Discurso durante a 29ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da aprovação de projeto, de iniciativa do governo federal, que regulamenta a gestão das florestas brasileiras.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Defesa da aprovação de projeto, de iniciativa do governo federal, que regulamenta a gestão das florestas brasileiras.
Publicação
Publicação no DSF de 31/03/2005 - Página 6923
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • NECESSIDADE, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, REGULAMENTAÇÃO, GESTÃO, FLORESTA, TERRA PUBLICA, OBJETIVO, GARANTIA, SOBERANIA NACIONAL, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, CRIAÇÃO, POLITICA FLORESTAL, FUNDO NACIONAL, DESENVOLVIMENTO FLORESTAL, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE.

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Amazônia ocupa quase 60% do território nacional. Uma região como essa, com tamanho espaço, deveria também ocupar o tempo desta Casa nos debates e nas discussões sobre modelo de desenvolvimento porque é uma região que ainda preserva 90% dos seus recursos. Não podemos reproduzir o mesmo modelo de desenvolvimento que atravessou o Atlântico e que se instalou no País, na região Sul, na região Centro-Sul, no Leste e no Nordeste brasileiros.

E é exatamente por saber que essa região é de tamanha importância, de tamanha grandeza, que volto a insistir, neste plenário, na tribuna do Senado, no tema referente a essa região, ao novo modelo de desenvolvimento que todos desejamos para a região.

Gostaria de destacar um seminário realizado pela Câmara Federal, chamado Gestão de Florestas Públicas. O seminário discute o Projeto de Lei nº 4.776, de 2005, que deverá chegar ao Senado. E nesse seminário estavam presentes dois governadores: Jorge Viana, do Acre, e Eduardo Braga, do Amazonas. São dois governadores da Amazônia que buscam alternativas para o desenvolvimento, no sentido de aproveitar os recursos da biodiversidade, não de forma tradicional, não com a implantação dos grandes projetos causadores de destruição ambiental e acumuladores de pobreza social, mas estiveram aqui conosco debatendo o programa de gestão de florestas públicas encaminhado à Câmara Federal e que, posteriormente, será objeto de discussão aqui no Senado.

Fomos convidados para coordenar um dos painéis de discussão. E é interessante porque esse projeto exige de todos nós uma acerta urgência. É estranho falar que, depois de 500 anos de absoluta omissão do Poder Público, o projeto chegue na Câmara e estejamos ansiosos para que tramite com rapidez.

O projeto regulamenta a gestão das florestas públicas, dá garantia à soberania e à sustentabilidade e ao desenvolvimento socioeconômico. Falo de nossa garantia à soberania porque, se continuar com o índice de desmatamento que hoje gira em torno de 23 mil a 25 km2 por ano, estamos colocando em risco a nossa soberania na região.

A não definição de uma atividade de um destino econômico à floresta tem provocado a sua conversão sistemática em monocultura, em pastagens.

É evidente que as queimadas, a destruição sistemática das florestas tem provocado, tem contribuído para a noção de gases nocivos na atmosfera e tem contribuído para o efeito estufa e para as mudanças climáticas. A maior contribuição do Brasil para as mudanças climáticas é exatamente as queimadas na Amazônia.

E o Governo apresenta esse projeto que tem alguns objetivos decisivos para a floresta, para a biodiversidade e para a região. O projeto regulamenta a gestão das florestas, das florestas nativas de domínio da União, dos Estados e dos municípios, cria o serviço florestal brasileiro que é um órgão regulador da gestão das florestas públicas e fomentador das atividades florestais sustentáveis no Brasil.

Aqui caberia a criação de uma instituição para o desenvolvimento dessas florestas para o fomento, a pesquisa, o crédito, a comercialização, talvez até futuramente um Ministério da Floresta, porque hoje os produtos florestais contribuem com quase 4 a 4,5% do PIB das exportações brasileiras. É significativa a contribuição dos produtos florestais na balança comercial brasileira.

O terceiro ponto é criar o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal, que busca promover o desenvolvimento tecnológico, a assistência técnica e o incentivo para o desenvolvimento da pesquisa.

É bom notar que, depois de 500 anos, este é o primeiro projeto que constrói, que busca construir políticas públicas para o desenvolvimento econômico, para a melhoria social e sobretudo para a preservação do patrimônio ambiental de toda a sociedade brasileira.

Aqui e na Câmara, já se votaram leis proibitivas, impeditivas, repressivas, no que diz respeito ao uso dos recursos naturais da Amazônia. Essa é uma lei, ao contrário, construtiva, que busca estabelecer regras para a utilização econômica dos recursos florestais, sejam eles madeireiros ou não. E isso é fundamental para o nosso País.

Estará presente também a nobre Ministra Marina Silva, participando do debate, da discussão, apresentando o seu projeto. Trata-se de um projeto que já tem alguma base de prática, porque alguns Estados, como o Amazonas e o Acre, já trabalham com manejo florestal. Tive oportunidade de visitar o Acre na semana passada e, em algumas áreas manejadas, áreas comunitárias, vi o impacto econômico, a melhoria de vida dos manejadores de produtos madeireiros da floresta.

Agora, peço a atenção da Ministra Marina Silva, porque estou preocupado com meu Estado. O Amapá, como todos sabem, é um Estado preservadíssimo. Tem ainda hoje em torno de 95% a 96% de sua cobertura vegetal primária intacta. Então, é um Estado virgem, e evidentemente um Estado virgem desperta uma cobiça muito grande. Tenho dito e reafirmo que a idéia de internacionalização da Amazônia é mais em decorrência do abandono que o Poder Público relegou à região. Imaginem que depois de 500 anos é que vamos ter uma lei que define a floresta para o uso econômico, de forma sustentável. Então, é uma região que representa 60% praticamente da superfície de nosso País e, mesmo assim, foi relegada, ao longo desses anos, ao abandono. Ora, o povo do Amapá, com suas comunidades tradicionais, tem ajudado a preservar aquele Estado. No entanto, neste momento se vislumbra, eu diria, uma articulação até um pouco arriscada, que pode confundir as pessoas. O Governo Estadual atual está acenando com a criação de um corredor da biodiversidade. Vejam, um corredor da biodiversidade de áreas que já foram criadas há muito anos, há muitas décadas. A última dessas grandes áreas de preservação criada foi o Parque Nacional das Montanhas do Tumucumaque, em 2002. Talvez seja a maior área de preservação do planeta, com 3,8 milhões hectares de áreas intactas.

Parece-me, então, que esse corredor da biodiversidade é a junção de todas essas áreas de preservação, com reservas extrativistas, estações ecológicas e biológicas, para uma gestão compartilhada entre o Governo do Estado do Amapá e o Governo Federal. Ora, ao mesmo tempo em que se fala da necessidade da criação desse corredor, dessa gestão integrada, o mesmo Governo, por meio de seu Secretário do Meio Ambiente, defende, de forma intransigente, a introdução da monocultura da soja no Estado do Amapá. E mais do que isso, está implantando-se uma siderúrgica para a produção de ferro-gusa a partir do carvão de essências nativas. A empresa está instalando-se, não tem plano de reflorestamento e se propõe a usar o carvão de essências nativas da região. Ou seja, vamos ter um processo acelerado e muito semelhante ao de Minas Gerais se não tomarmos medidas enérgicas. Por isso, advirto a Ministra Marina Silva para que atente e analise o que está por trás desse corredor da biodiversidade, porque a introdução de uma siderúrgica para usar carvão vegetal de essências nativas é um risco para a nossa floresta, como foi no Haiti e em Minas Gerais.

Além da introdução da monocultura da soja, além da implantação de uma siderurgia, pretende o Estado transferir para os seus domínios 2 milhões de hectares para formar as florestas estaduais produtivas. Vejam: está começando a tramitação do projeto de lei que vai regulamentar e gerir as nossas florestas. Portanto, seria importante, eu diria, neste momento, usar da cautela, aguardar o debate sobre esse projeto, que, certamente, vai tramitar com rapidez na Câmara. Até porque, antes mesmo de formar a comissão especial para começar a discutir o projeto, a Ministra Marina Silva teve a preocupação de promover esse seminário que continua ainda na Câmara. Portanto, antes de se proceder à transferência de terras - que não são terras, mas sim floresta de grande diversidade e de muita riqueza -, temos que ter um certo cuidado e um controle muito grande exatamente nas transferências das terras públicas da União para o Estado, como pretende o Governador.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - É óbvio que o projeto de lei prevê mecanismo de controle que devemos aprimorar já na Câmara, para que tramite muito mais rápido aqui, no Senado. O nosso desejo é vê-lo aprovado o mais rapidamente possível. Pela primeira vez na história da Amazônia, teremos uma clara definição de uso econômico dos produtos florestais madeireiros e não-madeireiros de nossas florestas.

Sr. Presidente, era o que eu tinha a dizer.

Muitíssimo obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/03/2005 - Página 6923