Discurso durante a 57ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Satisfação com o voto proferido pelo Ministro Celso de Mello a respeito da constituição de comissões parlamentares de inquérito, assegurando o direito da Minoria no Parlamento.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODERES CONSTITUCIONAIS.:
  • Satisfação com o voto proferido pelo Ministro Celso de Mello a respeito da constituição de comissões parlamentares de inquérito, assegurando o direito da Minoria no Parlamento.
Aparteantes
Arthur Virgílio, Heráclito Fortes.
Publicação
Publicação no DSF de 07/05/2005 - Página 13650
Assunto
Outros > PODERES CONSTITUCIONAIS.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, VOTO FAVORAVEL, RELATOR, EXPECTATIVA, APROVAÇÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), GARANTIA, DIREITOS, MINORIA, CONGRESSO NACIONAL, UTILIZAÇÃO, INSTRUMENTO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI).
  • GRAVIDADE, AUTORITARISMO, NOTA OFICIAL, LIDER, PARTIDO POLITICO, MAIORIA, MANIPULAÇÃO, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), PROTESTO, INCONSTITUCIONALIDADE, ATUAÇÃO, PRESIDENTE, SENADO, EPOCA, AUSENCIA, INDICAÇÃO, MEMBROS.
  • ELOGIO, ETICA, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, CRIME DO COLARINHO BRANCO.
  • QUESTIONAMENTO, IRREGULARIDADE, PRESIDENTE, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA PREVIDENCIA SOCIAL (MPS), CONFIANÇA, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF).
  • ANALISE, INDEPENDENCIA, PRESIDENTE, CAMARA DOS DEPUTADOS.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Alvaro Dias, prezados Colegas, na quarta-feira, vivemos um dos dias mais significativos na história do Congresso e na história do Poder Judiciário brasileiro. Não me lembro de decisão tão significativa, tão marcante e tão definitiva com relação aos rumos do Congresso brasileiro como foi essa decisão que está no Supremo e que teve o voto do Relator Celso de Mello, um voto de três horas, um voto de profundidade, que acolheu a tese prevista na Constituição, que estabeleceu que um terço dos Parlamentares é número suficiente para constituir uma Comissão Parlamentar de Inquérito.

O Ministro Eros Graus pediu vista, disse que estava disposto a votar de maneira diferente, mas, impressionado com os argumentos do Relator e com a defesa do extraordinário jurista Werner Becker, companheiro do Rio Grande do Sul, deu a entender que votará favoravelmente. Apesar do pedido de vista, fizeram questão de antecipar seus votos os Ministros Marco Aurélio de Mello, Carlos Aires Britto e Sepúlveda Pertence. Um quinto membro do Tribunal, o Ministro Gilmar Mendes, queria fazer o mesmo, mas o Ministro Nelson Jobim pediu-lhe que deixasse para fazê-lo quando do retorno do pedido de revisão.

Essa decisão é muito importante. Tenho dito e repetido que, para analisarmos se há uma democracia plena e se a democracia funciona estritamente em todos os seus contextos, há de se examinar a possibilidade de a minoria estar presente - essa possibilidade é requisito básico para isso. E a maioria das constituições democráticas do mundo traz isso. Não é que um terço vá decidir, não é que um terço vá condenar, não é que um terço vá tomar providências contra a maioria. Não é a ditadura da Minoria. Mas a Minoria, ou seja, um terço, pode constituir e instalar a CPI. Cabe à Maioria, depois, boicotá-la, não deixar convocá-la, não dar quórum e fazer o que bem entender.

Entretanto, o que ocorreu neste Senado é que mais de um terço - um terço equivale a 28 assinaturas, e havia 39 - pediu a constituição da CPI. Esse pedido foi levado ao Presidente, que solicitou aos Líderes que fizessem a indicação dos membros de suas Bancadas. Os Líderes da Maioria, do PT, do PMDB e sei lá eu de mais qual Partido, deram uma nota, a mais trágica que já vi - e tiveram a coragem de escrevê-la, assiná-la e publicá-la -, segundo a qual, a partir dali, para se constituir uma CPI no Senado, só com a concordância dos Líderes da Maioria. E não adianta pedir, não adianta recorrer, não adianta haver 30, 40 assinaturas. Se os Líderes querem, cria-se a CPI; se os Líderes não querem, não se cria a CPI.

Fico impressionado com o fato de um Senador apor a sua assinatura numa nota como essa. Fico impressionado por esses homens, responsáveis pela Liderança, assinarem uma nota fascista, ridícula e incompreensível, que estabelece: “Há CPI quando nós quisermos. Quando não quisermos, não há. Que se dane o texto da Constituição”.

Mais grave do que isso, só o Presidente do Senado que acatou. Mais grave do que isso, só o Presidente do Senado que não quis fazer as nomeações.

O Regimento da Câmara diz que, nas comissões, se os Líderes não indicarem os membros, caberá ao Presidente indicar. O Regimento Comum do Congresso Nacional diz que, não indicando os Líderes, caberá ao Presidente indicar. O Regimento do Senado Federal é omisso, mas tem um artigo que diz que os casos omissos serão resolvidos buscando a simetria com o Regimento Comum e o Regimento da Câmara.

Mas, segundo a análise do voto do Relator, nem importa isso. O que importa é que o Presidente do Senado tinha a obrigação de fazer cumprir a Constituição e instalar a comissão.

O nosso querido Procurador-Geral da República, por quem tenho o maior carinho e o maior respeito - se me perguntarem hoje quem é o homem público mais digno, mais correto, mais sério na história da República, direi que é o atual Procurador-Geral da República -, lamentavelmente ficará no cargo apenas por dois anos e não voltará; ao contrário do seu antecessor, que ficou oito anos e queria voltar - oito anos engavetando requerimentos e processos. O atual Procurador cumpriu seu mandato com uma dignidade extraordinária e não voltará ao cargo. Desde o primeiro dia, quando foi examinado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, disse que só queria ficar no cargo por dois anos. E sempre repetiu isso. Estranho que, mesmo assim, até por gentileza, penso que o Presidente da República e o Ministro da Justiça deveriam convidá-lo para ficar. O que sentimos, no entanto, é que estão doidos para que ele saia; o que sentimos é que o Governo Federal está louco para que ele saia para vir alguém que eles consigam moderar, porque esse eles não moderam; porque esse, na hora de denunciar o Sr. Jader Barbalho, ex-Presidente do Senado, assim o fez; na hora de denunciar o Sr. Antonio Carlos, também assim o fez. O Tribunal não aprovou, mas ele denunciou. Na questão referente ao Presidente do Banco Central virar Ministro, também ele denunciou. O Tribunal analisou diferente, mas ele denunciou.

Nesse caso, no entanto, S. Exª se equivocou, defendendo a tese de que caberia aos Líderes indicarem, e o nosso mandado teria que ser contra os Líderes. Não, teria que ser contra o Presidente. Quem cumpre a ordem de decidir é o Presidente. Quem falhou foi o Presidente, quem não cumpriu a decisão de cumprir a Constituição da República foi o Presidente. E eles determinaram: cabe ao Presidente indicar. Um voto de três horas. Nunca vi um voto tão completo. Nunca vi um voto tão claro. Nunca vi um voto tão preciso. Analisou nos mínimos detalhes, vírgula por vírgula, demoliu argumento por argumento, deixou a nu a posição do Presidente do Senado, qual seja, que ele tem que integrar, que ele tem que fazer valer o texto da Constituição.

Foram quatro os votos. O Ministro Eros Grau, um homem extraordinário, diga-se de passagem, pediu vista, argumentando que vai estudar com mais profundidade. Quero crer - ainda mais o Ministro Gilmar Mendes deixando claro o desejo de abrir o seu voto - que essa questão será aprovada.

E, volto a dizer: na minha opinião, Senador, é a decisão mais importante do Supremo Tribunal Federal envolvendo esta Casa. É o momento mais decisivo. Reparem que nem discutimos, não entramos no detalhe daquela comissão, não entramos com liminar querendo constituir aquela comissão. Despreocupamo-nos daquela comissão; preocupamo-nos com o instituto da comissão. Vai valer que o Presidente não precisa nomear e que os Líderes podem dizer que não nomeiam, que não indicam e está terminado?

Se o Supremo Tribunal Federal tivesse acatado a ordem do Dr. José Sarney, que diz que ele não pode nomear porque os Líderes não querem, acabam-se as comissões de inquérito. Acabou! Não há mais comissão de inquérito de interesse do País. Cria-se, sim, comissão de inquérito como a de ontem, por exemplo, uma comissão de inquérito que todo mundo quer para ver a questão dos imigrantes brasileiros no exterior.

Pois não, Senador Arthur Virgílio.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Senador Pedro Simon, até cheguei a conversar com V. Exª sobre isso, no plenário desta Casa. Tinha dúvidas sinceras sobre se a autoridade a ser coagida era a figura do Presidente da Casa ou a figura do Líder partidário. O que eu não tinha dúvida era de que em qualquer casa legislativa, de acordo com a tradição secular do Parlamento anglo-saxônico, que é a que seguimos, em se tendo um terço de uma casa legislativa, tem-se o direito de automaticamente instalar uma CPI. V. Exª toca num ponto nevrálgico, porque já fui Líder de Governo, V. Exª já foi, e, portanto, já vimos muita coisa acontecer nesta República. Já vi, quinhentas vezes, quinhentos governos dizerem assim: esta CPI, tendo ou não fulano de tal culpa no cartório - não estou entrando nem no mérito da ética -, não me convém, vou ganhar um certo tempo e depois faço; ou ela cai no esquecimento; ou, ainda, faço mais adiante, fora do foco da mídia. Isso aconteceu no Governo passado do qual fui Líder. Portanto, quero falar a V. Exª com sinceridade: nunca ouvi ninguém dizer que, sem a Maioria, não se faz CPI. Ou seja, ganhar tempo, já vi muito, mas desafiar, tentar desmoralizar o instituto da CPI, tentando fazer ficar desvalida a Minoria, que protege, portanto, o direito supostamente até de uma população majoritária, é a primeira vez. Ou seja, esse esgar autoritário, pela tendência que se vê no Supremo Tribunal Federal, está sendo esmagado pelo voto deste Ministro extraordinário, verdadeiro juiz, que é o Sr. Celso de Mello, e por uma Suprema Corte que nos dá orgulho. Afinal de contas, puxa vida, não estamos sós! O povo brasileiro pode olhar para cima e dizer mais: Não pensem que quebrar etapas e fazer o Sr. Meirelles ser julgado lá em cima é ajuda para o Sr. Meirelles, não; ao contrário, vai ser julgado com todo o rigor pela Corte mais dura do País, que é precisamente esta que a todos nos enche de orgulho, que é a Suprema Corte brasileira, o Supremo Tribunal Federal. Parabéns a V. Exª!

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Muito obrigado a V. Exª.

O máximo a que esta Casa tinha chegado - mas, aí, é, com todo respeito, culpa dos Senadores e Deputados - era retirar assinatura. Isso sim. Vi muitas CPIs, criei CPIs com imensa maioria, entreguei na Presidência e, dois dias depois, quando ia ver, não tinha mais assinatura. Essa pressão para um Senador retirar assinatura é absurda, mas é correta. Quer dizer, é incorreta, mas é legal. Retirando a assinatura, não se alcança o quórum de um terço dos Senadores e, logo, não pode criar a comissão.

No entanto, não retirar a assinatura, criar a comissão, mandar os líderes indicarem os membros, eles não os indicam e o Presidente acata uma nota dos líderes? Isso é demais. É a nota mais fascista que já vi. Não me lembro de algo parecido nem durante a ditadura. Na ditadura, criamos a CPI sobre o acordo nuclear entre o Brasil e a Alemanha - e não foi brincadeira, o Geisel era descendente de alemão. A CPI foi criada e o acordo foi votado após ter sido discutida e criticada duramente sua importância e necessidade para o Brasil, pois era um acordo muito caro.

Ouço o aparte do Senador Heráclito Fortes.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Senador Pedro Simon, quero fazer apenas uma pequena observação sobre a repercussão, ontem, na Comissão que presido, da convocação do Ministro José Dirceu. Veja bem, são 10 horas e 31 minutos, sexta-feira, e nenhum Senador do Governo, do PT, veio ao plenário se congratular com o hoje Ministro do Banco Central nem comentar a decisão tomada pelo Tribunal. Será que o Governo não quer defender o Sr. Meirelles? Não estava na conta do Governo a aprovação da medida? É esquisito isso. Quero informar à imprensa que acabei de receber a informação de que a Assessoria do PT está enlouquecida, procurando, em Brasília, um Senador que venha ao plenário. Vamos ver, Senador Pedro Simon, se até às 11 horas chega alguém.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Digo a V. Exª que o PT não fez questão da decisão grosseira de fazer o Sr. Meirelles Ministro. Isso é mais uma pílula que ele teve que engolir.

O Presidente do Banco de Boston ganha uma aposentadoria que até agora não nos querem informar. O Senador Antero Paes de Barros entrou com um requerimento pedindo para saber os termos, pois não tem nada demais sabermos os valores. É verdade que dizem que a aposentadoria dele é muito alta, não sei quantos mil dólares por mês. Mas essa parte não nos importa. O que nos importa é que dizem que, em função do ex-presidente ganhar essa aposentadoria, a direção do Banco de Boston deverá concordar com qualquer função dele no futuro. Isso significaria que, antes de ser Presidente do Banco Central, ele consultou o Banco de Boston. É verdade? Não sei. É mentira? Não sei. Mas a resposta, até agora, não veio.

Eu confio no Supremo Tribunal Federal. Acho que essa Corte dirá alguma coisa com relação ao Sr. Meirelles. E eu confio no Procurador. Todos estão falando, cobrando, mas vamos fazer justiça: não dá para dizer que o que se fala do Ministro da Previdência, se fala depois de S. Exª ter sido indicado Ministro. Não vi nada de novo. Tudo que se está falando agora se falava antes de S. Exª ser Ministro. Não foi a Bancada do PMDB e não foi a Executiva do PMDB quem indicou. Foram o Sr. Presidente do Senado e o Líder do PMDB que indicaram. E o Presidente Lula aceitou.

É verdade que, depois, em vista de críticas e mais críticas, colheram assinatura na Bancada - não sei quantos, eu não assinei - em solidariedade ao Ministro que estava sendo criticado. Mas, já que o Presidente Lula não quis tomar uma decisão, acho que o destino do Ministro também está nas mãos do Supremo. Acredito que o Procurador-Geral da República vai decidir, e eu confio muito na decisão de S. Exª. Se o Procurador achar por bem arquivar, eu me curvo, porque, na palavra dele, eu confio. Mas vamos ver o que vai acontecer.

Sr. Presidente, que a decisão de criar a CPI sirva de exemplo ao Congresso brasileiro. Não tenho nada a favor e nem contra ao atual Presidente da Câmara - nada. Eu o conheço e tenho respeito por S. Exª. Pode-se analisar a sua presença naquele cargo sob mil aspectos, mas falarei de dois. Primeiro, S. Exª só é Presidente porque o PT quis. Faltou competência ao PT, e faltou um ato de grandeza ao Presidente Lula, já que o Chefe da Casa Civil é quem deveria fazê-lo e não o fez: chamar os dois candidatos do PT e dizer: “Um de vocês vai ser e o outro não vai ser”. Isso porque a Oposição só apresentou candidato no momento em que o PT se dividiu. Segundo, pode-se dizer o que quiser do atual Presidente da Câmara dos Deputados, mas estava na hora de termos um Presidente com alguma independência. Faz muito tempo que o Presidente da Câmara e o Presidente do Senado são praticamente os porta-vozes do Presidente da República. O que se vota, o que não se vota, quando vota, quando não vota é decidido por um telefonemazinho do Presidente da República.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - V. Exª me permite um rápido aparte?

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Pois não. Ouço o aparte de V. Exª.

O Sr. Arthur Virgilio (PSDB - AM) - Senador Pedro Simon, o que contraria o Governo na figura do Presidente Severino não é a tão decantada e tão propalada fisiologia; é a independência. É bom que isso fique claro.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - É isso que quero dizer. Diga-se o que se quiser do Presidente da Câmara, mas, depois de muito tempo, lá está um Presidente que tem independência. Que bom! Espero que, sob esse ângulo, o nosso Presidente do Senado também seja independente. Mas independente para valer, não no sentido de ver o que é bom para o PMDB, se o PMDB vai ganhar vantagem, se terá uma participação maior ou menor no Governo, se alguém do Partido foi nomeado para algum cargo e, conforme isso, agir com rigidez ou facilidade. Não! Presidente é Presidente, deve agir com independência, fazendo aquilo que deve ser feito.

Não agradeço ao Supremo Tribunal Federal, porque não agradecemos aquilo que se faz por obrigação, mas digo que me orgulho da decisão tomada, na pessoa do bravo Nelson Jobim, Presidente daquela Casa. Levo a satisfação, a alegria, o júbilo do Senado Federal e tenho certeza de que, ouvindo pelo TV Justiça, muitos brasileiros se orgulharam e se emocionaram, na quarta-feira, com aquela decisão.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/05/2005 - Página 13650