Discurso durante a 45ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentário sobre a substituição do Papa João Paulo II pelo Cardeal Joseph Ratzinger.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. IGREJA CATOLICA.:
  • Comentário sobre a substituição do Papa João Paulo II pelo Cardeal Joseph Ratzinger.
Aparteantes
Marco Maciel.
Publicação
Publicação no DSF de 26/04/2005 - Página 10098
Assunto
Outros > HOMENAGEM. IGREJA CATOLICA.
Indexação
  • HOMENAGEM, IGREJA CATOLICA, ESCOLHA, BENTO XVI, PAPA, ELOGIO, PRONUNCIAMENTO, DEFESA, PAZ, JUSTIÇA SOCIAL, ABERTURA, COLABORAÇÃO, BISPO.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, assisti, desde a morte de João Paulo II, à caminhada e ao esforço feito no Vaticano para a escolha do seu sucessor.

Trata-se de um momento bonito da Igreja. Independentemente dos católicos, dos cristãos, o mundo acompanha esse momento por se tratar de uma escolha que define os rumos de um grupo importante da humanidade, grupo formado por mais de um bilhão de pessoas.

Vi a chegada dos Cardeais. Vi a beleza da despedida feita a João Paulo II, um homem que, muito além da sua religião, foi um cidadão do mundo, e o mundo lhe prestou homenagens, porque ele pregava o amor, pregava a paz, pregava a liberdade, pregava a unidade, principalmente aos mais pobres e aos mais humildes. E vi a angústia e a preocupação de quem seria o seu sucessor.

A escolha foi rápida, uma das mais rápidas que já houve. Foi escolhido um cardeal, se não me engano, o segundo mais velho, 78 anos, alguém que estava há mais de 20 anos no cargo mais difícil e, atrevo-me a dizer, mais antipático que pode existir em uma instituição: o de julgar. Deus já disse: “Não julgueis para não serdes julgados. Com a mesma força que julgares havereis de ser julgados”.

Se há uma profissão que nunca pensei em ser é a de juiz porque não teria condições de fazê-lo, e a minha índole é mais a de perdoar do que fazer justiça e impor o que deve ser feito. O seu cargo era difícil, muito difícil, e foi exercido por um longo período, muito longo. E o Cardeal, pelo seu estilo e comentários, era um homem simpático, com uma extraordinária cultura, principalmente teológica, mas, quando se dirigiam a ele, era pessoa simples e encabulada.

Escolhido, eu não vim a esta tribuna. Fiquei esperando, porque não esperava que fosse ele quem ganhasse. E as críticas, acho que até exageradas, de alguns brasileiros, críticas inclusive ásperas, infelizes digo eu, fizeram-me ficar precavido e aguardar o modo como ele iria iniciar seu pontificado. É interessante salientar que o sermão que ele fez em homenagem a João Paulo II, na missa de corpo presente daquele Papa, pregando idéias firmes de uma igreja agarrada a princípios, foi um pronunciamento muito diferente do que ele fez ontem. Levantei-me às cinco horas da manhã para assistir. Na verdade, o que alguns diziam, entre os quais o Senador Marco Maciel, creio que começou a acontecer. O Papa Bento XVI fez o seu primeiro discurso, o primeiro como Papa, muito diferente dos que tinha feito anteriormente. Parecia outra pessoa. E, verdadeiramente, era uma outra pessoa. Uma coisa é alguém estar ali para julgar, com a responsabilidade de julgar, durante 20 anos, fechado na sua cúpula e vendo o mundo lá longe. Outra coisa é o homem ser Papa e olhar para o mundo, principalmente para os que mais precisam, os mais humildes. O Papa não tem obrigação de julgar, nem de decidir, mas de olhar para o contexto da humanidade. E ele fez o seu pronunciamento. “Não me perguntem o meu programa, nem o meu pensamento. O meu pensamento é o pensamento do povo, dos meus bispos. Eu quero ouvir o pensamento dos que estão em roda de mim. Não me abandonem!” - disse ele numa reunião inédita, pois, pela primeira vez, um Papa, eleito, se reúne fechado com todos os cardeais, os que o elegeram e os que não o elegeram por terem mais de 80 anos, e pediu-lhes com piedade: “Venham falar comigo! Venham colaborar! Venham dizer o que pensam! Eu preciso de vocês!” E o que dizia Dom Cláudio Hummes aconteceu: o desejo de encontrar uma Igreja mais aberta, onde os bispos tenham mais presença e ela seja mais universal.

Eu creio nas forças do Espírito Santo e creio que essas forças agem, e estão agindo, no sentido de que aquele homem, naquela idade, assim como João XXIII, colocado numa transição, foi o Papa mais revolucionário dos últimos tempos, convocando o Concílio Vaticano II e fazendo as maiores transformações que tivemos na história da Igreja moderna. Eu confio que esse Papa vai seguir o caminho, como disse ontem: “Vou falar com os meus irmãos de todas as religiões, inclusive os judeus. Vou falar com aqueles que acreditam em Deus e com aqueles que não acreditam. Vou falar com toda a humanidade e vou dialogar com todos em seu conjunto”.

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Com o maior prazer.

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE. Com revisão do orador.) - Nobre Senador Pedro Simon, estou ouvindo, como toda a Casa, com muita atenção, o discurso de V. Exª. E V. Exª fertiliza a discussão que se abriu a partir da eleição do Papa Bento XVI. Eu começaria o meu breve aparte chamando a atenção para o fato de que V. Exª tem inteira razão. É que partimos do pressuposto de que o conclave que escolhe um Papa não é dominado, como nos conclaves políticos, em nossas convenções, por temas mundanos, terrenos, circunstanciais, efêmeros muitas vezes, e sim que um conclave dessa natureza se reúne sob a inspiração do Espírito Santo e, portanto, há uma variável, que não é humana, que interfere na escolha de um Papa, a quem incumbe o papel de continuar a pregação de Pedro, ou seja, de ocupar a cadeira Petrina e não somente...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE) - ...anunciar o Evangelho, mas também dialogar com outras confissões religiosas. João Paulo II nisso foi um Papa que teve presente essa preocupação, com a “inculturação” da fé, com o diálogo inter-religioso e com o convívio ecumênico. Foi o primeiro Papa a visitar uma mesquita, a estar com os muçulmanos; foi o primeiro Papa a ir a uma sinagoga conversar com os rabinos, os judeus - a quem ele chamava “os irmãos mais velhos na fé”. Esteve com a Igreja Anglicana e procurou estar com a Igreja Ortodoxa russa. Se isso não foi possível não foi porque ele não quisesse e, sim, por dificuldades que, na ocasião, foram oferecidas pelo próprio patriarca russo. Por fim, devo dizer que o seu sucessor, o hoje Papa Bento XVI, além de ter sido um operoso e diligente auxiliar de João Paulo II, é também um grande teólogo, o que está demonstrado em exposições que fez ao longo do tempo em que ocupou um dicastério extremamente importante, a Congregação para a Doutrina da Fé; provou ser pessoa extremamente dotada, tendo inspirado João Paulo II em algumas de suas encíclicas mais relevantes, como por exemplo, Fides et Ratio, ou Fé e Razão. Nessa encíclica, de alguma forma, mostra que entre fé e ciência não há nada de instransponível, pelo contrário. Se alguém desejar apontar alguma contradição, essa será falsa contradição. Além disso, o Papa Bento XVI é, como era também o Papa João Paulo II, uma pessoa extremamente simples e humilde. Embora fosse dos mais cultos dos cardeais da Igreja, não se jactava disso. Daí por que não me surpreende que esteja agora, como salienta V. Exª, conduzindo-se muito bem e, de alguma forma, fazendo com que se renovem as esperanças, já que a Barca de Pedro está em boas mãos e, conseqüentemente, podemos esperar um excelente pontificado.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Agradeço muito o aparte de V. Exª e digo que, se às cinco horas da madrugada, com angústia, acompanhei aquela missa, às nove horas, era com emoção, quase com lágrimas, que via o encerramento. Primeiro, o seu pronunciamento, trinta vezes aparteado com emoção, e depois o fato de ele andar, com seu carro aberto, ao lado daquelas 400 mil pessoas deixaram-me uma mensagem de esperança. A divisão entre a Igreja voltada internamente para seus pensamentos, seus sentimentos, seus dogmas e a Igreja voltada para o povo, para o social não pode ser colocada assim: essa ou aquela.

Creio que exatamente aquele que estava no lugar mais difícil e fechado da Igreja, como Cardeal, vem agora como Papa e fará completamente diferente do que fez como Cardeal. Agora, Sua Santidade olhará para a humanidade, por todos, para os jovens e para os problemas e dramas que vive a humanidade; até para os problemas dos não-casados, para a questão dos nascimentos e tudo mais. É um Papa que estará debatendo e discutindo.

O Cardeal de São Paulo desconfia que Sua Santidade convocará o Vaticano III. Para Sua Eminência dizer isso, deve ter sentido algo nessa direção, ou seja, que seria importantíssimo, em uma hora tão duvidosa, tão negra na humanidade, em termos de princípios, de valores, de globalização, dos caminhos para onde se vai, se a Igreja fizesse uma reunião dessas para a sua profunda meditação.

Eu não sou ingênuo, nem tenho autoridade para dizer aqui o que vai ser, como vai ser. Mas tenho autoridade e sentimento para dizer que o primeiro passo, o primeiro dia, as primeiras medidas demonstram que não era aquilo que alguns que pertenceram à Igreja e hoje não pertencem mais afirmaram. Eles foram, na minha opinião, exageradamente ásperos, de uma falta de caridade, na análise de um homem que estava começando.

Creio que o início foi positivo. Que Sua Santidade, numa hora em que talvez o vazio esteja tão grande, possa ocupar esse lugar; que possa ser o mentor que dialogue com o mundo e busque o entendimento entre todos.

Que bom que o início tenha sido assim! E que nós todos possamos esperar, rezar e até torcer para que esse Papa, ao contrário do que alguns pensam, traga posições importantes para sua Igreja, para seu povo e para a humanidade.

Acho que a hora é difícil, triste, dura, com incógnitas enormes, interrogações permanentes, fome, miséria. Creio que a Igreja Católica tem condições e a obrigação de atuar no sentido de fazer efetivamente o que prega a sua fé, o que pregam os nossos princípios e a nossa doutrina. Uma Igreja de paz, de amor, voltada para todos, principalmente para os que mais necessitam.

Que Deus e que o Espírito Santo sejam, realmente, os grandes conselheiros e estejam ali a orientar e a determinar as decisões importantes que Sua Santidade haverá de ter nos próximos dias e no seu papado. Que Deus o abençoe e a todos nós.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/04/2005 - Página 10098