Pronunciamento de Augusto Botelho em 21/12/2004
Discurso durante a 4ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Discussão sobre a unificação das eleições federais, estaduais e municipais no Brasil.
- Autor
- Augusto Botelho (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RR)
- Nome completo: Augusto Affonso Botelho Neto
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
ELEIÇÕES.:
- Discussão sobre a unificação das eleições federais, estaduais e municipais no Brasil.
- Publicação
- Publicação no DSF de 22/12/2004 - Página 44473
- Assunto
- Outros > ELEIÇÕES.
- Indexação
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- CRITICA, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, UNIFICAÇÃO, ELEIÇÃO FEDERAL, ELEIÇÃO ESTADUAL, ELEIÇÃO MUNICIPAL, ANALISE, HISTORIA, ELEIÇÕES, BRASIL.
- DEFESA, CONTINUAÇÃO, MODELO, ELEIÇÕES, BENEFICIO, DEMOCRACIA, INCENTIVO, DEBATE, POLITICA, MANUTENÇÃO, TEMPO, MANDATO.
O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, as eleições municipais de outubro passado trouxeram à baila, novamente, a discussão acerca da ocorrência bienal dos pleitos. A cada dois anos, os brasileiros são chamados às urnas para eleger, por seu turno, os detentores de cargos federais e estaduais, e municipais.
Também a cada dois anos, ressurgem, na imprensa e no Congresso Nacional, discussões acerca das vantagens e desvantagens desse esquema. De forma generalizada, as manifestações apresentadas se inclinam pela sua condenação. A existência de eleições a cada dois anos, além de custosa, constitui um aborrecimento a mais para população, legalmente obrigada a votar.
Ainda, particularmente a eleição municipal serviria de estopim para a sucessão presidencial e nos Estados. Potenciais candidatos a Presidente e a Governador e seus partidos utilizariam a campanha para enfraquecer os atuais titulares do cargo, abrindo as negociações para o próximo pleito.
Em decorrência desse prematuro início do quadro sucessório, o Presidente e os Governadores se vêem obrigados a participar ativamente do esforço de eleição de seus candidatos a prefeito, desperdiçando, assim, praticamente um ano de um mandato já exíguo.
Do ponto de vista dos prefeitos, a situação não é melhor. A ocorrência das eleições federais e estaduais na metade de seu termo, prejudica a maturação de programas governamentais de longo prazo, em razão das restrições existentes ao repasse de verbas nos períodos pré-eleitorais.
Em decorrência dessa percepção, foram apresentadas, somente nesta Casa, seis propostas de emenda à Constituição, que ora tramitam em conjunto, visando à unificação das eleições federais, estaduais e municipais.
Entretanto, antes de aceitarmos essas propostas como se fossem as vozes do senso comum a nos soprar o óbvio, devemos lançar um olhar mais isento para as origens dessa bipartição eleitoral e para as conseqüências da unificação.
A superação do regime autoritário de 1964 trouxe a necessidade de elaboração de uma nova Carta Magna. O Constituinte, diante das quase ilimitadas possibilidades que se abriam, houve por bem estabelecer mandatos com datas distintas para o Presidente e para as esferas estaduais e municipais.
Emenda constitucional posterior reduziu o termo presidencial para quatro anos, fazendo coincidir a eleição para Presidente com as demais eleições federais e estaduais. Mesmo na ocasião, não se cogitou seriamente da unificação geral dos pleitos.
O longo período autoritário inoculou na classe política brasileira, e na sociedade em geral, o fundado receio da concentração excessiva de poder. Por essa razão, a Constituição de 1988 contém inúmeras disposições destinadas a impedir ou reduzir ao mínimo a possibilidade de que um governante eleito ceda à tentação do cesarismo.
O enfeixamento de parcelas cada vez maiores de poder nas mãos de um mandatário é o prenúncio inevitável da tirania e da opressão. Por isso, toda democracia que se pretenda duradoura deve ser dotada de mecanismos que se contraponham à tendência de concentração do poder observada mesmo nos países com maior tradição democrática.
Ora, a disjunção das eleições municipais das demais incorpora, em nosso sistema constitucional, um mecanismo dessa natureza.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de fato, o Constituinte cuidou de manter separados os sufrágios federais e estaduais dos municipais, ao mesmo tempo em que consagrava a tripartição das esferas federativas. Talvez a maior originalidade de nossa Constituição resida no fato de que os Municípios constituam, ao lado da União e dos Estados, entes federativos plenos.
Sem dúvida, um único Município tende a ser fraco diante dos enormes recursos da União e dos Estados; não obstante, o seu conjunto constitui um formidável foco de mobilização social e política, capaz de evitar seu completo esmagamento pelo poder central.
Em razão disso, a separação das eleições municipais constitui um salutar exercício de democracia. Eleito o Presidente e o Governador, o eleitor dispõe de dois anos para apontar seu apoio ou sua discordância em relação aos rumos de sua administração e manifestá-lo de forma clara e inequívoca.
Essa eleição serve de alerta aos demais governantes, para que revejam seus rumos, antes que os resultados das próximas eleições os surpreendam amargamente.
A unificação das eleições, por outro lado, favoreceria a concentração de poder sem limites. Um demagogo, desprovido de apoio social amplo e dotado de desmedida ambição, poderia beneficiar-se de seu carisma e lograr obter o domínio completo das três esferas da federação, elegendo seus correligionários para a maioria dos governos estaduais e municipais.
Em tal circunstância, apenas decorridos quatro anos a população poderia manifestar seu arrependimento, período excessivamente longo, talvez, para a preservação da democracia.
Sr. Presidente, ainda, a unificação das eleições federais, estaduais e municipais acarretaria uma concentração indevida das atenções na corrida presidencial, unicamente. Em um país como o nosso, o debate se concentraria nas propostas para as questões nacionais, deixando esquecidos os problemas municipais.
As eleições separadas para prefeituras e vereanças, por outro lado, permitem que o eleitor se concentre na solução de problemas que, muitas vezes, o afligem de forma mais candente que as questões nacionais. O saneamento urbano é um problema tão grave quanto o nível de emprego e, fatalmente, seria esquecido em razão da simultaneidade com a eleição presidencial.
De resto, o comparecimento bienal do eleitorado estimula o debate democrático, atuando como um antídoto à apatia que poderia tornar-se prevalente nos períodos entre as eleições. A cada dois anos, a população é lembrada das vantagens e dos custos de se viver em uma democracia e se mobiliza para defendê-la.
Além desses argumentos que citei, há, finalmente, uma razão puramente prática para se rejeitar a unificação das eleições: ela somente poderia ser feita pela redução ou pela ampliação de mandatos, de presidente, governadores, senadores e deputados, ou de prefeitos e vereadores. Ambas as hipóteses são impróprias.
A redução dos mandatos destituiria governantes eleitos de metade do mandato a que fariam jus, transformando-os em meros simulacros de governantes. A ampliação lhes daria um período de governo para o qual não foram eleitos, à custa da vontade democrática dos governados.
Assim, a unificação das eleições não se apresenta como uma solução, mas como um problema.
Era o que tinha a dizer.
Muito obrigado!