Discurso durante a 18ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Decretação de estado de calamidade no Rio de Janeiro em razão da saúde pública.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CALAMIDADE PUBLICA. SAUDE.:
  • Decretação de estado de calamidade no Rio de Janeiro em razão da saúde pública.
Aparteantes
Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 12/03/2005 - Página 4882
Assunto
Outros > CALAMIDADE PUBLICA. SAUDE.
Indexação
  • REGISTRO, DECRETAÇÃO, CALAMIDADE PUBLICA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), MOTIVO, SAUDE PUBLICA, CRITICA, SITUAÇÃO, AUSENCIA, EQUIPAMENTOS, MEDICAMENTOS, MEDICO.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, JORNAL DO BRASIL, CRITICA, DISPUTA, NATUREZA POLITICA, PREFEITURA, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), MINISTERIO DA SAUDE (MS), PREJUIZO, POPULAÇÃO, SOLICITAÇÃO, PRIORIDADE, SAUDE PUBLICA.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, trago, pela segunda vez neste mês, a preocupação com a situação que os jornais estampam hoje, que é a decretação do estado de calamidade no Rio de Janeiro, em razão da saúde pública. Trata-se de situação gravíssima que ocorre e que aflige toda a população do Rio de Janeiro. Ali residem quase seis milhões de cidadãos e há uma disputa política entre a prefeitura do Rio de Janeiro e o Ministério da Saúde, e quem paga é a população, com sofrimento inexplicável diante disso.

De maneira muito clara, o Ministério da Saúde tem abordado o tema dentro de suas responsabilidades constitucionais, das normas técnicas que norteiam a avaliação, a discussão, o debate e as intervenções que devam ser feitas no setor de saúde.

O Sistema Único de Saúde, que é o melhor arcabouço de saúde pública da história e que se pode descrever em qualquer país da América Latina, é claro, desde o início dos anos 90, ao apontar as normas operacionais para o funcionamento. Previu situações em que etapas não fossem executadas corretamente pelos Municípios e em que responsabilidades do Estado e da União não fossem cumpridas adequadamente. As instâncias são desde alerta, ponderações, avaliações conjuntas, pactuações e repactuações até decisões finais de intervenção, como a que está ocorrendo no Rio de Janeiro.

A instância superior à decisão tomada unilateralmente pelo Governo Federal é a chamada Comissão Tripartite, que vai legitimar a intervenção tomada pelo Governo Federal e pode propor uma pactuação saneadora para a situação no Rio de Janeiro.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que traz preocupação são afirmações como as que os jornais estampam hoje: a população sofrendo, sentindo-se abandonada dentro dos hospitais municipais do Rio de Janeiro, a falta de equipamentos e de medicamentos básicos e de socorro para as doenças mais graves.

O Jornal do Brasil mostra comentário do Prefeito César Maia, que diz::

Tenho problemas na coluna, mas essa noite eu dormi muito aliviado quando vi o que o Ministério da Saúde estava disposto a fazer a intervenção.

Essa é uma situação claramente preocupante, porque o tratamento dispensado à saúde pública jamais pode ser norteado por esse tipo de comportamento.

Veio, então, a resposta do representante do Ministério da Saúde, Dr. Arthur Chioro, que estava visitando a cidade do Rio de Janeiro, na condição de mediador. Ele diz o seguinte, em relação ao Prefeito:

Ele não tem respeito e dignidade à vida humana. Duvido que tenha coragem de dizer isso nos olhos das pessoas que aguardam atendimento nas filas dos hospitais - desabafou.

Em seguida, vem uma constatação por parte da área técnica do Ministério da Saúde. O que está ocorrendo nos 28 hospitais que padecem com essa crise da saúde pública na cidade do Rio de Janeiro? O Hospital Souza Aguiar, por exemplo, é um hospital tradicional, secular e faz parte da vida do Rio de Janeiro, desde capital da República, no início do século XX. Informa ainda o Jornal do Brasil a respeito do hospital:

Ontem, por exemplo, o Hospital Souza Aguiar não tinha ortopedistas. Dos 15 clínicos que deveriam estar de plantão apenas três foram encontrados. A previsão é de que hoje as cirurgias sejam interrompidas pela falta de anestesistas na principal emergência do Rio.

É uma situação dramática para a população do Rio de Janeiro. O Ministério da Saúde tinha de tomar uma medida dura e saneadora para essa situação e agiu corretamente ao declarar o estado de calamidade pública, já que as buscas de pactos não foram adequadamente compreendidas pela Prefeitura. O Prefeito assegurava que só com as verbas poderia resolver o problema da mediação entre Ministério da Saúde e Prefeitura do Rio de Janeiro, e o Ministério da Saúde entendia que suas obrigações estavam cumpridas.

Há uma situação de impasse intransponível. O Secretário Estadual de Saúde, Dr. Gilson Cantarino, afirma que o Estado está plenamente apto a pegar os recursos do repasse fundo a fundo da gestão plena do sistema para o Município do Rio de Janeiro e, na condição de gestor estadual, substituir a Prefeitura e garantir o atendimento básico adequado às populações daquele Município.

Portanto, uma situação de crise efetivamente se instalou na Prefeitura do Rio de Janeiro. O Prefeito traz seus argumentos de financiamento para o setor e é justo que se comparem alguns itens, como fiz na semana passada.

Veja um exemplo, Sr. Presidente: no Estado do Rio de Janeiro, a União, por meio do Governo Federal, gasta por habitante ao ano R$231,93; o Estado, R$56,88, e o Município, R$105,12. No Piauí, nosso Estado-irmão - para não dizer que há perseguição de ordem política quanto ao financiamento -, a União gasta R$124,77 por habitante ao ano. Nesse Estado, a gestão é do Partido dos Trabalhadores, é bom que se diga. É claro que o Estado e os Municípios gastam outros valores.

Em relação ao Rio de Janeiro, vale a comparação. Enquanto, no Piauí, o Governo Federal financia R$124,77 por habitante ao ano, no Rio de Janeiro, gasta R$231,93, Senador Ramez Tebet. Assim, não há argumento para a Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro se dizer discriminada pelo Ministério da Saúde. Pode argumentar que seus serviços são caros e envolvem mais despesas, que é preciso haver maior parceria, mas jamais poderia tentar romper unilateralmente, porque quem está pagando é a população.

Os jornais apontam, no hospital Souza Aguiar, a ausência de médicos anestesistas no dia de hoje. Ontem, de quinze plantonistas clínicos, só havia três, e não havia nenhum ortopedista nesse hospital que é secular.

Uma briga política não pode trazer danos à população - esse é o meu entendimento. Considero que o Ministério não tinha outra prerrogativa, a não ser declarar o estado de calamidade pública e tentar intervir. Ele tem o apoio e a consciência do Governo do Estado, que pode assumir as responsabilidades imediatas, e o Município ficará, nesta fase, apenas com a atenção básica.

Mas não queremos essa crise: queremos solução. A crise política tem que redundar em uma solução imediata. Espero que o Prefeito, em vez de um ato de satisfação, opte por sentar-se à mesa para dialogar nas instâncias devidas, a fim de encontrar um caminho.

Ouço o nobre Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Senador Tião Viana, quando V. Exª diz “esse é o meu entendimento”, permito-me ler seu íntimo, embora isso seja uma audácia. Mas o que V. Exª está passando da tribuna é sua indignação e não seu entendimento. Realmente, causa-nos indignação saber que nem uma causa tão relevante como esta, a saúde da população, une os homens públicos. Como isso é possível? Vemos crianças morrendo de fome, doentes nos corredores dos hospitais, hospitais tradicionais sem remédios. E isso não une os homens públicos? E isso causa polêmica entre administradores municipais, estaduais, federais? Será que, nem nesse momento, não há um instante de união em favor do povo, da sociedade brasileira? Isso leva à descrença generalizada. Faz bem V. Exª em ocupar a tribuna e pedir que haja entendimento e compreensão. V. Exª aponta números, gastos da União, dos Estados e dos Municípios. Isso é o que foi liberado, é o que há para gastar, vamos admitir, mas resta outra pergunta: foram gastos realmente? Esse é o problema. No meio de uma - desculpe-me a expressão - confusão dessa, em que só a população está sofrendo, em que só ela está sendo punida, é justo admitirmos tudo. Positivamente, não é possível continuar esse estado de coisas. V. Exª fez referência ao Rio de Janeiro. Participei ontem de uma reunião na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, onde analisamos a morte de crianças subnutridas em aldeias indígenas. Ficou constatado e comprovado que se gasta muito mais em passagens, diárias e viagens do que em remédios e comidas, para atender a população indígena. Agradeço a V. Exª.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Senador Ramez Tebet, agradeço a V. Exª o aparte, que enriquece meu pronunciamento. V. Exª transmite solidariedade às populações do Rio de Janeiro e do Mato Grosso do Sul, aos irmãos índios que padecem um sofrimento, explícito nos jornais, na grande imprensa, que divulga a mortalidade infantil no Mato Grosso do Sul.

Srªs e Srs. Senadores, chama-me a atenção a história do Rio de Janeiro. Há 28 hospitais naquela cidade, para servir a população, além dos hospitais federais, da rede básica e da rede estadual.

(Interrupção do som.)

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Sr. Presidente, creio que terei direito a uma prorrogação de alguns segundos.

Quando se considera a história da saúde pública no Brasil, rememora-se a história de Oswaldo Cruz, de Carlos Chagas e de Sérgio Arouca, todos do Rio de Janeiro. Tantos nomes, tanta dedicação às causas científica, humanista e ética a favor de um modelo de saúde pública bom para este País!

O Rio de Janeiro, que deveria ser o exportador de um modelo de saúde pública para o Brasil, padece de uma agonia indescritível nos dias de hoje.

Então, a minha esperança é a de que haja, diante dessa crise, uma atenção revisada por parte do Prefeito Cesar Maia: que S. Exª se coloque mais na condição de gestor municipal; que assuma mais a solidariedade com a população do Rio de Janeiro que sofre neste momento; que esqueça a disputa da eleição presidencial, que só vai ocorrer no próximo ano; e que haja uma solução mediada entre o Governo do Estado do Rio de Janeiro, o Ministério da Saúde, e a Prefeitura do Rio de Janeiro, pensando-se na população, em primeiro lugar, e, depois, no direito e na liberdade que têm os políticos de apresentar divergências, levando prejuízo ou não à população.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR TIÃO VIANA EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e §2º, do Regimento Interno.)

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Matérias referidas:

“Decretada calamidade pública na saúde”;

“Estado quer administrar verba do SUS”.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/03/2005 - Página 4882