Discurso durante a 85ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

A crise política no País.

Autor
Heráclito Fortes (PFL - Partido da Frente Liberal/PI)
Nome completo: Heráclito de Sousa Fortes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT).:
  • A crise política no País.
Publicação
Publicação no DSF de 18/06/2005 - Página 20267
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT).
Indexação
  • COMENTARIO, TRANSFORMAÇÃO, CONDUTA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMPARAÇÃO, PERIODO, ANTERIORIDADE, VITORIA, ELEIÇÕES.
  • CRITICA, MANIPULAÇÃO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, REFERENCIA, DIVERSIDADE, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT), FUNDOS, PENSÕES, BANCO DO BRASIL.
  • EXPECTATIVA, EFICACIA, RESULTADO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT).

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não é sem nenhum motivo que o Governo chama esta sexta-feira de “muro das lamentações”, de “sexta-feira ingrata” ou de outros adjetivos.

Até há pouco tempo, as sextas-feiras, no Senado, eram dias de descanso; não havia número em plenário, o que aliviava não só os Senadores, como os jornalistas e também os funcionários da Casa.

As sextas-feiras, neste Governo, passaram a ser dias de vigília cívica, mas o Governo, muito ocupado, com algumas exceções como o Senador Tião Viana, não aparece aqui. São compromissos internacionais, ministeriais, inaugurações, visitas, mas a atividade parlamentar, a defesa do Governo é muito pouca. Raramente vêm aqui. Alguns são escalados e ficam aqui cabisbaixos.

Lembro-me da altivez, da autoridade com que o mesmo Partido, quando era Oposição, defendia suas teses, suas causas, atacava os corruptos e as corrupções. Eram verdadeiros paladinos da moralidade, que achavam ser monopólio exclusivo de uma rara espécie. Tudo caiu por terra.

Se nós, Senador Tião Viana, tivéssemos prestado atenção de como começou a mudar o Governo Lula, perceberíamos uma semelhança grande com o Presidente Collor, em dimensões diferentes, até pela origem de um e outro.

No dia da eleição do Presidente Lula, durante a comemoração na Avenida Paulista, o líder petista saiu da sua casa de origem humilde, numa cidade de trabalhadores, não no carro de costume, mas num helicóptero inglês, emprestado pela Rolls-Royce. Aquilo foi noticiado como uma coisa natural pelos seus assessores e asseclas, como uma grande conquista. O Brasil todo estava anestesiado e não percebeu o fato. De lá, ele saiu e ocupou, numa mesma tarde, dois hotéis próximos à Avenida Paulista, pertencentes a multinacionais: o Intercontinental e o Meliá. A 100m de distância, Senadora Heloísa Helena, passando por uma crise financeira fantástica, o Hotel Maksoud, de origem brasileira, foi desprezado.

O Collor fez parecido. Saiu num jatinho, com poucos amigos, e foi para as Seychelles. Evidentemente, as proporções de um fato e de outro não se comparam, mas um homem refinado, acostumado com tudo de bom e de melhor na vida, viajar para as Seychelles num jatinho tem a mesma dimensão que um trabalhador, um torneiro mecânico, sair da sua casa, no bairro em que viveu durante os momentos mais bonitos de sua vida, entrar num helicóptero e se dirigir para a Paulicéia Desvairada. Aquilo, para mim, foi a simbologia da despedida de Lula da classe trabalhadora.

Os fatos que vêm ocorrendo mostram que alguns conseguiram blindar o Presidente. O Presidente não consegue mais, como antigamente, respirar o ar comum dos mortais. Não o permitem.

Eu já disse aqui, e repito, que o conterrâneo do Senador Marco Maciel, Agamenon Magalhães, dizia que o homem público deveria dormir com um alfinete na cabeceira da sua cama ou no criado-mudo, para, de manhã, ao acordar, dar uma espetada no corpo e perceber que a dor que sentia era igual a de todos. Portanto, eram iguais. Infelizmente, os homens públicos se esquecem disso.

Senadora Heloísa Helena, Senador Mão Santa, não queiram sentir nem avaliar a minha frustração por estar nesta Oposição. Oh, Oposição incompetente! Oh, Oposição sem criação! Oh, Oposição sem imaginação! Passaram-se dois anos e seis meses, e não conseguimos criar uma crise para esse Governo, pois ele toma conta de todas. O Governo não dá espaço. Por mais tentativas que façamos, não conseguimos.

Hoje, estourou um fato que penso seja mais grave do que o jornal O Estado de S. Paulo anuncia: a denúncia contra o Sr. Delcídio Amaral.

Vamos admitir que seja verdade que S. Exª deu prejuízo. Por que o Sr. Sauer não o denunciou no começo? Não o denunciou há um mês? Não o denunciou anteriormente? Faz essa denúncia dois dias depois de o Sr. Delcídio ser anunciado Presidente da da CPI? E nós todos, aqui no plenário, sabemos que o Sr. Delcídio aceitou na marra essa presidência, e a aceitou como um presente de grego, sabendo que os que maquinaram a sua indicação o fizeram exatamente com a intenção de queimá-lo. É o fogo amigo palaciano. Lá no Piauí, temos uma expressão que diz que, em determinados casos, é melhor levar um bode amarrado para dentro d’água do que um cidadão assumir certas circunstâncias. O Senador Delcídio foi, com a mesma má vontade do bode, entrar em água. V. Exª é nordestina e sabe que o bode pula, o bode estrebucha. E, para nós, a primeira esperança de chuva é quando o bode começa a sair do relento, sair do tempo e se agasalhar em alguma coisa. Nunca vi uma incompatibilidade tão grande como entre o bode e a água. O Senador Delcídio foi nessas circunstâncias.

Aliás, o fogo amigo tem sido uma constante no Governo. A vítima agora é o maior de todos, o Ministro José Dirceu. V. Exª falou em samurai, não entendi bem, mas sei que V. Exª é inteligente. Parece que essas inspirações orientais, essas coisas que estão vindo muito de longe, estão exatamente maquinando algumas coisas.

Senadora Heloísa Helena, Senador Mão Santa, V. Exªs tiveram a curiosidade de observar no cenário da saída do Ministro José Dirceu - todos imaginávamos que fosse de pranto, aquele grande guerreiro, aquele grande combatente, para quem faziam fila na hora de recebê-lo - o ar de alívio, de alegria, nos sorrisos marotos de seus colegas? Revejam isso, vale a pena. A televisão está mostrando constantemente. Uns mais, outros menos, ninguém conseguia esconder o sorriso de alegria e satisfação. É triste, mas é verdade.

Acho que o Presidente Lula ou se liberta dessa camarilha que o cerca ou vai jogar por terra toda sua história e toda sua trajetória. Observo, algumas vezes, Senadora Heloísa Helena, quando este plenário está calmo, que alguns companheiros nossos fazem os discursos mais despropositais, defendendo a figura de quem não está sendo acusado, que é o Presidente, jogando para ele o foco de uma questão que nunca, nem de longe, se pensou em colocar em Sua Excelência.

Srª Presidente, Srs. Senadores, cheguei a esta Casa, primeiro na Câmara e agora aqui, muito novo e aprendi um bocado. Esta é uma academia de aprendizagem fantástica e, graças a Deus, entrei numa escola boa, convivendo com grandes figuras. Mas tenho comigo um sentimento. Existe no ar, nunca foi escrito, nunca foi colocado no papel, como aquele dicionário do correto, mas existe na mente de todos nós a existência de um manual de como não repetir erros, porque, se formos examinar as últimas crises que o Brasil viveu, vamos ver que, da primeira até a de agora, são repetições de erros.

Collor foi vítima dos próprios erros. Mas, antes de qualquer dos desacertos virem à tona, de maneira preconceituosa, criou-se a República das Alagoas. Estigmatizaram o Estado, o que deixou seus conterrâneos inteiramente indignados, porque, de uma maneira preconceituosa, começaram a enxovalhar o próprio Estado. Depois, os fatos vieram.

O Governo atual tem uma República gravíssima, que é a República da Previ. Anote o que estou dizendo, Srª Senadora, Srs. Senadores, essa história da Previ não está bem contada. O Sr. Sérgio Ricardo Rosa precisa prestar esclarecimento da sua atuação. Estão blindando o homem.

A finada Previ, que foi criada por decreto-lei e derrotada nesta Casa, voltando, pelo menos provisoriamente, a funcionar a SPC, é presidida por ele, que tem um passado recente de assessoria e sociedade com o Ministro Gushiken.

O Ministro Gushiken tem todo o direito de gostar dessa matéria. Admiro-o, fui Deputado com ele e vi a sua atuação na CPI dos Fundos de Pensões, envolvendo o Banco do Brasil. Mas então assuma o Ministério da Previdência! Não coloque um órgão paralelo dentro do Palácio do Planalto, indicando o Presidente, manobrando e manipulando essa área, que é sensível. Digo isso porque, em determinado momento da minha vida, fui superintendente de um fundo de pensão, exatamente dos Correios e Telégrafos, onde passei de um ano e meio a dois anos. Assumi numa época difícil, em que todos os escândalos remanescentes do Governo Collor estavam para ser consertados. Não se respeitava limite de aplicação, não se respeitava uma série de parâmetros exigidos pela legislação. Mas a SPC fiscalizava. Quando não tinha quadros próprios, requisitava do Banco Central e do Banco do Brasil pessoas experientes e mandava apurar. Mandaram para cá a medida provisória criando 600 ou 700 cargos. Criaram a estrutura de uma agência reguladora, só que o Presidente era indicado pelo Governo. E os Ministros da Previdência - pelo menos de um eu já ouvi, não me desmente - disse-me que, ao assumir, a recomendação que recebeu foi a de que não mexesse com esse rapaz que está lá, do qual não me lembro o nome agora. Que depois o Presidente Lula não diga que não sabe. Quem está alertando é um Senador da República.

Os funcionários aposentados do Banco do Brasil visitaram vários gabinetes, inclusive o de V. Exª, o da Senadora Ana Júlia Carepa e de vários Senadores, Senadora Heloísa Helena, alertando para prejuízos dados nas transações feitas por esse fundo de pensão. Sou irmão de três funcionários do Banco do Brasil - dois morreram e um está vivo. Convivi muito com essa gente, com os servidores do Banco do Brasil. Quando cheguei em Brasília, ainda solteiro, os três moravam na 204, na Asa Sul, e essa convivência fraterna se estende até hoje. Toda vez que o alarme anuncia, sou visitado por ele, procurado, insiste tão desesperado. As correspondências que chegam não são poucas, algumas pedem a blindagem da origem da informação com medo de represália.

É preciso que se verifique realmente o que está acontecendo. E aí não cabe a mim. Na hora em que eu tiver denúncias concretas, venho aqui e as faço sem nenhum constrangimento. Os indícios são muitos. É preciso que o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva volte os olhos para esse fato.

E quero até fazer justiça. As informações que me chegaram eram de que, no momento final, nos últimos meses, o Ministro José Dirceu já se atritava com o Ministro Gushiken exatamente por fatos que lhe chegavam ao conhecimento e que o alertavam. É um fato que merece, Senadora Heloísa Helena, uma reflexão do Governo. Porque, afinal de contas, estão em jogo a aposentadoria e a estabilidade de milhões de brasileiros. São vários os fundos, as denúncias estão aí, as providências não são tomadas. Não é brincadeira.

O Presidente disse, com muita firmeza, que iria cortar na própria carne. Que ponha em prática esse fato. Já encontrou o primeiro problema: quis cortar na carne, mas sentiu que o Delúbio é osso, que o Sílvio Pereira é osso, e já fica mais difícil. Parece que apareceu uma serra chamada Karina, porque para osso só serra ou serrote. Vamos ser se isso chega a algum lugar.

Digo isso com o respeito que tenho ao Presidente da República, para alertá-lo, mesmo que não seja nada. Apure, mande examinar. Conforme denúncias dos funcionários, as decisões são tomadas sem ouvir o conselho, sem o Banco do Brasil se manifestar. O que acontece? A Previ é maior que o Banco do Brasil.

Há uma denúncia deles sobre o encontro de contas havido entre um fundo e o Banco do Brasil, que gerou um prejuízo de dez milhões, e ninguém apura. Um senhor chamado Valdir Camilo, que representa os funcionários denunciou - foi ao Presidente do Banco do Brasil de nome Maranhão -, e nada aconteceu.

Senadora Heloísa Helena, duas matérias sobre o assunto foram censuradas na mídia. A última foi do Correio Braziliense e, depois de reclamações feitas aqui, a correção foi feita e a publicação foi feita uma semana depois, quando não mais havia nenhum sentido o efeito da notícia. Essa é uma coisa esquisita.

Dessa forma, lamentando não poder criar e ver a minha Oposição criar crise para o Governo, peço, agora, pelo amor de Deus, que não procurem criar, porque o Governo já tem as suas, em número suficiente. Creio que quanto menos se criar crise agora, melhor, porque os companheiros do Presidente Lula se encarregarão.

Minha última palavra é de tranqüilidade ao Brasil com relação à CPI dos Correios, da qual faço parte. Essa CPI não é minha, nem do Senado; essa CPI é do Brasil. Temos que respeitar os funcionários dos Correios, principalmente, os carteiros, que enfrentam chuvas, mordidas de cães e tantas intempéries. Os Correios, durante dez anos, foram considerados um dos três mais eficientes do mundo. Sua qualidade caiu recentemente, mas não se pode perder, de maneira tão grave e tão grande, essa eficiência.

Em homenagem àqueles carteiros, que, com suas roupas amarelas, de bicicleta, a pé, a cavalo, onde quer que cheguem, fazem chegar as correspondências, essas com os mais diversos objetivos, devemos honrar essa CPI. Em homenagem ao trabalhador brasileiro, beneficiado com a eficiência dessa empresa, precisamos dar toda a atenção a essa CPI. Por conta disso e pela capilaridade dessa instituição centenária, toda a Nação brasileira está de olho em nós. Não podemos permitir que a CPI não tenha fim, acabe em pizza ou não convença no seu desfecho.

Portanto, confiante de que, na terça-feira, teremos o início da CPI, sem nenhum objetivo de procrastinação, sem nenhum objetivo que não seja o da apuração, despeço-me de todos, nesta sexta-feira, na certeza de que, se o Governo não criar outra crise, vamos ter uma semana, pelo menos, tranqüila, que será a semana que vem.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/06/2005 - Página 20267