A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL. Como Líder. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vários Parlamentares, de alguma forma, comentaram, cada um de acordo com suas convicções e interpretação do momento - Senador Tião Viana, Senador Pedro Simon -, o assunto que está, sem dúvida, rebuscando mentes e corações no Brasil todo, que, ontem, culminou com a saída do Ministro José Dirceu, um fato extremamente importante.

Acompanhei pela imprensa as formulações dos articulistas e os comentários feitos, inclusive por petistas, e uma das frases que está colocada hoje num dos jornais de grande circulação é que o Ministro José Dirceu foi vítima do seu próprio veneno. Isso teria sido dito por alguns petistas.

Muitas pessoas, Senador Heráclito Fortes, do Brasil todo, quando me encontram, sempre perguntam se eu estou comemorando todas essas denúncias de corrupção e se estou comemorando a queda do Ministro José Dirceu. As pessoas citam comentários sórdidos, frios e intolerantes que ele fazia contra mim no processo de expulsão. Essas pessoas, Senador Tião Viana, lembram mais do que eu própria. Comentam a fala dele no programa “Bom Dia Brasil”, no “Jornal Nacional”. Um jornalista comenta o que ele, na surdina, falou, até de forma vulgar e sórdida, contra mim, desde a minha vida política até a minha vida pessoal, coisas que nem eu conseguia identificar se verdade era.

O Ministro José Dirceu, enquanto fui militante do PT, sempre foi para mim - claro que Lula era a maior liderança popular da América Latina, e continua sendo, e tinha todo aquele misto da subjetividade conosco, porque um operário, retirante nordestino, filho do povo, que, pelas mãos e vontade bela e legítima do povo, chegou pela primeira vez a ocupar a maior instância de decisão política do País, que é o Palácio do Planalto - e para os militantes do Partido, o mais preparado quadro partidário. O mais preparado quadro partidário sempre foi o Ministro José Dirceu. E quando eu era militante, ele nunca foi comigo o que muitas pessoas consideram, uma pessoa fria e intolerante. Muito pelo contrário, sempre foi um grande companheiro. Eu até reconheço que, durante o processo de coligação com o PL, ele fez um esforço grande para tentar retirar o caso de Alagoas, porque sabia que eu não aceitaria, de nenhuma forma, a aliança com o PL. Até reconheço que ele fez muitos esforços.

Por isso, para mim, era extremamente complicado ver a transformação do grande companheiro, que não era frio comigo, pelo contrário, me saudava com entusiasmo onde eu estivesse, em uma pessoa intolerante e implacável quando precisou servir ao rei, servir a Lula. Embora eu reconheça em Lula a mais brilhante personalidade que o movimento sindical já fez, a maior liderança popular da América Latina, nunca compartilhei da concepção elitista e preconceituosa de que Lula é um fraco, um pau-mandado, que os outros mandam e por ele fazem. Nunca compartilhei dessa visão. E claro que essa análise minha serve para o bem e para o mal.

E José Dirceu sempre foi... Do Lula, eu não tenho dúvida, ele reproduz aquele conhecido estratagema do ‘mel na boca e bílis no coração’. É capaz de lhe abraçar e sorrir pela frente e entregar um punhal para que algum outro lhe apunhale pelas costas. O Ministro José Dirceu é diferente, ele é o inimigo sem máscara, é o inimigo que olha nos seus olhos e diz: “Eu vou lhe aniquilar.” E você, por sua vez, olha nos olhos dele e diz: “Eu vou resistir e tentar lhe aniquilar também.” Ele sempre foi assim.

É por isso que eu sempre digo que ou todos são inocentes ou todos são responsáveis pelos mesmos crimes contra a administração pública. Eu não consigo acreditar que o Ministro José Dirceu desse algum passo - nem o Tesoureiro do PT, o Sr. Delúbio - sem a concordância, sem a autorização, sem o conhecimento do Presidente Lula. Eu acho isso impossível e talvez a Comissão Parlamentar de Inquérito me diga o contrário e eu terei a obrigação de vir a esta tribuna para dizer que errei, especulei, analisei de forma indevida.

Ao ouvir, ontem, o pronunciamento do Ministro José Dirceu, do ‘samurai’ José Dirceu, e ele falava sobre a mãe dele, mandando um recado carinhoso à mãe, dizendo que a mãe estava muito preocupada; imediatamente, a minha mãe me ligou, perguntando por que ele não pensou na mãe da Heloísa quando agiu com tanta intolerância, truculência e, sob o comando do Presidente Lula, me expulsou e promoveu um dos momentos de maior dor da vida minha, da Luciana, do Babá e do João Fontes. E eu observava a expressão do ‘samurai’. Samurai, todos sabem como eu gosto do mundo oriental, vem de saburai, que significa ‘servir ao senhor’.

E o ‘samurai’ José Dirceu, quando teve sua honra atingida e portanto a honra do seu mestre, o Presidente Lula, atingida também, tinha duas opções: o haraquiri, que, como sabem todos, significa o samurai empunhando sua espada, cortando o seu ventre e se suicidando, ou se transformar num ronin, que é o samurai errante, o samurai sem mestre e sem honra, que sai por aí afora para tentar resgatar a sua honra ou para tentar vingar o seu mestre. E foi exatamente isso que vi ontem no Ministro José Dirceu, promovendo, em concordância com o Presidente Lula e com a cúpula palaciana do PT, tal qual o samurai que tem duas alternativas, ou o haraquiri ou se transformar num ronin. Portanto, o guerreiro brilhante, implacável, corajoso, combativo, mas que se transforma num ronin, um samurai sem honra e sem mestre.

E eu me lembrava, com muita precisão, da forma como ele se estava conduzindo, ajudando o Governo Lula a patrocinar uma manobra extremamente inteligente.

Essa manobra do Governo foi muito inteligente: retira-se o Ministro José Dirceu, que é o foco das gravíssimas denúncias de corrupção, para se tentar esvaziar a crise, ludibriando a opinião pública, impedindo o aprofundamento das investigações, resguardando, de forma intocável, o Presidente Lula. Foi exatamente isso que aconteceu. Numa manobra muito inteligente, esvaziou-se o foco das denúncias graves de corrupção, que supostamente seria o Ministro José Dirceu. No entanto, não tenho dúvida de que ele nada faria sem a concordância, o conhecimento e a autorização do Presidente Lula.

A única dúvida que fica é se essa manobra inteligente de tentar esvaziar a crise, retirando o Ministro José Dirceu, foco das denúncias de corrupção, significa oxigênio suficiente para o Governo atravessar o nevoeiro das denúncias de crimes contra a Administração Pública e se isso não pode significar, também, tornar-se ainda mais refém do Senado, da Câmara e dos delinqüentes de luxo fisiológicos, que até querem que haja fragilidade no Governo para continuarem parasitando e privatizando a máquina pública, o aparelho de Estado.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu não poderia deixar de fazer essas brevíssimas colocações, diante dessa manobra inteligente do Governo, que tenta obter oxigênio para ludibriar a opinião pública, retirando o Ministro para, supostamente, esvaziar o foco das graves denúncias de corrupção que pesam contra o Governo.

Espero, sinceramente, que esta Casa seja capaz de dar continuidade à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito.

Várias pessoas telefonam-me, mandam e-mail, ligam para o 0800 gratuito do Senado, dizendo, a todo tempo, que a CPMI é “chapa branca” que não vai acontecer nada. É claro que a CPMI tem uma classificação “chapa branca”, pois são da Maioria os cargos de Presidente, de Vice-Presidente e de Relator, mas ainda continuo acreditando que este Congresso, tão desmoralizado perante a opinião pública, será capaz de aprofundar as investigações na CPI e apresentar à opinião pública os delinqüentes de luxo que parasitam o aparato público, o aparelho de Estado, para que possamos aprimorar essa tão desavergonhada e combalida democracia representativa.

Portanto, é só, Sr. Presidente.