Discurso durante a 76ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre a entrevista do Deputado Roberto Jefferson ao jornal Folha de S.Paulo, hoje. A necessidade de participação do Congresso Nacional nas investigações das denúncias de corrupção nos correios e da distribuição de mesadas aos integrantes dos partidos aliados ao governo.

Autor
Demóstenes Torres (PFL - Partido da Frente Liberal/GO)
Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Considerações sobre a entrevista do Deputado Roberto Jefferson ao jornal Folha de S.Paulo, hoje. A necessidade de participação do Congresso Nacional nas investigações das denúncias de corrupção nos correios e da distribuição de mesadas aos integrantes dos partidos aliados ao governo.
Publicação
Publicação no DSF de 07/06/2005 - Página 17946
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ENTREVISTA, ROBERTO JEFFERSON, DEPUTADO FEDERAL, DENUNCIA, RECEBIMENTO, PROPINA, BANCADA, CONGRESSO NACIONAL, APOIO, GOVERNO FEDERAL.
  • ANALISE, CRISE, NATUREZA POLITICA, GOVERNO FEDERAL, COMPARAÇÃO, SITUAÇÃO, FERNANDO COLLOR DE MELLO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • CRITICA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, PRESIDENTE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), MINISTRO DE ESTADO, CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO (CGU), DEFESA, GOVERNO FEDERAL, OPOSIÇÃO, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT).

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, “Contei a Lula do ‘mensalão’”. Deputado Roberto Jefferson.

Corria o primeiro ano do Governo Lula. O ex-Presidente do PTB, José Carlos Martinez, procurou o Deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) e contou que o tesoureiro do Partido dos Trabalhadores, Delúbio Soares, estava remunerando os Deputados do Partido Liberal (PL) e do Partido Progressista (PP) com a razão mensal de R$30 mil. O atual Presidente do PTB, então, contou que se recusou a receber a dadivosa oferta, mas, após a morte de Martinez, Delúbio deu nova carga ao assédio. A oferta do “delicioso idílio” foi feita ao Deputado José Múcio, que, em companhia dos também Deputados Bispo Rodrigues, Valdemar Costa Neto e Pedro Henry, pressionaram Roberto Jefferson a aceitar o estipêndio.

O Presidente do PTB insistiu na recusa e deu ciência ao Governo do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. Primeiro, contou da freguesia do Delúbio ao Ministro do Turismo, Walfrido Mares Guia. Em seguida, contou ao Ministro Chefe da Casa Civil, o Primeiro-Ministro, José Dirceu, que deu um murro na mesa e ponto. Ato contínuo, contou ao Ministro da Integração Nacional, que fez ouvidos moucos para a sinecura. Depois contou ao então Ministro das Comunicações, Miro Teixeira. De volta à Câmara dos Deputados, Teixeira ainda tentou tornar pública a podridão. O Deputado Roberto Jefferson, então, contou ao Ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo. Por instinto natural de preservação da própria espécie, o comunista fez cara de paisagem. Por fim, contou ao Presidente Lula, que chorou.

A história que acabo de relatar, como já é do conhecimento deste País, é um sumário da entrevista que a edição desta segunda-feira do jornal Folha de S.Paulo traz com o Deputado Roberto Jefferson, Presidente do PTB. A repercussão imediata do escândalo vai tornar inexorável a instalação da CPI dos Correios, digo, CPI do Delúbio, corrijo-me, CPI do Governo Lula.

É preciso deixar bem claro que estamos vendo uma série de discursos que são pura balela, discursos que dizem que o trabalho realizado pela Polícia Federal substitui o trabalho do Congresso Nacional. É uma ignomínia, é aviltar sobre as nossas atribuições, é tripudiar sobre o que pode fazer um Deputado Federal e um Senador da República! A Polícia Federal continua trabalhando bem. Palmas para a Polícia Federal! Palmas para o Ministério Público Federal! Palmas para a Polícia do Distrito Federal que desbaratou esse grave esquema de corrupção em certames, em concursos!

Mas é preciso lembrar o seguinte: a Justiça absolveu o Presidente Fernando Collor de Mello. Quem o cassou fomos nós: Deputados e Senadores. Não podemos nos esquecer, Senador Arthur Virgílio, dessa nossa responsabilidade! Não podemos jogar nossas responsabilidades às costas da Polícia Federal! É nosso dever, somos nós que temos que fazer, até porque a Justiça tem parâmetros estritos. Nós, não. Nós, além de todos os requisitos constitucionais, podemos conhecer politicamente da questão no bom sentido, como conhecemos no Governo Fernando Collor de Mello. Nós pudemos, àquela ocasião, colocar para fora um Presidente que faltou com a dignidade ao País.

E nós queremos agora que essa CPI seja instalada, porque é dever nosso investigar. É dever, não é faculdade, está na Constituição. Existe o fato determinado, existe tanto o fato determinado que aquele servidor já deveria estar preso. Alguns dizem: mas os corruptores não estão identificados! A CPI, Senador Tasso Jereissati, serve para isso também, para investigar, para descobrir novos fatos.

(A Presidência faz soar a campainha.)

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - E nós não podemos, de forma alguma, ficar aqui com cara de paisagem, esperando acontecer algo que a Polícia Federal vai apurar. Não vamos tolerar isso! Vamos fazer a nossa parte.

Agora, as conseqüências das investigações podem levar este País, mais uma vez, em pouco mais de uma década, ao impasse institucional. Vejam que há muita similaridade entre o Caso Collor e agora. Apenas se inverteu o termo inicial do mar de lama. O impeachment do ex-presidente ocorreu a partir de uma denúncia da cozinha da Casa da Dinda e deu ocasião à CPI do Orçamento, cujo resultado foi a cassação de dez Deputados Federais. O escândalo da vez tem início na Câmara dos Deputados e vai às vísceras do Palácio do Planalto e do Partido que engendra a máquina do poder da União.

Ao ler a entrevista do Deputado Roberto Jefferson, percebi que o Presidente do PTB agiu em estado de necessidade. Embora o Parlamentar tenha mantido o cenho seguro, pude ler em suas palavras o desabafo de um homem acuado pela verdade, sufocado por uma coação irresistível e pronto para enfrentar a perda do próprio mandato.

O escândalo do “mensalão” está adquirindo contornos cada vez mais graves a cada minuto. Agora à tarde, o Governador de Goiás declarou ao Globo Online que sabia da existência da distribuição da dádiva delubiana e alertou o Presidente Lula há um ano e meio. Perillo afirmou que, para abreviar o assunto, Luiz Inácio falou que se tratava de uma prática introduzida por Sérgio Motta, ex-Ministro das Comunicações no Governo Fernando Henrique Cardoso. Sr. Presidente, se o Governador de Goiás contou ao Presidente da República há um ano e meio, não compreendi o porquê do choro.

Srªs e Srs. Senadores, o professor Delúbio Soares, matemático que é, não vai ter muita dificuldade de deduzir a seguinte equação, quando tiver assento na CPI. Eram R$30 mil mensais. Como o Deputado Roberto Jefferson declarou que a distribuição do ervanário era em escala partidária e o PP e o PL somam 106 Deputados, chegaríamos a R$3,180 milhões por mês. Por ano, o resultado salta para R$38,160 milhões. Considerando-se que o choro do Presidente estancou o propinoduto em janeiro de 2005, são dois anos de festa no céu, com um custo de R$76,320 milhões.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Com toda certeza, tamanha quantia não saiu dos cofres do Partido dos Trabalhadores! Então, qual será a causa? Seria sobra de campanha? Vai haver uma nova edição da “Operação Uruguai”? Já podemos chamar o professor do PT de Delúbio PC Soares? Só não será aceitável acusar a oposição de maquinadora de crises para desestabilizar o Governo Lula. A denúncia da costelada malunga produzida por Soares foi provocada por uma entrevista espontânea do Presidente de um Partido da base aliada. A credibilidade do doutor Roberto Jefferson não pode ser desmerecida por ninguém do PT, já que o Presidente Lula o abraçou e lhe hipotecou irrestrita solidariedade, quando, há três semanas, a revista Veja revelou a contaminação do esquema de corrupção nos Correios. Tanto que a nota oficial do Partido dos Trabalhadores, divulgada hoje no final da manhã, trata as denúncias de maneira lacônica.

O SR. PRESIDENTE (Tião Viana. Bloco/PT - AC) - Peço a V. Exª que conclua, Senador Demóstenes Torres.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Vou concluir, Sr. Presidente. Peço só um pouco de tolerância, porque hoje houve quase uma hora de tolerância com os demais Parlamentares, e terminarei em, no máximo, dois ou três minutos.

O SR. PRESIDENTE (Tião Viana. Bloco/PT - AC) - Não houve com nenhum Parlamentar uma hora de tolerância; alguns passaram de três a cinco minutos, e V. Exª já está com quatro minutos a mais. A Mesa vai compreender V. Exª.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO) - Muito obrigado.

Em nada lembra o furor radiante da estrela vermelha. Será que o Presidente do PTB, a quem devoto o maior respeito, se converteu em uma espécie de “Garganta Profunda” do Governo Lula?

Eu gostaria de comentar que o caso “delúbiogate” deixou o Presidente do PT, José Genoíno, e o Controlador-Geral da União, Waldir Pires, falando sozinhos. No último sábado, ambos publicaram, respectivamente, um artigo nos jornais O Estado de S.Paulo e Folha de S.Paulo, usando o mesmo argumento em defesa do Governo Lula. Os artigos diferem-se apenas na extensão da cantilena moralizante. O de Genoíno, mais volumoso, tem passagens curiosas e nada como o dia seguinte para desmenti-las.

Primeiro, o Presidente do PT escreveu que o Partido “sempre deixou claro aos seus integrantes que não transige internamente” com a corrupção. O Professor Delúbio Soares mora no âmago do PT. Isso quer dizer que o Ministro José Dirceu e o Presidente Lula sabiam da operação fraudulenta denunciada pelo Deputado Roberto Jefferson, mas o Presidente do PT tomou conhecimento da malandragem somente hoje, ao abrir a Folha de S.Paulo. No encerramento do infeliz artigo, Genoíno escreveu que “a oposição quer a CPI dos Correios para conturbar o ambiente político do País”. Ora, um funcionário de alto escalão dos Correios é flagrado recebendo propina. Ato contínuo sabe-se que a fraude se estende ao Instituto de Resseguros do Brasil. Em seguida, o Presidente do PTB vem a público denunciar o “mensalão”. Não, doutor Genoíno! O lobo do PT não é a oposição, mas o próprio PT.

O artigo do Controlador-Geral da União tem algo de filosófico. Vale destacar o trecho em que o doutor Waldir Pires adverte o nada a ninguém, quando deixa a entender, como se envergasse a razão revolucionária de La Pasionaria, que os corruptos no Governo Lula no pasarán!

De acordo com o texto, “ainda que tenhamos superado a era dos históricos tesouros reais, aqui e ali, saudosistas recalcitrantes imaginam que podem ignorar a marcha da história e continuar se lambuzando com recursos públicos”. O entendimento do Controlador-Geral lembra muito o personagem Zagalo, de Eça de Queiroz.

(Interrupção do som.)

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL- GO) - Narrador do romance “O Conde de Abranhos”, Zagalo é um serviçal sabujo e admirador simpático do “varão eminente, orador, publicista, estadista e filósofo Alípio Severo Abranhos”. Na apresentação da obra, assim o humilde criado Zagalo resume a sua devoção ao Conde, sentimento só assemelhado à consideração do Controlador-Geral ao Governo do PT: Ele “deu-me os meios materiais de me tornar um conservador convicto, um defensor fervoroso das instituições, um amigo da ordem”.

É isso, Senador Antonio Carlos.

Muito obrigado pela tolerância, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/06/2005 - Página 17946