Discurso durante a 176ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre o índice de mortalidade de policiais civis e militares no país.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Reflexão sobre o índice de mortalidade de policiais civis e militares no país.
Aparteantes
Magno Malta, Sergio Guerra.
Publicação
Publicação no DSF de 08/12/2004 - Página 41371
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, AUMENTO, INDICE, HOMICIDIO, VITIMA, POLICIA CIVIL, POLICIA MILITAR.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), LEVANTAMENTO DE DADOS, CRESCIMENTO, HOMICIDIO, POLICIA MILITAR.
  • ANALISE, COMPARAÇÃO, SITUAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), CONFIRMAÇÃO, SUPERIORIDADE, HOMICIDIO, POLICIAL MILITAR, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES).
  • SOLIDARIEDADE, POLICIA MILITAR, IMPORTANCIA, RESPONSABILIDADE, GARANTIA, ORDEM PUBLICA, PROTEÇÃO, SOCIEDADE.
  • SUGESTÃO, REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS (CAS), COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, PARTICIPAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), REPRESENTANTE, GOVERNADOR, ESTADOS, COMANDO MILITAR, POLICIA MILITAR, MUNICIPIOS, SUPERIORIDADE, OCORRENCIA, HOMICIDIO, VITIMA, POLICIAL, DEMONSTRAÇÃO, INICIO, INTERVENÇÃO, ESTADO, SOLUÇÃO, PROBLEMA, SEGURANÇA PUBLICA.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tentarei abordar um assunto que julgo de grande relevância e que tem sido tratado, em alguns momentos, com atenção pela grande imprensa brasileira. No mês de agosto deste ano, o jornal Folha de S.Paulo deu um tratamento diferenciado à matéria e, no mês de outubro, quem o fez foi o jornal O Globo. Trata-se da morte de policiais militares e civis no Brasil.

Conforme noticia a grande imprensa, policiais sequer podem-se apresentar à sociedade fardados. Com a responsabilidade da função que lhes é devida, devem usar disfarces civis para terem o direito de viver em algumas cidades do Brasil.

Pedi à Consultoria Legislativa que fizesse um levantamento dos índices de mortalidade de policiais civis e militares no Brasil, e os dados obtidos são assustadores, de grande dificuldade de compreensão e aceitação passiva por parte de qualquer cidadão brasileiro. O jornal Folha de S.Paulo também fez um grande levantamento, no período de janeiro a julho, apontando a escalada de homicídios de policiais militares, que são os que fazem o policiamento ostensivo, diferentemente dos policiais civis, que executam outro tipo de abordagem policial.

Unidades federativas e o total de assassinatos até o mês de julho: Rio de Janeiro, 81 policiais assassinados; São Paulo, 59; Bahia, 29; Minas Gerais, 23; Pará, 18; Ceará, 10; Pernambuco, 9; Rio Grande do Sul, 9; Paraná, 8; Alagoas, 7; Espírito Santo, 4; Santa Catarina, 4; Goiás, 3; Piauí, 3; Distrito Federal, 3; Maranhão, 2; Mato Grosso do Sul, 2; Paraíba, 2; Tocantins, 1; Roraima, 1; Rondônia, 1; Sergipe, 1; e Mato Grosso, um.

No Acre, meu Estado, felizmente, não houve nenhum assassinato, bem como no Amazonas, Amapá e Rio Grande do Norte.

No total, até o mês de julho, houve 281 assassinatos de policiais no Brasil.

Comparativamente, observamos que, nos últimos sete anos, têm morrido, a cada ano, mais policiais assassinados no Rio de Janeiro que nos Estados Unidos, no Canadá e no Reino Unido juntos.

Fazendo uma análise comparativa com outros países, constatamos que morreram assassinados no Brasil, apenas de janeiro a julho de 2004, mais policiais do que nos últimos três anos e meio nos Estados Unidos, incluindo os que foram mortos nos atentados de 2001. Analisando os números de algumas unidades confederadas americanas, vemos que, na Califórnia, houve cinco assassinatos de policiais em 2004; no Estado da Flórida, dois; em Nova Iorque, quatro; e, no Texas, três.

É dramático o quadro que vivemos e o Parlamento brasileiro deve-se levantar em homenagem e em defesa dos policiais militares brasileiros, que fazem o policiamento ostensivo.

Durante muitos anos, exerci a Medicina e sei o valor, na travessia de uma madrugada nas grandes e médias cidades, da presença da Polícia Militar, da Polícia Civil e dos profissionais de saúde. Não é aceitável, não pode ser tolerado pela sociedade brasileira que tantas pessoas, no exercício da função de assegurar a ordem pública e proteger a vida, estejam sendo assassinadas.

O Sr. Magno Malta (PL - ES) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Concedo um aparte ao Senador Magno Malta.

O Sr. Magno Malta (PL - ES) - Senador Tião Viana, parabéns pelo pronunciamento! É com muito orgulho que faço este aparte porque também tenho-me preocupado com essa questão. Conheço a importância, para a sociedade, da repressão policial, por isso precisamos refletir a respeito. Quando encerramos a CPI do Narcotráfico, um grande narcotraficante brasileiro, Fernando da Costa “Beira-Mar”, foi recambiado da Colômbia. Eu estive, juntamente com outros dois Parlamentares, na Polícia Federal, onde, em conversa reservada, ele começou a falar do tráfico internacional. Em um determinado momento, um Parlamentar disse: “Não estou interessado no que vai para fora, rapaz. Estou interessado no que fica aqui dentro para matar os nossos irmãos”. Ele respondeu: “Não estou entendendo o senhor. O senhor sabia que o que vai para fora volta em arma para matar a polícia?” É verdade, Senador Tião Viana. Temos 1,1 mil quilômetros de fronteira aberta com o Paraguai, por onde passa quase todo o contrabando de armas de fogo de pequeno porte, que causam a violência urbana brasileira. Os policiais têm sido assassinados por meliantes em virtude da violência e do enfrentamento do tráfico. Normalmente, eles não são assassinados pelo financiador ou pelo grande traficante, mas por ordem do gerente da “boca”. Aqueles que são usuários e devem à “boca” tornam-se dependentes e pagam suas dívidas fazendo esse enfrentamento, queimando ônibus, provocando baderna na sociedade. Por isso, os índices são altíssimos. Há muito a se fazer. Primeiramente, é preciso que se fechem essas fronteiras. Depois, quando um sujeito diz que cheirar um papelote de cocaína na sexta-feira ou no sábado para ir à boate não faz mal a ninguém, é preciso que se entenda que, para a droga chegar à mão desse artista, morreu policial pelo caminho. V. Exª está fornecendo os dados: os filhos estão órfãos, o policial é mal-remunerado e a aposentadoria é ainda pior. Portanto, precisamos fazer um conjunto de leis neste País para remunerar bem os policiais. Hoje, existem homens realizando o sacerdócio da segurança pública nas madrugadas, porque, realmente, têm natureza de policial. São como o médico e a enfermeira que, mesmo mal-remunerados, não deixam o hospital, porque consideram a sua profissão um sacerdócio. Os que fazem por fazer, não: vão embora, largam para lá ou montam empresas. Os sacerdotes não fazem isso, e eles existem na Polícia. Não é possível que recebam mensalmente R$800,00 - valor que, após os descontos, se reduz a pouco mais de R$600,00 - e que, por não terem onde morar, vivam nas favelas e sofram esse índice altíssimo de assassinatos! Não podemos ficar de braços cruzados. V. Exª está de parabéns e merece a nossa admiração pelo tema que aborda. Precisamos fazer coro com V. Exª e buscar medidas junto ao Governo, porque não podemos mais tolerar tantas mortes de policiais, de “sacerdotes” da segurança pública neste País. Esses números são alarmantes e nos desmoralizam diante de outros países. Parabéns a V. Exª e muito obrigado pela oportunidade de permitir a minha participação neste debate.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Agradeço, eminente Senador Magno Malta. V. Exª é reconhecido em todo o Brasil como alguém que deu uma sólida contribuição à luta contra o narcotráfico ao presidir, com tanta grandeza, a CPI do Narcotráfico no Congresso Nacional.

Antes de conceder o aparte ao Senador Sérgio Guerra, fornecerei, a título de complementação, os seguintes dados comparativos: nos Estados Unidos, em 1998, 64 policiais foram assassinados; e, em 2003, 48; no Rio de Janeiro, em 1998, 122; e, em 2003, 147. O problema é crescente e beira o descontrole, criando um clima de absoluta insegurança que envolve a própria corporação militar.

É preciso ressaltar que, em 11 de setembro de 2001, houve o atentado às torres gêmeas, quando 135 policiais foram mortos nos Estados Unidos, mas, mesmo assim, o Rio de Janeiro, uma unidade federada, sem que seja feita comparação com aquele país, cuja população é de mais de 250 milhões de habitantes. No entanto, no Rio de Janeiro, homicídios praticados contra policiais militares é muito superior do que naquele país. Por essa razão, observamos, tristes, e contemplamos os registros feitos nos jornais argentinos recomendando alerta e preocupação máxima com as viagens turísticas ao nosso querido Estado do Rio de Janeiro.

Ouço o Senador Sérgio Guerra.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Senador Tião Viana, sem dúvida a leitura dos dados dessa pesquisa comprova resultados assustadores. Importante é que tenham sido trazidos ao nosso conhecimento e ao do País mediante a palavra de V. Exª. Aqui, em meu lugar, ouvindo a palavra de V. Exª, uma sensação estranha de impotência me invade.. Qual o nosso papel nisso tudo? Somos Senadores, e não somos tantos assim, e temos imensa responsabilidade, pelo menos devemos pensar dessa forma, e assistimos, passivamente, à leitura de dados como os que V. Exª reuniu, que são a dramática comprovação de um quadro que merece uma reação do povo brasileiro, do Governo, das instituições. Aceitar isso simplesmente é autocondenação. Um País que não reage a isso não terá demonstrado vontade; um governo que não atua de maneira forte e consistente contra isso não terá demonstrado capacidade de administração pública. Não estou, nesse momento, fazendo discurso de oposição ao Presidente Lula, nem à Governadora do Estado do Rio de Janeiro. O fato é que esse processo chegou a um ponto, muito bem esclarecido por V. Exª, que deveria mobilizar interesses. Como aceitar isso? Trata-se de algo comprometedor para o País, para todos nós, para a nossa cultura, para a nossa sociedade. Evidentemente há outros pontos que comprometem a Nação brasileira: falta de justiça social, a pobreza enorme, a fome, grandes desequilíbrios entre regiões, desperdício, impunidades. Mas esse dado trazido por V. Exª para que tomemos conhecimento é muito forte. A nossa Polícia está sendo assassinada nas ruas. Se não há segurança para ela, imagina para o País, para o povo, para o cidadão comum! É preciso reagir a isso. Gostaria de sugerir a V. Exª que mobilizasse companheiros seus para contribuir no desenvolvimento de uma resposta às perguntas que estão contidas nessa denúncia e que precisam ser respondidas.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Agradeço-lhe, nobre Senador Sérgio Guerra, que, sempre, com muita lucidez e competência, aborda temas dessa natureza, temas que dizem respeito à responsabilidade do Congresso brasileiro e de todos os Partidos. De minha parte, digo que eu jamais lançaria flechas dirigidas à Governadora do Rio de Janeiro com o fim de criar constrangimento político a S. Exª. Não é esse o meu propósito, mas, sim, o de prestar solidariedade à Polícia Militar do Brasil, aos policiais militares, que têm a responsabilidade de assegurar a ordem pública e proteger a sociedade. Da mesma forma, não responsabilizaria, em si, o Governo Federal, porque é um problema do Brasil. Olho para o meu Estado, o Acre, que pode servir como amostragem, porque, a cada 15 dias, nos reunimos com o Secretário de Segurança do Estado, o representante do Ministério Público do Estado, o Presidente do Tribunal de Justiça, representantes da Polícia Civil e Federal a fim de avaliar todo impacto que requer reflexão e intervenção.

O que fazia a Polícia de Nova Iorque quando tinha como prefeito o Sr. Rudolph Guiliani? A cada ato irregular ocorrido em determinado período havia a intervenção necessária para o problema. Parece que no Brasil a regra é a seguinte: “Ocorreu assassinato, procuremos o assassino”. Vivemos em estado de esquizofrenia absoluta, de perda, de descontrole, de, como se diz, morder a si próprio, de dar voltas em si mesmo, enfim, não analisamos as causas efetivas com o intuito de fazer a intervenção correta. É chegada a hora de uma reflexão mais profunda.

Não consigo imaginar que, até julho deste ano, 288 pais de famílias deixaram seus filhos em casa, suas esposas, seus parentes e amigos e, cumprindo o dever de proteger a ordem pública, foram vítimas de assassinatos, um crime que atinge níveis de intolerância insuportáveis. O assunto merece reflexão. O que ocorre no Estado do Espírito Santo deve ser um alerta para todos nós. É, sem dúvida alguma, preocupante a situação do Governador, nosso colega e ex-Senador, Paulo Hartung. É preocupante a insegurança da população do Espírito Santo. No Rio de Janeiro nem se fala. Penso que é um problema de Estado. Portanto, minha sugestão, partilhando o que V. Exª coloca, é que pudéssemos realizar uma audiência pública, ou na Comissão de Assuntos Sociais, ou na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, com o Ministro da Justiça, representantes e Governadores dos Estados mais atingidos por essa situação dramática e com o comando militar das Polícias Militares dos locais mais atingidos. Seria o início de uma ponderação de intervenção de Estado à altura do que o assunto exige.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/12/2004 - Página 41371