Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o ato médico.

Autor
Flávio Arns (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Flávio José Arns
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Considerações sobre o ato médico.
Publicação
Publicação no DSF de 21/12/2004 - Página 44116
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPASSE, PROJETO DE LEI, DEFINIÇÃO, COMPETENCIA, MEDICO, MOTIVO, REDUÇÃO, AUTONOMIA, ATUAÇÃO, DIVERSIDADE, CATEGORIA PROFISSIONAL, AREA, SAUDE.

O SR. FLÁVIO ARNS (Bloco/PT - PR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, você entregaria um filho portador de uma apendicite aguda para ser operado por uma enfermeira?

Por que não?

Porque o tratamento desta doença é um ATO MÉDICO.

Você aceitaria um laudo de uma Ressonância Magnética assinado por um técnico de Raio X?

Por que não?

Porque o exame de diagnóstico implica em formação médica especializada e é, essencialmente, um ATO MÉDICO.

A partir do desdobramento da medicina geral em muitas áreas específicas e mesmo do surgimento de novas áreas pelo avanço da ciência médica e de saúde, novas áreas de atuação profissional foram surgindo e cada uma delas foi obtendo a sua lei de reconhecimento profissional e definindo atribuições. Assim, todas estas novas áreas profissionais foram se constituindo e foi se definindo, por exemplo, o ATO FISIOTERAPÊUTICO, o ATO FONOAUDIOLÓGICO, o ATO PSICOLÓGICO, o ATO DE ENFERMAGEM SUPERIOR.

Como a Lei do Médico é a mais antiga, ela ficou com definições gerais e defasa no tempo. Quando as novas áreas profissionais estavam quase todas contidas na ação do médico, quase que naturalmente se definiam as competências e as fronteiras da ação do mesmo e toda a sociedade estava de acordo, não havendo qualquer questionamento.

Como em todas as novas áreas profissionais é legítimo que também os médicos busquem uma atualização da sua lei normativa e é senso comum a legitimidade deste pleito.

Onde está, então, o impasse e a causa das controvérsias?

Acredito que ela se encontra na definição da abrangência do ATO MÉDICO e na possibilidade da superposição de competências, algumas vezes criando um sentido de subordinação ou de perda da autonomia das outras áreas de atuação profissional em relação ao médico.

Aceitar que, como princípio, compete ao médico que recebeu formação específica em longos anos de formação e que se obriga a permanente atualização e reciclagem, a tarefa do DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO, não deveria causar qualquer dificuldade.

O projeto de lei 15/2002 que tramita no Senado Federal estabelece que:

1º O médico desenvolverá suas ações no campo da atenção à saúde humana para:

I. A promoção da saúde; II. A prevenção, o diagnóstico e o tratamento das doenças; III. A reabilitação de enfermos.

A dificuldade surge nos casos em que o diagnóstico e mesmo alguns tratamentos fazem parte da formação e da habilitação profissional de algumas destas novas áreas de atuação no campo da Medicina.

Por exemplo, o diagnóstico de algumas alterações psicológicas e mesmo o seu tratamento que não medicamentoso; a indicação e execução do melhor tratamento fisioterápico, a realização de exames fonoaudiológicos que conduzem a um diagnóstico.

Talvez nestas situações em especial, como hoje em geral, a saída esteja na compreensão e na aplicação do que venha a ser uma equipe multidisciplinar na área de saúde/medicina. Diante da complexidade da abordagem do paciente a contribuição de diversos profissionais tendo, como objetivo comum o que de melhor possa ser feito, valorizaria cada um, respeitando a sua competência e os limites da sua atuação.

Por exemplo, no atendimento de um paciente com problemas auditivos contribuiriam o médico, o fonoaudiólogo, eventualmente profissional da área de enfermagem e a síntese da atuação de todos seria o melhor diagnóstico e o melhor encaminhamento terapêutico. Quando se tratasse de tratamento cirúrgico, atuaria o médico cirurgião otorrinolaringológico na sua especificidade executando um ATO MÉDICO. Quando se tratasse de tratamento ou recuperação ou recuperação na esfera do fonoaudiólogo este executaria a sua missão como ATO FONOAUDILÓGICO.

O que nunca poderia acontecer é uma atuação profissional que ultrapassasse o campo da competência e que viesse a redundar em prejuízo ao paciente.

Outro ponto não compreendido e por isso causa de controvérsias não diz propriamente respeito à atuação do médico na relação médico-paciente mas à sua participação em coordenação, supervisão ou chefia, direção técnica e ensino. Como os serviços se tornaram multidisciplinares, necessariamente a chefia deles não será cargo privativo de médico. Porém é de bom senso que dentro de uma tal estrutura, a chefia específica do serviço médico seja exercida por médico.

Assim, por exemplo, a chefia de um posto de saúde pode ser exercida por profissional da área de saúde ou administrativa com especialização em saúde, porém a coordenação do serviço médico deveria ser exercida por médico, assim como da enfermagem por enfermeira e assim por diante.

Se no debate da questão estiver envolvida somente a questão de reserva de mercado profissional, supervalorização da área de atuação em detrimento das demais, com certeza não haverá consenso e como resultado nenhum benefício para a cidadania.

Se por outro lado o foco principal da questão estiver no melhor atendimento ao paciente e na contribuição para as melhores políticas de saúde para toda a população deverá ser encontrado um denominador comum e se chegará a uma formulação da melhor lei.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/12/2004 - Página 44116