Discurso durante a 32ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Homenagem de pesar pelo falecimento de Sua Santidade o Papa João Paulo II.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem de pesar pelo falecimento de Sua Santidade o Papa João Paulo II.
Aparteantes
Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 05/04/2005 - Página 7362
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, JOÃO PAULO II, PAPA, IGREJA CATOLICA, ELOGIO, ATUAÇÃO, DEFESA, PAZ, JUSTIÇA SOCIAL, LIDERANÇA, AMBITO INTERNACIONAL.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Para encaminhar a votação. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o mundo inteiro reverencia Sua Santidade o Papa João Paulo II. E é interessante notar que os sentimentos de pesar da humanidade vão muito além da Igreja Católica e das igrejas cristãs. Cultos os mais diferentes, adversários os mais radicais se reúnem numa espécie de abraço fraternal universal em homenagem ao Papa João Paulo II. É que ele, nesses longos 26, quase 27 anos de pontificado, foi bem mais que o representante maior da Igreja Católica. Ele cumpriu suas missões, sim.

Foi um período difícil. A humanidade, a modernidade e a falta de sentimento muitas vezes fazem com que a missão de quem determina o cumprimento da verdade, da justiça e do amor não seja uma missão fácil. Dentro da própria Igreja Católica encontrou problemas, dificuldades, divergências que teve de decidir. E decidiu como lhe dizia seu sentimento. Mas, quando se trata da figura humanitária, do homem do mundo que foi o Papa, quando se trata do cidadão na defesa dos grandes princípios da humanidade, aí Sua Santidade conseguiu unir todos, representar o sentimento de todos; foi muitas vezes a voz daqueles que não têm voz, daqueles pelos quais nunca ninguém falou.

A imprensa referiu-se ao Papa como conservador. Não consigo ver João Paulo II desta forma. Se por conservador quer-se indicar aquele que não se afastou dos princípios tradicionais da Igreja, diria que sim, que Sua Santidade foi conservador. Mas, se quisermos empregar a palavra com o sentido costumeiro, de alguém acomodado, despreocupado com o conjunto do universo, este Papa jamais foi conservador. João Paulo II foi humanitário, um homem voltado para todos e, de um modo especial, para os que mais necessitavam.

Sua Santidade, ainda que morando num palácio em meio a imponência e o lustro da pompa e das pessoas que o cercam, olhava além: para todos os que dele necessitavam. Por isso, se disse e se repetiu que Sua Santidade foi a voz daqueles que não tinham voz, daqueles que na miséria, na fome, na injustiça se quedavam pelo mundo, desamparados. Lá, no interior da África, da Ásia ou do Brasil foi a voz que falou alto. João Paulo II fez questão de viajar, de percorrer o mundo várias vezes; quatro vezes, esteve no Brasil, cinco, no México, não sei quantas, na África. Por todos os cantos do mundo, em países não católicos e até contrários ao espírito cristão, como países comunistas e otomanos, Sua Santidade levou a mensagem de paz, de compreensão, de amor, de crença em Deus e que, em nome Dele, todos devem buscar o bem, a confraternização. Por isso, as manifestações vêm de todos os cantos.

Eu assistia na televisão a manifestação do representante da Igreja Israelita em São Paulo, e ele, chorando, dizia que o Papa tinha sido um grande amigo dos judeus, que tinha mostrado carinho, afeto pelos judeus, não só pedindo perdão pela Igreja Católica pelo que ela não fez, mas também pelo que ela fez de menos em defesa dos judeus à época de Hitler. De outro lado, os palestinos agradeciam ao Papa por ter chegado no meio deles, na hora mais difícil, para clamar a paz, o entendimento entre todos os povos e defender os direitos daquela nação.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Permite-me V. Exª um pequeno aparte? (Pausa)

V. Exª não imagina a minha alegria, como católico, no dia em que vi o Papa pedir desculpas aos judeus, entre tantas outras atitudes. A humildade desse homem era imensa, Senador Pedro Simon. Era a humildade ao lado da grandeza. Realmente, foi uma personalidade inigualável.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Ele esteve na Argentina, certa vez, quando aquele País estava à beira de uma guerra com o Chile em razão do Canal de Beagle. A interferência dele impediu uma dolorosa guerra entre países vizinhos e irmãos.

A grande bandeira do Papa era a defesa dos pobres, dos mais humildes. Na Assembléia das Nações Unidas, onde foi figura máxima, aplaudida de pé, João Paulo II defendeu a tese de que Deus distribuiu as riquezas no mundo para que todos pudessem se locupletar e viver com dignidade, mas que havia uma hipoteca social sobre essas riquezas porque cada um de nós é responsável tanto quanto possível pela sorte de seu irmão. Sua Santidade dizia não entender como algumas nações, riquíssimas, gastassem quantias fabulosas se preparando para guerra. Elas poderiam constituir um fundo para resolver o problema da fome com uma parcela dos recursos gastos com a guerra pelas grandes nações.

O Presidente Lula lembrou essa proposta de Sua Santidade, ano passado, quando esteve na ONU. Lula também defendeu a importância de seguir aquele conselho, para que nações ricas constituíssem realmente um fundo, para que, com ele, a ONU pudesse equacionar o problema mundial da fome.

Normalmente os papas não saem de Roma. Este, contudo, quase não parava em Roma. Percorreu o mundo várias vezes.

É impressionante. Até hoje eu tenho diante de mim a alegria e a emoção do povo de Porto Alegre com a figura do Papa, ainda jovem, radioso, quando aceitou a cuia de chimarrão e o tomou. Colocaram pala nos ombros de Sua Santidade e toda a população do Rio Grande do Sul começou a gritar: “ucho, ucho, ucho, o Papa é gaúcho!” E ele repetiu, cantando junto: “o Papa é gaúcho!” Eu não me lembro de ter visto alegria, felicidade e emoção tão grande quanto aquela.

O importante é que ele era um Papa atlético, acostumado a praticar esporte, a natação. Era um Papa de físico avantajado. As viagens não o perturbavam. Mas, depois daqueles tiros, sua saúde ficou abalada e ele passou a sofrer cirurgia após cirurgia. Os médicos e os cardeais o aconselharam a descansar, a não mais viajar e exercer com serenidade a sua atividade em Roma. Sua Santidade não aceitou essa sugestão. De cadeiras de rodas, de muletas, rastejando-se às vezes, continuou a andar mundo afora.

Evidentemente, com o dom do Espírito Santo, o Papa aprendeu dezenas de idiomas; assim como desceu o Espírito Santo sobre os apóstolos, logo após a ascensão de Jesus, parece que também a Sua Santidade foi dado o dom de falar várias línguas, porque com todos se comunicava em seus respectivos idiomas.

Tive a emoção de estar junto ao Papa ou próximo de Sua Santidade, especialmente quando fui Governador do Rio Grande do Sul. Eu e o Arcebispo de Porto Alegre, D. Cláudio Colling, fomos ao Vaticano porque Sua Santidade nos havia prometido entregar uma estátua belíssima de Nossa Senhora, Mãe de Deus, que hoje está em Porto Alegre, em um Santuário construído especialmente para ela. Tivemos a oportunidade de estar ao lado do Papa, que nos lembrou com alegria os momentos em que esteve no Rio Grande do Sul e em todo o Brasil. Sua Santidade disse que o Brasil era um país de grande futuro e que era a maior Nação católica do mundo, mas que devia praticar realmente a bondade e a justiça. Falando Sua Santidade, o seu olhar não era deste mundo; os seus olhos fitavam, cravavam na pessoa com quem falava, e nós ficávamos com uma emoção imensa. Nunca me esqueço do seu aperto de mão; eu senti como que uma eletricidade, como que uma força que me era transmitida naquele momento. E a sua palavra vinha do fundo, e continha uma meiguice e uma bondade muito grandes. O Embaixador que estava conosco percebeu o que eu estava sentindo e, como S. Exª já tinha estado várias vezes com o Papa, disse: “Olha, Governador, o que o senhor está sentindo, todas as pessoas que vêm aqui sentem, a sensação de ser um homem dominado pelos dons do Espírito Santo. É que, na verdade, é uma benção estar com Sua Santidade”.

E o Papa João Paulo II se manteve com sua fé até o fim; não quis ir para o hospital, permanecendo nos seus aposentos. E que cena dramática quando se abriram as janelas do seu quarto, Sua Santidade ali, com os microfones à sua frente, abençoando o povo, sem que sua voz saísse! Viu-se no rosto de Sua Santidade a vontade, o que queria dizer e não conseguia, e as lágrimas nos seus olhos. Aquele povo, aquela imensidão, quando as cortinas foram fechadas, aplaudia e chorava ao mesmo tempo.

Sim, morreu um grande Papa. Tenho para mim que, nesse século que passou - um século triste, muito triste -, em que houve duas Guerras Mundiais que praticamente traumatizaram o mundo inteiro, o Papa tenha sido a grande figura. Foi um século de grandes Líderes, como Winston Churchill e Roosevelt; mas acho difícil que um nome tenha atingido, durante 26 anos ininterruptamente, a coragem e a bravura de João Paulo II.

Nós, católicos, ficamos a meditar e a rezar. Que fórmula estranha esta de a nossa Igreja escolher o seu chefe: reúnem-se os cardeais reservadamente na Capela Cistina e ficam lá fechados. A grande esperança de todos é que Deus os ilumine e fale por intermédio deles, escolhendo um nome que esteja à altura da hora que o mundo está vivendo. Hoje, mais do que ontem, o mundo precisa disso; talvez nunca como agora o mundo precise disso. Vivemos um tempo em que a humanidade tem referências tão pequenas, tristes, que deixam pouca esperança. Para onde vamos? O que acontecerá com esta globalização, que imaginávamos que equacionaria os problemas das injustiças e da fome? Pelo contrário. Que doutrina haveremos de seguir? Queira Deus que esses cardeais escolham um homem que, com as Suas bênçãos, possa ocupar o espaço de Sua Santidade, o Papa João Paulo II.

Como o mundo inteiro, nós, membros do Congresso Nacional, assim como todo o Brasil, trazemos a nossa mensagem de tristeza, sim, mas também de paz, de muito amor e de muita confiança porque Sua Santidade deixou seu exemplo, que haverá de ser seguido pelo seu povo.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/04/2005 - Página 7362