Discurso durante a 59ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com decisão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), de restringir o trabalho das farmácias de manipulação.

Autor
João Batista Motta (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: João Baptista da Motta
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Preocupação com decisão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), de restringir o trabalho das farmácias de manipulação.
Aparteantes
Gerson Camata, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 12/05/2005 - Página 14292
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • CRITICA, TENTATIVA, AGENCIA NACIONAL DE VIGILANCIA SANITARIA (ANVISA), RESTRIÇÃO, TRABALHO, FARMACIA, MANIPULAÇÃO, MEDICAMENTOS, JUSTIFICAÇÃO, CONSULTA, INSTRUMENTO PUBLICO, DENUNCIA, ORADOR, AUSENCIA, PARTICIPAÇÃO, CATEGORIA PROFISSIONAL, AREA, RESULTADO, PESQUISA.
  • NECESSIDADE, MANIPULAÇÃO, MEDICAMENTOS, ATENDIMENTO, DIFERENÇA, PACIENTE, REGISTRO, INFERIORIDADE, PREÇO, PRODUTO, COMPARAÇÃO, INDUSTRIA.
  • DEFESA, AUMENTO, FISCALIZAÇÃO, AGENCIA NACIONAL DE VIGILANCIA SANITARIA (ANVISA), OPOSIÇÃO, RESTRIÇÃO, FARMACIA, MANIPULAÇÃO, MEDICAMENTOS, REGISTRO, SUPERIORIDADE, NUMERO, EMPREGO, AREA.
  • ELOGIO, GOVERNO FEDERAL, FRACIONAMENTO, VENDA, MEDICAMENTOS, CONTRIBUIÇÃO, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA.

O SR. JOÃO BATISTA MOTTA (PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, mais uma vez venho a esta tribuna para registrar minha preocupação com a clara decisão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de restringir o trabalho das farmácias de manipulação. E isso está ocorrendo em todo o País, conforme a Consulta Pública nº 31, publicada no Diário Oficial da União (DOU) do último dia 18 de abril.

Quero aqui, Sr. Presidente, chamar a atenção do Governo Federal para a necessidade de um amplo e profundo debate sobre o tema. Não podemos, em hipótese alguma, mudar as regras do jogo sem que haja uma fundamentada e transparente discussão sobre o assunto.

A verdade é que, na prática, as consultas públicas que têm sido realizadas no âmbito da Anvisa não têm levado em consideração a maioria das propostas apresentadas pelas categorias profissionais envolvidas no processo de discussão.

Com raras exceções, as consultas têm, em linhas gerais, gerado resoluções ditatoriais, distantes da vontade da maioria. E o que se avizinha agora, no caso das farmácias de manipulação, parece-nos ser uma resolução sem qualquer visão do alcance social e econômico do setor.

A Consulta Pública em questão tem nada menos do que 40 páginas escritas em letras miúdas. Mas o verdadeiro propósito da Anvisa está mais do que claro. O que ela quer é impedir que as farmácias de manipulação manipulem produtos com apresentação e concentração equivalentes aos produzidos pela indústria químico-farmacêutica. Ora, trata-se de uma posição no mínimo suspeita, Senador Gerson Camata. A impressão que fica é que a Anvisa está defendendo os interesses de um poderoso setor industrial, em detrimento dos interesses da população de uma forma geral.

Mas os absurdos não se limitam a essa proibição. A Anvisa quer ainda proibir as farmácias de manipulação de fazerem publicidade de seus produtos, como se essa fosse uma prerrogativa legal e exclusiva da indústria farmacêutica. Agindo assim, a Anvisa parece estar simplesmente patrocinando uma reserva de mercado ofensiva à livre iniciativa e à democratização dos negócios. Como se isso não bastasse, a Anvisa está querendo invadir, de maneira afrontosa, a esfera de atribuições legais dos médicos, impondo verdadeira censura à receita médica.

Os defensores da arbitrária posição da Anvisa alegam que a resolução em questão tem por objetivo maior proteger o consumidor do risco do consumo de medicamentos mal preparados. Segundo eles, as farmácias de manipulação não reúnem condições suficientes para garantir total segurança aos medicamentos manipulados. Ao discutirem o assunto, alguns têm feito questão de lembrar a morte de um menino em Brasília, após ter consumido remédio manipulado.

Ora, Sr. Presidente, poderíamos citar aqui vários exemplos de pessoas que morreram em decorrência do consumo de medicamentos produzidos pela indústria químico-farmacêutica. Quem não se lembra das tragédias provocadas pelo Vioxx e pelo Lipobay, entre outros?

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador João Batista Motta, permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOÃO BATISTA MOTTA (PMDB - ES) - V. Exª tem a palavra, Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador, posso entrar neste assunto porque é minha praia. Eu sou médico.

O SR. JOÃO BATISTA MOTTA (PMDB - ES) - Assim como o Presidente Tião Viana também.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Eu queria ensinar o fato ao Governo; ao psiquiatra que está fazendo um bocado de besteira no nosso País. Senador Heráclito Fortes, em 1970, eu era Secretário de Saúde do Município de Parnaíba e o Prefeito era Elias Ximenes. Houve uma grande enchente. Fizeram mais de cem alojamentos em igreja, estádios e inclusive na minha casa em construção. Por isso, eu sou abençoado com Adalgisa. Eu estava num jantar no Rotary Club e um farmacêutico, Sr. Raul Bacelar, o mais antigo - morreu recentemente -, saiu e perguntou sobre minha preocupação. Eu disse que a cidade e esses alojamentos tinham a epidemia de uma micose - o que o povo chama de frieira - e que seria impossível administrar o remédio de tal laboratório, porque havia milhares e milhares de alagados. Ele disse: “Há álcool na sua secretaria?” Eu disse: “Ah! Assim também seria demais se não houvesse!” “Pois me leve lá”, disse ele. E o velhinho, Sr. Raul Bacelar, no seu simples laboratório, fez os galões de uma fórmula que realmente acabou com a micose, a frieira que atingia os piauienses alagados. Então, ele é muito mais econômico.

O SR. JOÃO BATISTA MOTTA (PMDB - ES) - Muito obrigado pelo aparte, Senador Mão Santa.

Sr. Presidente, especialistas no assunto garantem que o risco no âmbito das farmácias de manipulação é bem menor, na medida em que o médico tem condições de ajustar doses e compor fórmulas, respeitando as características individuais dos clientes, o que é impossível na indústria químico-farmacêutica, que produz medicamentos em grande escala para pacientes que não são iguais em suas funções.

Em meio a toda essa polêmica, é preciso ressaltar ainda que os remédios manipulados são infinitamente mais baratos que os medicamentos produzidos industrialmente.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JOÃO BATISTA MOTTA (PMDB - ES) - Perfeitamente, Senador Gerson Camata.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Quero cumprimentá-lo, ilustre Senador João Batista Motta. Quando li a notícia no jornal, não acreditei: parecia notícia daquela tal cartilha que estava querendo ensinar a nós como devemos falar, até censurar-nos a maneira de nos expressar. Agora estou acreditando que a Anvisa está marchando para a realização de uma segunda bobagem; a primeira V. Exª se lembra: proibir importar remédios pelo Porto de Vitória, como se o Espírito Santo não fizesse parte do Brasil, há uns dois anos. Agora, essa estultice louca de proibir que se manipulem medicamentos. Em todo o mundo os medicamentos são manipulados. Às vezes - e V. Exª citou aí - o médico exige a dosagem de um outro elemento, dos sais que compõem o medicamento, para determinados efeitos, ou para suprir efeitos colaterais de determinados medicamentos. É assustador! E eu tenho certeza de que a Anvisa vai recuar. Alguém de bom senso no Governo vai fazer a Anvisa recuar. Não pode! Nós não aceitamos, o Brasil não aceita, e a visão vai ser essa. Estão trabalhando para o povo ou para os laboratórios multinacionais? Essa é uma pergunta que fica no ar. Nós temos que pedir aqui à Liderança do Governo que faça a Anvisa parar com esse propósito, porque não há justificativa. E V. Exª diz isso, e o diz muito bem. Parabéns a V. Exª.

O SR. JOÃO BATISTA MOTTA (PMDB - ES) - Muito obrigado pelo aparte, Senador Gerson Camata.

Quero lembrar ainda, Sr. Presidente, que os manipulados usam os mesmos componentes e custam, em alguns casos, até 70% menos. Se há problemas, nobres Senadores, precisamos corrigi-los, quem sabe aumentando a fiscalização dos manipulados e exigindo, como propõe a própria Anvisa, assistência integral aos consumidores. Mas simplesmente impedir que as farmácias de manipulação produzam esses medicamentos é arbitrário e suspeito. Não tenho procuração para defender nenhum setor econômico; o que defendo aqui é, sobretudo, a igualdade de oportunidades.

Precisamos levar em consideração que as cerca de cinco mil farmácias de manipulação empregam diretamente, em todo o País, mais de cem mil pessoas, entre as quais 15 mil farmacêuticos.

Outro ponto a ser considerado é que esse setor já vem sendo regulamentado pela RDC-33/2000. E mais: a adequação e o aprimoramento dessas farmácias às normas em questão são indiscutíveis. Não há como negar que as farmácias de manipulação atingiram um novo patamar de exigência em relação à produção de medicamentos.

Por último, quero lembrar aqui que as agências reguladoras nasceram sob o argumento de que as ações estatais prejudicavam o tecnicismo necessário à evolução e ao aperfeiçoamento do setor regulado. O que estamos vendo agora é exatamente o contrário, ou seja, é a Anvisa tentando imobilizar o desenvolvimento de um segmento de extremo valor socioeconômico. O momento, como já disse, exige uma conscientização profunda de todos os setores envolvidos nessa questão. A Consulta Pública nº 31, como o próprio nome diz, é uma consulta e, como tal, passível de alterações, supressões e aprimoramentos. Assim, espero que prevaleça o bom senso, a ética e a transparência, sob pena de sepultarmos um setor econômico que cresce a cada dia em nosso País.

Sr. Presidente, termino fazendo um elogio ao Governo Federal, que, há poucos dias, fracionou a venda dos medicamentos, possibilitando aos mais pobres a aquisição de remédios - às vezes muito caros - fracionados. Depois de uma medida tão boa e tão aplaudida pela população brasileira, vem agora essa punhalada nas costas, principalmente dos pobres consumidores de remédios deste País.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/05/2005 - Página 14292