Discurso durante a 34ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Crítica ao decreto que criou a décima primeira Brigada de Infantaria Leve - Garantia da Lei e da Ordem - (BIL-GLO).

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FORÇAS ARMADAS.:
  • Crítica ao decreto que criou a décima primeira Brigada de Infantaria Leve - Garantia da Lei e da Ordem - (BIL-GLO).
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 07/04/2005 - Página 7790
Assunto
Outros > FORÇAS ARMADAS.
Indexação
  • COMENTARIO, CRIAÇÃO, BRIGADA, EXERCITO, SEDE, MUNICIPIO, CAMPINAS (SP), ESTADO DE SÃO PAULO (SP), OBJETIVO, INTERVENÇÃO, GARANTIA, ORDEM PUBLICA, COMBATE, TRAFICO, DROGA, FAVELA, REBELIÃO, DISTURBIOS CIVIS, DESOCUPAÇÃO, TERRAS, APREENSÃO, JURISTA, ILEGALIDADE, INCONSTITUCIONALIDADE, QUESTIONAMENTO, JUSTIFICAÇÃO, EMERGENCIA, ATUAÇÃO, FORÇAS ARMADAS, SERVIÇO INTERNO, RISCOS, AUTORITARISMO, SEMELHANÇA, REGIME MILITAR.
  • IMPORTANCIA, PRESERVAÇÃO, PLENITUDE DEMOCRATICA, COMENTARIO, NOTICIARIO, IMPRENSA, EXPECTATIVA, CONVOCAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA DEFESA, EXERCITO, ESCLARECIMENTOS, SENADO.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com base numa lei da qual só tomei conhecimento ontem, a Lei nº 117, de setembro do ano passado, o Governo do Presidente Lula criou a 11ª Brigada de Infantaria Leve - Garantia da Lei e da Ordem. Com sede em Campinas, essa brigada tem 13 unidades espalhadas por todo o interior paulista.

Alcançou muita repercussão essa decisão do Presidente Lula de criar uma unidade por meio da qual o Exército poderá intervir para garantir a lei e a ordem.

As tropas, segundo o seu comandante, mudarão o seu fito, porque serão treinadas para proteger a população. Até hoje eram treinadas para “matar o inimigo”, já que seriam unidades do Exército para a defesa do território nacional.

São sete mil homens que estão sendo treinados e equipados com cassetetes elétricos, bombas de gás, spray de pimenta indiana, balas de borracha e cães, além dos velhos urutus e de outros blindados sobre rodas. O objetivo é tomar as favelas do narcotráfico, conter rebeliões, desocupar terras, coibir manifestações populares ou distúrbios civis.

A assessoria do comandante do Exército diz que não há ilegalidade na medida, porque, na prática, ela vem sendo cumprida pelo Exército em missões como a do Pará, depois do assassinato da missionária Dorothy.

A grande verdade é que os juristas estão tremendamente preocupados com esse decreto. Segundo os juristas Dalmo Dallari e Fábio Konder Comparato, a intervenção nos distúrbios sociais pode se transformar num desvirtuamento da Constituição, e eles alertam ainda para o risco de as chamadas emergências para uso do Exército não serem bem justificadas.

Pela Constituição, o Exército brasileiro só pode ser usado internamente em casos de absoluta emergência, com elementos de fato comprovados, para, segundo Dallari, não acontecer como o que houve com o Bush, que determinou o uso do exército americano na invasão do Iraque. Por isso, “é preciso definir muito bem o que são essas emergências para o Exército atuar”, diz Dallari. Segundo o jurista, é preciso também que seja feito um acompanhamento minucioso sobre a formação e o preparo psicológico desses soldados.

A 11ª Brigada de Infantaria Leve - Garantia da Lei e da Ordem tem sete mil soldados que começaram a ser treinados na sede, em Campinas, há menos de um mês. Serão treinados em equipamentos com armas, cassetetes elétricos e bombas de gás lacrimogêneo, além de terem blindados sobre rodas, como Urutus e Cascavéis.

Para Comparato, o uso interno das Forças Armadas só pode ser efetivado quando houver uma exaustão das corporações policiais, principalmente em caso de paralisações das forças policiais ou de comprovado descontrole. “Será sempre uma situação de exceção, o que precisa ser comprovado pelo Governo. No caso dos protestos sociais, não se pode usar o Exército. Seria voltar ao regime militar”, diz Comparato.

Reparem, Srªs e Srs. Senadores, a delicadeza da matéria. Lei complementar, decreto-lei. As melhores intenções em casos excepcionais.

Várias vezes, aqui do Congresso, fazemos apelos no sentido de que o Exército intervenha, como no caso do Rio de Janeiro em tempos passados. O que assusta os juristas e a nós todos é, de repente, saber que há uma força de sete mil militares com a determinação de poder intervir em qualquer lugar do Brasil por ordem do Presidente da República.

Quando a Revolução de 64 começou seu trabalho, disseram que ela ali estava para garantir a lei e a ordem. Durante os vinte anos em que esteve no poder, esteve para garantir a lei a e a ordem. E em nome da lei e da ordem houve as intervenções, as mortes, a violência e tudo o mais.

Vivemos em um regime de plenitude democrática; vivemos em um regime de normalidade democrática. É verdade, não há como deixar de reconhecer, que vivemos situações quase dramáticas, como no Rio de Janeiro. A falta de segurança, a violência, a radicalização são quase que insuportáveis, mas mesmo assim, deixando a generalidade, a criação de uma força especial do Exército para atuar a qualquer momento, por determinação do Presidente da República... Confio no Presidente Lula e sei que se isso acontecer será em caso de extrema urgência, mas a lei é genérica, é permanente, não é para hoje nem para este Presidente, a lei é para ficar e é para isso que Comparato e Dallari, além de vários juristas e jornalistas em seus editoriais, chamam a atenção.

Um jornal de Porto Alegre fala disso: “Exército cria Brigada para Distúrbios Sociais. Jurista diz que seria a volta ao Regime Militar”. Reparem que a preocupação existe e é real.

Não sei se não será o caso de a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania convidar o Ministro da Defesa para nos dar algumas explicações e deixar mais clara essa situação.

A lei foi votada, em tese, em setembro do ano passado, no período das eleições municipais e eu não a acompanhei. Lamento reconhecer, mas não estive presente, nem me lembro de como foi votada essa lei.

Baseados nela, agora saem o decreto do Senhor Presidente da República e essas notícias da preparação de tropas, de sete mil homens, em Campinas, para uma guerra interna, para entrar nos conflitos sociais. E fica-se a perguntar: que tipo de conflito social? Será que é conflito social uma greve de trabalhadores? Será que é conflito social aquilo que até ontem era conflito social? Aquilo que o PT, ao longo de 20 anos, dizia que eram conflitos sociais, que deviam ser respeitados democraticamente?

São essas interrogações que deixam os juristas profundamente preocupados e que me fazem vir a esta tribuna. Foram muitas as pessoas que me procuraram; foram muitos os juristas que me procuraram, estranhando que eu não tivesse condições de esclarecer. A lei, eu não a conheci, mas me pedem que eu solicite esses esclarecimentos para que ela fique mais clara, para que esse decreto fique mais evidente e para que a Casa se aprofunde sobre a matéria.

Ouço o aparte do Senador Eduardo Suplicy.

O SR. PRESIDENTE (Tião Viana. Bloco/PT - AC) - Senador Eduardo Suplicy, o Senador Pedro Simon dispõe de mais dois minutos.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Pedro Simon, a sua preocupação tem a maior validade. Todos estamos preocupados com acontecimentos como o massacre de 30 pessoas na Baixada Fluminense, Rio de Janeiro, a respeito de como será possível evitar que continuem a acontecer, quase que diariamente, semanalmente, eventos tão graves e de enorme repercussão nacional e internacional. Será que a melhor solução é o uso das Forças Armadas? Uma coisa é elas estarem atentas para fornecer suporte em algum momento, mas a ação de fato deve ser feita pelas Polícias Civil, Militar e Federal, que, conforme estabelecido na Constituição, são os órgãos que devem estar atentos para isso. Então, é importantíssimo que venhamos a esclarecer inteiramente o assunto. Talvez um debate na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania fosse muito oportuno, seguindo a sua sugestão.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Eu acredito. V. Exª fala em brigada militar e em Polícia Federal porque o Exército tem outra destinação. Chamarmos o Exército em casos especiais é uma coisa, mas ele já ter uma brigada preparada para fazer a intervenção é uma modificação completa, é voltar ao que era durante 1964.

Não vamos pensar: “Não, mas o Lula eu conheço, o Lula eu sei que não vai fazer isso”. O Lula é hoje; amanhã, não sei quem será. Então, com essa mudança que está acontecendo, de preparação do Exército para intervir nos conflitos internos, estou muito preocupado. Sinceramente, o Dallari tem muita razão em levantar essa pergunta.

Concordo com V. Exª que será muito interessante ouvirmos as autoridades, trazendo à Comissão o Ministro da Defesa Civil e o Comandante do Exército para debaterem essa matéria.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/04/2005 - Página 7790