Discurso durante a 43ª Sessão Especial, no Senado Federal

Comemoração do quadragésimo quinto aniversário de Brasília.

Autor
Eduardo Azeredo (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MG)
Nome completo: Eduardo Brandão de Azeredo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Comemoração do quadragésimo quinto aniversário de Brasília.
Publicação
Publicação no DSF de 21/04/2005 - Página 9915
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA, ANIVERSARIO DE MORTE, JOAQUIM JOSE DA SILVA XAVIER, VULTO HISTORICO, TANCREDO NEVES, CANDIDATO ELEITO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, FUNDAÇÃO, CAPITAL FEDERAL, COMENTARIO, IMPORTANCIA, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), HISTORIA, BRASIL.
  • HOMENAGEM POSTUMA, JUSCELINO KUBITSCHEK, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ELOGIO, VIDA PUBLICA, CONSTRUÇÃO, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL.

O SR. EDUARDO AZEREDO (PMDB - MG. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Paulo Octávio; Sr. Governador Joaquim Roriz; prezada Anna Christina, presidente do Memorial JK e neta do nosso inesquecível Presidente; Senador Cristovam Buarque, ex-Governador de Brasília; Senador Maguito Vilela, ex-Governador de Goiás; Senadora Lúcia Vânia, minha colega de Partido; Senador Demóstenes Torres, Senadora Heloísa Helena, Senador Ney Suassuna, oradores inscritos para esta ocasião; senhoras e senhores, amanhã, comemora-se, em todo o País, uma data que simboliza, de uma só vez, as três mais altas contribuições políticas do meu Estado, Minas Gerais, para a formação do Brasil.

Vinte e um de abril é a data do sacrifício de Tiradentes em prol da independência; da morte de Tancredo Neves, que suportou em silêncio sua doença para assegurar a redemocratização; e o dia da inauguração de Brasília - marco da conquista definitiva do espaço nacional e da consagração de Juscelino Kubitschek de Oliveira como o maior líder republicano brasileiro.

Orgulho-me de dizer que nenhum outro Estado brasileiro tem uma data de sua história elevada a feriado nacional, em que pesem os relevantes fatos históricos protagonizados por brasileiros de diversos Estados irmãos.

Mas, como coincidem no dia 21 de abril os três importantes acontecimentos a que me referi, de fato fica ressaltada a dimensão do que o meu querido Estado representa para a nossa pátria!

Sobre o martírio heróico de Tiradentes não faltarão amanhã justos preitos de honra prestados em todo o Brasil e, particularmente, em Ouro Preto, a antiga Vila Rica, onde ele e seus companheiros idealizaram os planos de um futuro luminoso para o Brasil.

Quanto ao líder da redemocratização, Tancredo Neves, teremos nova sessão proposta e aprovada ontem pelo Senado, associando-se à homenagem especial que ele receberá da Câmara dos Deputados na próxima semana. A exemplo da que, no dia 15 de março, recebeu desta tribuna por parte de vários Senadores que destacaram sua participação ímpar no fim do regime militar.

Assim, hoje, como alvo de minha fala, desejo rememorar o grande feito da inauguração de Brasília, o que, evidentemente, significa referenciar a lembrança de Juscelino Kubitschek.

Afinal, Brasília e seu criador e construtor são inseparáveis. Somente um líder e governante como JK seria capaz de realização de tal vulto que, sem dúvida, é a mais importante do Brasil contemporâneo!

A importância não vem apenas da ousada e portentosa obra física edificada na solidão deste Planalto Central, como eternizaram as palavras de Juscelino ao definir pela primeira vez, em 02 de outubro de 1956, o lugar onde iria construir a nova capital do País.

O mais importante ainda foi o fato de a construção de Brasília ter ensejado o maior avanço realizado na ocupação, integração e desenvolvimento de amplíssimas regiões nacionais, até então alheias ao resto do Brasil.

Além de cumprir o que dispunha a Constituição de 1946 e de empreender uma obra desenvolvimentista, construir Brasília representou para Juscelino “transformar bens geográficos em bens econômicos”, “transformar uma imagem geográfica numa verdadeira nação” - como sintetizou, com suas próprias frases, sempre brilhantes e impregnadas de entusiasmo e futurismo.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, demais presentes, embora fizesse questão de registrar que a mudança da capital para o coração do Brasil não fora invenção dele, mas, sim, uma idéia que nascera já em 1822, JK equiparava a construção de Brasília à Abertura dos Portos, em 1808, e à Proclamação da Independência, como as etapas pelas quais o Brasil “atingiu sua maturidade”.

Sabia do que estava falando, porque, na campanha que o elegeu Presidente da República, em outubro de 1955, percorreu o País de ponta a ponta e viu com os próprios olhos os imensos vazios que se descortinavam sob as asas do avião.

Naquela época, ele observava, dois terços do Território Nacional “só eram brasileiros no mapa”. Preocupava-o integrar ao resto do País, especialmente, o vazio do Centro-Oeste e da Amazônia. E visionário realista que era, logo imaginou a grandeza que a Nação poderia alcançar se crescesse naqueles ermos longínquos do litoral.

Espaços nacionais que só tinham sido conhecidos de perto - mas no passado - por intrépidos bandeirantes.

Erigir Brasília e transferir a Capital da República consistiu, pois, no ponto de convergência das linhas do plano completo que o Presidente propôs - e executou - no País. Qual seja, o plano de “fazer deste País uma grande nação”: legenda e sonho que animaram Tiradentes e os demais conjurados mineiros e que, por outros modos e em outro tempo, empolgaram Juscelino Kubitschek. Por essa razão, denominou a construção da nova capital como a “meta-síntese”: a 31ª meta de seu plano de governo.

“Só mesmo ‘Nonô’ seria capaz de fazer tudo isto” - foi a exclamação simples de dona Júlia Kubitschek, humilde professora de Diamantina e mãe do Presidente, ao ver, no dia da inauguração, que Brasília se tornara realidade. Um dia que Juscelino, em palestra realizada, em 1965, no Círculo Republicano de Paris, durante seu exílio, recordou assim:

Centenas de milhares de pessoas, utilizando toda espécie de transporte, se deslocaram dos pontos mais afastados do Território Nacional, para presenciar o grande acontecimento. Acompanharam as cerimônias, instalados em caminhões, dormindo debaixo de árvores, não tendo milhares de pessoas senão o brilho das estrelas para iluminar as suas noites.

Não poderia haver palavras mais sinceras, para definir a cena da cidade inaugurada, do que o sentimento expresso pela mãe, que conhecia como ninguém o seu filho!

Mas, além dessa manifestação comovente, foi, naquela solenidade de Paris, presidida pelo ex-presidente René Coty, que Juscelino, já exilado, ouviu do Deputado francês Pierre Abelan o principal sentido político que o criador via em Brasília. A nova capital era, para Abelan e para JK: “o símbolo da luta de todos os povos que almejam a liquidação do subdesenvolvimento”.

Antes, outro francês, o célebre escritor André Malraux, havia intitulado Brasília de “A Cidade da Esperança”.

Mais, imaginara que um dia poderiam ser gravadas na pedra de um monumento as palavras que simbolizariam a construção da nova capital: “Audácia, Energia, Confiança”.

De fato, Sr. Presidente, senhoras e senhores, somente quem conhecia o grande e saudoso Presidente sabia avaliar a fundo o caráter extraordinário e certamente genial de sua pessoa e sua obra!

Além da inteligência fulgurante em tudo a que se dedicava - seja a cirurgia e a clínica médicas, seja a administração pública direta como a que levou a modernizar a cidade de Belo Horizonte, capital do meu Estado -, JK combinava qualidades que se complementavam em aparente contraste.

Era corajoso e sensível, audacioso e conseqüente, determinado e organizado, culto e prático, operoso e alegre, magnânimo e firme, patriota e cosmopolita, religioso e racional, convicto e aberto. democrata e imbuído de autoridade, franco a habilidoso.

Listar mais virtudes não seria lisonja post mortem.

Embora ainda muito jovem, tive a honra e o privilégio de notar a impressionante e despojada personalidade e o fascínio de sua liderança sobre seus companheiros, desde os tempos do antigo PSD, à época sombria do regime militar, que cassara e exilara o Presidente.

O PSD, Partido de JK, confundia-se com a melhor tradição da política mineira e a ele pertenciam muitas das mais importantes lideranças políticas de Minas, como o então Governador Bias Fortes, como Israel Pinheiro, construtor de Brasília e depois também Governador do Estado.

Permitam-me lembrar aqui, com saudade e com emoção, o meu pai, Renato Azeredo, que foi eleito Deputado Federal por seis mandatos e sub-chefe da Casa Civil de Juscelino na Presidência da República. Perfilou-se sempre ao lado do Presidente, mesmo nos momentos de agrura e de exílio.

E vejo aqui o Coronel Afonso Heliodoro, um grande companheiro de Juscelino - que há poucos dias fez aniversário, mais de 90 anos. (Palmas.)

Por meio dessa inesquecível convivência, pude admirar, direta e indiretamente, o perfil incomum do Presidente - como era sempre carinhosamente chamado, mesmo após ter saído do Planalto em janeiro de 1961.

A força e a clareza do seu perfil foram comprovadas à exaustão em sua determinação de construir a nova capital.

Em nenhum momento e por nenhum percalço, deixou de lado um só minuto o compromisso de executar o seu plano.

Imaginemos a força desse grande líder brasileiro quando, sentado no toco de uma árvore, na singela fazenda do Gama, projetava sobre a vastidão do cerrado a cidade que iria construir.

Junto com Oscar Niemeyer e Lúcio Costa, subia aos raros pontos elevados do Planalto e de lá apontavam onde se levantariam esse e aquele conjunto de edifícios públicos dos Três Poderes, de habitações ou, então, o lago Paranoá.

Naqueles primeiros momentos, JK já transformava a profecia de Dom Bosco em idéias factíveis, o que só é possível nos gênios capazes de perscrutar as necessidades, aspirações, idéias e sonhos mais profundos da mente coletiva e nacional para torná-los realidade concreta.

Sr. Presidente, a determinação do Presidente JK em relação a Brasília nunca mudou. Manteve-se a mesma desde a campanha presidencial, quando se comprometeu publicamente com eleitores em Jataí, no interior de Goiás, em cumprir o dispositivo constitucional que previa a mudança da capital da República para o Planalto Central - até depois da inauguração da cidade, quando eclodiu a chamada “Revolta dos 19” - fato pouco lembrado, pouco conhecido - em que uma minoria de Senadores que resistia em se transferir para a nova capital ameaçava paralisar o Governo instalando-se simbolicamente no Rio de Janeiro.

O próprio Juscelino confidenciou, mais tarde, que, durante os três anos e dez meses em que trabalhou nos projetos de Brasília, “vivera, sonhara e comera em função de uma data: 21 de abril de 1960” - a data em que hoje comemoramos os 45 anos depois da inauguração da nova capital.

Foram tempos de trabalho pesado dos candangos, mestres-de-obras, engenheiros e do próprio Presidente, que fez mais de uma centena de viagens entre Brasília e Rio, a maioria da vezes em vôos pela madrugada, pela noite. Aliás, JK voou o equivalente a 75 voltas ao mundo, mas dentro do Brasil!

Para enfrentar as incompreensões, manobras insidiosas e até calúnias que os radicais de então lhe impunham, Juscelino não usava subterfúgios. Arrostava-as com firmeza e habilidade, não hesitando em mostrar o seu verdadeiro jogo, que era o de promover o real desenvolvimento do País.

Propor e quantificar metas e não apenas lançar palavras, promessas e ações de marketing político; prever prazos para executá-las também foram decorrência da personalidade de JK!

No famoso pronunciamento que fez no dia 2 de fevereiro de 1960, em cadeia nacional de rádio e tevê, respondeu às críticas sobre a construção de Brasília e de inúmeras outras obras.

Obras de infra-estrutura que implantou de norte a sul e de leste a oeste no Brasil. Em vez de arenga e discurso vazio, apresentou dados concretos e números reais. E destacou exatamente que seu Governo introduzira uma nova prática no País: “a de planejar grandes obras de infra-estrutura e de executá-las em prazos certos”.

Bons tempos aqueles, comparados com os atuais, em que não há obras e tampouco prazos, não só para concluí-las, mas até mesmo para iniciá-las!

Para que tantas realizações resultassem do Governo de JK, precisou-se que cada dia fosse um dia de trabalho duro e operoso.

Ao passar a faixa presidencial a seu sucessor e adversário, num ambiente de absoluta normalidade democrática, Juscelino mostrou uma nova realidade do País.

Este novo Brasil já se evidenciava no início do seu Governo e levou o Cardeal Dom Carlos Carmelo de Vasconcelos Mota a proferir, em 3 de maio de 1957 - no sermão da primeira missa rezada no canteiro de obras de Brasília -, que a construção de Brasília e a obra administrativa do Governo configuravam “o acontecimento máximo depois do Ipiranga”.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, senhoras e senhores, a comparação feita pelo memorável cardeal brasileiro não exagerava. Articulada com a construção da nova Capital e, dentro do Plano de Metas, houve realizações notáveis em todos os setores, conforme Juscelino relata em sua autobiografia.

Rodovias que passaram a rasgar a imensidão continental brasileira, unindo pontos extremos de norte a sul e de leste a oeste.

Brasília tornou-se “núcleo irradiador do processo desenvolvimentista” e centro dos braços de milhares de quilômetros que passariam a formar um grande cruzeiro rodoviário. Assim, Brasília a Belém, a Fortaleza, ao Acre, a Belo Horizonte, a São Paulo, ao Rio de Janeiro.

JK construiu 18 mil quilômetros de rodovias - quase a mesma quilometragem da malha federal que havia até então - dos quais asfaltou 5 mil quilômetros. Hoje, luto para conseguir asfaltar 40 quilômetros da BR-040 no sentido Belo Horizonte/Brasília.

Na malha ferroviária, Juscelino acrescentou 1.800 quilômetros de linhas. Outro dia, disseram que Juscelino havia abandonado as ferrovias. Não é verdade. Juscelino deu, sim, prioridade às rodovias, que eram o meio mais rápido de chegar, mas construiu inclusive o acesso ferroviário a Brasília.

No setor de energia, os 3 milhões de quilowatts que existiam no Brasil, no início do seu Governo, quase dobraram. A produção de petróleo multiplicou doze vezes os 6 mil barris que eram extraídos.

Na siderurgia, projetou a expansão para 3,5 milhão de toneladas de aço até 1965.

Na mineração, somente a Companhia Vale do Rio Doce mais que dobrou sua exportação.

Sr. Presidente, caminho para o encerramento do meu discurso.

Também em outras áreas os resultados grandiosos traduziram-se em números reais - é bom frisar. A capacidade de armazenamento da produção agrícola saltou de 85 mil toneladas para 600 mil. Em julho de 1960, saía da fábrica o primeiro trator produzido no Brasil, e no final daquele ano já se alcançavam 2.500 unidades.

No campo institucional, não foi menor o progresso: na educação, o Governo superou a aplicação de 10% da receita orçamentária então estabelecida pela Constituição Federal.

Os problemas sociais e econômicos crônicos do Nordeste ganharam a criação da Sudene, como instrumento de solução efetiva e planejada.

Como se vê, não foi apenas Brasília que se tornara “a mais movimentada frente de trabalho do mundo”, já no início de 1958 - portanto, apenas dois anos do início do Governo. Foi o Brasil inteiro que se engajou como nunca fora visto, num processo planejado, amplo e integrado de construção e desenvolvimento na grande nação.

Aos 45 anos de idade, Brasília é hoje uma grande metrópole com mais de dois milhões de habitantes, milhares deles do meu Estado, Minas Gerais. Apesar dos muitos contrastes sociais, comuns a todo o País, Brasília é uma cidade moderna, que mostra o novo Brasil, um Brasil com melhor distribuição populacional, um Brasil de esperança e de paz.

Muito obrigado.(Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/04/2005 - Página 9915