Discurso durante a 35ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o "Dia Mundial da Saúde", especialmente o Dia da Saúde Materno-Infantil.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Considerações sobre o "Dia Mundial da Saúde", especialmente o Dia da Saúde Materno-Infantil.
Publicação
Publicação no DSF de 08/04/2005 - Página 8057
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, SAUDE, DEBATE, PRIORIDADE, MULHER, CRIANÇA, REGISTRO, DADOS, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAUDE (OMS), MORTE, GRAVIDEZ, PARTO, MORTALIDADE INFANTIL, ANALISE, DESIGUALDADE REGIONAL, FALTA, EQUIPAMENTOS, PREVENÇÃO, DOENÇA.
  • REGISTRO, HISTORIA, PROGRAMA, GOVERNO BRASILEIRO, ATENDIMENTO, SAUDE, MULHER, DETALHAMENTO, ATUAÇÃO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), ATUALIDADE, NECESSIDADE, CUMPRIMENTO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, DESTINAÇÃO, RECURSOS, SAUDE PUBLICA.
  • DIVERGENCIA, ORADOR, DIRETRIZ, MINISTERIO DA SAUDE (MS), INCLUSÃO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), ASSISTENCIA, REPRODUÇÃO HUMANA, MOTIVO, SUPERIORIDADE, GASTOS PUBLICOS, APOIO, PROGRAMA, PLANEJAMENTO FAMILIAR.
  • DIVERGENCIA, ATUAÇÃO, SECRETARIA ESPECIAL, POLITICA, MULHER, CRIAÇÃO, COMISSÃO, REVISÃO, LEGISLAÇÃO, ABORTO, DEFESA, DEBATE, SOCIEDADE CIVIL.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Senadora Heloísa Helena, tenho a grata satisfação de continuar o debate que foi muito bem iniciado pela nobre Senadora Ideli Salvatti, trazendo considerações sobre o Dia Mundial da Saúde, especificamente o Dia da Saúde Materno-Infantil. Hoje, obrigatoriamente, refletimos em nosso País sobre a condição de saúde da mulher, a mulher-mãe e as crianças que nascem neste País e no mundo.

A Organização Mundial de Saúde lança, coincidentemente, em seu dia de lembranças sobre a saúde materno-infantil, um boletim que informa o seguinte:

A cada ano, cerca de 530 mil mulheres morrem durante a gravidez ou parto; mais de 3 milhões de crianças nascem mortas; mais de 4 milhões de recém-nascidos morrem nas primeiras semanas de vida; cerca de 10,6 milhões de crianças morrem antes dos cinco anos.

A Organização Mundial de Saúde estima que, de um total de 136 milhões de nascimentos por ano, em todo o planeta, especialmente nos países em desenvolvimento, menos de dois terços das mulheres recebem assistência de profissionais capacitados.

Cerca de 90% dos óbitos de menores de 5 anos podem ser atribuídos a seis tipos de doenças: infecções neonatais agudas; infecções das vias respiratórias inferiores, principalmente pneumonia; diarréia; malária; sarampo e o vírus da síndrome da imunodeficiência adquirida.

É uma situação que traz sofrimento e tristeza a toda a comunidade de profissionais de saúde pública e a todos aqueles que de fato procuram construir um modelo de saúde em seus países. Mas, quando olhamos os dados sobre mães adolescentes, ficamos ainda mais preocupados. Mulheres de 15 a 17 anos que tiveram filhos, em 2003: Região Norte, 35 mil; Região Nordeste, a região de V. Exª, 128.376; Região Sudeste, 95 mil; Região Sul, 50 mil; Região Centro-Oeste, 24.666.

Quando verificamos, associada ao nascimento, a taxa de mortalidade infantil, o sofrimento também é muito grande. A média nacional é de 26 crianças morrendo em cada mil que nascem no País de uma maneira geral. Ao se observar os dados regionais, constata-se o seguinte: Região Norte, a minha Região, 26,1%; Região Nordeste, 35,5%; Região Sudeste, 18,7%; Região Sul, 16,9%; e Região Centro-Oeste, 19,2%. Então, as Regiões Nordeste e Norte padecem efetivamente pelo drama das mortalidades infantil e materna.

Quando observamos os dados de proteção à mulher, segundo o Boletim sobre Saúde Reprodutiva, janeiro de 2005, preocupamo-nos mais ainda: 81% dos Municípios brasileiros não possuem mamógrafo; 25% das mulheres a partir de 49 anos não contam com a cobertura da mamografia; 8,1% dos Municípios brasileiros oferecem cobertura para 75% das mulheres em busca de tratamento para o câncer da mama; 10 mil casos de câncer da mama são registrados no Brasil por ano; mais de 9 mil casos de câncer de colo de útero são registrados no Brasil todos os anos.

É como se tivéssemos aquele choque de realidade. Quando cai qualquer avião neste País, a sociedade fica muito refletida e preocupada, mas não consideramos que aqui há nove mil mulheres morrendo. Comparativamente, seriam cinqüenta Boeing 737, carregados de mulheres, caindo todos os anos em nosso País. Todas essas razões são motivadas por doenças evitáveis, como é o caso, de modo distinto, do câncer de colo de útero, uma doença causada por um vírus chamado HPV, Papiloma Virus Humano, que pode ser perfeitamente evitado com diagnóstico correto, orientação sexual e tratamento para aqueles que estejam infectados. Então, trata-se de uma situação que traz tristeza, a responsabilidade de uma reflexão crítica e intervenção melhor por parte do Estado.

Temos o dever de fazer uma análise sobre a evolução do debate das ações acerca da saúde materno-infantil no Brasil. É justo que se faça a leitura, como reconhecimento a governos passados e ao atual, pelos esforços que têm sido feitos.

Os programas materno-infantis elaborados até a década de 70 focavam a mulher sob uma perspectiva reducionista, revelando apenas sua especificidade biológica e seu papel de mãe-doméstica. Não havia qualquer interação com outros programas sociais do governo. Isso se traduzia no baixo impacto sobre as indicações de saúde da mulher. A partir daí, com forte influência do movimento feminista, o conceito de saúde da mulher foi adquirindo significado próprio.

Em 1977, o Ministério da Saúde lançou o Programa de Saúde Materno-Infantil, com foco na gravidez de alto risco.

A década de 80 introduz a discussão sobre “saúde reprodutiva”. Em 1984, o Ministério da Saúde elaborou o Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher, que incorporou a perspectiva de atenção à mulher em todas as fases de sua vida, considerando sua individualidade, suas necessidades e seus direitos, marcando, sobretudo, uma ruptura conceitual com os princípios norteadores da política de saúde das mulheres até então em vigor. Incluía ações educativas, preventivas, de diagnóstico, tratamento e recuperação, englobando: assistência clínico-ginecológica; assistência pré-natal, ao parto e puerpério; atenção ao planejamento familiar; doenças sexualmente transmissíveis; câncer de colo de útero e de mama; e climatério, além de outras necessidades identificadas a partir do perfil populacional das mulheres. Sua cobertura deveria atingir a população feminina acima de 10 anos.

Em 1994, a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, realizada no Cairo, introduziu avanços no debate sobre a saúde da mulher, ao dar prioridade, dentre outras questões, aos serviços de saúde materno-infantil e aos direitos reprodutivos, com recomendação explícita de que os serviços de saúde reprodutiva estivessem vinculados à atenção básica de saúde.

A Quarta Conferência Mundial Sobre a Mulher, realizada em 1995 em Beijing, também enfatizou políticas de saúde voltadas especificamente para as mulheres.

A partir de 1998, o Governo brasileiro define como prioridade de ações a saúde da mulher, enfatizando-se a saúde reprodutiva e, em particular, as ações para redução da mortalidade materna (pré-natal, assistência ao parto e anticoncepção).

Em 2004, o Governo do Presidente Lula lançou o Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal, firmado entre a União, Estados, Municípios e sociedade civil, que consiste na execução de um conjunto de ações articuladas pelas diferentes esferas de governo para qualificação da atenção obstétrica e neonatal. O objetivo é reduzir em 15%, até o fim de 2006, os atuais índices de mortalidade materna e neonatal no País, e em 75% até 2015.

Uma das ações já implementadas pelo Ministério da Saúde foi a inclusão das urgências obstétricas e pediátricas no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência - Samu. São ambulâncias que socorrem pessoas, Brasil afora; já foi registrado o atendimento de mais de 30 milhões de pessoas no País. Lançado nacionalmente pelo Ministério da Saúde, no ano passado, o Samu opera com unidades móveis, que prestam assistência pré-hospitalar a pessoas que precisam de pronto-socorro.

Ainda em 2004, o Ministério da Saúde elaborou um plano de ação para operacionalização do Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher, ao longo do período de 2004 a 2007. A elaboração do plano teve por base o documento “Princípios e diretrizes para a atenção integral à saúde da mulher”, que serviu de subsídio à elaboração do Plano Plurianual.

No documento, o Ministério ressalta que, para que os objetivos sejam alcançados, é necessário, entre outros compromissos, o cumprimento da Emenda Constitucional nº 29, que garante a alocação de recursos. Vale lembrar a crise dos Municípios brasileiros; se fizermos uma reflexão, veremos que não se cumpre a destinação dos recursos. Os Municípios não estão cumprindo os 15%, que devem ser alocados à saúde; os Estados não estão cumprindo os 12%; e a União se esforça, a todo custo, para cumprir o equivalente ao exercício financeiro anterior mais a variação nominal do PIB.

Em seus objetivos gerais, o Governo se compromete a:

1- promover a melhoria das condições de vida e saúde das mulheres brasileiras, mediante a garantia de direitos legalmente constituídos e a ampliação do acesso aos meios e serviços de promoção, prevenção, assistência e recuperação da saúde, em todo o território brasileiro;

2 - contribuir para a redução da morbidade e mortalidade feminina no Brasil, especialmente por causas evitáveis, em todos os círculos de vida e nos diversos grupos populacionais, sem discriminação de qualquer espécie; e a

3 - humanizar e qualificar a atenção integral à saúde da mulher nos serviços de saúde.

O Ministério da Saúde lançou, em 22 de março de 2005, a Política Nacional de Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos, com três eixos principais de ação: a ampliação da oferta de métodos anticoncepcionais reversíveis (não-cirúrgicos); a ampliação do acesso à esterilização cirúrgica voluntária; e a introdução da reprodução humana assistida no Sistema Único de Saúde.

A isso permito-me fazer uma crítica e apresentar uma interpretação completamente diferente. O Ministério da Saúde, sabendo das causas de mortalidade, das doenças e endemias que abatem a população, lança a ampliação do acesso ao programa de reprodução humana assistida no Sistema Único de Saúde, o que considero muito, porque a introdução de proteção para a fertilização assistida às mulheres tem um custo em torno de R$15 mil, e este País não tem condições de tratar isso como prioridade. Essa é uma matéria que se baseia em lógica de política internacional de proteção à saúde. Não me vejo, de modo algum, à vontade para concordar com esse item de responsabilidade assumido pelo Ministério da Saúde; no mais, estou em absoluta concordância. A política, que prevê ações voltadas ao planejamento familiar para o período de 2005 a 2007, é uma demonstração de preocupação do Governo Federal em garantir os direitos de homens e mulheres, adultos e adolescentes, em relação à saúde sexual e reprodutiva.

Em 6 de abril, a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres instalou a Comissão Tripartite que vai rever a legislação punitiva que trata da interrupção voluntária da gravidez. Pela formação e convicções que tenho, de ordem filosófica e religiosa, registro minha completa divergência nessa matéria, em nada querendo diminuir a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, mas externando minha completa ruptura com esse tipo de legislação, que se julgue ser um avanço em relação à mulher brasileira. É um assunto que deveríamos tratar num grande debate com a sociedade, para depois pensarmos em apresentar soluções de Governo para a política de interrupção da gravidez no Brasil. A minha posição é frontalmente contrária, por motivações pessoais, filosóficas e próprias da minha formação médica e cristã.

Essa era a lembrança e a reflexão que queria trazer ao Senado Brasileiro a respeito dos indicadores de saúde que se abatem sobre as crianças que nascem e que dão os primeiros passos na vida e das mulheres que ainda são vítimas de dramas de desigualdades. Por exemplo, uma mulher latino-americana tem 27 vezes menos chance de ter uma gravidez e um parto saudável do que uma mulher americana.

Temos o registro de que 11 milhões de crianças morrem, todos os anos, no planeta, e aproximadamente oito milhões, antes de completarem um mês de vida, o que dá uma média de mortalidade, dividida ao longo de 12 meses, de 30 mil mortes por dia. Fazendo-se uma comparação, essas crianças morrem, em sua maioria, antes dos 30 dias de vida.

É uma situação dramática que se abate sobre o País. Felizmente, temos uma política de saúde crescente, voltada a assumir compromissos sociais e éticos com a saúde do povo brasileiro, o que não é um atributo deste Governo, mas também uma preocupação de governos anteriores. Sem sombra de dúvida, é preciso uma resposta emergente, de completa insatisfação e inquietação, e a defesa de uma revolução sanitária, para mudar esses indicadores no Brasil de hoje.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.

 

*********************************************************************************

SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR TIÃO VIANA.

*********************************************************************************


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/04/2005 - Página 8057