Discurso durante a 42ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Debate sobre a criação do cargo de senador vitalício. (como Líder)

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO.:
  • Debate sobre a criação do cargo de senador vitalício. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 21/04/2005 - Página 10044
Assunto
Outros > SENADO.
Indexação
  • ELOGIO, PARTICIPAÇÃO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, VIAGEM, FUNERAL, PAPA, DEMONSTRAÇÃO, DEMOCRACIA, TOLERANCIA, DIFERENÇA.
  • NECESSIDADE, DISCUSSÃO, VITALICIEDADE, CARGO ELETIVO, SENADOR, AMPLIAÇÃO, EXPERIENCIA, DEBATE, AUSENCIA, DIREITOS, VOTO, COMENTARIO, SITUAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, APROVEITAMENTO, EXPERIENCIA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONTRIBUIÇÃO, PAIS.
  • DEBATE, APOSENTADORIA, CARGO ELETIVO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, AUXILIO, ASSESSORIA JURIDICA, DEMONSTRAÇÃO, SUPERIORIDADE, DEMOCRACIA, VALORIZAÇÃO, POLITICO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 20/40/2005


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DISCURSO PROFERIDO PELO SR. SENADOR ALOIZIO MERCADANTE NA SESSÃO DO DIA 19 DE ABRIL DE 2005, QUE, RETIRADO PARA REVISÃO PELO ORADOR, ORA SE PUBLICA.

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O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Como Líder. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, subo a esta tribuna, para discutir o tema do Senador vitalício, uma proposta antiga do então Deputado Arthur Virgílio, que, apresentada, à época, na Câmara dos Deputados, foi alvo de uma polêmica bastante forte e acabou não tendo progressão.

Há cerca de dois meses, quando almoçamos e falamos sobre a pauta do Congresso Nacional e os desafios do futuro, S. Exª relembrou essa matéria, e eu disse que achava que deveríamos sentar e refletir sobre ela. Isso ficou meio perdido até a viagem que fiz junto com o Presidente Lula, os ex-Presidentes José Sarney e Fernando Henrique Cardoso, o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, e os Presidentes Renan Calheiros e Severino Cavalcanti.

Aquele avião tinha um simbolismo muito especial: o Brasil se fazia representar, nos funerais do Papa João Paulo II, por uma dimensão única - eu diria - na história recente. Estavam juntos o Presidente, dois ex-Presidentes e mais o ex-Presidente Itamar Franco. Portanto, todos os Presidente do período da transição democrática e do período democrático da história do Brasil estavam presentes, dando uma dimensão de amadurecimento democrático do País, de espírito público, de grandeza, de capacidade de conviver com a diferença.

Esse foi um gesto muito forte, que poucas nações poderiam ter, tanto que ouvi, de viva voz, o Presidente Jacques Chirac afirmar que estava impressionado, ao ver juntos todos aqueles ex-Presidentes e que a França não poderia ter um momento como aquele.

Ouvi do ex-Primeiro-Ministro Durão Barroso, hoje Presidente da União Européia, meu amigo, a mesma expressão, quando nos encontrou. Ele se referiu à beleza da atitude da Nação brasileira, do Estado brasileiro, de reunir todos aqueles ex-Presidentes e o atual Chefe de Estado numa cerimônia, como seus representantes.

Acho que esse sentimento me fez pensar na necessidade de encontrarmos uma solução institucional para o assunto que abordo. Ao contrário daqueles que apequenam esse debate, dizendo que se trata de uma tentativa de acomodar um problema ou outro, penso que se trata de pensar uma solução da democracia brasileira, uma solução institucional de largo prazo. Isso seria dar uma estatura e um lugar para os ex-Presidentes, que a história deveria preservar.

Se analisarmos, por exemplo, a democracia americana, verificaremos que esse debate foi feito nos anos 40. Roosevelt foi eleito em 1932, 1936, 1940 e 1944, em quatro mandatos sucessivos, e morreu no início do último. Com sua morte, Truman assume a Presidência da República. Naquela ocasião, eles votaram uma emenda constitucional, restringindo o direito a apenas uma reeleição, depois da qual o Presidente da República não poderia disputar mais eleições.

É assim na Itália, para onde estávamos indo. Por sinal, a dimensão de Senador vitalício existe exatamente naquele país e não apenas para ex-presidentes. No caso italiano, essa dimensão foi dada, por exemplo, a Norberto Bobbio, que era um grande jurista, um grande filósofo, que produziu grandes textos sobre a teoria política e foi homenageado com esse honroso cargo na democracia italiana.

Tendo seus representantes estado na Itália e vivido uma experiência como essa, o Brasil deu uma demonstração de grandeza, de espírito público, de Nação, de Estado. Por que, então, não se abrir esse debate no País?

Não procede a tese de que essa representação seria ilegítima do ponto de vista do processo decisório do Senado Federal, porque ninguém pretende alterar o princípio do pacto federativo de três Senadores por Estado. Esses Senadores não teriam direito a voto, mas um espaço republicano institucional e permanente, para trazer sua contribuição como ex-Presidentes da República, sobretudo em debates sobre o Plano Plurianual, sobre políticas de reforma de Estado, sobre mudanças institucionais, em que essa experiência, essa vivência poderia ajudar significativamente.

Por tudo isso, espero que esse debate continue com maturidade. Estamos vivendo o início de um processo democrático, quando comparados com outras nações; a democracia aqui ainda é um processo recente. Quero dizer que estou de acordo com Senador Arthur Virgílio em não apresentar a proposta, porque só tem sentido fazê-lo, se houver uma convergência política entre os principais Partidos, os mais representativos, para um debate com a estatura deste que está sendo proposto. Aqui não se pretende resolver problemas conjunturais; o que se busca é construir uma saída institucional e duradoura para a democracia brasileira.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Tenho pouco tempo, Senador Eduardo Suplicy.

A Espanha acabou de fazer uma reforma constitucional, instituindo a participação permanente dos ex-presidentes no Conselho da República. No caso da Espanha, o Conselho da República tem uma função institucional relevante, mas essa não é a nossa experiência democrática.

Ex-Presidentes no Brasil não têm sequer uma aposentadoria, uma fonte de remuneração. Pergunto: estamos fazendo quarentena para juiz e para diretor do Banco Central, e o Presidente da República não a terá? Então, estamos criando artificialismo, no caso daqueles que, com sua integridade, deixam a Presidência da República?

Pergunto se o Presidente José Sarney não engrandeceu esta Casa no debate político institucional; se não soube preservar seu papel de ex-Presidente da República em todos os momentos e em todos os debates.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - E estendo este elogio ao Senador Marco Maciel, que se tem comportado aqui com a condição de quem foi um ex-Presidente da República. Também o Presidente Itamar, na condição de Embaixador da Itália, preserva essa dimensão.

Trata-se, portanto, de uma função permanente, institucional, democrática, a ser dada ao homem que ocupa o mais alto cargo da Nação e que a preside pela maioria do voto do povo, por pelo menos 50 milhões de votos. Que seja preservada essa condição a qualquer que seja o Presidente daqui para frente, que tem a responsabilidade, como Chefe de Estado e de Governo, de dirigir uma nação de 180 milhões de pessoas, com um orçamento de R$400 bilhões.

Entendo que alguns têm uma visão diferente. O que não posso aceitar é apequenar esse debate. Acho que ele tem de ser feito com qualidade, tranqüilidade, profundidade. E não deve haver nenhuma iniciativa, se não houver acordo entre as grandes nações. Isso só tem sentido, se for uma atitude suprapartidária, uma solução de Estado, uma solução democrática.

Na América Latina, não existe esse mecanismo. O que temos visto, com recorrência, é a instabilidade política permanente: nos últimos doze anos, quinze chefes de Estado não terminaram seu mandato no continente. Se queremos pensar a democracia como um processo maduro, equacionado, duradouro, temos que aprimorar as instituições. E não é possível, numa sociedade democrática, com a importância que tem a sociedade brasileira, não pensarmos o dia seguinte de um Chefe de Estado. Ele deve ter um lugar na República, um lugar privilegiado, um espaço institucional; deve ter, inclusive, condições de defesa jurídica. Alguns respondem a 200 processos, quando saem, e a República sequer lhes garante assessoria jurídica. Portanto é um debate de alta qualidade...

(Interrupção do som.)

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - ... espero que possamos preservar a qualidade dessa discussão.

Senador Eduardo Azeredo, ouço V. Exª.

O SR. PRESIDENTE (Tião Viana. Bloco/PT - AC) - A Mesa informa ao Senador Aloizio Mercadante que o tempo está esgotado, já com a prorrogação de três minutos, e que há, ainda, cinco Líderes inscritos. Pede, portanto, a colaboração, para o bem da Ordem do Dia, que virá a seguir.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - O meu aparte é apenas para concordar. Quero dizer que a minha posição sempre foi também no sentido de reconhecer a importância da experiência de quem governa um País com 180 milhões de habitantes, como o Brasil. A estranheza do PSDB foi com a forma agressiva - digamos assim - com que o PT reagiu, como se fosse uma questão que o PSDB estivesse inventando. É uma questão do País. Então, quero dizer que estou de acordo. A posição nossa é a de buscar um entendimento nesse sentido.

SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Esclareço que entendo ser uma questão do País, suprapartidária. É democrático divergir. O debate é absolutamente procedente e devemos fazê-lo. Não basta apenas dizer: “Não, esta não é uma boa solução”. Qual é a solução alternativa? Os ex-Presidentes, no dia seguinte, não têm uma aposentadoria, não têm uma fonte de renda, não têm um espaço institucional, e ficamos criando artifícios, como já fizemos no passado, para encontrar um porto institucional para preservar essa condição.

Um ex-Presidente não pode ser tratado como um cidadão qualquer, assim como não o é o juiz, como não o é o Presidente do Banco Central, que tem o princípio da quarentena. E quanto ao Presidente da República?

Entendo que assegurar um lugar aos ex-Chefes de Estado seria um amadurecimento democrático. Vejam, na experiência americana, o papel de Carter, por exemplo, nos direitos humanos e na democracia; na Coréia do Norte ou na Venezuela recentemente. Vejam, por exemplo, na democracia americana, o tsunami, onde estavam Clinton, Bush e outros.

Portanto, fico muito honrado de ter visto o Brasil, nos funerais do Papa, representado por todos os ex-Chefes de Estado. Espero que essa questão seja debatida com tranqüilidade, maturidade e respeito institucional, porque é uma dimensão muito importante da solução democrática.

Concedo um aparte ao Senador Arthur Virgílio.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Sr. Presidente, ia pedir para falar em seguida a título de réplica.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Concedo um aparte ao Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Aloizio Mercadante, considero importante que V. Exª tenha trazido esse assunto com muita seriedade ao debate. Já me manifestei hoje aqui a respeito, mas gostaria de ponderar que a colaboração e a interação do Senado com os ex-Presidentes é um dos aspectos positivos da proposição que V. Exª abraçou. Mas, se, pelos diversos argumentos do debate, a questão de ex-Presidentes se transformarem em Senadores vitalícios não for a mais adequada, há uma alternativa, qual seja, a de institucionalizarmos adequadamente o encontro de ex-Presidentes da República com Senadores, sempre que avaliarmos - ou eles avaliarem - que este é um debate saudável. Poderíamos ter aqui, periodicamente, um diálogo nosso, seja com o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso ou com o Senador Marco Maciel ou com todos os demais.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Senador Eduardo Suplicy, é um pouco mais do que isto. O ex-Presidente Ernesto Geisel, ainda no regime militar, saiu da Presidência e teve que trabalhar na Petroquisa. Não existe nenhuma proteção para um ex-Chefe de Estado no Brasil, nenhuma, sequer uma fonte de renda. Pergunto se é correto continuarmos desta forma. O Presidente Fernando Henrique Cardoso disse para mim: “Tenho 200 processos na Justiça e o Estado brasileiro sequer me dá a Advocacia Geral da União para me defender juridicamente”. É correto continuarmos assim? Porque se não é correto, temos que discutir com profundidade. A democracia precisa assegurar um lugar aos ex-Chefes de Estado, todos eles, um lugar grandioso, um lugar respeitado, um lugar que preserve o princípio da quarentena e incorpore a experiência, a sabedoria e a vivência institucional no debate democrático, qualificado e permanente.

Por isso, entendo que esta é uma discussão necessária e o tamanho dessa discussão é o que está sendo proposto, nem mais, nem menos. Então, não vamos apequenar uma reflexão que precisa ser feita. O Brasil precisa tratar esta questão como outras nações trataram e exatamente por estar na Itália, que tem essa solução, uma solução exitosa, reconhecida e valorizada, imagino que esta possa vir a ser a solução no Brasil. Se não é esta, vamos encontrar uma outra. O que não podemos é fechar os olhos para uma questão absolutamente indispensável que é o tratamento dos ex-Presidentes da República à democracia brasileira.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/04/2005 - Página 10044