Discurso durante a 40ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com o problema da pavimentação da BR-163, Rodovia Cuiabá-Santarém. (como Líder)

Autor
Aelton Freitas (PL - Partido Liberal/MG)
Nome completo: Aelton José de Freitas
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Preocupação com o problema da pavimentação da BR-163, Rodovia Cuiabá-Santarém. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 15/04/2005 - Página 9221
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • COMENTARIO, PROJETO, GESTÃO, ANDERSON ADAUTO, EX MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DOS TRANSPORTES (MTR), ANALISE, PROPOSTA, PARCERIA, DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DOS TRANSPORTES (DNIT), CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO E TECNOLOGICO (CNPQ), DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, REGIÃO, RODOVIA, ESTADO DO PARA (PA), BUSCA, JUSTIÇA SOCIAL.
  • ANALISE, HISTORIA, INEFICACIA, INFRAESTRUTURA, TRANSPORTE DE CARGA, PORTOS, ESCOAMENTO, PRODUÇÃO AGROPECUARIA, EXPORTAÇÃO, JUSTIFICAÇÃO, ASFALTAMENTO, RODOVIA, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), ESTADO DO PARA (PA), NECESSIDADE, ATENÇÃO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, REGIÃO, APREENSÃO, RISCOS, AUMENTO, CONFLITO, VIOLENCIA, DESTRUIÇÃO, MEIO AMBIENTE.

O SR. AELTON FREITAS (Bloco/PL - MG. Pela Liderança do PL. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o tema deste meu pronunciamento pode surpreender aqueles acostumados a ouvir minhas palavras quase sempre sobre questões e interesses de Minas Geras ou da classe agropecuária, que procuro representar da melhor maneira possível, mais recorrentes em minhas ocupações desta tribuna.

Hoje, Sr. Presidente, em caráter excepcional, peço licença aos nobres Pares que representam os Estados da região amazônica, em especial aos paraenses, pois destacarei aqui a problemática da pavimentação da BR-163, sob aspectos estruturais, legais e sociais que julgamos indispensáveis.

Esta minha incursão se justifica pelo fato de que tive a honra e o privilégio de conhecer e apoiar o nascedouro de um inédito e arrojado projeto de pesquisa sobre a relação entre a pavimentação da BR-163 e as providências necessárias para que a conclusão não venha a agravar ainda mais tensões sociais tão intensas como as que já existem no interior, principalmente do Estado do Pará.

Reitero, pois, tratar-se este pronunciamento de resultados de preliminares de um projeto sobre um tema tão caro à região amazônica, que nasceu no coração de Minas Gerais, ao sair do papel durante a gestão do então Ministro dos Transportes Anderson Adauto, hoje Prefeito de Uberaba. Intitulado “Integração de Conceitos e Desenvolvimento de Sistema de Análise e Formatação de Projetos de Concessão de Rodovias e Obras em Infra-Estrutura de Transportes” e coordenado pelo renomado pesquisador e meu amigo Alexandre Gavriloff, o referido trabalho reuniu mais de meia centena de grandes cabeças do País e do exterior, que analisaram, sob aspectos históricos, econômicos, políticos e sociais, os desafios que o Governo precisa enfrentar para levar à região por onde passa a BR-163 um desenvolvimento verdadeiramente sustentável, que não se restrinja a asfalto e possa restabelecer um estado de ordem e um mínimo de justiça social, hoje ausentes.

Os problemas brasileiros com escoamento de produção vêm de muito tempo. Há cem anos, o café, também apelidado de “ouro verde”, como hoje é a soja, era o principal gerador de divisas de exportação, e seu escoamento já estava estrangulado. A estrutura portuária, então encabeçada pelo Estado do Rio de Janeiro, não se mostrava suficiente para atender aos transatlânticos, e as demais vias de transporte eram inadequadas para a demanda.

Chegamos aos dias atuais e constatamos realidade bem semelhante, sobretudo quanto à natureza de problemas estruturais.

Com economia ainda dependente das exportações, o Brasil desponta como um dos maiores exportadores mundiais de uma soja que, em grande parte, é produzida e colhida no norte de Mato Grosso, roda alguns milhares de quilômetros para o sul do País, embarca nos enfartados portos de Santos ou Paranaguá, navega os mesmos tantos mil quilômetros para o norte e chega à mesma linha de latitude de onde partiu.

O sonho de um produtor praticamente vizinho do rio Amazonas é, por motivos óbvios, “atender à demanda internacional pela porta da frente”. Um desejo ainda impossível de ser concretizado, Sr. Presidente Senador Demóstenes Torres, por esbarrar no deplorável estado da lendária rodovia Cuiabá-Santarém, que mal saiu do papel.

É nesse contexto que se justificam providências para o asfaltamento da BR-163.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. AELTON FREITAS (Bloco/PL - MG) - Como preciosa colaboração para as discussões, o trabalho de pesquisa coordenado pelo grande pesquisador Alexandre Gavriloff, fruto da parceria do Dnit com o CNPq, demonstra, em textos sensíveis e pluralistas, a certeza de que uma obra como essa deve envolver bem mais do que uma mera pavimentação. Essa é a conclusão a que cheguei após o conhecimento dos resultados preliminares do projeto.

Sr. Presidente Senador Demóstenes Torres, Srªs e Srs. Senadores, primeiramente, pode-se afirmar com segurança que os argumentos comerciais para o asfaltamento da BR-163 são absolutamente contundentes. Realmente, essa pavimentação pouparia tempo e recursos para a exportação da produção de grãos, viabilizando uma rota muito mais racional do que a atual, que impõe os portos de Santos e Paranaguá.

Mas, se o aspecto econômico é unanimidade, não podemos dizer o mesmo das razões sociais e ambientais. São muitas as controvérsias que convergem para procedentes questionamentos sobre o papel desempenhado pelo Estado.

É importante enxergar, Sr. Presidente, que a conhecida vocação da política brasileira para o inconcluso não é a única causa de uma longa espera pela pavimentação da rodovia.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. AELTON FREITAS (Bloco/PL - MG) - A estrada é um projeto que atravessa o meio da Amazônia, passando por reservas indígenas e ambientais, áreas de garimpo e regiões de conflitos fundiários. Trata-se de uma área marcada pela grilagem de terras, pela expropriação de antigos habitantes e de populações indígenas e pela extração criminosa de madeira e minério.

Tais aspectos somados caracterizam uma ausência de Estado percebida a olho nu, que não pode mais perdurar, sob pena de se acentuar o desrespeito aos direitos estabelecidos em níveis incontroláveis.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. AELTON FREITAS (Bloco/PL - MG) - Sr. Presidente, peço-lhe que me conceda mais um minuto e darei o restante do meu pronunciamento como lido.

A ineficiência estatal estimula o trabalho escravo, o desmatamento e a atuação de organizações criminosas que têm em comum a violência contra o mais fraco, seja ele o índio, o camponês ou até mesmo o mogno.

Sr. Presidente, meus nobres Pares, minha intenção neste pronunciamento não é, em hipótese alguma, desenterrar críticas e julgamentos sobre o histórico de conflitos e desmandos na região. Preocupo-me, sobretudo, com o futuro, com os impactos de uma obra que o Governo precisa finalizar.

Nesse sentido, pode-se afirmar que, sem as devidas medidas prévias que resultem em maior presença do Estado, a conclusão da BR-163 pode vir a acelerar e potencializar o ritmo de degradação da região amazônica.

Não podendo mais continuar, Sr. Presidente, peço que meu discurso seja dado como lido e que seja publicado na íntegra, para registro nos Anais desta Casa. Trata-se de um alerta, feito ainda em tempo, e chamo meus nobres edis a uma reflexão no que tange principalmente à construção da BR-163.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR AELTON FREITAS

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O SR. AELTON FREITAS (Bloco/PL - MG. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o tema deste meu pronunciamento pode surpreender aqueles acostumados a ouvirem minhas palavras sobre as questões e interesses de Minas Gerais ou da classe agropecuária, mais recorrentes em minhas ocupações desta tribuna.

Hoje, em caráter excepcional, quero pedir licença aos nobres pares que representam os estados da região Amazônica, em especial aos paraenses, pois destacarei aqui a problemática da pavimentação da BR-163 sob aspectos estruturais, legais e sociais que julgo indispensáveis. Esta minha incursão se justifica pelo fato de que tive a honra de apoiar o nascedouro de um inédito e arrojado projeto de pesquisa sobre a relação entre a pavimentação da BR-163 e as providências necessárias para que a sua conclusão não venha a agravar, ainda mais, tensões sociais tão intensas como as que já existem no interior do estado do Pará.

Reitero, pois, tratar-se este pronunciamento de resultados preliminares de um projeto sobre tema tão caro à região amazônica, que nasceu no coração de Minas Gerais, ao sair do papel durante a gestão do então Ministro dos Transportes, Anderson Adauto, hoje prefeito de Uberaba. Intitulado (nome correto do projeto) e coordenado pelo renomado pesquisador Alexandre Gavriloff, o referido trabalho reuniu 15 grandes cabeças do país e do exterior que analisaram sob aspectos históricos, econômicos, políticos e sociais os desafios que o governo precisa enfrentar para levar à região por onde passa a BR-163 um desenvolvimento verdadeiramente sustentável, que não se restrinja a asfalto e possa restabelecer um estado de ordem e um mínimo de justiça social hoje ausentes.

Os problemas brasileiros com escoamento de produção vêem de muito tempo. Há cem anos, o café, também apelidado de "ouro verde" como hoje é a soja, era o principal gerador de divisas de exportação e o mesmo já tinha o seu escoamento estrangulado. A estrutura portuária, então encabeçada pelo Rio de Janeiro, não se mostrava suficiente para atender os transatlânticos e as demais vias de transporte eram inadequadas para a demanda.

Chegamos aos dias atuais e constatamos realidade semelhante, sobretudo quanto à natureza de problemas estruturais.

Com economia ainda dependente das exportações, o Brasil desponta como um dos maiores exportadores mundiais de uma soja que em grande parte é colhida no norte do Mato Grosso, roda alguns milhares de quilômetros para o sul, embarca nos enfartados portos de Santos ou Paranaguá, navega os mesmos tantos mil km para o norte e chega na mesma linha de latitude.

O sonho de um produtor praticamente vizinho do rio Amazonas é, por motivos óbvios, “atender a demanda internacional pela porta da frente”. Um desejo ainda impossível de ser concretizado por esbarrar no deplorável estado da lendária rodovia Cuiabá -Santarém.

É neste contexto que se justificam providências para o asfaltamento da BR 163. Como preciosa colaboração para as discussões, o trabalho de pesquisa coordenado por Alexandre Graviloff, fruto de parceria do DNIT com o CNPq, demonstra em textos sensíveis e pluralistas a certeza de que uma obra como essa deve envolver bem mais do que mera pavimentação. É esta a conclusão a que cheguei após conhecimento dos resultados preliminares do projeto.

Srªs e srs. Senadores, em primeiro lugar, pode-se afirmar com segurança que os argumentos comerciais para o asfaltamento da BR-163 são absolutamente contundentes. Realmente, essa pavimentação pouparia tempo e recurso para a exportação da produção de grãos, viabilizando uma rota muito mais racional do que a atual, que impõe os portos de Santos e Paranaguá.

Mas se o aspecto econômico é unanimidade, não podemos dizer o mesmo das razões sociais e ambientais do projeto. São muitas as controvérsias que convergem para procedentes questionamentos sobre o papel desempenhado pelo Estado.

É importante enxergar que a conhecida vocação da política brasileira para o inconcluso não é o única causa de uma longa espera pela pavimentação da rodovia.

A estrada é um projeto que corta ao meio a Amazônia, passando por reservas indígenas e ambientais, áreas de garimpo e regiões de conflitos fundiários. Uma área marcada pela grilagem de terras, expropriação de antigos habitantes e populações indígenas, extração criminosa de madeira e minério.

Tais aspectos somados caracterizam uma ausência de Estado que não pode mais perdurar, sob pena de se acentuar o desrespeito aos direitos estabelecidos para níveis incontroláveis.

A ineficiência estatal estimula o trabalho escravo, o desmatamento, e a atuação de organizações criminosas que têm em comum a violência contra o mais fraco, seja ele o índio, o camponês ou o mogno.

Sr. Presidente e meus nobres pares: minha intenção neste pronunciamento não é, em hipótese alguma, desenterrar críticas e julgamentos sobre o histórico de conflitos e desmandos na região. Preocupo-me, sobretudo, com o futuro, com os impactos de um obra que Governo precisa finalizar.

Nesse sentido, pode-se afirmar que sem as devidas medidas prévias que resultem em uma maior presença do Estado, a conclusão da BR-163 pode vir a acelerar o e potencializar o ritmo de degradação da região amazônica.

A pavimentação da estrada deve ser precedida por profundas medidas estruturais. Quero congratular-me com o CNPq que em uma pesquisa inédita sobre este tema procura despertar no poder público maior atenção para um corpo social que tem sido historicamente esquecido nas margens da BR: o habitante local.

Em projetos de infra-estrutura regional este cidadão sempre foi encarado como obstáculo ou resíduo do progresso, pronto para ser culturalmente ou literalmente dizimado. A sua marginalização é resultado de um progresso econômico planejado para atender apenas uma ínfima minoria, sem qualquer noção de desenvolvimento sustentável e responsabilidade social.

É evidente que num país necessitado de maior justiça social e melhor distribuição de renda, o progresso, o avanço tecnológico e o desenvolvimento não podem ser privilégios de classes.

A idéia equivocada da Amazônia como um “vazio”, um “espaço sem gente”, tem der ser abolida de uma vez por todas. Tal concepção irreal já causou estragos suficientes ao servir de argumento para a expropriação de terras e povos antigos, prática ainda recorrente.

Além disso, a classificação nega o status de “gente” a mais de 170 povos indígenas e a alguns milhões de antigos habitantes.

As notícias sobre a rodovia Santarém-Cuiabá sempre ressaltam o estado de abandono que é ilustrado com caminhões carregados de madeira, gado ou soja enterrados na lama. Mas este está longe de ser o único problema. Ainda mais cruel são situações relatadas de mães que vêem os filhos de menos de dez anos ingressarem em atividades ilegais.

A pavimentação pode socorrer as populações residentes ao longo da rodovia do isolamento em que vivem. Mas não do abandono. Sem dúvida essas pessoas reclamam contato e comunicação, serviços que podem ser facilitados com a pavimentação da rodovia. Entretanto, a esperança cultivada é de que a pavimentação da rodovia leve melhor acesso à saúde, educação, justiça, enfim, a direitos básicos e mínimos que, na verdade, devem estar garantidos com ou sem rodovia, com ou sem asfalto.

A BR-163 , como qualquer outra estrada, não é só uma via por onde passam mercadorias. Ela também transporta tempo e espaço, uma vez que por ela passam pessoas.

Srªs e srs. Senadores, se, de fato, o asfaltamento da Santarém-Cuiabá vier a se concretizar, a matemática da economia deve ceder lugar a uma concepção de estrada que antes de tudo seja vista como uma artéria social.

A BR-163 requer bem mais do que tecnologia para a realização de uma obra de engenharia, bem mais do que um leito de concreto e asfalto. A idéia de que as obras pretendidas, por si só, melhorariam a condição das populações locais não passa de ilusão.

A possibilidade de um transporte facilitado a locais onde haveria acesso a atendimentos públicos que são direitos inerentes a qualquer brasileiro não é nenhum privilégio.

Com o caos social já instalado, somente o atendimento prévio desses direitos pode garantir que o estado de ilegalidade não se amplie. Asfalto não elimina trabalho escravo, nem violência, nem narcotráfico, nem grilagem e expropriação de terras e, muito menos, degradação ambiental.

A conclusão com a qual encerro este discurso, senhor presidente, senhoras e senhores senadores, é simples e objetiva: a pavimentação da BR 163 é fundamental para melhorar o escoamento da produção agrícola nacional e fortalecer nossa economia, mas nada garante que irá diminuir o abandono em que vivem as populações carentes de seu entorno.

O Estado deve, primeiramente, assumir a sua ausência em relação a essas pessoas e deixar claro que, independente de haver ou não asfaltamento, precisa lhes prover os direitos até agora negados. Garantido isto, a pavimentação da BR 163 só trará efeitos positivos. Que o nosso governo saiba interpretar os sinais deixados por uma pesquisa inédita sobre a complexa dimensão de uma pavimentação asfáltica na região amazônica e faça nascer daí um conceito eficiente de integração regional.

Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/04/2005 - Página 9221