Discurso durante a 17ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro da visita, este ano, ao Brasil do Príncipe de Astúrias, Felipe de Borbón, e da princesa Letizia Ortiz.

Autor
Augusto Botelho (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RR)
Nome completo: Augusto Affonso Botelho Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. POLITICA DE DESENVOLVIMENTO.:
  • Registro da visita, este ano, ao Brasil do Príncipe de Astúrias, Felipe de Borbón, e da princesa Letizia Ortiz.
Publicação
Publicação no DSF de 11/03/2005 - Página 4773
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. POLITICA DE DESENVOLVIMENTO.
Indexação
  • REGISTRO, VISITA, BRASIL, PRINCIPE HERDEIRO, PRINCESA, PAIS ESTRANGEIRO, ESPANHA.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, PARCERIA, PAIS ESTRANGEIRO, ESPANHA, FINANCIAMENTO, INFRAESTRUTURA, BRASIL.
  • ANALISE, LEGISLAÇÃO, PARCERIA, SETOR PUBLICO, SETOR PRIVADO, FINANCIAMENTO, INFRAESTRUTURA, APRESENTAÇÃO, DADOS, PRECARIEDADE, ESTADO, ATENDIMENTO, DEMANDA, MUNICIPIOS, COMENTARIO, NECESSIDADE, ESTABILIDADE, ECONOMIA, INCENTIVO, INVESTIMENTO, LONGO PRAZO.

O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a visita do Príncipe de Astúrias, Felipe de Borbón e da princesa consorte Letizia Ortiz, este ano, chamou bastante a atenção da imprensa no País. A visita do herdeiro do trono foi destaque não apenas pelo grande carisma da realeza espanhola, ou pelo charme que a monarquia ainda possui para muitas pessoas.

Se buscarmos um sentido mais prático para o destaque conferido pela imprensa aos príncipes, veremos que a Espanha é simplesmente o segundo maior investidor estrangeiro no País. Por esse motivo, a visita capitaneada pelo Príncipe de Astúrias trouxe consigo inúmeros investidores, liderados por José Moraes, diretor da Confederação Espanhola de Organizações Empresariais.

O Fórum de Investimentos e Cooperação Empresarial Hispano-Brasileiro reuniu, em São Paulo, 70 empresas espanholas e 316 brasileiras. Tópico inevitável dos entendimentos entre os empresários dos dois países foi a aprovação da Lei nº 11.079, em dezembro do ano passado. Essa lei institui e disciplina as parcerias público-privadas, tidas por alguns como passo decisivo para viabilizar o aporte de capital privado - inclusive estrangeiro - no financiamento dos grandes projetos no País.

Creio que as alterações que virão no modo de se construir a infra-estrutura no Brasil são tão grandes, tão repletas de possibilidades, mas também de perigos, que gostaria de tecer alguns comentários sobre a recém-aprovada lei das parcerias público-privadas. 

Em primeiro lugar, é preciso ter de forma clara o contexto em que surge a necessidade de financiamento do setor privado na área de infra-estrutura. Se fizermos um retrospecto panorâmico das últimas três décadas, veremos que a conjuntura externa e a interna se modificaram radicalmente dos anos de 1970 para cá.

Grosso modo, podemos dizer que a década de 1970 se caracterizou no Brasil por sucessivos déficits públicos, índices inflacionários acima do desejável para o equilíbrio das contas e alastramento da atuação estatal por virtualmente todos os setores da economia. Projetos de grande porte foram financiados integralmente pelo Estado, sem grandes preocupações sobre as conseqüências macroeconômicas dos empreendimentos executados.

Os anos da década de 1980, permeados por períodos recessivos e por vários choques econômicos, caracterizam-se pela escassez do dinheiro para investimento, e pelo aumento de seu custo no mercado de juros internacionais. Esse quadro difícil antecipa alguns traços que viriam a se tornar típicos dos anos 90, tais como: busca sistemática de combate à inflação, políticas ortodoxas de combate ao déficit público, que passa a ser o grande vilão da vez; e os inúmeros constrangimentos fiscais que restringem progressivamente a participação direta do Estado na economia.

Cria-se, então, o paradoxo entre a contínua necessidade de investimento na infra-estrutura e a crescente debilidade do Estado de fazê-lo em volume compatível com as demandas da economia contemporânea.

Nesse contexto, as parcerias público-privadas são uma das respostas possíveis a esse problema. Se exemplificarmos com números a situação atual do Brasil, talvez fiquem mais claras nossas necessidades de investimento para a manutenção do atual ciclo de crescimento econômico.

Os valores dos diversos setores da infra-estrutura são colossais. Segundo o parecer do ilustre Senador Rodolpho Tourinho, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania desta Casa, estima-se que são necessários investimentos anuais da ordem de R$20 bilhões na área de energia, R$9 bilhões na área de saneamento, 4,5 bilhões em rodovias, 3 bilhões em ferrovias, 1,2 bilhão nos portos e 500 milhões em hidrovias. Esses valores totalizam R$40 bilhões a cada ano para que a infra-estrutura acompanhe o crescimento da economia.

Sr. Presidente, bem sabemos que, na conjuntura em que vivemos, não é razoável esperar que o Estado disponha de R$40 bilhões a cada ano, todo ano, para investimento. Se o Estado brasileiro puder compartilhar os ônus e os bônus desses investimentos com o setor privado, a economia ganhará em dinamismo e o Estado se desincumbirá de assumir, sozinho, os riscos de empreendimentos de grande porte.

O que as parcerias público-privadas (PPPs) propõem é justamente a associação entre setor público e setor privado, com o compartilhamento de riscos tanto na construção da infra-estrutura quanto na posterior prestação de serviços.

Nesse ponto, aliás, é oportuno enfatizar que, desde o encaminhamento do projeto de lei ao Congresso Nacional, em novembro de 2003, até sua aprovação no Senado Federal, pouco mais de um ano depois, o aprimoramento legislativo foi notável. Vulnerabilidades em relação à lei de responsabilidade fiscal, à lei de licitações e ao limite para a participação de recursos públicos nas parcerias foram apontadas - e sanadas - nas Comissões especializadas desta Casa. No cômputo geral, pode-se dizer que o texto final conseguiu atingir um bom equilíbrio entre o interesse público e a necessidade de uma legislação eficaz e transparente, capaz de atrair o investimento privado.

Alguns pontos positivos da lei das PPPs merecem destaque.

Um deles é a essência mesma da parceria entre o setor público e o setor privado, qual seja, o compartilhamento do risco. O primeiro tem por missão oferecer serviços úteis que tenham relevância social; já o segundo organiza-se de forma a obter lucros com seus projetos.

O setor público pode, então, no contrato de PPP, comprometer-se a garantir uma receita mínima ao empreendedor, no caso de a rentabilidade ficar aquém de um patamar pré-estabelecido. Como os contratos de infra-estrutura são significativamente longos, podendo mesmo durar décadas, é razoável esperar da empresa que vai operacionalizar o empreendimento - do qual ela mesma é a responsável pela construção - que a qualidade do projeto seja a mais elevada possível. Tal lógica difere da sistemática adotada até agora no Brasil, em que uma empresa é contratada para um projeto cujo resultado será administrado por outra empresa ou mesmo pelo próprio setor público.

Finalmente, a possibilidade de amortizar o empreendimento em 30 ou até em 40 após a concessão acaba por reduzir os custos finais do empreendimento. Ademais, grandes são as chances de as empresas privadas conseguirem financiamento de capital a custos menores do que aqueles que seriam obtidos pelo Governo.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como podemos notar, as possibilidades que a Lei das PPPs fornece são imensas; porém, é fundamental que sejamos capazes de manter no Brasil ambiente propício aos negócios e aos investimentos.

Um pré-requisito indispensável e aliado incondicional das PPPs é a manutenção da estabilidade no campo macroeconômico. Bruscas variações de preços, câmbio e juros dificultam o cumprimento de metas de longo prazo, planejadas com antecedência, e terminam por afugentar o investidor da infra-estrutura.

Em um sistema mundial caracterizado por alta especulação e volatilidade de capitais, corremos o risco de atrair tão-só os especuladores de curto prazo, que, ao menor sinal de debilidade do Governo, fogem do País, até porque não estabeleceram com ele nenhum vínculo duradouro. Desse tipo de “investidor” queremos distância, Sr. Presidente!

Para que possamos incentivar a vinda - e a permanência - de investidores do setor privado comprometidos com os desígnios do País, é preciso consolidar um marco regulatório adequado. Ao empresário, precisamos garantir duas coisas, disse o Secretário de Assuntos Internacionais do Ministério do Planejamento, José Miranda, ao jornal Valor Econômico: garantia de que ele vai receber o valor contratado e transparência e lisura no processo de contratação.

Nesse ponto, o prestígio das agências reguladoras é fundamental; no sentido de regulamentar, controlar e fiscalizar os serviços públicos prestados pelas concessionárias.

E não é só isso: as agências são importantes para garantir a qualidade do serviço prestado à população, com a busca do equilíbrio entre oferta e procura e o estabelecimento de preços e patamares compatíveis com a realidade brasileira.

A impessoalidade e o planejamento, princípios que norteiam as atividades das agências, são importantes para assegurar a estabilidade necessária para que os investimentos se realizem. 

Esses são alguns pontos que merecem nossa legítima preocupação. Até em função de nossa inexperiência com o manejo das PPPs, temos de redobrar os cuidados para evitar o acúmulo de riscos no setor público e a produção de lucros excessivos no setor privado. Nesse caso, não estaríamos a falar de parceria, mas de exploração de um setor pelo outro, o que não podemos - nem devemos - aceitar.

Feitas essas ressalvas, compartilhadas com V. Exªs neste Plenário, é razoável concluir que as parcerias público-privadas podem constituir-se em ponto de inflexão no tratamento da questão da infra-estrutura com responsabilidade fiscal, sem varinha de condão nem passe de mágica. O fim último das PPPs é o de atender ao interesse público e às necessidades dos cidadãos. Nesse contexto, o Congresso Nacional tem destacado papel a cumprir.

Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/03/2005 - Página 4773