Discurso durante a 58ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Insatisfação com a decisão que paralisou os trabalhos do Congresso Nacional, em virtude da Reunião de Cúpula da América do Sul - Países Árabes. Críticas ao modelo político adotado pelo governo Lula.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Insatisfação com a decisão que paralisou os trabalhos do Congresso Nacional, em virtude da Reunião de Cúpula da América do Sul - Países Árabes. Críticas ao modelo político adotado pelo governo Lula.
Aparteantes
Arthur Virgílio, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 10/05/2005 - Página 13814
Assunto
Outros > SENADO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • REGISTRO, CANCELAMENTO, REUNIÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, TERRAS, EFEITO, SUSPENSÃO, SESSÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS.
  • CRITICA, SUSPENSÃO, TRABALHO, CONGRESSO NACIONAL, EFEITO, REALIZAÇÃO, REUNIÃO, REPRESENTANTE, AMERICA DO SUL, PAISES ARABES.
  • COMENTARIO, ENTREVISTA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, PERIODICO, FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS (FGV), ANALISE, PROCESSO, QUEBRA, LEGITIMAÇÃO, PODER PUBLICO, BRASIL, POSSIBILIDADE, CRISE, PAIS.
  • COMPARAÇÃO, SITUAÇÃO, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, AMERICA DO SUL.
  • CRITICA, GESTÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONTRIBUIÇÃO, INICIO, ROMPIMENTO, PROCESSO, LEGITIMAÇÃO, PODER PUBLICO.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), UTILIZAÇÃO, GOVERNO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), CRIAÇÃO, CARGO PUBLICO, DESRESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, primeiramente, comunico que será impossível realizar a reunião da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, no dia de amanhã, porque a Câmara dos Deputados cancelou suas atividades, com precedência ao anúncio feito pelo Senado Federal. Os Parlamentares sequer virão a Brasília hoje e amanhã. Portanto, não teríamos a presença dos Parlamentares da outra Casa do Congresso Nacional na CPMI.

No entanto, os funcionários colocaram-se à disposição para a realização dos trabalhos da reunião da CMPI. De qualquer forma, o nosso agradecimento a eles.

Assim, com a presença do Relator Deputado João Alfredo, estaremos definindo uma nova data para realização da reunião.

Mais uma vez, registro a minha insatisfação pessoal em relação a decisão de paralisar os trabalhos do Congresso Nacional amanhã. Repito: não vejo motivos que justifiquem esse descanso remunerado.

Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, foi muito oportuno o tema que o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso abordou em entrevista concedida à edição de maio da revista Conjuntura Econômica, da Fundação Getúlio Vargas: o início do esgarçamento do processo de “legitimação” do Poder Público no Brasil.

Os acontecimentos demonstram que pode estar em curso um processo de fragmentação da legitimação do Poder Público no Brasil. Essa fragmentação, sem dúvida, como bem apontou o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, poderia conduzir o País a uma crise institucional.

No nosso entorno, temos exemplos que merecem ser analisados, Senador Mão Santa. O processo de fragmentação da Argentina, por exemplo, levou o Presidente De La Rúa a renunciar após 24 meses de governo. Deixou a Casa Rosada sob panelaços e saques a supermercados.

No Peru, o populista Alan Garcia, que antecedeu Alberto Fujimori, deflagrou o processo de fragmentação do Poder Público naquele país, que foi continuado e ampliando no governo de Fujimori, destituído pelo Congresso peruano.

Na Venezuela, o esgarçamento do Poder Público levou Carlos Andrés Pérez a ser destituído.

Na Bolívia, igualmente, o processo de deterioração levou o Presidente Gonzalo Sánches de Lozada a renunciar após 14 meses de gestão.

A crise institucional, nascida na esteira da fragmentação do processo de “legitimação” do poder público no Equador, provocou a queda de Jamil Mahuad após 18 meses de governo, abrindo caminho para a eleição de Lucio Gutiérrez, atualmente exilado no Brasil.

Devemos estar atentos, portanto, à opinião pública, aos anseios da sociedade brasileira em relação a seus representantes no Parlamento brasileiro.

A democracia, a governabilidade e governança não são conquistas consolidadas na América do Sul.

A recente renúncia do Presidente do Equador, Lucio Gutiérrez, foi a décima interrupção de um mandato constitucional nos últimos 16 anos na América do Sul.

Isso significa uma média de um presidente caindo a cada ano e meio na região, com saídas registradas entre 1989 e 2005, em sete dos dez países sul-americanos.

O Congresso Nacional deve ser caixa de ressonância da nossa sociedade.

A gestão do Presidente Lula contribui, em larga escala, para deflagrar o esgarçamento do processo de “legitimação” do poder público.

Como explicar, por exemplo, que a política econômica do Governo é capaz de assegurar ao Bradesco um lucro, no primeiro trimestre de 2005, de R$1,205 bilhão, o dobro do registrado em igual período do ano passado?

Como explicar, Srª Presidente, Srs. Senadores, especialmente para a legião de trabalhadores deste País que depositou confiança de forma absoluta no Presidente Lula de que estava chegando a vez dos trabalhadores do Brasil, que foi um equívoco, pois, na verdade, chegava a vez dos banqueiros do Brasil? Nunca os bancos no nosso País alcançaram lucros tão gigantescos como no Governo Lula.

Como explicar a estimativa do Tesouro e do Banco Central de que a elevação da taxa básica de juros custará R$27 bilhões a mais, em 2005, aos cofres públicos?

O Senador Arthur Virgílio jurou que, se o Ministro José Dirceu vier prestar depoimento nesta Casa, não será cobrado sobre a elevação de taxas de juros e nem será cobrado sobre o caso Waldomiro Diniz*. Seria questionado apenas sobre pontos referentes à privatização da Infraero. Mas, sem dúvida, os Senadores Arthur Virgílio, Leonel Pavan, Mão Santa, outros Senadores de nosso Partido, todos os dias, desta tribuna, cobram do Governo uma postura de ousadia em relação a mudanças necessárias para conter o processo de deterioração da economia popular do nosso País, com o absurdo das elevadas taxas de juros que praticamos, que conferem aos bancos os lucros fantásticos que estão obtendo, na contramão da queda do poder aquisitivo da classe média brasileira, sobretudo os assalariados do nosso País.

Este, sim, é um ponto importante na análise dessa hipótese de esgarçamento do processo institucional no Brasil. Como explicar, por exemplo, que o Governo pretenda negociar pontos cruciais de uma futura reforma política, o fim da verticalização, sem realizar um debate qualificado no Congresso Nacional?

Aponto a reforma política na análise dessa questão levantada pelo ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, ou seja, do esgarçamento do processo de legitimação do poder público no Brasil, porque estamos com o modelo político defasado, o modelo político que se deteriorou, sobretudo na desesperança da população brasileira em dias melhores no nosso País.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Com prazer, Senador Arthur Virgílio. Quando se imaginava que o Presidente Lula seria o líder de uma articulação política para conferir ao País um modelo político compatível com a nossa realidade, o que vemos é o Presidente na contramão da reforma política, aceitando como preço para ter o PMDB possivelmente em uma aliança em 2006 acabar com a verticalização, sem discutir reforma política no Congresso Nacional.

Perdoem-me os adeptos dessa providência. É legítimo pretender acabar com a verticalização. Não quero discutir sequer o mérito. Mas quem defende o fim da verticalização não pode falar em reforma política. Reforma política é exatamente o oposto. Reforma política é a valorização dos partidos políticos, é a constituição de Partidos nacionais...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - ... e não o estabelecimento de uma espécie de samba do crioulo doido, na arquitetura do quadro partidário brasileiro.

Concedo o aparte ao Senador Arthur Virgílio, antes que se esgote o meu tempo.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - O Senador Heráclito Fortes estava lembrando que, quando alguém quiser designar uma figura desonesta, ou seja, alguém que se prestou a fazer o papel de testa-de-ferro de outro, aquilo que a imprensa chama comumente de laranja, segundo aquela cartilha meio cretinazinha, que gastou dinheiro público - não sei nem se não é o caso de entrarmos com uma ação popular para ressarcir os cofres públicos daquilo - agora não se pode porque ofende a fruta. Então, chamar alguém de laranja ofende a fruta; de burro ofende o animal, e assim vamos. Mas, Senador Alvaro Dias, quero retornar a um ponto, que foi citado há uns três minutos, para falar do desencanto.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - De fato o quadro é de velhice. O Governo envelheceu; as promessas estão aí; as realizações são pífias, e o envelhecimento leva, de fato, a um estado de perplexidade, que chega a ser perigoso neste País. Parabéns a V. Exª pela lucidez, pela oportunidade e pela serenidade do discurso que profere nesta tarde.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Arthur Virgílio, que tem liderado a Oposição no Congresso Nacional com muita competência.

Concedo um aparte ao Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Alvaro Dias, seu pronunciamento é muito oportuno. Temos que denunciar que o PT, o núcleo duro, aliás é o José Dirceu mesmo, o maligno, quer instituir aqui um Partido único. Todo mundo sabe que a democracia precisa de Partidos fortes. E o PMDB, na vida contemporânea, Senador Arthur Virgílio, significa isto, a redemocratização, Ulysses encantado no fundo do mar, Teotônio Vilela com câncer e Tancredo Neves se imolando. Cooptar, comprando o Partido?! O Lula seria homem, seria líder, se deixasse o PMDB livre e ganhasse nas urnas. Digo isso, porque ocorreu comigo. Governabilidade é outra coisa. Governei o Piauí e tinha como meu Partido coligado mais forte o PSDB. Eu os liberei e eles participaram com chapa e eu os venci. É assim. O Lula está assassinando o maior partido da democracia e não há democracia sem partidos fortes. Essa é a situação do PMDB; mas parece que, inspirado em Ulysses Guimarães, reagiu o Michel Temer e avançou, e tudo indica que será salvaguardado ao povo brasileiro o direito de ter novas opções e a alternância do poder.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Senador Mão Santa, muito obrigado pelo aparte de V. Exª.

Para concluir, Srª Presidente, eu iria enumerar outros fatos que contribuiriam para que essa preocupação cresça relativamente ao esgarçamento do processo de legitimação do Poder Público no Brasil, a exemplo do que ocorreu em tantos países da América Latina, mas citaria mais um fato: a partidarização da máquina administrativa, em prejuízo da sua eficiência, através da edição de medidas provisórias.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - A Folha de S.Paulo dá destaque ao tema, hoje, e noticia que o Governo criou cerca de 120 mil novos postos de trabalho no setor público por meio de medidas provisórias.

Vejam que estamos admitindo no Congresso Nacional essa afronta à Constituição do País com medidas provisórias que aumentam a despesa pública com a criação de cargos - principalmente comissionados - nos dois anos e alguns meses do Governo Lula. Além da utilização da medida provisória de forma inconveniente e absolutamente inconstitucional, há o despropósito da partidarização da máquina pública, reduzindo ou comprometendo definitivamente a sua eficiência.

Muito obrigado, Srª Presidente, pela condescendência em relação ao tempo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/05/2005 - Página 13814