Discurso durante a 80ª Sessão Especial, no Senado Federal

Comemoração do Dia Mundial pela Erradicação do Trabalho Infantil.

Autor
Serys Slhessarenko (PT - Partido dos Trabalhadores/MT)
Nome completo: Serys Marly Slhessarenko
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. POLITICA SOCIAL.:
  • Comemoração do Dia Mundial pela Erradicação do Trabalho Infantil.
Publicação
Publicação no DSF de 11/06/2005 - Página 19353
Assunto
Outros > HOMENAGEM. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA INTERNACIONAL, ERRADICAÇÃO, TRABALHO, INFANCIA.
  • COMENTARIO, DADOS, ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT), SITUAÇÃO, TRABALHO, INFANCIA, MUNDO, BRASIL.
  • NECESSIDADE, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO, MENOR, TRABALHADOR, IMPORTANCIA, CONSCIENTIZAÇÃO, SOCIEDADE, AUSENCIA, DISCRIMINAÇÃO, CRIANÇA, SITUAÇÃO, POBREZA.
  • IMPORTANCIA, TRABALHO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), SENADO, EXPLORAÇÃO SEXUAL, CRIANÇA, ADOLESCENTE.
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, PESSOAS, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), BENEFICIO, CRIANÇA, TRABALHADOR.
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, SECRETARIO NACIONAL, ASSISTENCIA SOCIAL, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE A FOME, DEFESA, DIREITOS, CRIANÇA.

A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, senhores que compõem a Mesa, Sr. Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Sr. Representante da OIT, Srª Presidente da Missão Criança, Srªs e Srs. Senadores, já se pronunciaram o Senador Cristovam Buarque, a Senadora Lúcia Vânia, a Senadora Heloísa Helena. Diria que eu já não precisaria fazer meu pronunciamento, porque tudo o que foi dito aqui é um retrato da realidade e vamos, com certeza, repetir os fatos no nosso discurso.

Mas, antes de iniciar a minha fala, saúdo todas as autoridades que estão hoje presentes. O nosso País deve muito às nossas crianças e deve muito às senhoras e aos senhores que aqui estão, porque, com certeza, todos aqui estão extremamente envolvidos em ações no dia-a-dia pela vida das nossas crianças.

Meu abraço muito carinhoso a cada criança que está aqui. E, ao fazê-lo, faço a todas as crianças do nosso País, muito especialmente àquelas crianças que Cristovam, Lúcia Vânia e Heloísa Helena, nosso Senador e nossas Senadoras, mencionaram: os carvoeirinhos e as carvoeirinhas, as crianças que trabalham nos sisais, as abandonadas nas ruas - as quais sabemos que, com um mínimo de apoio, com a garantia da educação em nossas escolas, conseguem sair com facilidade dessa situação. Basta que condições lhes sejam oferecidas.

Hoje é realmente um dia de reflexão no Senado da República.

De acordo com dados da OIT e do Programa Internacional de Eliminação do Trabalho Infantil (IPEC), existem no mundo cerca de 350 milhões de crianças e jovens envolvidos em alguma atividade econômica. Cerca de 250 milhões de crianças são exploradas, o que equivale a uma criança em cada seis no mundo. Destas, 170 milhões trabalham em condições perigosas, e 76 milhões têm idade inferior a 10 anos. A maior parte desse exército de minitrabalhadores vive na Ásia (127 milhões) e na África e Oriente Médio (61 milhões). Na América Latina e Caribe, são 17,4 milhões. Uma parte menor, mas dramaticamente consistente, desse contingente de trabalhadores é vitima de escravidão e destinada, por exemplo, à atividade de prostituição - número estimado em 8,4 milhões de crianças no mundo.

São números que estão postos por aí. Qualquer um pode abrir um livro e ver um dado estatístico desses, mas o Senado da República tem a obrigação de deixar registrado nos seus Anais, e nós, Senadores, temos que ter esses dados permanentemente no nosso coração e na nossa consciência. Por isso, fiz questão de trazer esses números para esta tribuna e deixá-los aqui gravados.

O trabalho infantil, ao mesmo tempo em que é combatido por muitos, é usufruído por outros tantos e exercido por cerca de 3,8 milhões de crianças e adolescentes no Brasil, o que coloca nosso país como o terceiro país latino-americano a tornar a infância algo inviável, segundo dados da Unicef.

O Brasil possui mais de 80% da população vivendo na área urbana. Apesar de a população e os empregos em geral se concentrarem nas áreas urbanas, o trabalho infantil ainda tem a sua maior proporção na área rural, ou seja, mais ou menos 70%.

Não entram nesses números dados de crianças envolvidas com o tráfico de drogas, delitos ou prostituição, pela dificuldade de identificá-los, mas acreditem, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, senhoras e senhores aqui presentes, é um número inaceitável. Nenhuma criança pode ser exposta a esse tipo de violação e exploração.

A história do trabalho infantil, ilegal até os 15 anos, segundo nossa Constituição, acompanha a própria trajetória do nosso País, quando crianças descendentes de negros e índios eram obrigadas a incrementar a mão-de-obra das fazendas no período colonial. De lá para cá, expandiram-se as "possibilidades de trabalho", passando pelo vendedor de jornais, o engraxate, o vigia de carros, até chegar aos soldados e aos chamados “aviões” do tráfico, utilizados na venda de drogas.

Essa é uma chaga social de proporções assustadoras, que, em nosso País, acomete quase 10% das crianças entre 5 e 14 anos, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD. Entre essas, aproximadamente 520 mil estão inseridas no contexto do trabalho infantil doméstico.

Tenho dados aqui que são aterradores. O Senador Cristovam, com certeza, é das pessoas que mais conhece tais problemas, pela dedicação, vontade e determinação que ele tem - assim como todos nós -, permanentemente, de dizer que as nossas crianças precisam estar na escola.

Sou professora, como outros Senadores e Senadoras que temos aqui. Trinta por cento dessas crianças não freqüentam a escola. O analfabetismo chega a 10%. Em alguns Estados do nosso País, o número dessas crianças trabalhando sob servidão, sem nenhuma remuneração, ultrapassa 10%. E mais de 50%, em quatro Estados da nossa Federação, não freqüentam a escola. Trinta por cento é no global.

No meu Estado de Mato Grosso, Sr. Presidente, aproximadamente doze mil garotas são trabalhadoras domésticas. Alguns dirão que é pouco, mas a densidade demográfica do meu Estado é pequena; por isso, considero um número absurdo.

As crianças trabalhadoras não são vítimas apenas dos problemas sociais que flagelam suas famílias. Sofrem da mesma forma da intolerância de uma sociedade que não se livrou do seu ranço escravocrata e acredita, isso que é o pior, que o trabalho é a melhor formação possível para meninas e meninos oriundos da classe trabalhadora, sob o pretexto de que o trabalho livra a criança do ócio e a afasta dos perigos da criminalidade, atuando como agente formador.

Deixa-me absolutamente indignada ouvir esse discurso quase que permanentemente quando combatemos o trabalho infantil. As pessoas dizem: a senhora quer que essa criança vá para o mundo da criminalidade, Senadora? Porque é muito bom e importante a criança trabalhar para a formação dela.

Temos que combater esse ranço discriminatório. Mostrar à população brasileira, já que não podemos para todo o Planeta, que não é por aí a saída, não é colocando as nossas crianças para trabalhar, e trabalho geralmente escravo ou semi-escravo, que vamos resolver o problema. Vamos resolvê-lo fazendo essas crianças permanecerem na escola, fazendo essas crianças serem realmente crianças, terem seu tempo. Criança tem que brincar, sim. Criança tem que estudar, tem que brincar, tem que ter a sua vida de criança.

Como disseram aqui há poucos instantes todos os Senadores que me antecederam, a Senadora Lúcia Vânia, o Senador Cristovam Buarque - mas eu ouvi aqui o final do discurso da Senadora Heloísa, porque tive que sair para dar uma entrevista -, as nossas crianças não são tratadas como crianças. Elas são tratadas como um ser humano em estado de semi-servidão. E isso não pode continuar.

Este preconceito tem origens históricas e está sedimentado na estruturação do ensino brasileiro, que reserva para os filhos da elite o ensino formal e para os filhos do trabalho o ensino profissionalizante. E o pior é que alguns confundem: se não há sequer escola profissionalizante, colocam as crianças para trabalhar de qualquer maneira, chegando à situação que foi relatada aqui com muito mais detalhes.

Aqui no Congresso Nacional, Sr. Presidente, eu quero destacar a atuação da CPMI da Exploração Sexual, que terminou o trabalho e o relatório há pouco tempo, mas deixou muitas recomendações e proposituras da maior relevância. Essa CPMI funcionou sob a presidência da eminente Senadora Patrícia Saboya Gomes, com a relatoria da nossa Deputada Maria do Rosário. Foi um trabalho grandioso que enalteceu o Senado da República e a Câmara dos Deputados.

Eu também fui membro desta CPMI, que investigou principalmente a exploração sexual, quando ficou flagrante a utilização de crianças em redes de prostituição. A partir dos debates realizados no âmbito dessa Comissão, surgiram ações legislativas em prol da criança e do adolescente.

            O Governo Federal tem se destacado com diversas ações para combater o trabalho infantil. Mas não serei injusta. Quero dizer aqui que no governo anterior também existiram ações determinadas. Eu louvo, inclusive, o trabalho da Senadora Lúcia Vânia por tudo o que S. Exª relatou aqui, mas principalmente pelo Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti). Senadora Lúcia Vânia V. Exª falou nos carvoeirinhos e nas carvoeirinhas, no trabalho dessas crianças nos canaviais. Presidi, em Mato Grosso, como Deputada Estadual, a CPI do Trabalho Escravo. Quando a pedi, e quando assumi a Presidência e começamos o trabalho, imaginei que fôssemos tratar do trabalho escravo de adultos, mas nos espantou o tanto de criança - criança pequenininha - que fotografamos com o facão que cortava cana, do lado dela, e o facão era maior do que a própria criança. Realmente, isso nos envergonha, isso é terrível, isso é triste.

Vou até pedir ao Presidente que fique meu discurso na íntegra registrado nos Anais do Senado, porque ele está bastante grande. Queria ir mais para o final, dizendo que não posso deixar de fazer uma homenagem à atuação de um setor que comparece nessa empreitada, que é peça fundamental para a correção, inclusive das falhas, de nossas políticas públicas, que são as ONGs, que atuam onde os braços do Estado, por algum motivo, não conseguem chegar. Então, realmente, nossa homenagem a todas as organizações não-governamentais, que muito fazem por esta questão.

Queria falar aqui também, especialmente ao Senador Cristovam Buarque, que, em novembro de 1998, criou uma organização para disseminar a mania de educação, com o objetivo de retirar a obrigação das crianças de trabalhar para auxiliar no sustento de suas famílias e colocá-las nas salas de aula, que é o lugar em que elas têm obrigação de estar.

Quero também aqui homenagear a Missão Criança, essa importantíssima ONG que tem o objetivo de disseminar o Programa Bolsa Escola no Brasil e no mundo, garantindo o direito à educação a todas as crianças.

            Não posso deixar de citar também a Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente, que saúdo aqui na pessoa da Srª Sandra. A fundação completa 15 anos em 2005, a mesma idade do Estatuto da Criança e do Adolescente. Ela tem se destacado por ações que incidem diretamente no combate ao trabalho infantil, além de parcerias com outras entidades na formação de redes sociais atuantes na sociedade.

Concluindo a minha fala, gostaria de apresentar o resultado de uma pesquisa elaborada pela OIT e pelo Ipec, em 2003, que investigaram os custos que a exploração infantil traz para a economia dos países. O resultado é surpreendente: se os 250 milhões de crianças não fossem exploradas e tivessem acesso à educação, até considerando o trabalho e a produção perdida, a vantagem econômica global seria notável. Em 20 anos, para cada dólar gasto em educação das crianças que atualmente são exploradas, haveria um incremento na renda de US$9,9, em média, no mundo e US$15,6, em média, nos países emergentes. A eliminação do trabalho infantil causaria, nos mesmos 20 anos, um incremento médio de 9,3% do PIB nos países da América Latina e de 5,1% nos países emergentes.

Estes dados só vêm a comprovar a idéia de que o investimento em educação e na manutenção de nossas crianças nas escolas é fundamental para a erradicação do trabalho infantil. Acredito que em breve viremos a esta tribuna comemorar a total erradicação do trabalho infantil. Está em nossas mãos, e sei que não estamos nos furtando em trabalhar mais e mais pelas crianças deste País.

Louvo aqui, encerrando, a campanha que a CNTE, Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação, vem fazendo pela conversão de parte da dívida em investimentos para a educação. Essa é uma campanha que a sociedade brasileira tem que assumir. Parte dessa dívida - 20% ou 30%, não sei que percentual - tem que obrigatoriamente ser convertida em investimentos para a educação.

Quero pedir ainda o registro nos Anais do Senado desse artigo do Sr. Osvaldo Russo: “Direito de ser criança”. O artigo finaliza dizendo que lugar de criança é na escola e que toda criança tem direito à convivência familiar e comunitária, criança tem direito de ser criança. E vamos abolir esse slogan que através dos tempos sempre foi inculcado em nossas mentes, de que criança e jovem são o futuro do Brasil. Não, criança e jovem são o presente do Brasil. Conforme esse presente lhes for oferecido, elas e nós teremos um grande futuro.

Um abraço a todos e a todas. (Palmas.)

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DA SRª SENADORA SERYS SLHESSARENKO.

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a srª serys slhessarenko (Bloco/pt - mt. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, hoje, durante esta sessão solene para comemorar o Dia Mundial de Erradicação do Trabalho Infantil, celebrado anualmente dia 12 de junho, devemos fazer uma reflexão sobre o tema, sobre o que temos feito para acabar esta aberração social que é a exploração de crianças, o roubo de suas infâncias.

De acordo com dados da OIT e do Programa Internacional de Eliminação do Trabalho Infantil (IPEC), existem no mundo cerca de 350 milhões de crianças e jovens envolvidas em alguma atividade econômica. Cerca de 250 milhões são exploradas, o que equivale a uma criança em cada seis no mundo. Destas, 170 milhões trabalham em condições perigosas e 76 milhões têm idade inferior a 10 anos. A maior parte deste exército de mini-trabalhadores vive na Ásia (127 milhões) e na África e Oriente Médio (61 milhões). Na América Latina e Caribe são 17,4 milhões, ou seja, 8% do total. Uma parte menor, mas dramaticamente consistente, desse contingente de trabalhadores é vitima de escravidão e destinada, por exemplo, à atividade de prostituição - número estimado em 8,4 milhões de crianças no mundo.

O trabalho infantil ao mesmo tempo em que é combatido por muitos, é usufruído por outros tantos e exercido por cerca de 3,8 milhões de crianças e adolescentes no Brasil, o que coloca nosso país como o terceiro país Latino-Americano a tornar a infância quase inviável, segundo dados da Unicef.

O Brasil possui mais de 80% da população vivendo na área urbana. Apesar da população e os empregos em geral se concentrarem nas áreas urbanas, o trabalho infantil ainda tem grande proporção rural.

Atualmente, a OIT afirma que 70% dos trabalhos infantis dividem-se na agricultura, pesca e atividades de caça; seguidos por 8% que vêm das linhas de produção, comércio atacado e varejo; 8% de serviços domésticos; 4% de transportes, armazenamentos e comunicação, e os 3% restantes são atribuídos à construção e a mineração.

Não entram nesses números dados de crianças envolvidas com o tráfico de drogas, delitos ou prostituição, pela dificuldade de identificá-los, mas acreditem senhores senadores, senhoras senadoras, é um número inaceitável, nenhuma criança pode ser exposta a este tipo de violação e exploração.

A história do trabalho infantil, ilegal até os 15 anos segundo nossa Constituição, acompanha a própria trajetória do país, quando crianças descendentes de negros e índias eram obrigadas a incrementar a mão-de-obra das fazendas no período colonial. De lá para cá, expandiram-se as "possibilidades de trabalho", passando pelo vendedor de jornais, o engraxate, o vigia de carros, até chegar aos soldados e os chamados “aviões” do tráfico, utilizados na venda de drogas.

Esta é uma chaga social de proporções assustadoras, que em nosso país, acomete aproximadamente 7% das crianças entre 5 e 14 anos, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD. Dessas, aproximadamente 520.000 estão inseridas no contexto do trabalho infantil doméstico.

Esses dados são mais preocupantes quando cruzados com dados de pesquisas encomendadas pela Organização Internacional do Trabalho - OIT nas cidades de Belém, Belo Horizonte e Recife. Constata-se que o trabalho infantil doméstico atinge em cheio as meninas (92,71%), majoritariamente as pardas e negras (74,70%), as quais invariavelmente provêm de famílias de baixa renda. Isso é um retrato cruel da discriminação social contra crianças pobres, do sexo feminino, pardas e negras.

Em geral, a remuneração é de cerca de meio salário mínimo mensal, a escolaridade média é inferior a 6 anos, e cerca de 30% não freqüenta a escola. O analfabetismo chega a quase 10% em Alagoas, e o número de pessoas trabalhando sem rendimento é próximo de 10% no Ceará e Santa Catarina, e mais de 50% não freqüentam escolas em Rondônia, Roraima, Espírito Santo e Distrito Federal.

No meu estado do Mato Grosso, Senhor Presidente, aproximadamente 12 mil garotas são trabalhadoras domésticas, ou seja, 0,5% da população mato-grossense, o que considero um número expressivo, apesar de não ser um dos maiores índices do país, ainda assim é preocupante.

As crianças trabalhadoras não são vítimas apenas dos problemas sociais que flagelam suas famílias. Sofrem da mesma forma da intolerância de uma sociedade que não se livrou do seu ranço escravocrata e acredita que o trabalho é a melhor formação possível para meninas e meninos oriundos da classe trabalhadora, sob o pretexto de que o trabalho livra a criança do ócio e a afasta dos perigos da criminalidade, atuando como agente formador.

Este preconceito tem origens históricas e está sedimentado na estruturação do ensino brasileiro, que reserva para os filhos da elite o ensino formal e para os filhos do trabalho o ensino profissionalizante.

Após fazer esta apresentação da situação do trabalho infantil no Brasil, principalmente das meninas trabalhadoras, quero destacar a atuação do poder público, a nossa atuação, frente a este grave problema.

Aqui no Congresso Nacional devo destacar a atuação da CPMI da Exploração Sexual, sob a presidência da eminente Senadora Patrícia Saboya Gomes, da qual fui membro, que discutiu temas relacionados a exploração sexual, onde ficou flagrante a utilização de crianças em redes de prostituição. A partir dos debates realizados no âmbito da Comissão surgiram ações legislativas em prol da Criança e do Adolescente.

O Governo Federal tem se destacado com diversas ações para combater o trabalho infantil. Não vou ser injusta, devo dizer que desde o governo anterior já há ações com vistas a erradicar o trabalho infantil.

Para tentar combater o problema do trabalho de crianças em carvoarias do Mato Grosso, e mais tarde o trabalho infantil de maneira geral, o governo federal lançou, em 1996, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti).

O Governo do nosso querido Presidente Lula, juntamente com alguns segmentos da sociedade civil, encontra-se empenhado na tarefa de erradicar o trabalho infantil no País. Para tanto, vem utilizando diversos mecanismos e instrumentos disponíveis, que vão desde a fiscalização realizada no local de trabalho à implantação e desenvolvimento de projetos que visam a dar orientação aos pais e às crianças que trabalham, fornecendo-lhes também capacitação para alternativas de geração de renda familiar.

Sr. presidente, acredito muito que a Educação é uma das saídas para a total erradicação do trabalho infantil! Garantir que as crianças de nosso país permaneçam mais tempo nas salas de aula é uma forma de evitar que sejam exploradas.

É exatamente este o foco dos principais programas do governo para o tema, condicionar o repasse da renda à freqüência escolar, apesar dos problemas que surgiram e que é de conhecimento geral, não podemos deixar de elogiar esta ação que tem gerado sim, muitos benefícios para as populações mais carentes, com aumento real das taxas de permanência das crianças nas escolas.

A transferência de renda funciona também como uma forma de acabar com a cruel desigualdade de renda existente em nosso país, Senhores senadores, senhoras senadoras, o Brasil é o Segundo país com maior desigualdade de renda do mundo! Uma situação inaceitável para um país tão rico como o nosso, num contexto como este falar em erradicação do trabalho infantil torna-se difícil.

Apenas com o incremento real da renda das famílias, principalmente as mais pobres, é que conseguiremos este objetivo; é exatamente isto que os programas do governo pretendem, substituir a renda gerada pela criança com seu trabalho, subsidiar sua permanência na escola e, ainda, propiciar cidadania para as famílias mais pobres, num esforço em redistribuir a renda nacional.

Não posso deixar de fazer aqui uma homenagem à atuação do terceiro setor nesta empreitada, peça fundamental para correção das falhas do Estado. Acredito que seja esta a real função das ONG’s, atuar onde os braços do Estado, por algum motivo, não chegam.

Especialmente o Senador Cristovam Buarque, que em novembro de 1998 criou uma organização para disseminar a mania de educação. Com o objetivo de retirar a obrigação das crianças de trabalharem para auxiliar no sustento de suas famílias e colocá-las nas salas de aula, que é o lugar onde elas têm a obrigação de estarem. Surgindo, assim, a Missão Criança, uma importantíssima ONG que tem o objetivo de disseminar o programa Bolsa-Escola no Brasil e no mundo, garantindo o direito à educação a crianças pobres.

Não posso deixar de citar, também, a Fundação ABRINQ pelos Direitos da Criança e do Adolescente que completa 15 anos em 2005 - mesma idade que tem o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA. A Fundação tem se destacado por ações que incidem diretamente no combate ao trabalho infantil, além de parcerias com outras entidades na formação de Redes sociais atuantes na sociedade.

Concluindo minha fala gostaria de apresentar o resultado de uma pesquisa elaborada pela OIT e pelo IPEC, em 2003, que investigaram os custos que a exploração infantil traz para a economia dos países. O resultado é surpreendente: se os 250 milhões de crianças não fossem exploradas e tivessem acesso à educação, até considerando o trabalho e a produção perdida, a vantagem econômica global seria notável. Em vinte anos, para cada dólar gasto em educação das crianças que atualmente são exploradas, se obteria um incremento na renda de 9,9 dólares em média no mundo e 15,6 dólares em média nos países emergentes. A eliminação do trabalho infantil causaria, nos mesmos vinte anos, um incremento médio de 9,3% do PIB nos países da América Latina e de 5,1% nos emergentes.

Estes dados só vêm a comprovar a idéia de que o investimento em educação e na manutenção de nossas crianças nas Escolas é fundamental para a erradicação do trabalho infantil. Acredito que em breve viremos a esta tribuna comemorar a total erradicação do trabalho infantil, está em nossas mãos e sei que não estamos nos furtando em trabalhar mais e mais pelas crianças deste país.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigada.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE A SRª SENADORA SERYS SLHESSARENKO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e o § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Direito de ser criança - (Osvaldo Russo)”


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/06/2005 - Página 19353