Discurso durante a 34ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca do debate sobre o nepotismo.

Autor
Heloísa Helena (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • Considerações acerca do debate sobre o nepotismo.
Publicação
Publicação no DSF de 07/04/2005 - Página 7792
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • IMPORTANCIA, DEBATE, NEPOTISMO, LOBBY, SOCIEDADE CIVIL, AUMENTO, CONTROLE, LEGISLATIVO, BUSCA, JUSTIÇA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA.
  • COMENTARIO, CONTRATAÇÃO, PARENTE, GABINETE, GERALDO MESQUITA JUNIOR, SENADOR, DEFESA, IDONEIDADE, ETICA, DIFERENÇA, CORRUPÇÃO, MEMBROS, CLASSE POLITICA, ELOGIO, DECISÃO, DEMISSÃO, PROTESTO, PERSEGUIÇÃO, NATUREZA POLITICA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE (PSOL).
  • DEBATE, REFORMA POLITICA, DEFESA, PROIBIÇÃO, PARENTE, SUPLENCIA, MANDATO ELETIVO, REELEIÇÃO, ANUNCIO, APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o debate sobre o nepotismo é muito interessante, muito.

Senador Geraldo Mesquita, só mesmo V. Exª para fazer eu vir até o Plenário hoje, porque estou com dificuldade para falar, já que fiz uma cirurgia na gengiva.

Trata-se, como já disse, de um debate muito interessante, pelo qual a sociedade, de uma forma geral, estabelece mecanismos de controle e tenta pressionar o Senado e o Congresso Nacional no sentido de alterar determinada legislação, pois tem todo o direito de achar absolutamente injustas atitudes dessa natureza. Até porque há tanto político sem-vergonha neste País; são tantos os políticos cínicos e dissimulados; são tantos os políticos que fazem de conta que são do alto clero, quando, na verdade, têm a estatura moral da pior ralé do baixo clero; são muitos os que enganam bem: fazem pose, saem por aí afora, são recebidos nos salões da high society como se pessoas sérias efetivamente fossem - e não o são. Então, isso leva a uma desqualificação da classe política por parte da população de uma forma em geral.

Às vezes, é muito difícil - e sei o quanto é difícil - deixar que um talento, uma inteligência fique de fora de uma estrutura do seu gabinete ou de um aparato que se coordena politicamente simplesmente pelo elo do parentesco. É muito difícil. Para mim, especialmente, sempre foi algo difícil - assim procedo porque é importante perante minha própria consciência. Eu, por exemplo, tenho um irmão, que é médico. Uma pessoa extremamente inteligente, um homem brilhante; aliás, foi ele quem me criou, praticamente, Senador Geraldo Mesquita. Meu pai morreu quando eu tinha três meses de vida; meu irmão mais velho foi covardemente assassinado. Então, sobrou para esse meu irmão cuidar de mim, filha de uma família pobre, com uma mãe pobre - somos nós dois em casa. E, para mim, é sempre doloroso ver a situação do meu irmão. Ele é médico no interior de Alagoas e vive perambulando pelos hospitais, Senador Papaléo Paes, dando plantões em Quipapá e em outras localidades, também em Pernambuco. Certa vez, ele vinha tão cansado, tão exausto de um plantão para iniciar um outro que virou o carro e quase perdeu o braço. Ainda hoje ele não recuperou por inteiro os movimentos do braço. É evidente que, às vezes, eu fico pensando: “Deus do céu, uma pessoa brilhante como ele, certamente o Senado ficaria melhor se ele aqui estivesse e não eu”. Por circunstância do destino, o povo escolheu a mim, pois ele nunca ocupou cargo público. E nós sempre discutimos muito sobre isso.

Mas, às vezes, a utilização de talentos de uma família, como aconteceu com V. Exª, tem uma repercussão pública gigantesca, tendo em vista a transparência como V. Exª tratou o caso. É claro que V. Exª não contratou um vigarista articulado com o dinheiro podre do narcotráfico como Waldomiro Diniz para servir ao seu Gabinete, nem V. Exª está, por exemplo, acobertando um delinqüente fiscal chamado Henrique Meirelles. Não é esse o caso. Por isso, hoje, fiquei feliz quando, ao mesmo tempo, V. Exª me comunicou sua decisão. Não que V. Exª precise se explicar do ponto de vista ético, V. Exª não precisa disso - não se pode ser mais ou menos ético: ou se é honesto, ou se é safado; ou se é ético, ou se é vigarista. Mas é evidente que, nesta Casa, ninguém, sobre esses tapetes azuis que escondem muita podridão, jamais poderia questionar V. Exª eticamente. Contudo, conforme V. Exª me comunicou hoje de manhã, até para evitar que alguma coisa respingue no P-Sol - porque há uma atitude de truculência e de intolerância contra V. Exª e contra o nosso Partido também -, V. Exª, num gesto de generosidade política, resolveu, para evitar qualquer fala sem-vergonha, pôr um fim no problema do gabinete. Portanto, laços de parentesco não haverá no gabinete de V. Exª.

E por que isso é muito interessante? Eu até disse que acabou sendo bom esse debate estar na pauta porque, se V. Exª fosse uma pessoa cínica e dissimulada, tinha acordado rapidamente aqui.

V. Exª já imaginou, Senador Tião Viana, se eu tivesse uma prima brilhante, e pedisse ao Senador Geraldo Mesquita para que ela ficasse no gabinete de S. Exª! Quem saberia? Ou então, se eu tivesse marido desempregado, eu poderia pedir emprego para ele no Ministério da Agricultura, se eu fosse da corriola do Palácio do Planalto. Resolveria os meus problemas familiares: bastaria pedir para me empregar lá, do outro lado, ou em um gabinete aqui! Porque a coisa mais fácil é ser cínico e dizer: “Dá um jeitinho para mim”. O outro dá esse jeitinho e a gente troca favores sem que ninguém descubra. Como já acontece aqui e lá também.

Mas esse debate foi importante. Agradeço, de coração, a generosidade de V. Exª. Inclusive V. Exª disse que, se fosse para criar problemas para o P-SOL V. Exª sairia do Partido. V. Exª, por livre e espontânea vontade e generosidade política, resolveu o problema do seu gabinete para que não haja ninguém em seu gabinete com laços de parentesco, evitando, assim, que queiram fazer respingar na gente a lama da pocilga em que eles chafurdam. Agradeço V. Exª de coração. Agora vão ter que inventar uma outra coisa! Daqui a pouco - Ave Maria! -, às vezes, fico imaginando... Porque o que esse povo é capaz de fazer! Fico impressionada! De repente, ao assistir o Jornal Nacional, está lá. Só falta dizer que tem, não é? Porque quando o cabra é podre ele tenta jogar lama no outro para que o outro fique podre também, porque ninguém se contenta em ver gente honesta por trás. É um trauma para político vigarista ver uma pessoa honesta.

Mas acabou sendo bom. V. Exª tem razão. Não havia ilegalidade nenhuma no gabinete de V. Exª. Mas V. Exª reconheceu, com generosidade, com sensibilidade, que não terá mais ninguém com laços de parentesco em seu gabinete para evitar que se respingue no P-SOL. E, aí, nós aproveitaremos também este momento em que se faz um debate de faz-de-conta de reforma política para introduzir outras coisas que são extremamente importantes. É realmente algo vexatório colocar filho, irmão ou aderente em uma primeira suplência de Senado. Isso tem que acabar. Do mesmo jeito, fazer do negócio público patrimônio, o que também é a coisa mais fácil do mundo. O cara é prefeito. Aí, lá na lei está dizendo que a esposa dele não pode ser candidata a prefeita para substituí-lo, mas o sobrinho pode. Aí, ele pega o sobrinho e coloca lá para continuar com o “patrimonialismo” da prefeitura, ou seja, transformar uma prefeitura ou um governo do Estado ou um mandato num negócio de família. Então, é extremamente importante que isso acabe também.

Agradeço a generosidade de V. Exª em evitar que se respingue politicamente em nós, contra o P-SOL. O essencial é isto: já que estamos discutindo reforma política, que discutamos o mecanismo para impedir a apropriação em todos os laços de parentesco e não apenas como está na proposta que está tramitando na Câmara. E começaremos a coletar assinaturas para a nossa proposta de emenda constitucional, estendendo esse processo para todos os Poderes - Legislativo, Executivo e Judiciário -, a fim de estabelecermos um mecanismo muito mais ferrenho contra a apropriação familiar de Prefeituras, Governos Estaduais e Governo Federal. Portanto, isso não poderá ocorrer mais. Se tem um sobrinho que não pode ser contratado do gabinete, o sobrinho não pode ser prefeito no lugar de um outro prefeito, ou virar suplente de Senador. Isso também não pode acontecer.

Então, fico muita agradecida; extremamente agradecida. V. Exª sabe da estima e da consideração que tenho por V. Exª. Agradeço muito a sua generosidade política, porque não é justo que acabe realmente respingando no P-SOL, em seus Parlamentares e em seus militantes um gesto, que, todos sabemos, nada de má-fé ou de apropriação pública para resolver problema familiar teve, nada disso aconteceu. Portanto, apenas para deixar registrado e para informar que estamos iniciando a coleta de assinaturas para a nossa proposta de emenda constitucional, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/04/2005 - Página 7792