parcerias público-privadas.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • Considerações sobre o projeto que regulamenta as parcerias público-privadas.
Aparteantes
Rodolpho Tourinho.
Publicação
Publicação no DSF de 07/12/2004 - Página 40447
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, DEBATE, CONGRESSO NACIONAL, JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, PARCERIA, SETOR PUBLICO, SETOR PRIVADO, DEFESA, URGENCIA, APROVAÇÃO, BENEFICIO, APERFEIÇOAMENTO, SERVIÇO, INFRAESTRUTURA.
  • ATENÇÃO, ALTERAÇÃO, PROJETO, GOVERNO FEDERAL, AUTORIA, VALDIR RAUPP, SENADOR, CUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO, RESPONSABILIDADE, NATUREZA FISCAL.
  • COMENTARIO, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, PARCERIA, SETOR PUBLICO, SETOR PRIVADO, VIABILIDADE, INVESTIMENTO, PAIS ESTRANGEIRO, CHINA, INFRAESTRUTURA, BRASIL.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na atividade legislativa, as grandes decisões e os acordos memoráveis nem sempre são fruto de processos rápidos e ágeis. Pelo contrário, rapidez e agilidade podem traduzir-se em açodamento e intempestividade.

O amplo debate e a discussão minuciosa das matérias são necessários, principalmente nesta Casa, que é uma Casa revisora, pois tendem a minimizar a possibilidade de fracasso do legislador na concretização dos objetivos que traçara ao elaborar a proposição legislativa.

Sr. Presidente, um projeto, muitas vezes, sofre modificações, e, quanto mais nebulosos os contornos, mais gente vota; quanto mais nítidos, menos gente vota. É preciso que haja nitidez, mas que esteja bem acordada, senão se pensa em fazer um cavalo de raça inglesa e acaba por se construir um camelo, com todas aquelas linhas grosseiras.

O projeto de lei que institui as Parcerias Público-Privadas (PPPs) é exemplo dos benefícios trazidos ao processo legislativo pela discussão e pelo debate. Afinal, após alguns meses de tramitação nesta Casa - o que incluiu a fertilidade de idéias das audiências públicas -, o projeto ganhou uma versão muito mais elaborada do que o texto original. Eu mesmo apresentei várias emendas a esse projeto.

O consenso foi estabelecido, e garantiu-se a eqüidade entre o interesse público e o privado, a repartição de riscos e benefícios, o respeito à responsabilidade fiscal e a necessária prioridade à satisfação das necessidades dos usuários dos serviços públicos.

O nosso País, Sr. Presidente, precisa urgentemente de serviços de infra-estrutura. As nossas estradas estão sucateadas, as nossas ferrovias estão com problemas sérios, os nossos portos não estão como gostaríamos, as nossas universidades estão mal administradas, seja por falta de dinheiro, seja por falta de manutenção dos equipamentos físicos. Enfim, se o País crescer um pouco mais, as veias por onde corre a riqueza não serão suficientes, nem nossas rodovias, nem nossas vias fluviais. Por isso, precisamos acelerar, e as PPPs serão imprescindíveis.

Nesse sentido, merecem todo destaque as salvaguardas incluídas no relatório do Senador Valdir Raupp, do PMDB, principalmente as que se referem ao cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal e às obrigações da parte privada.

Ao limitar em 1% da receita corrente líquida do exercício as despesas de caráter continuado da União derivadas do conjunto de PPPs, considerando o exercício vigente e a projeção para os seis exercícios seguintes, o projeto de lei garante a fiel observância do mais poderoso instrumento de garantia da moralidade do gasto público neste País: a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Essa foi uma lei que mudou inclusive o caráter dos próprios administradores brasileiros. E veio para ficar, pois determina a responsabilidade sobre os gastos com o dinheiro público.

E vai além! O Senador Valdir Raupp estende o respeito à Lei de Responsabilidade Fiscal a Estados e Municípios, ao proibir a União de conceder garantia e realizar transferência voluntária aos entes públicos cujas despesas totais com os contratos de PPP excedam 1% das respectivas receitas correntes líquidas.

O projeto também avançou ao excluir as concessões comuns, que não envolvem a contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado, do rol de parcerias passíveis de serem enquadradas como público-privadas.

Na seara das licitações para a constituição de PPPs, o projeto estabelece uma medida que considero importantíssima para a garantia da seriedade e da lisura do processo licitatório: a previsão de que a minuta de edital e de contrato seja submetida à consulta pública e divulgada na imprensa oficial e regular.

Coroando os aperfeiçoamentos, estão os limites impostos à participação do setor público no financiamento das PPPs: 70% do valor do contrato para a participação de empresas públicas e sociedades de economia mista; e 80% quando houver aporte de recursos de fundos de pensão patrocinados pela administração pública.

Essa medida garante que o parceiro privado entre na parceria com pelo menos 30% da verba necessária, poupando o Poder Público do desembolso da totalidade dos recursos, o que seria uma afronta à própria concepção de Parceria Público-Privada.

Fica também garantida a justa repartição dos riscos entre os parceiros, evitando que o Poder Público assuma sozinho os riscos e que o parceiro privado fique somente com a parte boa: os lucros.

As Parcerias Público-Privadas são muito importantes para o desenvolvimento do País. No entanto, antes de serem firmadas, devem passar por rigorosa avaliação, a fim de garantir que tenham como norte, sempre e exclusivamente, a melhoria da qualidade de vida do povo brasileiro.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os aperfeiçoamentos feitos ao projeto de lei das PPPs - diga-se, de passagem, oportunos e pertinentes - proporcionaram o consenso necessário para sua aprovação nas comissões e, sem dúvida, também no plenário.

Mais do que um acordo político, o projeto trará inúmeros benefícios ao nosso País, que precisa, com urgência, de investimentos em infra-estrutura para poder crescer e gerar empregos.

Nós nos preocupamos inclusive com a devolução dessas obras, porque as obras realizadas geram, em alguns casos, até concessões. Se, nos últimos anos, quem estiver cuidando dessa obra não o fizer de maneira adequada, isso será um prejuízo para a população. Por isso, parte desse dinheiro deve ficar guardada em um fundo e só será repassada se a obra, ao ser devolvida ao público, estiver em boas condições. Tudo isso foi pensado. Foi realmente muito boa a discussão e muito bem aprofundada.

A recente visita do Presidente da República Popular da China ao Brasil trouxe à tona as enormes oportunidades que serão geradas para nosso País com os vultosos investimentos que aquela Nação pretende fazer na infra-estrutura brasileira por intermédio das Parcerias Público-Privadas. Não é segredo que a economia da China é a que mais cresce no mundo. Por conseguinte, precisamos aproveitar tamanha exuberância e trazer investimentos chineses para o nosso País. 

A China, Sr. Presidente, tem crescido às vezes 9% em um trimestre, chegando ao ponto de frear algumas áreas de crescimento para que não falte eletricidade, cimento, aço. Quando o Brasil voltou a se relacionar diplomaticamente com a China, ela tinha um PIB menor do que o nosso e tinha muitas dificuldades. Eles observaram bem o poder da sua moeda, mas cuidaram também dos investimentos. Não ficaram, como nós, cuidando da moeda, tentando fazer com que o real tivesse estabilidade. E, hoje, disparou. O país tem um bilhão e 300 milhões de pessoas que consomem quase todo o cimento do mundo, uma parte gigantesca do aço mundial, e por aí afora.

A aprovação do Projeto de Lei das PPPs viabilizará a realização de numerosos investimentos chineses no setor de infra-estrutura brasileiro. Como tem a maior população do mundo, a China considera fundamental o suprimento de produtos agrícolas e matérias-primas para a sua economia. Para tal, empresários chineses estão dispostos a investir pesado em nossos portos e ferrovias.

Para se ter uma idéia do potencial dos negócios, os chineses anunciaram que pretendem investir US$2 bilhões na Ferrovia Norte-Sul e no porto de Itaqui, no Maranhão, obras que facilitarão o escoamento de soja brasileira produzida no norte de Mato Grosso, no Piauí, de V. Exª, e no próprio Estado do Maranhão.

Tenho certeza de que os investimentos chineses não ficarão por aí. Com a aprovação das PPPs o Governo brasileiro pretende atrair investimentos para a Ferrovia Transnordestina, para os portos de Suape e de Santos, e para o anel viário de acesso ao Porto de Sepetiba e outros. Tais investimentos são fundamentais para o desenvolvimento do nosso País, que, sabidamente, vem enfrentando, como eu disse, sérios problemas de infra-estrutura, com rodovias precárias, ferrovias quase inexistentes e portos ultrapassados.

A capacidade de investimento nessas áreas por parte do Governo brasileiro é, infelizmente, muito reduzida. Os recursos chineses que adentrarão o Brasil por meio das PPPs poderão suprir essa lacuna e trazer enormes benefícios para nós, que aumentaremos nossas exportações; e para a China e outros países, que terão abastecido seus mercados internos.

 Para se ter uma idéia, temos hoje, Sr. Presidente, 60 milhões de hectares plantados. Mas temos a potencialidade de, sem mexermos na Amazônia, plantar mais 90 milhões de hectares. Plantamos hoje cerca de 25 milhões de hectares de soja e já chegamos a ser o maior produtor desse produto. A potencialidade do Brasil é gigantesca. Se trabalharmos com afinco, este País será o mais rico do mundo. É pena que percamos tanta energia em discussões estéreis. É pena que a classe política se perca tanto em desvãos de filosofias que não conseguimos entender. Às vezes, observo os problemas e fico sem entender por que não encontramos logo as soluções, já que, às vezes, elas são tão fáceis de se compreender. Mas a discussão, o ruído e o barulho dessas discussões terminam atrapalhando.

O governo chinês estima que o intercâmbio comercial entre os dois países chegará a US$35 bilhões em 2010. Vejam, Srªs e Srs. Senadores, que mercado potencial para os produtos brasileiros!

A visita do Presidente Hu Jintao rendeu ao País inúmeros acordos comerciais vantajosos. Foi liberada a exportação da carne bovina e do frango para a China. Em troca, o Brasil permitiu a importação de carne de frango e suína processadas. Estima-se que os ganhos brasileiros com a exportação de carne bovina in natura serão de US$600 milhões anuais, sem contar com a venda de miúdos, muito apreciados na China. As vendas de ave deverão proporcionar ao País ganhos anuais da ordem de US$200 milhões.

Ficou acertada também a compra de dez aviões da Embraer no ano de 2005, o que gerará uma receita de US$200 milhões. No campo do turismo, foi assinado um memorando para facilitar o acesso de grupos de turistas chineses ao Brasil, um passo importante para melhor explorar o enorme potencial turístico nacional, ainda subutilizado.

Para viabilizar acordos tão fundamentais para a economia brasileira - e, em troca, tornar-se parceiro preferencial -, o Governo brasileiro reconheceu a China como uma economia de mercado. Tal reconhecimento, Sr. Presidente, traz benefícios, mas também riscos com os quais eu me confesso preocupado. Em tese, com status de economia de mercado, a China poderá enfrentar menos salvaguardas e restrições comerciais do Brasil do que com seu antigo status de economia em transição. No entanto, o Ministro Furlan garantiu que, para o caso de eventuais contenciosos, o Brasil não abre mão das salvaguardas que possui, muito menos da aplicação de regras anti-dumping dentro dos procedimentos normais da OMC.

Espero que, de fato, as autoridades brasileiras sejam extremamente diligentes na defesa dos interesses comerciais brasileiros, pois não podemos brincar com economia tão poderosa quanto a da China.

É preciso encontrar um meio-termo entre a ampliação dos negócios com a China - e estamos buscando também com a África do Sul, a Índia, o Paquistão e muitos outros - e a defesa incondicional da nossa economia. Afinal, não podemos admitir que empregos sejam trocados por divisas. Aumento do comércio, sim! Desemprego para os brasileiros, não!

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a aprovação do Projeto de Lei das Parcerias Público-Privadas proporcionará enormes benefícios para o Brasil e para o povo brasileiro. Viabilizados por meio das PPPs, os investimentos chineses e outros nas áreas de infra-estrutura poderão contribuir para o desenvolvimento sustentável do País e para a geração de emprego e renda.

A parceria comercial do Brasil com outros países tem um futuro promissor. Entretanto, para que ele se concretize, precisamos agarrar as oportunidades sem descuidarmos, um momento sequer, da nossa defesa comercial.

O Sr. Rodolpho Tourinho (PFL - BA) - Permite-me V. Exª um aparte, Senador Ney Suassuna?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Pois não.

O Sr. Rodolpho Tourinho (PFL - BA) - Considero muito oportuna a ponderação de V. Exª em relação às PPPs, pois ela é um resumo importante de todo o projeto discutido, praticamente ao longo deste ano.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Perdoe-me, nobre Senador: com muita competência de V. Exª, que foi o Relator na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e o responsável pelo brilho final do projeto nas Comissões.

O Sr. Rodolpho Tourinho (PFL - BA) - Discordo de V. Exª, mas agradeço pela sua apreciação. Foi um trabalho de todos ao longo desse tempo inteiro. A importância de seu pronunciamento também está no apoio que traz, explicitamente, ao projeto. V. Exª enfatiza os pontos principais, aquilo que chamamos de blindagem da Lei de Responsabilidade Fiscal, não permitindo que União, Estados e Municípios venham a criar esqueletos impagáveis no futuro, o que não existia no projeto original. Além disso, trata da blindagem das regras de licitação, quer da obra pura, por meio da Lei de Licitação, quer por intermédio do regime de concessão, que não se abriu àquilo que se pretendia, e da blindagem dos fundos públicos. V. Exª demonstrou preocupação com a conservação do bem ao final de 35, 20 ou 15 anos e com a possibilidade de retenção disso, mediante vistoria a qualquer momento. Quando V. Exª se refere aos chineses, trata da importância de retirarmos da Câmara, enviando-o para o Senado, o projeto das agências reguladoras, pois com um marco regulatório claro e preciso, os chineses, seguramente, pensarão duas ou três vezes antes de virem para cá. Tem sido função do Senado rever e aprimorar esses projetos, o que entendo ser muito importante. Quero louvar o pronunciamento de V. Exª porque ele reflete tudo o que fizemos ao longo deste ano.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Nobre Senador, obrigado pelo aparte. O PFL e a Bahia têm muito de que se orgulhar de V. Exª. Nas suas participações nesta Casa, com a experiência que obteve como Ministro de Minas e Energia e também como Secretário de Fazenda da Bahia por um tempo longo, V. Exª tem-nos trazido a praticidade de quem conhece todo o métier.

            Eu trouxe esse assunto à tribuna porque vamos votá-lo na próxima quarta-feira e é bom que os Srs. Senadores e todo o público brasileiro saiba bem do que se trata, quais foram as preocupações e o que fizemos. Houve uma hora em que disseram: “Não, a Oposição está bloqueando”. Não, a Oposição queria uma melhoria do texto, que foi feita depois de entendimento com o Governo. Houve aprimoramentos importantes do Senador Valdir Raupp e de V. Exª, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

Ainda haverá debates, mas 90% a 95% das coisas já foram dirimidas e o Brasil espera de braços abertos que venham as PPPs, para que a nossa infra-estrutura possa avançar. Com certeza, na quarta-feira, vamo-nos aprofundar nesse debate.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/12/2004 - Página 40447