Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apresentação de três projetos de mudança na legislação tributária.

Autor
Gilberto Miranda (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: Gilberto Miranda Batista
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO FISCAL.:
  • Apresentação de três projetos de mudança na legislação tributária.
Publicação
Publicação no DSF de 02/03/2005 - Página 3702
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO FISCAL.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, ALTERAÇÃO, IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO, OBJETIVO, PROTEÇÃO, CONTRIBUINTE.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO FISCAL, CODIGO TRIBUTARIO NACIONAL, BENEFICIO, CONTRIBUINTE, REGULAMENTAÇÃO, EXECUÇÃO FISCAL.

O SR. GILBERTO MIRANDA (PFL - AM. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o apetite arrecadatório do Estado brasileiro afigura-se insaciável a qualquer pessoa que examine nossa história fiscal recente. Nos últimos dez anos, a fração do Produto Interno Bruto (PIB) que o Governo arranca das empresas e dos cidadãos só fez crescer. O pior é que isso se deu sem que aumentassem, em quantidade ou qualidade, os serviços prestados pelo Estado à Nação; ao contrário, a infra-estrutura de transportes, por exemplo, encontra-se inteiramente sucateada. A malha rodoviária, para falarmos do caso mais sensível, é hoje um festival de crateras e de pontes caídas, apesar da introdução da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE), adotada para custear, precisamente, a conservação de nossas rodovias. Nem comento aqui, por fastidioso, o caso da origem da CPMF, e de seu destino.

Os cidadãos pagam, e as empresas também, tributos mais e mais escorchantes. O Tesouro Nacional faz caixa, exibe o superávit aos bancos nacionais e estrangeiros, mas os serviços públicos, que seriam a contrapartida dos recolhimentos, não aparecem.

Este ano de 2005 começa, muito sintomaticamente, com o debate acirrado sobre a infame Medida Provisória nº 232. É preciso atentar, Sr. Presidente, para o abuso, para a violência absurda que nela se insere. Por um lado, o Governo, trombeteando prestar um grande favor à população, reajusta a tabela do Imposto de Renda das Pessoas Físicas, um ato que deveria ser de rotina, para a simples manutenção do valor da renda livre das pessoas após o recolhimento do tributo, descontada a inflação; por outro lado, onera significativamente o imposto devido pelos profissionais liberais e pelas micro e pequenas empresas que declaram e recolhem o imposto pelo método do lucro presumido.

Se chamo “sintomático” o fato de o ano se iniciar com esse debate, é porque, a meu ver, isso mostra que a sociedade está cansada desse furor arrecadatório do Estado brasileiro e começa a reagir. De fato, reage com energia e veemência inesperadas, pois vindas de um povo acostumado a baixar a cabeça aos atos administrativos mais drásticos, aos assaltos mais descarados ao seu bolso, enfim, a mais escandalosa assimetria de deveres e direitos entre Estado e cidadão.

É nesse espírito, de reação ao abuso arrecadatório do Estado, que, sintonizado com os anseios da Nação, estou apresentando ao escrutínio de meus Pares três projetos de mudança de nossa legislação tributária. São intervenções pequenas, pontuais até mesmo, mas que atacam, a meu ver, alguns pontos vitais, onde se define, onde se institucionaliza a injustiça e se legitima o esbulho do cidadão e a exclusão dos seus direitos de defesa, em favor do Estado.

Em primeiro lugar, apresento uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) pela qual se estenderá ao Imposto de Importação a exigência da noventena prevista no inciso III, alínea c, e parágrafo 1º do art. 150.

Explico: o prazo de noventa dias é uma espécie de mitigação do princípio da anterioridade que se deve observar na entrada em vigência da maioria dos novos tributos. Por entender que há impostos que apresentam caráter regulatório, com funções extrafiscais, o constituinte permitiu sua exclusão da obrigatoriedade de esperar o início do ano seguinte àquele em que for criado ou tiver sua incidência ou alíquota agravada. O Imposto de Importação é peculiar. Uma história de instabilidade cambial nos legou o receio de que crises exijam cortes bruscos em nossas importações, cortes impossíveis se a anterioridade valesse. O risco de sangria de recursos, ainda forte em nosso psiquismo econômico, justifica, por certo, a excepcionalidade.

É forçoso reconhecer, entretanto, que a liberdade de se aumentar, a qualquer momento, o Imposto de Importação implica certo abalo da segurança jurídica. Isso porque, o tempo todo, há importações em curso, com mercadorias contratadas nas condições prevalentes antes da eventual alteração; por exemplo: mercadorias já embarcadas no país de origem, ou com o câmbio já contratado, ou cuja fabricação no estrangeiro já se iniciou. Nesses casos, o importador pode vir a arcar com custos proibitivos, que o teriam levado, se pudesse prever a alteração das regras, a não realizar o negócio.

Dessa maneira, e segundo a alteração legislativa que proponho, sem prejuízo do manejo flexível do imposto aduaneiro, restará assegurada a segurança jurídica do contribuinte importador contra a sanha arrecadadora de qualquer governo.

Além dessa PEC, estou apresentando também dois Projetos de Lei. O primeiro altera a Lei de Execução Fiscal (Lei nº 6.830/1980), de maneira a obrigar a Fazenda Pública a juntar, na fase inicial dos processos contra o contribuinte acusado de omissão ou elisão fiscal, cópia do processo administrativo, como prova do crédito alegado, para que o suposto devedor se possa defender adequada e eficientemente. Mais que necessário, Srªs e Srs. Senadores, pelas mesmas razões aqui aludidas, é mudar a situação presente, na qual, de acordo com o art. 53 da Lei nº 8.212/1991, além de não ter o ônus da prova, o Estado, como impetrante da ação, pode exigir, já desde a simples citação, a penhora e a indisponibilidade de bens do acusado, desrespeitando o direito de defesa deste.

Há, Sr. Presidente, um único adjetivo aplicável a esse quadro jurídico: kafkiano. É como se o cidadão, para o Estado brasileiro, não passasse de um inseto suspeito, desde sempre, de todo tipo de desvio de conduta, e não tivesse sequer o direito essencial de saber do que está sendo acusado. Para por um fim a esse abuso do poder do Estado e ao desamparo do cidadão e contribuinte, proponho a alteração da Lei de Execução Fiscal e a revogação do mencionado artigo 53 da Lei nº 8.212/1991.

Finalmente, apresento ainda um segundo Projeto de Lei, pelo qual proponho a alteração dos artigos 134 e 135 do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966), de modo a moralizar a prática do redirecionamento da execução fiscal, de que a Fazenda Pública é useira e vezeira.

Esses artigos tratam da responsabilização de pessoa fisica por débito de terceiro, seja pessoa física ou jurídica. É o caso típico da responsabilização de sócios ou diretores de empresas por dívidas tributárias destas, quando da execução fiscal. Muitas vezes, ainda que a empresa esteja solvente e nomeie bens à penhora em valor suficiente para a garantia integral da dívida, a Fazenda, por considerar os bens dos responsáveis mais atraentes, redireciona o processo executivo contra estes.

Porém, Sr. Presidente, sabemos que a Carta de 1988 é a Constituição Cidadã do inesquecível Deputado Ulysses Guimarães. Seu artigo quinto, no inciso LV, assegura o devido processo legal e, no inciso XXXV, a apreciação, pelo Poder Judiciário, de lesão ou ameaça ao direito. A recepção pura e simples dos mencionados artigos do Código Tributário Nacional pela Constituição, portanto, é duvidosa. É para sanar essa dúvida, e em coerência com a proposta geral de defender o cidadão e contribuinte da sanha tributadora do Estado, que proponho o acréscimo de um parágrafo único ao art. 135, e de um parágrafo primeiro ao artigo 134, renumerando-se para parágrafo segundo seu atual parágrafo único.

Os dois novos dispositivos introduzem, como disse, a exigência de reconhecimento, por pronunciamento judicial prévio, no caso concreto, dos atos ou omissões que dão ensejo ao redirecionamento da execução fiscal.

Trata-se, como afirmei, de intervenções mínimas em nosso aparato de Direito Tributário. Sua repercussão para o reequilíbrio das relações entre Estado e cidadão, no entanto, deverá ser muito positiva. Acredito, no mínimo, estar trazendo uma contribuição válida para o debate e para a luta de todos os cidadãos contra a tirania tributária do Estado brasileiro.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/03/2005 - Página 3702