Discurso durante a 54ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Necessidade de regulamentação de dispositivos da lei que permite parcerias públicas privadas.

Autor
Valdir Raupp (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Valdir Raupp de Matos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE DESENVOLVIMENTO. POLITICA ENERGETICA.:
  • Necessidade de regulamentação de dispositivos da lei que permite parcerias públicas privadas.
Publicação
Publicação no DSF de 04/05/2005 - Página 13084
Assunto
Outros > POLITICA DE DESENVOLVIMENTO. POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • DEMORA, GOVERNO, DISCUSSÃO, NORMAS, REGULAMENTAÇÃO, LEGISLAÇÃO, PARCERIA, SETOR PUBLICO, INICIATIVA PRIVADA, REGISTRO, REUNIÃO, COMISSÃO TECNICA.
  • ANALISE, POSSIBILIDADE, PARTICIPAÇÃO, EMPRESA ESTATAL, PROJETO, PARCERIA, SETOR PRIVADO.
  • REGISTRO, SITUAÇÃO, SETOR, ENERGIA ELETRICA, AUSENCIA, VIABILIDADE, PARCERIA, SETOR PUBLICO, SETOR PRIVADO, DEFESA, CRIAÇÃO, INCENTIVO, INVESTIMENTO.

O SR. VALDIR RAUPP (PMDB - RO. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, até o presente momento, maio de 2005, muitos dispositivos da lei que permite parcerias público privadas, sob nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, ainda não foram regulamentados. E os questionamentos levantados, que foram discutidos em detalhes por ocasião da aprovação da referida lei, especialmente durante o período de exame de nosso parecer na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, apesar dos nossos esforços, ainda permanecem sem definição detalhada.

Procurarei elucidar as questões levantadas a partir da análise da legislação em vigor e das informações coletadas informalmente junto a técnicos do governo. Cabe notar que somente agora o governo está iniciando a fase de discussão das normas para operacionalização das PPPs. No dia 14 de abril ocorreu a primeira reunião da Comissão Técnica das Parcerias Público-Privadas (CTP), criada pelo Decreto nº 5.385, de 4 de março de 2005, que institui o Comitê Gestor de Parceria Público-Privada (CGP). Essa Comissão é formada por representantes dos Ministérios do Planejamento, Orçamento e Gestão; Fazenda; Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; Transportes; Minas e Energia; Integração Nacional; Meio Ambiente; além da Casa Civil da Presidência da República, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal.

Muitas das perguntas levantadas serão certamente avaliadas por esta comissão, que possui, entre outras, as seguintes competências: propor ao comitê gestor a definição dos serviços prioritários para a execução do regime de PPP e dos critérios para a análise da conveniência e oportunidade de contratação sob esse regime; recomendar a autorização para a abertura de procedimentos licitatórios e a aprovação das minutas de editais e contratos; propor os procedimentos para celebração dos contratos de PPP e analisar suas eventuais modificações; estudar e formular propostas de resoluções e procedimentos de competência do comitê.

De todo modo, a partir da lei, pode-se tirar algumas considerações a respeito da participação das empresas estatais nas PPPs. De acordo com o art. 1º as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios poderão contratar PPP. Assim, as empresas estatais poderão ser a parte contratante de um contrato de PPP.

Segundo nosso entendimento, as empresas estatais também poderão participar dos projetos de PPP como uma das partes executoras do projeto somente nos casos em que se associarem a empresas privadas para constituição de Sociedade de Propósito Específico (SPE), incumbida de implantar e gerir o objeto da parceria. Entretanto, conforme dispõe o § 4º do art. 9º, a empresa estatal não poderá ser titular da maioria do capital votante da SPE.

Se de um lado há essa limitação, por outro, existe a vantagem de que a empresa estatal, em conjunto com o setor privado, poderá obter financiamento no BNDES sem se submeter aos limites previstos para empréstimo ao setor público, uma vez que a SPE será enquadrada como empresa privada e não pública. Como a maioria do capital votante da SPE tem que ser privado, as operações de crédito não estarão sujeitas aos limites e condições instituídos pela Resolução nº 2.827, do Banco Central, que “consolida e redefine as regras para o contingenciamento do crédito ao setor público”.

Os limites a que estão sujeitas as SPEs constituídas para gerir projetos de PPP são os previstos nos arts. 27 e 28 da Lei 11.079, de 2004, quais sejam: a contratação de operações de crédito com empresas públicas ou sociedades de economia mista controladas pela União não poderá exceder a 70% do total das fontes de recursos financeiros da SPE, sendo que para as áreas das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, onde o índice de Desenvolvimento Humano (IDH) seja inferior à média nacional, essa participação poderá chegar a 80%. Quando houver participação de entidades fechadas de previdência complementar, o limite dos recursos para operações de crédito e contribuições de capital provindos destes entes, em conjunto com os provindos das empresas públicas e sociedades de economia mista controladas pela União, será de 80% das fontes de recursos da SPE, podendo chegar a 90% nas áreas das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, onde o IDH seja inferior à média nacional.

Assim, a nosso ver, as empresas de economia mista poderão participar das PPPs como investidoras, desde que associadas a empresas privadas e sem deter o controle da SPE. A vantagem para a empresa estatal será a maior facilidade de acesso aos financiamentos públicos, em especial do BNDES, pois a SPE não estará sujeita às regras de contingenciamento de crédito ao setor público. Por outro lado, cabe destacar que não faria sentido a contratação de PPP com empresas estatais de forma isolada, porque o Estado pode contratá-las diretamente, sem licitação (a chamada concessão imprópria) e conceder o subsídio, quando necessário.

Com relação às perspectivas de aplicação das PPPs no setor elétrico, pode-se dizer que neste setor é pouco provável que sejam firmados contratos baseados nesse nova modalidade, uma vez que quase a totalidade dos projetos do setor é auto-sustentável.

Convém lembrar que o art. 2º da Lei nº 11.079, de 2004, define a PPP como o contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada (concessão de serviços públicos ou de obras públicas quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários, a contraprestação pecuniária do parceiro público ao privado) ou administrativa (contrato de prestação de serviços em que a Administração Pública seja usuário direta ou indireta). O § 3º desse artigo deixa claro que não constitui PPP a concessão comum, entendida como a concessão de serviços ou obras públicas de que trata a Lei nº 8.987, de 1995, quando não envolver contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado.

Como os projetos do setor elétrico não necessitam da complementação pecuniária do setor público à tarifa cobrada do usuário, não se enquadram na definição de PPP. Segundo técnicos do Ministério da Minas e Energia, apenas usinas termoelétrica a gás e a Usina de Angra III seriam projetos deficitários. Entretanto, no momento, considera-se que ainda existam outras alternativas melhores e mais baratas de fontes de energia do que o gás. Em relação a Angra III, como a Constituição Federal, em seu art. 177, confere monopólio à União do enriquecimento e processamento de minerais nucleares, a geração de energia elétrica a partir do urânio não poderia se dar com a participação da iniciativa privada.

Dessa forma, é provável que o setor elétrico continue efetuando suas concessões com base na Lei 8.987, de 1995. A carteira de projetos de PPP para o período 2004-2007, elencada pelo Ministério do Planejamento (disponível no site), enumera 23 projetos passíveis de contratação, nos setores de rodovias, ferrovias, portos, e irrigação, ao custo estimado de R$13 bilhões, não havendo qualquer menção à energia elétrica.

Na prática, diversos projetos do setor elétrico têm sido executados por meio de parcerias, principalmente na área de transmissão, com o respaldo da Lei de Concessões. Entretanto, essas parcerias não prevêem a contrapartida financeira do setor público, ao contrário do modelo de PPP, uma vez que isso não se faz necessário no setor elétrico. O problema maior apontado por técnicos do Ministério das Minas e Energia é o financiamento dos investimentos e a necessidade de garantias nos empréstimos para expansão do setor.

É verdade que o setor elétrico já conta com alguns mecanismos que o diferenciam em relação aos demais, como, por exemplo, o Fundo Reserva Global de Reversão, instituído pelo Decreto nº 41.019, de 1957, e incorporado ao arcabouço legal pela Lei nº 5.655, de 1971 e leis posteriores. Esse fundo, constituído por quotas computadas no custo do serviços das empresas concessionárias e permissionárias do setor elétrico, foi criado para indenizar ativos não totalmente depreciados e/ou amortizados, em razão da retomada da concessão, bem como financiar, com custo baixo, a expansão, manutenção e melhoria do sistema elétrico. Embora o fundo arrecade recursos expressivos (previsão de arrecadação de R$ 1 bilhão em 2005), não tem podido atender plenamente à demanda por financiamentos para expansão do setor elétrico, pois passou a atender outras finalidades, como a compensação pela perda de receita pelas concessionárias distribuidoras em razão da criação do consumidor de baixa renda, além da universalização e do financiamento de programas específicos, como o “Luz para Todos” e o de eletrificação rural.

Assim, talvez haja a necessidade de se criar novos mecanismos voltados especificamente para fomentar os investimentos do setor elétrico, uma vez que o modelo de PPP, em princípio, não se enquadra nas características do setor. Esses mecanismos deveriam equacionar os problemas do setor de funding para financiamentos, redução das taxas de juros nos empréstimos e cobertura das garantias requeridas.

Esperamos que as informações sejam úteis e acho que devemos unir esforços no sentido de estimular o governo a acelerar suas ações no sentido de viabilizar com rapidez as PPP’s. Afinal, já estamos perdendo o primeiro semestre deste ano e o ano que vem é de meio semestre, por causa das eleições e todas suas restrições legais quanto a contratos com o governo.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/05/2005 - Página 13084