Discurso durante a 67ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Resposta ao pronunciamento do Arthur Virgílio.

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EXPLICAÇÃO PESSOAL.:
  • Resposta ao pronunciamento do Arthur Virgílio.
Publicação
Publicação no DSF de 25/05/2005 - Página 16166
Assunto
Outros > EXPLICAÇÃO PESSOAL.
Indexação
  • ACUSAÇÃO, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), TENTATIVA, PARALISAÇÃO, TRABALHO, LEGISLATIVO, EXECUTIVO, MONOPOLIO, ATENÇÃO, IMPRENSA, OPINIÃO PUBLICA.
  • ELOGIO, HISTORIA, LUTA, DIREITOS, TRABALHADOR, DEMOCRACIA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REPUDIO, DISCRIMINAÇÃO, FALTA, OPORTUNIDADE, EDUCAÇÃO.
  • ELOGIO, POLITICA EXTERNA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, APRESENTAÇÃO, DADOS, PROGRAMA, GOVERNO FEDERAL, CRIAÇÃO, VAGA, UNIVERSIDADE.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Para uma explicação pessoal. Com revisão do orador.) - Senador Pedro Simon, sinta-se citado. V. Exª é um tribuno eloqüente e que sempre abrilhanta esta Casa.

Eu não queria utilizar esse recurso, porque realmente penso que retirar citações fora do contexto, do papel social e do lugar político que cada um se encontra não contribui. Mas eu poderia citar, por exemplo, o Presidente Fernando Henrique Cardoso.

O Presidente Fernando Henrique Cardoso chamou os defensores da CPI da corrupção de irresponsáveis. Irresponsáveis que estão enganando o povo:

Ética para mim é uma forma de conduta e não pode se desfazer em um palanque eleitoral formado por irresponsáveis que fazem de conta que estão apurando o que já foi apurado. Não é por aí que as coisas serão resolvidas. A CPI objetiva apenas paralisar o processo de reformas, bloqueando as ações do Parlamento e do Executivo, além de monopolizar as atenções da imprensa e da opinião pública, reduzindo o Congresso Nacional à pauta de uma mesquinha disputa política pelo poder. Uma CPI não pode abordar diversos episódios, muito menos de caráter genérico, não vinculados entre si, alguns ocorridos em administrações estaduais e sem a indispensável caracterização do fato determinado.

Fernando Henrique Cardoso atacou duramente a nova tentativa de abertura da CPI de Corrupção, no Senado, e o pedido feito por advogados paulistas. "CPI é coisa séria, não pode ser palanque eleitoral, não pode ser tribuna para enganar. Eu lamento que as pessoas honradas, os advogados, utilizem pedaços de jornal para imaginar que o Governo comprou Deputados, quando tudo o que se fez foi obedecer ao Orçamento - o Orçamento é lei. Chega de enganar a população brasileira".

Eu poderia continuar lendo, são dezenas de citações que seguem a mesma direção."Pode ter havido coincidência".

São dezenas de citações que não vale reproduzir.

Diz aqui: "A forma de combater a corrupção é acionar a Controladoria Geral da União, que é independente, que tem apoio do Executivo e que é eficiente ao combate da corrupção."

O Ministro disse ainda: "A situação se agrava, se a CPI for instalada, porque será um palanque eleitoral que nada contribuirá para a transparência."

E por aí vamos. Portanto, esse tipo de citação não ajuda o debate. Cada caso é um caso, temos que analisar as diversas situações, avaliar e se posicionar em cima de um debate concreto, circunstanciado e, eu diria, consistente.

Eu diria mais: V. Exª insiste novamente numa visão elitista da propagação do conhecimento, da cultura e do saber para uma parte pequena da sociedade brasileira. É fantástico transferir aqueles que nunca tiveram o chamado "berço de ouro", as condições de poder estudar em boas escolas, ter bons professores, morar em uma casa digna, para poder ter uma profissão e dizer que é deles a responsabilidade. É isso que V. Exª acabou de fazer desta tribuna.

O Presidente Lula nasceu em Caetés, subúrbio de Garanhuns, numa família de nove filhos. Veio para São Vicente num pau-de-arara. Viveu a sua infância e adolescência trabalhando para sua sobrevivência. Perdeu o dedo na máquina de uma fábrica com 18 anos de idade.

De fato, depois que estava na fábrica, assumiu uma liderança política fundamental. Ou as greves, no final dos anos 70, que ele dirigiu e construiu, não foram fundamentais para a democracia deste País? O tempo em que ele não estava na sala de aula estudando, estava ajudando a abrir fronteiras, espaço de liberdade, de debate e de cultura para todas as escolas e universidades deste País, porque não se aprende numa ditadura.

E ele colocou a sua vida e a sua militância para conquistar a liberdade de expressão, de manifestação, o direito de organização dos trabalhadores, a construção do sindicato livre. Está aí, lutando pelo direito do trabalhador de ter um salário digno. Uma central sindical combativa como foi a CUT significou que alguns pais passaram a ter salário para poder sustentar seus filhos e irem para a escola.

Foi essa luta social, a criação de um Partido, como o Partido dos Trabalhadores, com 25 anos de luta, não apenas pela ética, como pela justiça, que ajudou o País a mudar, e a mudar para melhor, não só na luta da anistia, da democracia, da Constituinte, mas também do Bolsa-Família, que é o maior gasto social deste Governo, porque ele sabe o que é uma família em que nenhum dos filhos consegue o seu diploma. Ele era o filho mais novo e o único que conseguiu terminar o curso do Senai. E esse tipo de preconceito foi usado sempre contra ele.

Lamento ver V. Exª, a quem respeito tanto, utilizar e reproduzir esse argumento. Inclusive com o argumento que era feito na campanha de que o Presidente Lula não poderia representar bem o Brasil se não falasse francês e inglês, se não dormisse no palácio da rainha ou se não fosse visitar o Presidente dos Estados Unidos em Camp Davis.

No entanto, o resultado da política externa está aí, temos as maiores exportações da história do Brasil. O Brasil, hoje, lidera em todos os fóruns internacionais, como a Organização Mundial do Comércio, é bem recebido no Japão, na América Latina, no mundo árabe, na Ásia, falando português, porque, internacionalmente, há tradução. E falando um português bem claro, pois como diz Caetano Veloso: "Minha língua é minha pátria". A utilização da nossa língua é uma forma também de valorizar a nossa diplomacia e a nossa inserção internacional.

Por tudo isso, esses argumentos elitistas foram destruídos nas urnas pelo povo brasileiro. E eu esperava que seriam sepultados. Entre outras coisas, quando o Presidente Lula assumiu o Governo, só havia 120 mil vagas no ensino público gratuito. Apenas 120 mil vagas! O ProUni criou 100 mil vagas no ano passado, mais 100 mil vagas este ano e criará mais 100 vagas no próximo ano no ensino público e gratuito, dando direito àqueles que não podem pagar de terem acesso, de se manter na escola, especialmente os filhos dos trabalhadores mais pobres.

Concluo, contanto uma historinha. Dou aula há 25 anos na Unicamp, que tem o vestibular mais difícil deste País. Lá havia uma moça que trabalhava como faxineira no cursinho para alunos carentes. Chamava-se Marinalva, tinha 36 anos e três filhos. Terminava o trabalho, sentava e prestava atenção à aula. A Marinalva fez o vestibular, ali naquele cursinho como faxineira, passou na Unicamp, formou-se, concluiu o mestrado e hoje é diretora do cursinho onde começou como faxineira.

Infelizmente, Senador, existe uma multidão de Marinalvas neste País, de talentos brilhantes, fantásticos que passaram a vida inteira com o umbigo no tanque e a mão na vassoura e nunca puderam pegar num lápis e numa caneta. Entretanto, aqueles que sempre pegaram nas letras, na caneta, que tiveram lápis e acesso à universidade é que deveriam ter uma atitude de valorizar o saber popular e construir caminhos verdadeiros para que possamos democratizar o saber, o conhecimento e os estudos na nossa sociedade e não reproduzir o preconceito, porque isso não ajuda no debate político e muito menos na relação entre este Congresso e o povo brasileiro.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/05/2005 - Página 16166