Discurso durante a 38ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Pesquisa realizada pela Subsecretaria de Pesquisa e Opinião Pública do Senado Federal sobre violência doméstica contra a mulher.

Autor
Valmir Amaral (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/DF)
Nome completo: Valmir Antônio Amaral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. FEMINISMO.:
  • Pesquisa realizada pela Subsecretaria de Pesquisa e Opinião Pública do Senado Federal sobre violência doméstica contra a mulher.
Publicação
Publicação no DSF de 13/04/2005 - Página 8910
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. FEMINISMO.
Indexação
  • IMPORTANCIA, PESQUISA, OPINIÃO PUBLICA, REALIZAÇÃO, SUBSECRETARIA, SENADO, ASSUNTO, VIOLENCIA, VITIMA, MULHER, RESIDENCIA, REGISTRO, DADOS, IDENTIFICAÇÃO, DESRESPEITO, DISCRIMINAÇÃO SEXUAL, EXPECTATIVA, MELHORIA, PROTEÇÃO, LEGISLAÇÃO.
  • ANALISE, HISTORIA, EVOLUÇÃO, BRASIL, MUNDO, PROTEÇÃO, MULHER, AUMENTO, FEMINISMO, PARTICIPAÇÃO, POLITICA NACIONAL.

 

O SR. VALMIR AMARAL (PMDB - DF. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero referir-me à pesquisa realizada pela Subsecretaria de Pesquisa e Opinião Pública do Senado Federal sobre violência doméstica contra a mulher. Trata-se de iniciativa das mais louváveis, seja pela importância do tema, seja pela oportunidade, seja ainda pelo rigor científico que a lastreou.

Entre todas as formas de violência contra a mulher, a doméstica talvez seja a mais insidiosa, uma vez que ocorre no próprio lar, ambiente que deveria caracterizar-se pelos sentimentos de acolhimento e conforto. Mais que isso, o agressor quase sempre mantém laços afetivos ou de consangüinidade com a vítima. Segundo especialistas, a violência doméstica se processa em três níveis: físico, psicológico e abuso sexual, que concentra os dois anteriores, com severas repercussões na saúde sexual e reprodutiva da mulher.

A pesquisa empreendida pelo Senado Federal abrangeu um universo composto por mulheres com mais de 16 anos, residentes nas 27 capitais brasileiras, totalizando 16 milhões 433 mil 682 pessoas, de acordo com o Censo realizado pelo IBGE em 2000. A amostragem foi implementada por cotas proporcionais, isto é, de acordo com a quantidade de mulheres em cada capital, por processo randômico. Foi utilizado um questionário estruturado com perguntas fechadas, contendo 20 questões relativas à violência doméstica e 5 perguntas referentes ao perfil da entrevistada. Foram ouvidas, no total, 815 mulheres, sempre por telefone.

O Relatório de Pesquisa toca em vários aspectos relevantes. A percepção do desrespeito a que as mulheres estão submetidas é reveladora. Mais de 80% das mulheres acham que não recebem o mesmo tratamento que os homens. Não por acaso, as mulheres mais pobres e menos escolarizadas tendem a identificar um maior grau de desrespeito. As mulheres vêem, especialmente, alguns locais e situações como mais propensos às práticas discriminatórias, como o ambiente de trabalho, a Justiça ou as instituições públicas. Somente 3% das mulheres sentem-se respeitadas ao demandar serviços cotidianos, como consertar o carro ou providenciar reparos na casa.

Quanto à violência propriamente dita, um terço das mulheres entrevistadas (33%) afirmaram que a violência sexual é a forma mais grave de violência doméstica, seguida pela violência física (29%). Convém ressaltar que a tipificação da violência doméstica pode requerer, por vezes, atenção a elementos sutis, como é o caso da violência moral e/ou psicológica, relatadas por 18% das entrevistadas. É o caso, ainda, Sr. Presidente, de uma ocorrência pouco comentada: cerca de 60% das mulheres relatam sofrer abuso contra seu patrimônio ou contra seus rendimentos.

Srªs e Srs. Senadoras, outro dado contraria o senso comum sobre a violência doméstica. Com efeito, devido ao caráter privado das relações, tem-se a idéia errônea de que o fenômeno da violência contra a mulher seja sempre sorrateiro ou camuflado. No entanto, 40% das mulheres relataram já ter presenciado algum ato de violência contra outras mulheres. Sr. Presidente, eis, portanto, como as características patriarcais da sociedade brasileira podem conduzir a um quadro de silêncio e omissão, mesmo entre as vítimas.

O cenário que se vai descrevendo é ainda mais pernicioso quando se considera que a nota dominante da agressão é seu caráter continuado. Entre as mulheres que já haviam sofrido alguma violência física (17% do total), 71% relataram episódio de violência doméstica anterior. Outro agravante é o fato de a exposição à violência iniciar-se precocemente: 77% das mulheres agredidas sofreram a primeira violência até os 29 anos. Srªs e Srs. Senadoras, eis o triste quadro que se desenha: violência acobertada, repetida e precoce.

Sr. Presidente, uma pergunta do questionário talvez interesse mais diretamente a esta Casa. Trata-se daquela que indaga se as leis brasileiras protegem as mulheres contra abusos e violências domésticas. Apesar de a maioria (54%) das entrevistadas ter dito que há proteção total ou parcial, um número expressivo, 45%, crê que ainda não há leis em quantidade e qualidade suficientes. Tais achados demonstram que, em nosso País, a perspectiva de gênero na legislação ainda é um processo em etapa de franca construção.

Entretanto, é preciso ressaltar que houve avanços. A “Primeira Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres”, ocorrida em julho de 2004, estabeleceu como um dos eixos norteadores das políticas públicas a superação da violência contra a mulher, mediante ações de prevenção, assistência e enfrentamento. No âmbito do Legislativo, as proposições atinentes às mulheres têm crescido em número, de forma sistemática, desde o início dos anos 80, quando a Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou a “Declaração da Eliminação da Violência contra a Mulher”, o primeiro documento internacional de direitos humanos a focar exclusivamente a violência contra a mulher, percebida como um tipo de violação e degradação dos direitos humanos.

Em 1995, a 4a Conferência Mundial da Mulher, realizada em Pequim, conclamou os governos do mundo a combater todas as formas de violência contra a mulher, ratificando as determinações da Declaração de 1980, e instando os signatários a não considerar justificativas de ordem religiosa, cultural e tradicional que continuam a embasar essas manifestações de violência. A chamada Conferência de Pequim acordou um plano de ação qüinqüenal destinado a aprimorar a situação e os poderes da mulher no campos social, econômico e político, melhorar a sua saúde, fomentar a educação e promover os seus direitos conjugais e sexuais.

Talvez ainda seja cedo para mensurar com exatidão os avanços provindos da Conferência, mas já é certo que houve significativo aumento numérico das proposições legislativas sobre a violência contra a mulher, já a partir de 1996 e, sobretudo, de 1999 em diante, o que demonstra que o Poder Legislativo Federal tem procurado recepcionar as aspirações dos movimentos de mulheres e feministas, em sua luta por eqüidade e cidadania.

De outro lado, embora os níveis de representação das mulheres ainda estejam em patamares considerados baixos, a bancada feminina nas duas Casas do Legislativo tem demonstrado interesse em criar e ampliar as instâncias que dêem conta do recorte de gênero. O exemplo emblemático dessa postura pró-ativa foi a criação formal da Bancada Feminina no Congresso Nacional (2001), de caráter suprapartidário, e que objetiva agilizar a tramitação de projetos considerados prioritários para as causas das mulheres. Também não devem ser esquecidas as proposições que buscam promover alterações no Regimento Interno, visando ampliar a participação feminina.

Srªs e Srs. Senadoras, cabe dizer que o Parlamento brasileiro vem respondendo de maneira gradual, mas consistente, às demandas das mulheres. Contudo, os dados da mencionada pesquisa sugerem que se promovam ações que resultem em maior visibilidade do trabalho dos congressistas. Exemplo concreto foi dado pela Comissão do Senado Federal que esteve encarregada, no ano passado, dos trabalhos referentes ao Ano Nacional da Mulher. Foram desenvolvidos projetos que incluíram palestras, debates, mostras e publicações. Entre essas últimas, merece destaque a publicação conjunta do Arquivo do Senado Federal e da Consultoria Legislativa intitulada “Proposições Legislativas sobre Questões Femininas no Parlamento Brasileiro”.

Seguiremos trabalhando, é certo, para que a sociedade brasileira erradique, de vez, essa imensa e humilhante chaga da violência doméstica cometida contra as mulheres.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/04/2005 - Página 8910