Discurso durante a 44ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Implicações decorrentes da aprovação da reserva indígena Raposa/Serra do Sol.

Autor
Augusto Botelho (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RR)
Nome completo: Augusto Affonso Botelho Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • Implicações decorrentes da aprovação da reserva indígena Raposa/Serra do Sol.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 21/04/2005 - Página 10030
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • ESCLARECIMENTOS, IMPETRAÇÃO, AÇÃO POPULAR, OPOSIÇÃO, PORTARIA, HOMOLOGAÇÃO, RESERVA INDIGENA, MOTIVO, IRREGULARIDADE, FORMA, DEMARCAÇÃO, EXCLUSIVIDADE, INCLUSÃO, SEDE, MUNICIPIO, UIRAMUTÃ (RR), ESTADO DE RORAIMA (RR), FIXAÇÃO, PRAZO, EXPULSÃO, POPULAÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, PRODUTOR, ARROZ, PROVOCAÇÃO, DESEMPREGO.
  • RECLAMAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESRESPEITO, DIREITOS, POPULAÇÃO, ESTADO DE RORAIMA (RR).
  • EXPECTATIVA, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), DECISÃO, ACOLHIMENTO, AÇÃO POPULAR, OPOSIÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, HOMOLOGAÇÃO, RESERVA INDIGENA, ESTADO DE RORAIMA (RR), MOTIVO, PREJUIZO, ECONOMIA, AMBITO ESTADUAL.

O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Efraim Morais, Srªs e Srs. Senadores, falo neste momento somente para fazer um comunicado sobre um fato que está ocorrendo neste momento, no meu Estado.

Nós, o povo de Roraima, vínhamos sofrendo humilhações, sendo violentados em nossos direitos, sendo injustiçados pelo Governo Central deste País. Quando o Presidente Lula foi eleito, pensei que iria haver justiça para os pequenos. Porque o meu Estado é o que possui mais áreas indígenas. Quase 51% da nossa área já é território indígena. E na Raposa/Serra do Sol - área onde teve início a civilização do meu Estado, com o advento da pecuária - as pessoas, nesses 30 anos, estão sendo colocadas para fora de suas áreas com a promessa de serem reassentadas em outros locais e indenizadas. As pessoas foram citadas nominalmente - por exemplo, “fazendeiro José da Silva, 1,5 mil hectares” - para serem reassentadas, o que até hoje não ocorreu.

Diz a imprensa que a portaria e sua recente homologação - contra as quais impetrei ação popular com pedido de efeito suspensivo liminar - deixaram de fora as áreas de fronteira, mas nenhum desses textos legais diz isso. A portaria refere-se apenas à área do quartel de Uiramutã, que não chega nem a dois hectares. Isso nos leva a crer que a informação da imprensa não é a mais correta.

A imprensa também afirma que o meu Estado será compensado com 10 mil pequenas propriedades de 100 hectares destinadas a reassentamentos. Isso já deveria ter sido feito, porque a maioria dessas pessoas já estão nessas propriedades há mais de 30 anos. O Governo Federal nunca regulamentou a situação dos pequenos proprietários do meu Estado.

Por esse motivo venho aqui reclamar e esclarecer que impetrei uma ação popular contra a portaria de homologação da Raposa/Serra do Sol, pela forma como foi feita. Já esteve em meu Estado uma comissão desta Casa, que ouviu as pessoas e concluiu que a portaria não poderia ter sido feita dessa forma pelo Ministério da Justiça e homologada pelo Presidente Lula.

Recebemos também a visita de uma comissão da Câmara dos Deputados, que igualmente concordou com a posição do Estado de Roraima e dos indígenas da região. A maioria dos indígenas que habitam a Raposa/Serra do Sol são contra a homologação da forma como está sendo feita. Lá existem quatro vilas. E a homologação atual somente incluiu a sede do Município de Uiramutã.

            O último parágrafo do referido texto legal diz que serão expulsas, no prazo de um ano, as pessoas que não são índias e que lá moram. Pergunto ao Presidente Lula e ao Ministro da Justiça: para onde vão as pessoas que são casadas com indígenas e que já têm até netos na região da Vila do Mutum, do Socó, da Água Fria e da Vila Pereira? Como essas pessoas vão viver? Elas são pobres e as casas delas, se indenizadas, não valeriam nem R$10 mil, não dando para comprar nem um terreno na cidade de Boa Vista. No interior, um cunhado ou um primo ajudam, um irmão ajuda o outro; quando um não tem farinha, o outro tem; quando uma pessoa pega mais peixes, ela divide com a família. Então, são pessoas pobres que vivem da mesma forma que os indígenas da região. Elas não vão agredir em nada a cultura dos índios.

            Nós, os Parlamentares e o povo de Roraima, nunca fomos ouvidos.

            Os indígenas lá vivem em condições análogas à dessa população que será expulsa, no prazo de um ano, se vigorar essa homologação na forma como foi feita. Entretanto, acredito em Deus, principalmente, e que a justiça será feita.

Houve uma outra questão que, para mim, não é ética. No dia 14, tudo o que tínhamos conseguido na Justiça até então foi anulado, porque o foro não deveria ser o Superior Tribunal de Justiça e, sim, o Supremo Tribunal Federal. Então, perderam efeito todas as liminares conseguidas pelo Estado e pelas pessoas. Até mesmo a portaria antiga, que já estava suspensa, voltou a vigorar. No dia 15, o Ministério da Justiça elabora uma outra portaria, anula a portaria antiga, e a área é homologada. Ou seja, não tivemos direito de defesa; foi cerceado o direito de defesa do povo de Roraima.

Estou vindo aqui reclamar com o Presidente Lula. Sua Excelência tem de conceder esse direito, porque votamos nele e o elegemos para a Presidência. Realmente, não representamos muitos votos neste País. O Estado possui 340 mil habitantes, não pesamos realmente na decisão das eleições presidenciais. Porém, somos um Estado do Brasil, e a Constituição nos deu direito à terra, que até hoje não foi transferida.

Há pouco, ouvi o Senador Pedro Simon fazendo uma prece, falando da ditadura, do direito de ir e vir, do direito cerceado. Atualmente, em Roraima, estamos sem o direito de ir e vir. Os ônibus em que se pretendiam levar as comunidades que queriam participar da manifestação que está ocorrendo agora no meu Estado foram impedidos de sair da cidade pela Polícia Federal. Ontem foram presos carros que estavam com tratores dos produtores rurais.

Portanto, estou aqui para dizer que vamos lutar na Justiça até o último instante para tentar manter os seis mil empregos diretos e indiretos que tendem a acabar dentro de um ano. Quando expulsarem os produtores de arroz que ocupam as áreas limítrofes - eles não estão no meio da área indígena, estão na borda, não ocupam nem 0,2% do terreno - perderemos seis mil empregos. Isso equivaleria, em um Estado como São Paulo, a quase 400 mil empregos; em uma cidade de dois milhões de habitantes, a 34 mil empregos.

Sabemos que este País está com deficiência de emprego. Os dez milhões de empregos que sonhavam dar não apareceram. Os trabalhadores não têm esses dez milhões de empregos. E lá no meu Estado ainda vão acabar com seis mil empregos.

Não sei como ficará a situação. Espero não haja violência. Peço às pessoas que participam da manifestação que não tomem atitudes violentas. Temos paciência, pois estamos há trinta anos esperando pela justiça, que, um dia, chegará.

Concedo, com prazer, um aparte ao Senador Paulo Paim.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Augusto Botelho, estava no meu gabinete e assisti ao fim do pronunciamento do nobre Senador Geraldo Mesquita Júnior e também ao aparte de V. Exª. Faço este aparte, primeiramente, para cumprimentá-lo pelo seu pronunciamento, em que demonstra preocupação com o desemprego. Além disso, quero, de público, registrar a minha solidariedade ao Senador Geraldo Mesquita Júnior. Sem sombra de dúvida, S. Exª é um Senador comprometido com as causas populares. Acompanhou-nos naquele voto histórico da questão do salário mínimo e no debate que fizemos nesta Casa sobre a reforma da Previdência e ajudou a montar a PEC paralela. Quero dizer a V. Exª, Senador Geraldo Mesquita Júnior, que tenho muito orgulho de trabalhar ao seu lado. Conheço a sua história antes de V. Exª chegar ao Senado da República. Se me permitir, ressalto um episódio ocorrido com um amigo que temos em comum, que é um dos diretores do Diap. Logo que aqui chegava e falava um pouco da minha caminhada e sobre como cheguei ao Senado, sem estrutura econômica alguma, ele disse: “Você não ganhou do Geraldo Mesquita Júnior”. Sabe onde ficava o comitê de S. Exª? Certa oportunidade, um amigo queria dialogar com o Senador e eu disse: “Procure o Geraldo no comitê”. O comitê era o seu celular. E assim conseguiu chegar aqui. Então, Senador Geraldo Mesquita, tenha certeza absoluta de que sua história é bonita. Meu depoimento é de total solidariedade a V. Exª, porque sei da sua caminhada e do seu compromisso efetivamente com os mais pobres deste País, sem deixar de dialogar com todos os setores. Mantenha a cabeça erguida, olhando sempre em frente. Certamente, no Senado Federal, há colegas que pensam como V. Exª. Sem sombra de dúvida, se houver qualquer PEC sobre essa questão do nepotismo, todos nós assinaremos - e tenho a certeza de que V. Exª será o primeiro. V. Exª está muito machucado e com razão, mas saiba que o povo do seu Estado continuará tendo o maior orgulho por suas posições. O que mostra a prática de homem público não é apenas o discurso - o que, às vezes, é até fácil para qualquer um de nós, acostumados a falar em palanques e em grandes debates, tanto no Plenário quanto nas Comissões - mas, sim, o voto no dia-a-dia. E V. Exª, com certeza absoluta, sempre votou e continuará votando - tenho a ousadia de prever seus votos - ao lado do nosso povo, da nossa gente, daqueles que mais precisam. É o que escreve a sua história. Por isso, tenho orgulho de ser seu colega neste Parlamento, Senador Geraldo Mesquita. Muito obrigado, Senador Augusto Botelho.

O SR. AUGUSTO BOTELHO (PDT - RR) - Agradeço a V. Exª.

O povo de Roraima está, há 30 anos, sofrendo humilhações e violações. Seus direitos não estão sendo respeitados. Quando o Presidente Lula foi eleito, pensávamos que essa situação fosse modificar-se, mas, agora, as esperanças, também em Roraima, estão começando a minguar.

Espero que o Supremo Tribunal Federal acate a ação popular ou, então, reveja essa posição. Não podemos extinguir seis mil empregos em um Estado que não dispõe de empregos. A principal atividade econômica do meu Estado, depois do FPM - que não é uma atividade econômica, mas o rendimento do meu Estado -, é a cultura de arroz irrigado; e essa cultura vai ser morta, vai ser violentada. Os nossos produtores já têm ofertas para ir para a Venezuela ou para a Guiana. Se forem humilhados mais uma vez e expulsos de seus lugares, irão para esses países, e vamos simplesmente passar a importar arroz da Venezuela e da Guiana. Os pobres do meu Estado, que comem arroz três quartos, que custa R$0,30 a R$0,50 o quilo nas máquinas de arroz ou nos revendedores, não vão ter mais esse arroz para comer. O responsável por isso será o Presidente Lula, se mantiver a homologação da forma como está fazendo.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/04/2005 - Página 10030