Discurso durante a 37ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Necessidade de regulamentação de propagandas de cigarros e bebidas alcoólicas.

Autor
Heloísa Helena (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Necessidade de regulamentação de propagandas de cigarros e bebidas alcoólicas.
Aparteantes
Tião Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 12/04/2005 - Página 8645
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • DENUNCIA, RISCOS, PROPAGANDA COMERCIAL, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, BEBIDA ALCOOLICA, VINCULAÇÃO, SAUDE, ESPORTE, INCITAMENTO, CRIANÇA, ADOLESCENTE.
  • REGISTRO, TRAMITAÇÃO, DIVERSIDADE, PROPOSTA, REGULAMENTAÇÃO, PUBLICIDADE, BEBIDA ALCOOLICA, AUTORIA, SENADOR, ORADOR, CRITICA, OBSTACULO, LIDER, GOVERNO FEDERAL, SENADO, APROVAÇÃO, EMENDA, PROIBIÇÃO, PROPAGANDA, ALCOOL, MEDIDA PROVISORIA (MPV), FLEXIBILIDADE, PROPAGANDA COMERCIAL, CIGARRO.
  • COMENTARIO, EFEITO, BEBIDA ALCOOLICA, AUMENTO, VIOLENCIA, ESTUPRO, MULHER, CRIANÇA, HOMICIDIO, ACIDENTE DE TRANSITO, INFERIORIDADE, PRODUTIVIDADE, DESEMPREGO, DEFESA, NECESSIDADE, ADVERTENCIA, PRODUTO, DANOS, SAUDE, USUARIO, SOLICITAÇÃO, AGILIZAÇÃO, TRAMITAÇÃO, PROJETO, SENADO, PROIBIÇÃO, PUBLICIDADE, COMBATE, LOBBY, EMPRESA DE BEBIDAS.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vou tratar, mais uma vez, de um tema que tenho debatido desde o primeiro ano do meu mandato nesta Casa, portanto, há seis anos, não apenas apresentando projetos a ele relacionados, mas tentando, de todas as formas, impedir algo que considero danoso à sociedade, ou seja, a publicidade das bebidas alcoólicas.

Sei que há vários projetos em tramitação nesta Casa, dos Senadores Jefferson Péres, Eduardo Suplicy, Marina Silva, Emilia Fernandes, Roberto Requião, Geraldo Mesquita, Maguito Vilela e meu próprio. São vários os projetos que aqui tramitam sobre a proibição da publicidade de bebidas alcoólicas. Quanto a isso, nem precisamos dizer da publicidade enganosa que seduz crianças e jovens ao fazer uma analogia sórdida e mentirosa com a juventude, com a beleza, com o esporte e com a saúde. É uma situação extremamente grave.

Como estamos em abril de 2005, é importante relembrar, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que em abril de 2003, nesta Casa, já no atual Governo Lula, houve uma polêmica muito grande em relação à medida provisória, editada pelo Presidente da República, que garantia uma abertura, ou seja, uma flexibilidade daquela medida provisória editada pelo Presidente Fernando Henrique que tratava da proibição da publicidade do fumo. Houve uma flexibilidade em 2003 para possibilitar a publicidade do fumo em função da corrida automobilística que estava havendo em São Paulo.

Na época, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, briguei muito para que pudéssemos incorporar naquela medida provisória uma emenda que garantisse a proibição da publicidade das bebidas alcoólicas.

Por mais que apresentássemos vários argumentos, é importante relembrarmos - porque a pior coisa é o esquecimento - a fala de duas personalidades muito importantes do Governo. Uma delas, a do Senador Tião Viana, que, no dia da votação, disse:

O Ministro da Saúde, de maneira sóbria e corajosa, até pela profissão médica que exerce, de sanitarista e psiquiátrica, abordou com firmeza e dignidade, na Comissão de Assuntos Sociais [o que é verdade], sua total aversão, seu total confronto com a propaganda do álcool no País e está encaminhando matéria para controlar a propaganda e restringir o uso do álcool.

Mais longe que o Senador Tião Viana foi o Líder do Governo, o Senador Aloizio Mercadante. Estou a rir, senhores telespectadores, porque o Senador Tião Viana está presidindo a sessão e sabe e concorda, por uma questão de honestidade intelectual, com o que estou falando. O Líder do Governo, para tentar convencer os Senadores no sentido de rejeitar a minha emenda, que garantia a proibição da publicidade de álcool, e de que não seria necessário aprová-la, disse:

Em relação ao alcoolismo, em relação à propaganda de bebidas, quero informar às Srªs e aos Srs. Senadores que o Governo criou uma comissão interministerial composta por onze Ministérios, incluindo a Advocacia-Geral da União e organismos do Governo, que, em um prazo máximo de 90 dias, apresentará um plano relativo ao problema de bebida alcoólica. Tratarão dos alcoólicos, do seu tratamento, da tributação, da propaganda anti-alcoolismo e da proibição de propaganda de bebidas. Portanto, solicitaria que aguardássemos esse estudo para que tivéssemos uma avaliação completa e uma política consistente. É compromisso do Ministro da Saúde (...) estabelecer uma política de combate à propaganda do álcool e alcoolismo. Em 90 dias, (...) esse grupo ministerial apresentará a conclusão dos seus relatórios.

Isso ocorreu em abril de 2003, portanto, há dois anos. Imaginem que perda de tempo! Ou é mentira ou muita perda de tempo, porque se juntaram onze Ministérios, a Advocacia-Geral da União e vários organismos de Governo para estudar - desculpem-me a expressão - uma “porcariazinha” de uma alteração legislativa, matéria sobre a qual vários projetos tramitam na Casa.

Por que é importante, Srªs e Srs. Senadores e Sr. Presidente Papaléo Paes? É essencial, porque a publicidade é propaganda enganosa e mentirosa, que seduz nossas crianças, nossa juventude, nossas famílias, fazendo uma analogia sórdida da bebida com a juventude, o esporte, a saúde e o lazer. É uma gigantesca propaganda enganosa.

Sabemos o que o álcool faz, sabemos que o fumo promove danos gravíssimos à saúde individual. Sabe o Senador Tião Viana, grande especialista, bem como V. Exª, médico que é, Senador Papaléo Paes, que existe até polêmica no mundo da Ciência sobre os agravos à saúde do fumante passivo. No entanto, mesmo que passemos desse pressuposto, nem se comparam com os agravos à saúde pessoal, à família e à sociedade, porque a utilização das bebidas alcoólicas promove agravos à saúde pessoal e à saúde da família de forma inimaginável.

A maioria das mulheres e crianças estupradas e espancadas em suas próprias casas são vítimas de pessoas alcoolizadas, que, muitas vezes, depois, no momento de sobriedade, choram jogados nas cadeias, pensando no que efetivamente fizeram com suas mulheres e crianças.

Nesta semana, foi publicada pesquisa da Federação das Indústrias da Itália sobre a queda da produtividade, com o fumo em 10%, Senador Tião Viana, porque calculam a média das horas que as pessoas gastam fumando. Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, V. Exªs se lembram de que, no Brasil, a própria Fiesp divulgou pesquisa que demonstra o quanto a bebida alcoólica influi diretamente no desemprego, na concessão de licenças e na baixa produtividade. Centenas de estudos no Brasil e no mundo mostram como transformar um cidadão pacato num assassino em potencial, demonstram como aumenta o número de assassinatos no raio de um quilômetro de um bar e como o álcool viabiliza dados gravíssimos à população de forma em geral com os acidentes de trânsito. Os piores acidentes de trânsito, aqueles que mais matam ou promovem seqüelas gravíssimas, estão diretamente relacionados às pessoas alcoolizadas.

Antes de concluir, concedo um aparte a V. Exª, Senador Tião Viana.

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Agradeço a V. Exª, Senadora Heloísa Helena, a oportunidade do aparte e quero, de fato, testemunhar que é exatamente a expressão da verdade o que V. Exª diz sobre o debate que tivemos em relação à propaganda de bebidas alcoólicas em 2003. Eu tinha toda a consideração positiva e a certeza de que o Governo do Presidente Lula, por intermédio do Ministro Humberto Costa - que representava o Ministério da Saúde e mais dez Ministérios -, tomaria uma atitude definitiva em relação à regulamentação da propaganda de bebidas alcoólicas. Minha expectativa era a de que, de fato, chegaríamos a uma conclusão naquele ano, encontrando uma solução de saúde pública compatível também com o interesse das grandes empresas, que têm suas responsabilidades éticas e morais e, ao mesmo tempo, os seus direitos, dentro de uma legislação que deve ser adequada a um Estado democrático de direito. Infelizmente, o nosso Governo falhou nessa matéria. Faço a mesma crítica de V. Exª: não poderíamos ter postergado tanto uma decisão como essa; o prazo deveria ter sido cumprido. Como profissional de saúde, testemunhamos ao lado de V. Exª o calvário, o lamento e a aflição por que passam milhares de famílias, vítimas de dependência do álcool neste País. Sabemos que um filho, em uma família em que um dos pais seja alcoólatra, passará pelo menos três gerações para se livrar, de fato, das seqüelas, das manchas de sentimento morais e de outra natureza que o alcoolismo gera em uma casa. É uma situação dramática, porque a movimentação comercial em torno do álcool envolve bilhões e bilhões de dólares, e o nosso Governo ainda não teve força suficiente para enfrentar o problema. Neste caso, a nossa crítica é exatamente a mesma. Não tenho razão alguma para reduzir o impacto de insatisfação e inquietação pelo fato de o nosso Governo não ter agido ainda. Do mesmo modo, transfiro uma crítica para o Senado Federal. Em maio do ano passado, chegou aqui o acordo da Convenção Quadros, para regularmos a propaganda de cigarro, vício que mata duzentas mil pessoas, no Brasil, por ano, vítimas do câncer e das doenças respiratórias, e por aí vai. E, até hoje, o Senado Federal não agiu em relação à Convenção Quadros. Sei que existe influência do setor produtivo rural, que vai de Alagoas ao Rio Grande do Sul, na luta pela sobrevivência das famílias, dos pequenos agricultores, mas temos de encontrar uma solução.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Com certeza.

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Há pouco tempo, apresentei uma proposta sobre a regulamentação de guloseimas em horários de televisão que atingiam as crianças inocentes. Em alguns programas de televisão, as crianças são constantemente alvo de propagandas de guloseimas, sendo induzidas a erros alimentares e à conseqüência da maior doença de saúde pública do mundo hoje, que é a síndrome metabólica, ligada à obesidade, a que mais mata no mundo atualmente. Fui bombardeado por vários especialistas em marketing, do Sr. Washington Olivetto a outros, dizendo que era um absurdo o Parlamento se posicionar em relação à regulamentação de matéria de propaganda. Então, a força contrária é muito poderosa. Houve a alegação de que ali se movimentava, apenas em propaganda de alimentos, mais de R$2 bilhões por ano. Então, enfrentamos um lobby desse tamanho, dessa dimensão. Penso que a única saída é a dignidade do Parlamentar e a coragem de assumir posições como a que V. Exª assume agora. Assumo isto sem constrangimento: o nosso Governo está errado em não ter concluído a regulamentação da propaganda de bebidas alcoólicas.

A SRª HELOÍSA HELENA (P- SOL - AL) - Agradeço de coração a V. Exª, Senador Tião Viana, a sua honestidade intelectual. Tem acompanhado esse caso da mesma forma que eu. Sabemos que nem V. Exª nem eu somos movidos pelo falso moralismo, o moralismo farisaico, em relação a isso.

Eu nunca bebi, mas não foi por falso moralismo. Nunca bebi porque sempre tive preocupação e medo em função de várias pessoas em minha família terem problemas de alcoolismo. Tinha medo de não conseguir parar. Mas esse não é o caso, não é a realidade, nem o cotidiano de milhares de outras pessoas que nem imaginam isso, especialmente as nossas crianças e a nossa juventude que não querem saber, porque a propaganda que está na televisão é uma propaganda belíssima, vinculada ao esporte, à saúde, à beleza, a mulheres estonteantes. As propagandas mais bonitas geralmente são de bebidas alcoólicas, especialmente de cervejarias.

Sempre ridicularizo alguns Parlamentares e membros de Governo que se transformam ao ouvir o “tchiiii” da cerveja se abrindo. V. Exª se lembra - isto aconteceu no Governo Fernando Henrique e no Governo Lula também - que todas as vezes que tratamos disso vem para cá a tropa de choque dos lobistas das cervejas do Brasil, e muitas pessoas que, às vezes, agem como leões raivosos se transformam em gatinhos sarnentos e covardes quando está em jogo o “tchiiii” das cervejarias.

Sei que compartilho a opinião de V. Exª em relação a isso e espero, Sr. Presidente, que o Senado possa agilizar os projetos e o Governo possa ter a coragem necessária, porque é essencial para o Brasil, e proibir a publicidade de bebidas alcoólicas. O álcool é uma droga psicotrópica. Infelizmente, é aceita socialmente e estimulada de uma forma irresponsável pela propaganda enganosa das empresas, das cervejarias, e pela omissão dos governos.

Espero que possamos, tanto o Congresso Nacional como o Governo, agilizar os mecanismos necessários para proibir, volto a repetir, a publicidade de bebidas alcoólicas. Proibir a publicidade de bebidas alcoólicas é proibir a publicidade de uma droga psicotrópica. O álcool é uma droga psicotrópica. Então, espero que esta Casa e o Governo tenham a coragem necessária para enfrentarem o lobby das cervejarias, das bebidas alcoólicas, e proibirem definitivamente a publicidade. E que também garantam a colocação nas garrafas de bebidas de um rótulo, necessário também, advertindo sobre os agravos à saúde individual e coletiva relacionados à utilização dessas bebidas.

Obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/04/2005 - Página 8645