Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Aumento da expectativa de vida no Brasil, de acordo com dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Aumento da expectativa de vida no Brasil, de acordo com dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE.
Publicação
Publicação no DSF de 26/02/2005 - Página 3273
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, DADOS, ESTATISTICA, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), EVOLUÇÃO, MEDIA, VIDA, POPULAÇÃO, AUMENTO, NUMERO, IDOSO, APERFEIÇOAMENTO, CIENCIA E TECNOLOGIA, SAUDE, REDUÇÃO, MORTALIDADE INFANTIL, NECESSIDADE, MELHORIA, INDICE, COMPARAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ANALISE, DIFERENÇA, HOMEM, MULHER, NEGRO, MORTE, ACIDENTE DE TRANSITO, VIOLENCIA, VITIMA, JUVENTUDE.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, anualmente, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística divulga dados referentes à expectativa de vida dos brasileiros, permitindo acompanhar detalhadamente a evolução demográfica de nossa população.

            O último relatório aponta que, entre 2000 e 2003, a esperança de vida do brasileiro aumentou 0,8%, passando para 71,3 anos. Esse dado explicita, ao mesmo tempo, bons e maus aspectos, merecendo, tanto uns quanto outros, uma reflexão ponderada.

            A ampliação, conquanto modesta, mantém a tendência consistente de crescimento desde que esses índices passaram a ser sistematicamente calculados, a partir do censo de 1980. Naquele momento, o IBGE apontava uma duração média de vida de 63,9 anos. Estimativa referente ao período anterior indica que, no início do século 20, a esperança de vida do brasileiro era de aproximadamente 35 anos.

            Esse aumento decorre, em parte, da revolução científica e tecnológica havida no século passado. Os extraordinários avanços da medicina, produziram, em todo o mundo, um melhoramento dos índices de expectativa de vida e de mortalidade infantil. No País, também essa tendência foi seguida.

            A difusão de antibióticos e outros novos medicamentos, a implantação de campanhas de vacinação em massa, a expansão da rede de atendimento hospitalar e a criação de programas de saúde preventiva e de transferência de renda refletiram-se no aperfeiçoamento de todos os nossos índices sociais.

            Não apenas a esperança de vida foi ampliada. Outros índices, como o de mortalidade infantil, melhoraram sensivelmente. Se em 1970 morriam cerca de 100 bebês a cada mil nascidos vivos, hoje esse índice é de 27,8 por mil.

            A evolução é inegável. A leitura das séries históricas dos dados sociais indica claramente a redução progressiva das mazelas de nosso País, por conta da difusão de mecanismos de proteção social que, ao menos parcialmente, cumprem a promessa de uma vida melhor para a população.

            Entretanto, ainda que tenhamos, sem sombra de dúvida, melhorado, temos de reconhecer que nosso avanço não ocorreu no mesmo passo que o de diversas outras nações do mundo.

            A mortalidade infantil despencou, é verdade, mas nossos índices permanecem superiores ao de quase todos os nossos vizinhos. Mesmo países abalados por severas convulsões sociais, como a Colômbia, lograram obter um índice inferior ao nosso.

            Da mesma forma, nosso novo índice de expectativa de vida - 71,3 anos - é, ainda, ligeiramente inferior ao índice da Faixa de Gaza, por exemplo, que é de 71,4 anos. Mesmo uma das regiões mais conturbadas do planeta acha-se em igualdade de condições conosco.

            Perante os dados das nações desenvolvidas, nosso atraso fica evidente. No topo da lista se encontra o Japão, com um índice de 81,5 anos. Cá embaixo, na octogésima sexta posição, estamos nós.

            Isso dá o que pensar. Melhoramos, é verdade, mas melhoramos o bastante? Por que sequer fomos capazes de reproduzir o desempenho de países semelhantes ao nosso, como Argentina e México?

            Nossa perplexidade aumenta se levarmos em consideração que, de acordo com o próprio IBGE, o indicador poderia ser elevado em dois ou até três pontos, não fosse a alta incidência de mortalidade por causas externas.

            Verifiquemos os dados apresentados. O brasileiro pode esperar viver 71,3 anos, é o que diz o IBGE. Mas o que dizer da desigualdade entre grupos?

            Analisemos primeiro a diferença entre os sexos. Em todo o mundo, de maneira uniforme, as mulheres tendem a viver mais que os homens. No Brasil isso não é diferente. Enquanto a expectativa de vida masculina é de 67,6 anos, a feminina atinge 75,2 anos.

            As mulheres, sabemos todos, Sr. Presidente, são mais resistentes a doenças infecciosas e parasitárias que os homens, além de menos sujeitas ao enfarte e ao derrame cerebral; mas não é essa a principal causa da acentuada diferença que se observa no Brasil. Pensemos na chamada “mortalidade por causas externas”.

            Essa rubrica reúne, com a suavidade dos eufemismos, flagelos já há muito conhecidos: a violência e as mortes no trânsito. Entre 1979 e 2001, faleceram 1,2 milhão de pessoas em nossas ruas e estradas, e foram assassinadas 600 mil.

            Se os acidentes de trânsito vêm diminuído, lenta mas constantemente, desde a adoção do novo código de trânsito, os homicídios aumentaram explosivamente neste período: em vinte anos, houve um incremento de 130% no número de assassinatos.

            A praga da violência nas cidades e nos campos ceifa um número cada vez maior de vidas. A tragédia se completa ao observarmos que a maior parcela das vítimas é composta de jovens, principalmente os do sexo masculino, entre 15 e 24 anos.

            São esses os recrutas preferenciais do tráfico de drogas, os alvos costumeiramente eleitos pelos justiceiros, as vítimas habituais dos atos espúrios de violência sem sentido provocados pelo álcool e pela falta de perspectivas.

            São os jovens do sexo masculino que, premidos pela ausência de possibilidades concretas de inserção social, terminam por abraçar a criminalidade; um desesperado abraço que sói terminar em tragédia e morte.

            Estamos dizimando nossos jovens. Em 2003, uma jovem de 20 anos possuía a expectativa de viver mais 57,8 anos, ao passo que um rapaz da mesma idade possuía uma sobrevida provável de apenas 51 anos. A probabilidade de que esse rapaz fosse assassinado era de 3,3 por mil, ao passo que a moça enfrentava uma probabilidade de apenas 0,87 por mil.

            A percepção da injustiça se torna ainda mais aguda se decompusermos os índices de esperança de vida também no tocante à raça dos indivíduos.

            Dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento mostram que, no ano 2000, a esperança de vida das mulheres brancas brasileiras atingia 73,8 anos. A das mulheres negras, no mesmo ano, restringia-se a 69,52 anos, apenas ligeiramente superior à dos homens brancos - 68,24 anos. Finalmente, a esperança de vida dos homens negros resumia-se a parcos 63,27 anos.

            Para comparação, se levarmos unicamente em conta o dado referente aos homens negros, o Brasil se situaria na centésima sexagésima quarta posição na lista dos 192 países pesquisados pela ONU.

            Ao mesmo tempo, podemos verificar, estarrecidos, que a expectativa de vida masculina na Faixa de Gaza, novamente, atinge 70,13 anos! Para um jovem negro, concluímos, é mais seguro viver lá que aqui. Ao menos, pode-se esperar viver mais tempo.

            Essa ironia cruel demonstra a extensão da injustiça que cometemos e o tamanho de nosso desafio para os anos vindouros.

            Era o que tinha a dizer. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/02/2005 - Página 3273