Discurso durante a 29ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Leitura de carta que repudia a política de administração pública da Radiobrás.

Autor
Heloísa Helena (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Leitura de carta que repudia a política de administração pública da Radiobrás.
Publicação
Publicação no DSF de 31/03/2005 - Página 6930
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, LEITURA, CARTA, AUTORIA, SERVIDOR, EMPRESA BRASILEIRA DE COMUNICAÇÃO S/A (RADIOBRAS), DESTINATARIO, ORADOR, DENUNCIA, ATUAÇÃO, AUTORITARISMO, DIRETORIA, EMPRESA PUBLICA, AUSENCIA, ETICA, DESRESPEITO, DEMISSÃO, INJUSTIÇA, FUNCIONARIO PUBLICO, PREJUIZO, FUNCIONAMENTO, EMPRESA JORNALISTICA.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - V. Exª sabe, assim como eu, que foi uma decisão tomada pela maioria dos Líderes e pela Mesa Diretora. Já disse várias vezes aqui que no dia em que eu quiser falar mais, falarei, porque o Regimento Interno manda, possibilita e autoriza. Enquanto isso não ocorrer, farei o acordo de Líderes.

Senador Eduardo Siqueira Campos - V. Exª sabe disso, é meu amigo -, como sou asmática, aprendi, durante a vida, a ter que falar rápido, sem respirar, pois é mais fácil para mim. Mas fico constrangida com o constrangimento de alguns Senadores que ocupam a tribuna e não podem garantir o que é a essência do Senado, que é falar, debater, compartilhar informações e posições ideológicas programáticas. Esta é a nossa razão de existir, em vez de estarmos passeando por estes tapetes azuis. Sei que a decisão não é de V. Exª. Espero que um dia ocorra uma pane nesse aparelho ou a Casa queira consertar a decisão.

O SR. PRESIDENTE (Eduardo Siqueira Campos. PSDB - TO) - A partir de agora começam a correr os 10 minutos de V. Exª. As palavras rápidas de V. Exª são sempre carregadas de muita inteligência, Senadora Heloísa Helena.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Nem pedirei o que o Regimento Interno me autoriza.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, passo a compartilhar agora com a Casa uma carta que recebi de várias trabalhadoras e trabalhadores da Radiobrás. É uma carta que chama a atenção. E, em função do documento recebido, encaminho requerimento de informações ao Ministro Luiz Gushiken, solicitando que informe aos trabalhadores da Radiobrás, ao Senado e à sociedade de forma geral, qual a política administrativa e de comunicação pública da Radiobrás.

Passo a ler a carta encaminhada pelos trabalhadores, Senador Geraldo Mesquita Júnior:

É preciso chamar a atenção da sociedade para os abusos e os desmandos que estão acontecendo na Radiobrás que vêm sendo denunciados por notinhas nos jornais e pelos sindicatos dos jornalistas e dos radialistas, mas, por serem dispersos, não se despertou ainda para a gravidade da situação.

Por trás de um discurso demagógico em defesa de um jornalismo público, a diretoria da Radiobrás está destruindo uma eficiente estrutura de comunicação construída com recursos públicos, e comete as maiores atrocidades e desrespeito a profissionais competentes que trabalham na empresa há anos, muitos dos quais próximos da aposentadoria. A última da empresa foi acabar com o departamento de fotografia da Agência Brasil e demitir 8 fotógrafos, nenhum com menos de 15 anos de casa. Mudanças e reestruturações são naturais, mas a ausência total de novas propostas e a forma desrespeitosa e injustificada com que os profissionais são demitidos deixam claro que o único motivo das demissões é a abertura de vagas para os amigos da direção”. [o que já não é novidade, porque o atual Governo repete o Governo anterior, em que aos amiguinhos tudo e àqueles que têm dependência o rigor sabe-se lá do que, porque da lei, com certeza, não é.]

Esta tem sido a prática [continua a carta] adotada pelo Sr. Eugênio Bucci, que desde que assumiu há dois anos, demite os funcionários antigos para colocar no lugar seus ex-alunos e jornalistas do PT desempregados em São Paulo e Porto Alegre.

(...)

O clima de insegurança e terrorismo instalou-se na empresa, desde então provocando sérias conseqüências para os trabalhadores que vivem desesperados pela ameaça constante do desemprego e da perseguição política. As crises de hipertensão e stress emocional têm sido cada vez mais constantes, mas na última sexta-feira um fato mostrou que o desrespeito à história profissional e à vida das pessoas pode ter conseqüências graves e irremediáveis. Ao saber da sua demissão, depois de 22 anos de trabalho dedicados à empresa, o fotógrafo Hermínio Oliveira sofreu um infarto e está até hoje na UTI do Hospital Santa Luzia.

No domingo passado, o Correio Braziliense [tive a oportunidade de ler a matéria e também o blog do jornalista Ricardo Noblat] trouxe uma página inteira sobre a vida profissional do fotógrafo Gervásio Batista, cujas lentes registraram flagrantes históricos de presidentes brasileiros desde Juscelino Kubitschek. Gervásio, de 80 anos e de disciplina e vitalidade admirados por todos no exercício da profissão, também já tinha recebido seu cartão vermelho...[e entrado na lista dos demitidos], mas quando soube da repercussão da notícia no Correio Braziliense, a diretoria telefonou-lhe às pressas para dizer que seu nome havia entrado na lista por engano.

Veja o nível do cinismo, Senador Geraldo Mesquita Júnior! Outro octogenário histórico da empresa, Anatol Von Beher, que há quase 30 anos traduzia para o alemão as notícias do Serviço Internacional da Radiobrás, há dois meses, quando chegou para trabalhar, foi informado pelo garoto de 24 anos que havia passado a ser seu chefe que estava demitido porque a Agência Brasil estava acabando com o serviço alemão. Nem o argumento de que ele era fluente também em inglês adiantou. Os amigos, informa a carta, Senador Geraldo Mesquita Júnior, dizem que estão extremamente preocupados pela baixa estima que tomou conta do velho alemão, só comparável aos horrores da guerra que enfrentou na Alemanha.

Esses são alguns exemplos. Na Radiobrás, serviços de comunicação prestados há anos acabam da noite para o dia sem nenhuma justificativa. Estão aos poucos destruindo uma empresa pública que presta, e tem obrigação de prestar, serviços de comunicação relevantes e de interesse público, para transformá-la em um medíocre cabide de emprego.

O que mais incomoda a todos é a falta total de ética, o deslavado privilégio dos protegidos da diretoria (alguns conseguiram em apenas dois anos de empresa promoções de até 18 pontos de uma única vez) e os gastos absurdos, abusivos e injustificados com as inúmeras viagens dos diretores pelo Brasil e pelo exterior para apregoar tal teoria do jornalismo público.

Os diretores participam constantemente de viagens nacionais e internacionais, falsamente apregoando a teoria do jornalismo público que, na Radiobrás, só serve para engordar alguns bolsos com as diárias do dinheiro público. Há diretores que sequer moram em Brasília e têm suas passagens e diárias bancadas pela empresa. Os abusos começaram a chamar a atenção inclusive do Tribunal de Contas da União, que já exigiu explicações sobre vários contratos de terceirização de serviços para os quais a empresa está altamente capacidade a executar. Aliás, serviços que são a própria razão de existir da Radiobrás. É o caso, por exemplo, da empresa privada contratada para fazer o tal do programa “Café da Manhã com o Presidente”. O Tribunal de Contas da União mandou anular o contrato. Se a Radiobrás tem cinco emissoras de rádio, centenas de competentes profissionais da área, não seriam eles competentes para fazer o programa? Tanto é que, após a imposição do Tribunal de Contas, a empresa saiu e o tal programa continua funcionando.

Aliás, terceirização está virando uma pratica injustificável na empresa. Contratação de mão-de-obra, aluguel de equipamentos, tudo é motivo para um “contratinho”. Até vídeos institucionais a empresa paga para fazer, embora tenha duas emissoras de televisão. O que ninguém entende é por que a empresa já gastou seis milhões de reais na compra de equipamentos para serem usadas na TV Brasil, uma TV que será criada para divulgar o Brasil no exterior e que sequer tem data para entrar no ar.

A mais recente e estranha atitude da diretoria da empresa foi anunciar publicamente, através da imprensa e de editais, a realização de um concurso público para a contratação de 34 profissionais. No entanto, a diretoria anunciou internamente que são mais de duzentas vagas e que o concurso é aberto também aos funcionários contratados por FC, isto é, sem concurso, que é a totalidade dos que foram trazidos pela nova diretoria. Isso mostra claramente que se encontrou a forma de legalizar a contratação dos protegidos. O que não se pode garantir é a lisura e a seriedade desse concurso, que já começou levando à opinião pública informações deliberadamente incorretas com relação ao número de vagas. E perguntam eles se a Radiobrás está a ressuscitar a prática dos concursos de carta marcada.

Assim, Sr. Presidente, por entendermos que a Radiobrás é uma empresa pública gerida com recursos públicos, que deve fazer um jornalismo voltado para os interesses da sociedade e não para os medíocres interesses particulares dos amiguinhos ou da corriola do Poder, apresentamos um Requerimento de Informações para que o Ministro Luiz Gushiken preste informações a esta Casa e à sociedade sobre qual é a política de comunicação da Radiobrás. É inadmissível que, numa empresa pública, a permanência ou não de um profissional nas sórdidas listinhas de demitidos estejam relacionadas não à competência, não à vitalidade e à capacidade de trabalho, mas às amizades das corriolas do Palácio, do Senado ou da Câmara Federal. Isso nós não podemos aceitar.

É só, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/03/2005 - Página 6930