Discurso durante a 61ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre a redução do numero de vereadores dos Municípios Brasileiros. (como Líder)

Autor
Efraim Morais (PFL - Partido da Frente Liberal/PB)
Nome completo: Efraim de Araújo Morais
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES. DESENVOLVIMENTO REGIONAL. LEGISLAÇÃO ELEITORAL. POLITICA PARTIDARIA.:
  • Considerações sobre a redução do numero de vereadores dos Municípios Brasileiros. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/2005 - Página 14819
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES. DESENVOLVIMENTO REGIONAL. LEGISLAÇÃO ELEITORAL. POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • AGRADECIMENTO, CONVITE, PARTICIPAÇÃO, COMISSÃO, CARATER PERMANENTE, ACOMPANHAMENTO, OBRA PUBLICA, RODOVIA, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), ESTADO DA PARAIBA (PB).
  • APOIO, TRANSPOSIÇÃO, AGUA, RIO SÃO FRANCISCO, BENEFICIO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DA PARAIBA (PB), ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), ESTADO DO CEARA (CE).
  • ANALISE, INCONSTITUCIONALIDADE, RESOLUÇÃO, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE), REDUÇÃO, NUMERO, VEREADOR, MUNICIPIOS, TENTATIVA, CONCENTRAÇÃO, PODER, GOVERNO FEDERAL, PREJUIZO, FEDERAÇÃO, AUTONOMIA, CAPACIDADE, MUNICIPIO.
  • CRITICA, RESOLUÇÃO, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE), SUBORDINAÇÃO, COLIGAÇÃO PARTIDARIA, ELEIÇÃO, GOVERNADOR, SENADOR, DEPUTADO FEDERAL, DEPUTADO ESTADUAL, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REDUÇÃO, AUTONOMIA, ESTADOS, LEGISLATIVO.
  • MANIFESTAÇÃO, POSIÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA FRENTE LIBERAL (PFL), APOIO, AUTONOMIA, SOCIEDADE.

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicialmente, gostaria de me congratular com o Senador Ney Suassuna e agradecer o convite para participar da reunião do fórum permanente dos três Estados. Penso que deveria ser incluída toda a Bancada Federal, bem como os Governadores, a fim de que possamos, ao menos, tomar posições importantes, até políticas, se necessário, sem ceder aos encantos do Governo Federal. No momento em que se puder decidir em nome da Paraíba, que esteja acima o Estado, e não o Governo Federal.

Entendo que as promessas existem, Senador Mão Santa, na duplicação da BR-101 e na transposição do rio São Francisco.

Existem passos avançados, e queremos nos congratular em relação à referida transposição. Somos favoráveis. É preciso que os Parlamentares do Nordeste se entendam nessa matéria. Há necessidade da transposição para os Estados, principalmente para o meu Estado, a Paraíba, para o Rio Grande do Norte e para o Ceará.

Sabemos da posição contrária de outros Estados do Nordeste, mas é por meio de diálogos e de investimentos no semi-árido nordestino que poderemos chegar à concretização desse sonho, que é a transposição do rio São Francisco. O mesmo ocorre no que tange à duplicação da BR-101, que é da maior importância para a economia de vários Estados nordestinos.

Sr. Presidente, o assunto de que tratarei hoje diz respeito mais ao que aconteceu há um ano, quando o Tribunal Superior Eleitoral adotou a famosa Resolução nº 21.702, que alterou o número de vereadores de quase metade dos Municípios brasileiros. Um ano é suficiente, acredito, para dissipar as intensas emoções mobilizadas quanto a essa questão e que, como uma verdadeira cortina de fumaça, impediram a apreciação isenta de todas as suas implicações.

De fato, Srs. Senadores, poucos temas políticos despertaram, na última meia década, tamanha atenção nos meios jornalísticos quanto à redução do número de vereadores. Poucos temas também foram abordados de forma tão unânime. A medida foi apresentada, sem exceção, como essencial à moralização das finanças públicas e como forma de combater o excesso de mordomias nos legislativos municipais.

Transformada em cavalo de batalha de eminentes representantes da mídia imprensa, do rádio, da televisão, a resolução do Tribunal Superior Eleitoral tornou-se intocável na opinião de alguns.

Todo aquele que tentasse manifestar opinião contrária à resolução, por qualquer motivo, se via imediatamente lançado à condição de velhaco, mal-intencionado, casuístico ou , no melhor caso, alienado das verdadeiras intenções do povo brasileiro.

Realizada a eleição e a posse dos vereadores sufragados, consumados os efeitos daquela resolução, passada a comoção que foi construída em torno do fato, é cabível agora fazer as questões que, à época, eram caladas pelo barulho ensurdecedor da mídia. E essas questões, que não são poucas, possuem fundamental relevância para a reflexão acerca da natureza do federalismo brasileiro e da repartição dos poderes.

Sr. Presidente, o Estado brasileiro sempre se caracterizou pela tensão entre tendências favoráveis e contrárias à centralização dos poderes. É bem verdade que essa tendência é comum a todos os países que possuem estrutura federativa e, ao mesmo tempo, grande extensão territorial.

De fato, Sr. Presidente Mão Santa, também podemos verificar essa dinâmica na história institucional dos Estados Unidos, da Argentina, do México, do Canadá, da Austrália e da Índia. Em todos eles, esteve sempre presente essa discrepância entre o exercício do poder centralizado e o desejo de autogoverno das populações locais, entre o potencial homogeneizador da administração federal e a multiplicidade das condições sociais localizadas.

Essa tensão entre tendências centrífugas e centrípetas não é, em si, um problema, desde que se consiga alcançar um equilíbrio entre ambas: a excessiva centralização é a marca das tiranias, bem como o excessivo localismo caracteriza o domínio das pequenas oligarquias regionais.

Justamente à luz desse delicado, mas necessário, equilíbrio, a Resolução nº 21.702 caracteriza um retrocesso notável na evolução da história institucional brasileira.

Com efeito, a Constituição Federal de 1988 incorporou inúmeras provisões destinadas a conferir maior capacidade administrativa a Estados e Municípios, em contraposição ao sistema eminentemente centralista que caracterizou o regime constitucional de 1967.

O constituinte de 1988 entendeu que a nova sociedade democrática que se construía deveria garantir, aos Estados e Municípios, maior liberdade de auto-organização do que a que lhes fora até então concedida.

Por essa razão, definiu com precisão o rol de competências que caberia a cada um dos níveis da Federação, ao mesmo tempo em que reconhecia, de maneira inequívoca, que os Municípios são entes federativos autônomos, não subordinados à União e/ou aos Estados.

Dentre as competências assinaladas ao Município, encontra-se a de fixar, respeitados os limites ditados pelo texto constitucional, o número de vereadores que comporão sua própria Câmara Municipal.

Sr. Presidente, essa competência decorre do reconhecimento de que apenas os próprios munícipes, representados por seus vereadores, estariam capacitados a entender as características especiais de suas cidades e a estabelecer qual dimensão deve possuir sua representação legislativa.

Sr. Presidente Mão Santa, esse foi o entendimento que prevaleceu, na prática política e jurisprudencial brasileira, até bem pouco tempo, mais precisamente até o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, do Recurso Extraordinário nº 197.917.

Naquele julgamento, decidiu o STF fazer tábula rasa de toda a experiência acumulada desde 1988 e entendeu que o texto constitucional prescrevia a rígida fixação, por critérios aritméticos, do número de vereadores que cada Município estaria apto a possuir.

Em decorrência, foi editada a já referida Resolução do TSE que fixou o número de vereadores nas cerca 5.600 cidades brasileiras.

Sr. Presidente, ainda que o constituinte de 1988 tenha reconhecido o valor do federalismo, é forçoso reconhecer que, comparado a outros países, notadamente aos Estados Unidos, Canadá e Austrália, o Brasil é ainda um Estado muito centralizado.

Mesmo assim, as disposições constitucionais que conferiram maior autonomia a Estados e Municípios representaram auspicioso avanço na direção de uma sociedade mais aberta e consciente.

No entanto, mesmo essa pouco autonomia parece incomodar aqueles que, por qualquer motivo, buscam implacavelmente reduzi-la!

De fato, rigorosamente todas as emendas constitucionais que foram implementadas desde a promulgação da Constituição e que, de alguma forma, abordaram a repartição de competências e prerrogativas federativas favoreceram o fortalecimento da União em detrimento de Estados e Municípios.

Estranhamente, esse desejo de concentração progressiva de poderes e receitas na mão do poder central parece haver contaminado não apenas o Executivo, mas também componentes dos demais poderes e membros do Ministério Público.

Revestido pela capa da defesa do interesse público e de um republicanismo desinteressado, esse impulso nada mais esconde que um incontido desejo de concentração de poderes, baseado na incapacidade de se aceitar a auto-regularização da política local pela própria população.

Para muitos, vítimas de um difuso elitismo cultural, os Estados e Municípios seriam incapazes de efetuar, com competência e honestidade, sua própria organização administrativa e política.

Como resposta a essa suposta incapacidade, restaria à União o dever de enfeixar o máximo de poderes que fosse possível, encarregando-se diretamente de tudo.

Sr. Presidente, incorretamente, aqueles que esposam essa visão vêem o Governo Federal como uma ilha de excelência cercada de incompetência e desonestidade por todos os lados.

Essa presunção, guardadas as proporções devidas, em nada difere daquela mantida por pessoas que se consideram melhores que seus semelhantes porque receberam um diploma de pós-graduação ou porque possuem maior quantidade de dinheiro.

Sem dúvida é verdade que muitos Municípios pobres sofrem uma carência aguda de quadros qualificados. Mas, insisto, esse problema não se resolverá pela retirada de poderes e competências do Poder Municipal.

Uma verdadeira Federação somente se fará pela contínua descentralização dos poderes, de modo que a formulação de políticas se aproxime cada vez mais de seu destinatário último, o povo brasileiro.

Nesse sentido, a eliminação da capacidade de os próprios Municípios determinarem o número de membros de sua Câmara constitui um rude golpe em sua autonomia.

Não apenas porque na maioria das cidades houve uma redução da representação política e, conseqüentemente, do espaço público de discussão, mas principalmente porque lhes foi subtraída, em parte, sua capacidade de gerir os assuntos de seu próprio interesse.

Reconhecida a incompetência dos Legislativos municipais de se auto-organizarem, quanto tempo faltará, Srªs e Srs. Senadores, para que reconheçamos a incapacidade de as próprias prefeituras se organizarem?

Haverá então aqueles que defenderão que os pequenos Municípios podem possuir apenas três ou quatro secretarias; os médios, de cinco a dez secretarias, rigorosamente estabelecidas por cálculo aritmético.

Reconhecida essa incompetência, quanto tempo até que a eleição de governantes e legisladores municipais seja, também elas, considerada inútil?

Mas foram incorretas não apenas as premissas em que se basearam a decisão do TRF e a resolução do TSE. Também os meios utilizados e os resultados obtidos foram equívocos.

Mesmo que admitamos, para efeito de argumentação, que os Municípios não possuem competência para fixar o número de seus vereadores, ainda assim restará a dúvida acerca da constitucionalidade do instrumento utilizado.

O uso de Resolução para fixar o número de eleitos por cidade não apenas é inapropriado, em razão da natureza das resoluções e do fim a que se destinam, como também configura uma violação evidente do princípio constitucional de separação e independência dos Poderes.

Efetivamente, a referida Resolução se ocupa de assunto que, por ser atinente à organização político-administrativa do Poder Legislativo de entes federados autônomos, somente poderia ser objeto de legislação emanada deste Congresso, a quem, por força da Constituição, cabe responsabilidade exclusiva para tal regulação.

Por essa razão é que tal Resolução se encontra, hoje, sob o exame do Supremo Tribunal Federal, quer na forma de ações diretas de inconstitucionalidade, quer na forma de argüições de descumprimento de preceito fundamental.

Também do ponto de vista dos resultados obtidos, a Resolução nº 21.702 se apresenta insatisfatória.

Não falemos apenas da inconveniência prática da fixação de um número par de vereadores com o possível risco de sobrestamento indevido da atividade legislativa, em razão de empate nas votações.

O fato é que, mesmo com a justificativa nominal da redução de vereadores, a economia de gastos não foi alcançada. Com efeito, o orçamento dos legislativos municipais já se encontrava, desde antes, sujeito a severas restrições do art. 29, “a”, da Constituição, e da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Em decorrência, as notícias que chegam de todo o País dão conta de que, efetuada a redução dos vereadores, manteve-se inalterada a parcela orçamentária destinada às Câmaras, ocorrendo simplesmente o remanejamento dos valores porventura excedentes para outros usos dentro do próprio Legislativo.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a inconveniência do pensamento centralizador que acabo de descrever em traços gerais é evidente. Isso, no entanto, não impede que os defensores de tal pensamento voltem à carga em outras questões de teor semelhante.

Refiro-me à Resolução nº 20.933, de fevereiro de 2002, que determinou a verticalização das coligações partidárias estaduais em relação ao alinhamento ocorrido para as eleições presidenciais.

            Essa disposição se caracteriza pelo mesmo viés centralizador que anima a Resolução 21.702, ao ignorar a existência...

(Interrupção do som.)

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB) - ... de condições políticas locais em nome de uma suposta equalização do processo eleitoral.

Sr. Presidente, para concluir, mais dois minutos.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Pois não.

O SR. EFRAIM MORAIS (PFL - PB) - Sr. Presidente, de forma indireta, a verticalização subordina a eleição dos Governadores, Senadores, Deputados Federais e Estaduais à eleição do Presidente da República, relativizando, assim, a autonomia dos Estados e do Poder Legislativo.

Sr. Presidente, o Partido da Frente Liberal, a que tenho a honra de pertencer, sempre permaneceu fiel aos seus princípios do liberalismo, vinculação essa que se acha estampada em seu próprio nome.

Meu Partido acredita, Sr. Presidente, firmemente, que a sociedade é plenamente capaz de se autogovernar, prescindindo da suposta sabedoria de um poder central superior. Por essa razão, repelimos qualquer esforço que venha a reduzir a autonomia da sociedade, ainda que em nome de um alegado bem público.

Era o que eu tinha a dizer.

Agradeço a V. Exª, Presidente Mão Santa, pela tolerância.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/2005 - Página 14819