Discurso durante a 20ª Sessão Especial, no Senado Federal

Comemoração dos vinte anos da redemocratização do Brasil.

Autor
Eduardo Azeredo (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MG)
Nome completo: Eduardo Brandão de Azeredo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. ESTADO DEMOCRATICO.:
  • Comemoração dos vinte anos da redemocratização do Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 16/03/2005 - Página 5078
Assunto
Outros > HOMENAGEM. ESTADO DEMOCRATICO.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, REDEMOCRATIZAÇÃO, BRASIL, COMENTARIO, PARTICIPAÇÃO, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), SOCIEDADE CIVIL, HISTORIA, COMBATE, DITADURA.
  • ELOGIO, PARTICIPAÇÃO, ULYSSES GUIMARÃES, EX-DEPUTADO, TANCREDO NEVES, CANDIDATO ELEITO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, JOSE SARNEY, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ABERTURA, NATUREZA POLITICA, DEMOCRACIA, PAIS.

O SR. EDUARDO AZEREDO (PSDB - MG. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, entre tantos oradores da sessão especial de hoje - alguns dos quais foram testemunhas e artífices da redemocratização do País -, cabe-me agora a honra de também participar da celebração do acontecimento político mais importante da vida brasileira, nas últimas quatro décadas.

Prestar esta homenagem à reconquista de democracia, à memória de seu líder mais insigne, Tancredo de Almeida Neves, e a todos os que lutaram pela redenção política do Brasil, significa para mim - um representante de Minas Gerais nesta nobre Casa - recordar essa árdua e memorável caminhada.

Do mesmo modo que para a maioria dos brasileiros, 15 de março de 1985 marcou minha lembrança como o dia da vitória do movimento.

A par de inúmeros outros episódios decisivos da vida nacional, a participação de Minas Gerais na redemocratização foi especialmente relevante, porque a catalisou!

Catalisar, porque a verdadeira política mineira participa e estimula as mudanças e reações da política brasileira, sem alterar a sua substância. Coloca seus melhores homens a serviço do Brasil, sem lhe cobrar glórias nem contrapartidas.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, essa é a razão pela qual friso que o significado da presente sessão é o da valorização da política e dos políticos como expressão legítima de uma sociedade livre e democrática.

Foi a Política, com “p” maiúsculo, que levou milhões de brasileiros a ir para as ruas e praças deste País exigir o retorno do Estado Democrático de Direito; uma luta grandiosa porque foi pacífica; e pacífica porque foi grandiosa!

O longo e duro caminho culminou no dia 15 de março de 1985, quando José Sarney assumiu o mais alto cargo da República, como primeiro Presidente civil eleito pelo Congresso e representantes das Assembléias Legislativas. Vinte anos de tenaz resistência haviam passado desde que o Arbítrio assumiu o Poder em 1964.

Assim, é forçoso reconhecer que a redemocratização teve longas e profundas raízes no solo da História.

Formaram as raízes a paciente, experiente e perseverante resistência agrupada no legendário MDB, bem como a paixão dos que se entregaram à contestação e até à equivocada opção pelo confronto.

Pelo caminho da resistência pacífica e pelo da reação temerária, muitos dedicaram suas vidas e alguns chegaram a sacrificá-las para que, afinal, a democracia voltasse a vigorar plenamente no Brasil.

Porém, é preciso destacar que, a opção pela via pacífica e parlamentar viabilizou tal reconquista, a partir da resistência perseverante de políticos, líderes, militantes, religiosos, Imprensa, estudantes, sindicatos e entidades sociais.

Não prevalecesse essa opção, seguramente o 15 de março de 1985 poderia ter sido o dia que não existiu! E o calendário da história do Brasil, apesar do que já vinha mudando no cenário político, possivelmente teria se datado por acontecimentos erráticos, se não funestos.

Os mudancistas achavam-se em situação tão sensível que, na madrugada daquele dia inesquecível, não tinham ainda certeza do que aconteceria ao País.

Poucas horas antes da posse, havia irrompido a trágica notícia de que Tancredo Neves, o Presidente eleito, não podia assumir o poder porque acabara de ser submetido a uma inesperada e melindrosa cirurgia.

E a certeza da redemocratização transformou-se subitamente no vácuo da insegurança e do medo de que o sonho, que ainda se iniciava, poderia terminar.

Embora Tancredo Neves estivesse nessa terrível situação, o seu espírito pautava, sem o saber, as decisões políticas que se tomavam durante a angustiante e triste emergência.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a luta política contra o regime autoritário, mesmo nas condições adversas que este impôs, com a extinção dos partidos, as brutais e seguidas cassações de mandatos e direitos, e com as restrições às liberdades públicas e individuais, foi aceita.

A oposição avançou, passo a passo, e fortaleceu-se em disputas notáveis, tanto para o Congresso e Assembléias Estaduais, quanto para os governos dos Estados e até para a Presidência da República.

Destaque-se a eleição de 14 senadores oposicionistas, em 1974, e vários governadores também da oposição, em 1982. Antes, já havia o aumento substancial e progressivo da representação na Câmara dos Deputados. Por um lado, comprovou tese da resistência pela via parlamentar, e por outro terminou por amedrontar o governo militar e levá-lo a editar o Pacote de Abril, fechando o Congresso.

Nunca esmoreceu a luta pelo retorno ao Estado Democrático de Direito! A oposição lançou anticandidatos a Presidente da República, com Ulysses Guimarães concorrendo com o general Ernesto Geisel e o general Euler Bentes disputando com o general João Figueiredo.

A campanha das Diretas Já, simbolizada pela emocionante personalidade do senador Teotônio Vilela, teve a participação de líderes nacionais - entre eles, o ex-Presidente Fernando Henrique, o Presidente Lula, o Deputado Pimenta da Veiga, o hoje prefeito José Serra e o ex-governador Miguel Arraes.

Essa foi uma das mais fortes e impressionantes manifestações já realizadas no Brasil republicano.

Como pode testemunhar aqui, nesta sessão, o ilustre neto e então secretário-particular de Tancredo, Aécio Neves - hoje talentoso Governador do Estado de Minas Gerais - o grande líder mineiro, a exemplo de seus companheiros de oposição, empenhou-se para que fosse vitoriosa a emenda Dante de Oliveira, destinada a restituir o direito do brasileiro escolher livremente seu presidente.

Entretanto, parlamentar que conhecia a exata correlação de forças no Congresso, Tancredo previa a possibilidade de derrota da emenda. Para que não se perdesse o impulso popular das Diretas Já, havia percebido a necessidade da alternativa da eleição de um oposicionista pelo Colégio Eleitoral.

Essa alternativa começou pela eleição do Senador Tancredo Neves para o governo de Minas, em 1982, que empolgou o Estado.

Tão logo Tancredo assumiu, Belo Horizonte se tornou o destino de políticos dos mais diversos partidos, já reorganizados ou legalizados após a anistia. Pacientemente e com o suporte quase integral de todos os líderes partidários de Minas, iniciou a articulação de apoios nacionais à candidatura ao Colégio Eleitoral.

Antes mesmo de se desincompatibizar do governo do Estado, Tancredo Neves contou com o trabalho persistente de seu vice-governador Hélio Garcia, prefeito de Belo Horizonte, que saiu pelo País a angariar o apoio de governadores e lideranças estaduais, que tinham representantes no Colégio Eleitoral.

Outros grandes líderes se perfilaram na resistência desde o primeiro momento: os ex-Presidentes Juscelino Kubitschek e João Goulart na formação da Frente Ampla! Ulysses Guimarães, Franco Montoro, Mário Covas, Thales Ramalho, José Richa, Humberto Lucena, Freitas Nobre, Henrique Santillo.

Citem-se também os mineiros Renato Azeredo - de quem tenho orgulho de ser filho -, Sebastião Paes de Almeida, Edgar da Mata Machado, Jorge Ferraz, Camilo Nogueira da Gama. E mais, Israel Pinheiro, José Maria de Alckmin e Pedro Aleixo - que ficaram na Arena, mas não se submeteram aos excessos do regime militar!

Outras opções de resistência foram Leonel Brizola, Darci Ribeiro, Luís Carlos Prestes, Rubem Paiva, Carlos Lacerda - que se uniu à Frente Ampla - e tantos mais.

A sessão especial de hoje deve um preito de admiração e gratidão pelo que os resistentes de todos os matizes fizeram em favor da redemocratização.

Mas igualmente se deve - e muito - a ilustres brasileiros que aqui estão presentes: os nobres Senadores Marco Maciel, Antonio Carlos Magalhães, Jorge Bornhausen e Pedro Simon, que foram Ministros de Tancredo Neves e José Sarney.

Ilustres nomes gravaram-se na História, como Petrônio Portela - que no Congresso foi, ao lado do oposicionista Thales Ramalho, o principal articulador governista da abertura - e João Calmon, Nelson Marchezan, Aureliano Chaves.

A Aureliano cumpre-me, como Senador por Minas, homenageá-lo de forma especial. Íntegro e corajoso, arrostou a situação da época e, embora vice-Presidente da República, liderou a criação da Aliança Democrática, que possibilitou a fundação do Partido da Frente Liberal e o apoio de diversos dissidentes a Tancredo.

Ainda quando era Governador de meu Estado, Aureliano Chaves assumiu a linha de frente para defender Ernesto Geisel das tentativas de setores radicais do regime em golpear a abertura em andamento!

Com o avanço da redemocratização, apesar da derrota da campanha das Diretas Já, o nobre e saudoso líder mineiro ajudou a articular a composição do PFL com o PMDB.

Daí resultou na escolha do hábil e competente José Sarney como candidato a vice-presidente na chapa de Tancredo Neves ao Colégio Eleitoral de 15 de janeiro de 1985.

Uma homenagem especial deve ser feita igualmente ao Deputado Ulysses Guimarães, que ilustra a galeria dos mais importantes vultos da história republicana brasileira, certamente como o mais tenaz e desprendido condestável político.

Ulysses e Tancredo Neves interpretaram um dueto inesquecível sobre a sabedoria, a habilidade e perseverança políticas.

Para viabilizar a redemocratização, Tancredo costurou artesanalmente a ampla aliança que ajuntou até ex-adversários, inclusive generais abertos ao entendimento, como Leônidas Pires Gonçalves e Reynaldo Mello de Almeida.

Assim eram Tancredo, na retaguarda da persuasão e das articulações, e Ulysses, na vanguarda das frentes de luta junto ao Congresso e à opinião pública: um não existiria sem o outro, e o Brasil, sem nenhum dos dois!

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Ulysses, embora fosse dirigente do maior partido da oposição, abriu mão de ser o candidato da transição; depois, aceitou não disputar o Colégio Eleitoral; e, por fim, não levantou objeção a que José Sarney, o vice-Presidente eleito, tomasse posse do mais alto cargo da República, durante o impedimento de Tancredo Neves - que muitos ainda esperavam ser temporário.

A serenidade e prudência com que Sarney conduziu os passos iniciais e efetivos da redemocratização, rumo à Constituinte de 1988 e logo depois à primeira eleição direta para a Presidência da República, comprovaram que se tratava de um resgate político-institucional consolidado e já inscrito na História.

A História não é, portanto, obra de um só, por mais importante que este seja! Nem obra que começa do zero, como alguns narcisos da política pretendem, hoje, fazer crer!

Esses têm a pretensão de reformar o País e até o mundo, ignorando e menosprezando os alicerces e as paredes levantadas no passado, com trabalho duro e sacrifícios, dos quais os pretensiosos sequer quiseram participar.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, homenagear o retorno à democracia em nossa pátria e a memória dos que lutaram por ela é a ocasião de celebrarmos a verdadeira política!

Sem a livre manifestação de opinião e de organização, sem o respeito às garantias e liberdades públicas e individuais e sem o pleno Estado de Direito, não há política digna deste nome!

Um marco irreversível foi alcançado pela redemocratização de 1985. Agora é necessário o aperfeiçoamento da representação e organização partidárias e que se assegurem maior estabilidade, previsibilidade e modernidade na atuação dos três Poderes da República.

Esse é um excelente começo e plataforma para o Brasil lançar-se a projetos de maior porte, como o desafio de proporcionar a todos os cidadãos acesso à educação, à saúde e saneamento, à habitação, ao transporte, à segurança e à justiça.

A democracia só se dará com o desenvolvimento e o bem-estar de toda a Nação!

Muito Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/03/2005 - Página 5078