Pronunciamento de Mozarildo Cavalcanti em 29/03/2005
Discurso durante a 28ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Proposta de convocação de plebiscito sobre redivisão territorial do País. (como Líder)
- Autor
- Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
- Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
DIVISÃO TERRITORIAL.:
- Proposta de convocação de plebiscito sobre redivisão territorial do País. (como Líder)
- Aparteantes
- Eduardo Azeredo.
- Publicação
- Publicação no DSF de 30/03/2005 - Página 6765
- Assunto
- Outros > DIVISÃO TERRITORIAL.
- Indexação
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- REGISTRO, HISTORIA, DEBATE, DIVISÃO TERRITORIAL, ASSEMBLEIA CONSTITUINTE, TRABALHO, COMISSÃO ESPECIAL, PROPOSTA, CRIAÇÃO, ESTADOS, DIVISÃO, ESTADO DO PARA (PA), ESTADO DO AMAZONAS (AM), ESTADO DE MATO GROSSO (MT).
- COMENTARIO, TRAMITAÇÃO, PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO, ASSUNTO, PLEBISCITO, DIVISÃO TERRITORIAL, IMPORTANCIA, DEMOCRACIA, BUSCA, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, REGISTRO, OCORRENCIA, DISCRIMINAÇÃO, IMPRENSA, ANALISE, VANTAGENS, ECONOMIA, REPRESENTAÇÃO POLITICA, REGIÃO NORTE.
O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a imprensa nacional tem, nos últimos dias, abordado um tema que tive a oportunidade de apresentar logo que assumi meu mandato de Senador, em 1999: a redivisão territorial do País.
Fui Constituinte e tive a oportunidade de debater a redivisão territorial do País, quando foram apresentadas inúmeras propostas para se fazer a redivisão territorial do Brasil. Dessas propostas, foram aprovadas, pela Assembléia Nacional Constituinte, a criação do Estado do Tocantins, por desmembramento da metade norte do Estado de Goiás, e a transformação dos Territórios Federais de Roraima e do Amapá em Estados-membros da Federação.
Naquela ocasião, os Constituintes houveram por bem criar, nos artigos das Disposições Constitucionais Transitórias, uma comissão especial para estudar e emitir parecer sobre a questão da redivisão territorial do País.
Essa comissão, formada por Parlamentares, por membros do Executivo e até mesmo do Poder Judiciário, constituiu-se, reuniu-se no prazo previsto e apresentou uma conclusão, propondo a criação do Estado do Tapajós, no Pará; do Território do Rio Negro, no Amazonas; e do Território do Araguaia, no Mato Grosso, além de outras proposições mais voltadas a mesorregiões e não propriamente à criação de novas unidades da Federação.
Essas recomendações da comissão, que seriam, portanto, fruto de projetos de decreto legislativo que convocaria plebiscito para que as populações desses Estados se pronunciassem sobre a criação ou não dessas novas unidades da Federação, nunca foram levadas à frente na Câmara nem no Senado. Não houve iniciativa alguma do Poder Executivo nesse sentido. Portanto, o trabalho da comissão, criada pela Constituição, foi letra morta, deixou de existir.
Assim, em 1999, aqui chegando, ainda com aquelas discussões vivas em minha cabeça, apresentei três projetos de decreto legislativo que propunham a convocação de plebiscito para consultar a população do Estado do Amazonas, do Pará e do Mato Grosso, coincidentemente os três maiores Estados da Federação. Eu estava buscando - justamente olhando nosso mapa - redesenhá-lo de maneira mais consentânea com a busca da eliminação das desigualdades regionais.
É preciso dizer que o projeto de decreto legislativo não estava criando nem propondo a criação de Estados, mas propondo a convocação de um plebiscito para que as populações daquelas unidades da Federação possam se pronunciar a respeito.
No Senado, os Srs. Senadores aprovaram por unanimidades as três propostas: a criação do Estado do Tapajós, no oeste do Pará; a criação do Estado do Araguaia, no norte do Mato Grosso; e, no Estado do Amazonas, minha proposta de criação do Estado do Solimões foi modificada, por iniciativa do Senador Jefferson Péres, criando três territórios federais no oeste do Amazonas - o Território do Rio Negro, mais ao norte; o Território do Solimões, na metade oeste do Estado, e o Território do Juruá, na fronteira com o Acre, portanto na metade inferior oeste do Estado do Amazonas.
Esses projetos seguiram para a Câmara dos Deputados. Depois disso, o Senador Sebastião Rocha aprovou um outro projeto de decreto legislativo propondo a redivisão do Amapá e, portanto, a criação do Território Federal do Oiapoque, que também seguiu para a Câmara, após ser aprovado aqui. Na Câmara, hoje, existem cerca de dezesseis propostas de decreto legislativo para a criação de territórios federais e de Estados.
Sr. Presidente, a imprensa está colocando o carro na frente dos bois, ao dizer que já estamos propondo a criação do Estado. E não é isso. O que se está propondo é a convocação de um plebiscito, para discutir com a população a conveniência ou não da redivisão territorial. Posteriormente, numa votação ampla, a população dirá se quer ou não a redivisão. Mas, da forma como se coloca na imprensa, é como se já estivéssemos criando os Territórios e os Estados, pois publicam que iremos aumentar os gastos em muitos bilhões de reais, quando nada disso é realidade.
Após a realização do plebiscito, se as populações quiserem a criação dos Estados e dos Territórios, ainda haverá uma longa jornada a ser percorrida, que é a apresentação de uma lei complementar que criará o Estado ou o Território. Essa lei complementar, que deverá ser aprovada na Câmara e no Senado e sancionada pelo Presidente da República, irá definir como será o Estado ou o Território e quais serão as configurações não só geográficas, mas econômicas, que implicarão na criação dessas novas unidades.
Portanto, parece que há um preconceito - até de boa-fé - de alguns em relação à divisão do seu Estado. O Amazonas, por exemplo, sozinho é maior do que os sete Estados do Sul e Sudeste juntos; o Pará representa a superfície dos sete Estados do Sul e Sudeste juntos; e Mato Grosso é quase essa mesma área, 906 mil quilômetros quadrados. Esses três Estados são a metade do tamanho do Brasil. Então, é lógico que, com esse mapa e essa geografia, nunca eliminaremos as desigualdades regionais.
Nós, que temos a mania - em alguns momentos, uma mania salutar - de imitar os Estados Unidos, nesse particular, não o tentamos imitar. Se olharmos o mapa dos Estados Unidos continental, retirado o Alasca, veremos que tem uma área menor que a do Brasil e possui cinqüenta Estados. Nos Estados Unidos, quase todos os Estados estão desenhados em linha reta. Lá, a criação dos Estados não levou em conta sequer os limites geográficos, não considerando se, nesses limites, passava um rio ou havia uma montanha. Preocuparam-se em desenvolver igualmente o país, levando, de norte a sul, de leste a oeste, condições iguais de desenvolvimento.
No Brasil, a Constituição Federal diz que é dever da República eliminar as desigualdades regionais. Se assistirmos às sessões do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, vamos ouvir, todos os dias, Parlamentares clamando pela eliminação dessas desigualdades, dizendo que as regiões mais pobres estão cada vez mais ricas e as mais ricas, cada vez mais ricas.
Aqui, há um equívoco enorme. Por exemplo, se São Paulo computasse o número de imigrantes que vão para lá, atraídos pelas melhores condições de trabalho e de estudo ou por outras razões, agravando as questões sociais de saúde, segurança e moradia, talvez o Estado fosse o maior incentivador da criação de novas unidades da Federação. Isso também se aplica ao Rio de Janeiro e a Minas Gerais.
No entanto, existem vários vieses que se entrecruzam e que prejudicam o debate, como a questão do aumento do número de Deputados e de Senadores das regiões mais pobres. O poder político poderia caminhar numa direção em que os Estados mais pobres seriam mais bem representados. Aliás, deveria ser assim: os Estados mais fracos deveriam ter uma representação maior do que os mais ricos. No entanto, vige uma outra regra constitucional a que respeitamos.
Mas o que queremos não é discutir o tamanho de representação política, de domínio econômico, político e até científico das unidades mais avançadas. O que queremos mesmo é discutir o Brasil do século XXI. Se analisarmos nosso mapa, verificaremos que pouco ou quase nada mudou em relação ao Brasil do século XIX, tampouco em relação ao século XX. Em 1943, o Presidente Getúlio Vargas ousou criar na distante Amazônia, quando praticamente só existiam dois Estados - Amazonas e Pará -, cinco territórios federais: Roraima, Amapá, Guaporé, hoje Rondônia, Iguaçu e Ponta Porã. Esses dois últimos, na Constituinte de 1946, foram reincorporados aos Estados de origem: Paraná e Mato Grosso. No regime militar, foi criado o Estado do Mato Grosso do Sul, por desmembramento do então Estado do Mato Grosso, que era o maior Estado da Federação. Recentemente, em 1988, foi criado mais um Estado, o Tocantins, e houve a transformação de dois territórios federais.
Então, na verdade, o que existe é uma mesmice, uma repetição de programas que não vão à frente nem no Nordeste nem no Norte do País. E teimamos em ter esse mesmo tipo de mapa. Inclusive, as capitais dos Estados do Amazonas, do Pará e do Mato Grosso foram estabelecidas quando a realidade era outra e o acesso era feito somente por via fluvial. Por isso, as capitais ficavam às margens dos grandes rios, distantes do restante do Estado. No Amazonas, a capital fica no leste, distante três horas de vôo de avião a jato de Tabatinga, que fica no oeste. Da mesma forma, Belém fica às margens da Baía do Guajará, a mais de três horas de vôo de Santarém, que está na ponta leste do Estado.
Portanto, é preciso rediscutir essa questão, mas sem o sentimento de domínio, de que “este aqui é meu feudo e não posso pensar em dividi-lo”. Na verdade, a palavra não é dividir e sim multiplicar. Estamos propondo a multiplicação das unidades da Federação e não a sua divisão. Queremos criar novas unidades da Federação. Achamos que essa questão deve ser discutida de maneira serena, dentro do aspecto regional, levando em conta as peculiaridades de cada uma das regiões, mas, principalmente, chamando a atenção para o fato de que o que se está propondo ainda não é a criação e, sim, a convocação de plebiscito para que o povo possa falar.
Nós não podemos, nem o Senado nem a Câmara, calar a voz do povo. Vamos dar oportunidade para que o povo fale. Se ele não quiser a redivisão, vamos nos curvar a essa decisão; mas se ele quiser, nós não podemos impedir que isso aconteça e muito menos arranjar desculpas para que não aconteça.
Concedo, com muito prazer, um aparte ao Senador Eduardo Azeredo.
O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Senador Mozarildo Cavalcanti, concordo com V. Exª em que o Brasil precisa discutir com seriedade essa possível redivisão territorial. Somos um País relativamente novo e com Estados enormes. A experiência recente da criação dos Estados do Tocantins e Mato Grosso Sul teve êxito, deu certo. Tenho sempre dito, até por ser representante de Minas Gerais, que alguns Estados que já têm limites consolidados, como é o caso do meu Estado e da Bahia, apesar de terem uma área territorial grande, não devem ser objeto de redivisão, porque já existe toda uma cultura regional e já existe, como disse, um limite consolidado. Mas em relação às novas fronteiras do Brasil, que são aquelas que vieram especialmente depois da corajosa decisão de Juscelino Kubistchek de construir a nova capital, e são exatamente esses Estados do Centro-Oeste e do Norte, considero que aí, sim, podemos ter novas unidades federadas, sem que exista esse pensamento pequeno de considerar que a mudança pretende na verdade é aumentar o número de Deputados Federais e Senadores. Não é possível se pensar assim, porque o objetivo maior é a melhor ocupação territorial do Brasil, com áreas novas que sejam objeto de exploração correta, auto-sustentada, que respeite o meio ambiente. Precisamos fazer com que o Brasil tenha condições de cuidar dessas áreas. A população brasileira de 180 milhões de habitantes terá uma qualidade de vida melhor se estiver mais bem distribuída no País. Quanto mais concentrarmos em megacidades como São Paulo pior será a qualidade de vida e maior serão os problemas de segurança. Então, quero manifestar a minha opinião também favorável para que possamos fazer uma primeira discussão e depois chegarmos a projetos em relação a essa região do Brasil, que representa as novas fronteiras agrícolas e populacionais do País.
O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Agradeço imensamente pelo aparte de V. Exª, Senador Eduardo Azeredo. V. Exª citou bem o caso de Minas Gerais. Mas quantas Minas Gerais cabem no Amazonas, no Pará, no Mato Grosso? Então, é preciso que tenhamos definido, no mínimo, um tamanho ideal para a unidade da Federação ou pelo menos discutido o que podemos fazer nesse sentido.
O que não se pode é deturpar um debate dessa ordem sob o manto de que o objetivo é apenas gastar mais dinheiro, criar mais cargos, atender a ambições políticas não justas.
Falo aqui sem nenhuma preocupação de estar ferindo esse ou aquele Parlamentar, porque, como já disse, o que pretendemos é que haja um plebiscito, uma consulta popular. Afinal, nós, embora representemos a população, não somos donos da vontade do povo. Então, precisamos permitir que a população possa se pronunciar, depois de um debate franco, em que poderão se manifestar aqueles que são favoráveis e os que são contrários à matéria.
Sou de um Estado, que é o menor da Federação em termos de população e de recursos financeiros, já pertenceu ao Estado do Amazonas, passou pelo estágio de território federal e hoje possui universidade federal, faculdades particulares, centro federal de ensino tecnológico, estradas que ligam a capital à capital do Estado vizinho do Amazonas e com a Guiana. Então, na verdade, não seríamos o que somos se tivéssemos continuado como Município do Estado do Amazonas.
Para ilustrar, citaria o caso do Município de Barcelos, do Amazonas, que é maior, em extensão, do que o Estado de Roraima, mas que já foi capital do Amazonas e hoje tem menos de 30 mil habitantes, vive da pesca artesanal, não tem faculdades, está abandonado pelo poder público em função de sua distância da capital.
Então, é preciso termos esse sentimento de brasilidade para que possamos discutir. Vou inclusive, Sr. Presidente, apresentar um requerimento propondo a criação de uma Comissão Mista que possa sistematizar essas propostas que estão aqui no Senado e na Câmara, porque algumas estão superpostas, e possamos selecioná-las para apresentar um conjunto de propostas que possa merecer a discussão, aprovação e o plebiscito nas diversas unidades da Federação.
Muito obrigado.