Discurso durante a 26ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Lembra a data de 21 de março como o Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial.

Autor
Valmir Amaral (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/DF)
Nome completo: Valmir Antônio Amaral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DISCRIMINAÇÃO RACIAL.:
  • Lembra a data de 21 de março como o Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial.
Publicação
Publicação no DSF de 24/03/2005 - Página 6280
Assunto
Outros > DISCRIMINAÇÃO RACIAL.
Indexação
  • REGISTRO, DIA INTERNACIONAL, LUTA, ELIMINAÇÃO, DISCRIMINAÇÃO RACIAL.
  • ANALISE, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, BRASIL, PROTESTO, INJUSTIÇA, DISCRIMINAÇÃO, NEGRO, DEFESA, COTA, GRUPO ETNICO, UNIVERSIDADE.

O SR. VALMIR AMARAL (PMDB - DF. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em memória ao massacre de Shaperville, ocorrido na África do Sul no ano de 1960, a Organização das Nações Unidas instituiu a data de 21 de março como o Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial.

Naquela data, 69 negros foram mortos, e mais de 180 foram feridos pela repressão do regime de apartheid que então vigorava na República Sul-Africana. Tratava-se de uma mobilização pacífica contra uma lei odiosa que os obrigava a portar cartões de identificação, especificando os lugares onde podiam transitar.

A nódoa que representou o regime do apartheid na África do Sul, Senhor Presidente, nos faz lembrar permanentemente desta que é uma das facetas mais perversas da condição humana: a discriminação e o preconceito racial.

O pensamento racista é vil e traiçoeiro, permanecendo de tocaia até nos espíritos mais generosos e altruístas. Muitas vezes incrustadas profundamente na sociedade, as manifestações discriminatórias não costumam mostrar abertamente a sua cara.

Exemplo disso é a pesquisa realizada em 2003 pela Fundação Perseu Abramo, que demonstrou que 87% da população brasileira acredita que há racismo em nosso País, mas apenas 4% declarou-se como racista. Ora, como é que pode haver racismo sem racistas? Ou vítimas sem algozes?

O fato é que, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, temos uma enorme dívida social de reparação racial a pagar. E não podemos mais postergar o seu adimplemento.

Os negros ainda são maioria nas favelas e guetos de nossas grandes cidades, estão praticamente alijados dos cursos mais concorridos de nossas faculdades e representam a maior parcela dos que engrossam as fileiras do mercado informal de trabalho. O mito da igualdade racial não pode mais servir como fundamento de nosso imobilismo.

Portanto, Sr. Presidente, não tenho dúvidas de que o País necessita, sim, de ações afirmativas para combater o problema. A política de cotas para as universidades públicas federais é um bom exemplo, embora alguns a vejam como uma injustiça com os não-contemplados. Mas como podem ser mais injustiçados que os negros, herdeiros malditos da escravidão e cujos direitos básicos sempre lhes foram negados?

A criação das cotas representa, sobretudo, um acréscimo na autoconfiança dos afrodescendentes. Muitos que não ousavam se inscrever para o vestibular, provavelmente inibidos pelas estatísticas desfavoráveis, resolveram tentar e acabaram obtendo resultados extremamente satisfatórios.

O caso ocorrido na Universidade Federal da Bahia ilustra bem tal situação. No último vestibular promovido pela instituição, em 37 dos 61 cursos oferecidos, a nota mais alta da prova objetiva foi obtida por concorrentes que se inscreveram pelo sistema de cotas.

Assim, o argumento de que os alunos que se utilizam das cotas são despreparados não se sustenta. A grande maioria dos cotistas, cerca de 88%, foi classificada para a segunda fase do vestibular da UFBA exclusivamente pelo seu desempenho, independente da questão racial. Apenas nos cursos mais concorridos e elitizados, como Direito, Medicina e Odontologia, em que normalmente são raros os alunos negros, as cotas fizeram diferença.

Permitir que o negro ingresse na universidade com dignidade e altivez, meus Caros Colegas, não representa caridade ou benevolência. Trata-se tão somente de um passo importante na construção de uma sociedade mais democrática e justa, em que a discriminação racial seja um problema enfrentado com seriedade, sem rodeios.

Srªs e Srs. Senadores, discriminação racial, conforme preceitua a Convenção Internacional da ONU sobre o assunto, significa “qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada na raça, cor, ascendência, origem étnica ou nacional com a finalidade ou o efeito de impedir ou dificultar o reconhecimento e exercício, em bases de igualdade, aos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou qualquer outra área da vida pública".

Sabemos que, desgraçadamente, tais situações ainda acontecem em nosso País. Por isso, temos de continuar lutando, de forma incansável, contra qualquer tipo de discriminação ou preconceito de raça no Brasil. Que a data de 21 de março sirva como reflexão para todos nós.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/03/2005 - Página 6280