Discurso durante a 87ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários aos indícios de corrupção no governo Lula.

Autor
Heloísa Helena (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT). PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Comentários aos indícios de corrupção no governo Lula.
Aparteantes
Alvaro Dias, Sergio Guerra, Tasso Jereissati.
Publicação
Publicação no DSF de 22/06/2005 - Página 20451
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT). PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, POLITICA NACIONAL, QUESTIONAMENTO, REPRESENTAÇÃO POLITICA, DEMOCRACIA, FALTA, ETICA, EXERCICIO, MANDATO PARLAMENTAR, PERDA, REPUTAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, IMPORTANCIA, INSTRUMENTO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EFICACIA, FUNÇÃO FISCALIZADORA.
  • DECLARAÇÃO, RESPONSABILIDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DISTRIBUIÇÃO, CARGO PUBLICO, CONHECIMENTO, FALTA, IDONEIDADE, AUTORIDADE, CRIME DO COLARINHO BRANCO.
  • COMENTARIO, ENRIQUECIMENTO ILICITO, CLASSE POLITICA, NEGLIGENCIA, GOVERNO FEDERAL, RESTITUIÇÃO, RECURSOS, SETOR PUBLICO, ROUBO.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o debate da ética já ocupou muitos pronunciamentos de vários Parlamentares e meus na Casa. Muitas coisas já foram ditas em relação a isso, as CPIs estão instaladas, como também a Comissão de Ética da Câmara, e muitas outras coisas mais. Vários Senadores hoje já se pronunciaram sobre isso também, e o Presidente da República fez mais uma das suas frases de efeito, que, com certeza, ocupará manchetes dos jornais. Sempre faço questão de repetir que ele dizia que ninguém tem mais autoridade moral do que ele - certamente, no passado, sim; no presente, não.

Mas acho que esse debate da corrupção, especialmente no que se relaciona ao Congresso Nacional, é algo que tem que nos dar muita preocupação. Sei que não estamos numa democracia de fato, porque democracia sem justiça social não se consolida como tal. Sei que a democracia representativa não se consolida simplesmente porque existem mulheres e homens sentados nas cadeiras azuis do Senado, ou nas cadeiras verdes da Câmara, ou nas assembléias legislativas como a da nossa querida Naluh Gouveia espalhadas pelo Brasil todo. Não é isso a democracia representativa. Vivenciamos uma democracia representativa falida, vendida, carcomida, onde muitos parlamentares compram seus respectivos mandatos ou se aproveitam do aparelho do Estado e se apropriam da dor, da miséria e do sofrimento da grande maioria da população para dali usufruir cargos, prestígio e poder.

O Congresso Nacional sempre foi visto como uma Casa desmoralizada, porque se submete à promiscuidade com o Palácio do Planalto. Todas as vezes que o Presidente da República ou qualquer outra personalidade política faz pouco caso do Congresso Nacional, até digo que o Congresso Nacional bem que merece, porque alguns parlamentares se comportam como lideranças políticas vendidas que, ao invés de defender aquilo que se comprometeram ao longo de suas histórias de vida, se submetem ao balcão de negócios sujos e à promiscuidade com o Palácio do Planalto.

É evidente que, no debate atual sobre a corrupção, não adianta querer relacionar somente o Congresso Nacional. É claro que aqui existem parlamentares vendidos, inconseqüentes, irresponsáveis, alguns até com muita pose. Quando fazem o debate do alto clero e do baixo clero, tanta gente se apresenta como se do alto clero fosse, mas tem a estatura moral da ralé clero. Tanta gente que se apresenta de forma sofisticada, com palavras mirabolantes, minuciosas, é igualmente vendida a muitos outros mais facilmente condenáveis pelo Brasil afora.

O que é importante ser dito é que neste momento que vivemos é importante a Comissão Parlamentar de Inquérito. Volto a repetir que só uma CPI, por ter poder de investigação, próprio das autoridades judiciais, consegue aprofundar as investigações e possibilita que o Congresso cumpra com a sua tarefa nobre de fiscalizar os atos do Executivo.

Agora, uma coisa que tem que ser deixada clara, a não ser quem é da corriola do Palácio do Planalto ou quem de alguma forma está se lambuzando no banquete farto do poder, com cargos, prestígio, liberação de emenda e outras coisas mais, precisamos deixar absolutamente claro que todas as denúncias de corrupção, os indícios relevantes de crimes contra a administração pública que estão sendo apresentados, para estarrecimento, indignação e tristeza da grande maioria da população, estão relacionados diretamente com a forma como o Presidente Lula, que imita o Presidente Fernando Henrique, distribui, partilha o aparelho de Estado. Não sei por que há dificuldade de a gente dizer isso. O aparelho de Estado, o aparato público, quando os cargos são distribuídos para conhecidos delinqüentes de luxo, é óbvio que esses delinqüentes de luxo, que se consolidaram ao longo da história política do País, parasitando e privatizando a máquina pública, quando são restituídos aos cargos pelo Presidente Lula, muitos delinqüentes de luxo que serviram ao Governo Fernando Henrique, isso significa entregar a eles o aparelho de Estado, o aparato público para que eles continuem a parasitar. É aquela velha história. Todas as vezes que se fala em corrupção no País, imediatamente a população diz: Ah! Mas tem que restituir o roubado. Se não restituir o que roubou, não adianta.

Claro que todos nós sabemos que político que enriquece na política é ladrão. Ninguém se enriquece com salário. Se um político enriqueceu na política, é ladrão. Não se enriquece com salário. Enriquece-se traficando influência, intermediando interesse privado, explorando prestígio, parasitando o aparelho de Estado. Muitos desses, inclusive, verbalizam o compromisso com a ética. É por isso que o povo não acredita em político. É por isso que a grande maioria da população não acredita em político, porque vê tantas personalidades que nunca tiveram compromisso com a ética verbalizando a defesa da ética, do mesmo jeito que muitos, no passado, assumiram compromisso com a ética e fazem acordos espúrios com os delinqüentes de luxo do Brasil. Em relação àquilo que o povo do Brasil diz, que tem que obrigá-los a restituir o que roubaram, o Governo Lula, tal qual o governo passado, em vez de obrigar o ladrão a restituir o que roubou, restitui o ladrão ao cargo público para que ele continue a roubar, a parasitar e a privatizar o espaço público. Não sei por que a dificuldade de dizer isso. Isso não significa um ataque pessoal a Ministro, a Presidente da República ou a quem quer que seja. Quem é que tem dúvida da história belíssima do Presidente Lula, um operário, um retirante nordestino, um filho da pobreza, um filho do povo, que chegou pela primeira vez na maior instância de decisão política do País pelas mãos belas, legítimas e livres do povo? Quem é que tem dúvida sobre o passado? Quem é que deixa de admirar e reconhecer o passado? Entretanto, temos obrigação de dizer isto. É impossível que alguém acredite que qualquer mecanismo de corrupção poderia ser implantado, implementado dentro do Palácio do Planalto sem o Presidente Lula saber. Tem que acabar com isso. Ou todos são inocentes ou todos são efetivamente responsáveis. É óbvio. Tem que acabar com esse comportamento preconceituoso, elitista, de caracterizá-lo como um pau-mandado quando é cômodo. Não é. É uma figura brilhante, absolutamente conhecedora da máquina partidária, da máquina governamental. Tem um misto de incompetência em relação a outros? Todos nós podemos não ser profundos conhecedores de áreas técnicas, é por isso que temos que escolher quem profundamente conhece áreas técnicas, independentemente da sua carteirinha de filiação partidária ou das suas concepções ideológicas, para ajudar a máquina pública.

Mas isto tem que ser dito: se tem delinqüente de luxo aqui, se tem delinqüente de luxo no Congresso Nacional, foi comprado pelo Presidente Lula ou pelos seus amigos do Palácio do Planalto. Se tem delinqüente de luxo ocupando cargo, prestígio e poder - não batedores de carteira, porque batedor de carteira é simplório para determinadas personalidades -, muitos dos conhecidos e ilustres delinqüentes de luxo foram nomeados. Alguém imagina que a Abin (Agência Brasileira de Inteligência), a Abin, quando não sabe da vida de alguém, ela inventa, ela cria. É impossível que alguém possa ser nomeado para um cargo público sem o devido conhecimento da Abin. A Abin fiscaliza a vida de todas as pessoas, monta dossiês, monta escândalos, cria ou apresenta os que efetivamente ocorrem.

Então sejamos honestos intelectualmente. É evidente que só uma CPI mostra exatamente tudo. Se a CPI mostrar que o Presidente Lula, ou o Ministro José Dirceu, ou qualquer um dos outros denunciados são inocentes, eu venho para esta tribuna declarar a inocência dessas pessoas. Agora, por honestidade intelectual e por tudo o que eu conheço, vamos acabar com isso, porque é muito feio e gera palavras de ordem: “Ninguém tem mais ética do que eu!” São bravatas que pousam muito bem nas páginas dos jornais, mas efetivamente não correspondem à realidade objetiva. Se delinqüentes de luxo foram nomeados para cargos públicos, o foram com o conhecimento do Presidente da República, compartilhando com ele. E se eles estavam utilizando....

Ontem, naquela entrevista do Deputado Roberto Jefferson, ele disse: “O Presidente Lula ligou para mim e falou que CPI não é bom para o Governo”. Então, acabemos com isso. Essa gente não pode mais nem falar do Roberto Jefferson. Estavam com ele um dia desses, de mala e cuia, todos juntos; como agora vão falar? Podemos alguns de nós falar. Nós, aqueles que nunca tivemos identidade ou percorremos os mesmos caminhos. Mas até um dia desses eram da mesma tropa e corriola! Estavam parasitando o espaço público da mesma forma. Então sejamos ao menos honestos intelectualmente.

Eu concedo um aparte a V. Exª, Senador Alvaro Dias, e depois a V. Exª, Senador Sérgio.

O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - Senadora Heloísa Helena, o Presidente Lula tem sido poupado exatamente em função dessa sua bela história a que V. Exª se refere, da sua origem e passado. Mas eu creio que está na hora de o Presidente responder pelo seu presente. O passado é bom para a história. Certamente os historiadores se encarregarão do passado do Presidente, mas nós, que representamos o povo do Brasil aqui, temos que nos preocupar com o presente. E não há como não responsabilizar o Presidente da República por tudo o que está ocorrendo. De quando em vez o Presidente se apresenta com o viés autoritário, como hoje, dizendo que ninguém tem mais moral e ética do que ele para falar sobre o que está ocorrendo. Queremos que o Presidente, em vez de falar autoritariamente, apresentando-se com esse viés autoritário, utilize sua autoridade para mandar investigar para valer e não para acobertar determinados fatos, proteger determinados setores do Governo e pessoas, que se constituíram em coadjuvantes do Presidente durante todo o período de militância partidária e, agora, na Presidência da República. Portanto, Senadora, é hora, sim, de o Presidente assumir responsabilidades em relação ao presente. Aplaudimos o passado de Sua Excelência, mas queremos que dê respostas às exigências da sociedade em relação a sua postura no presente.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Concedo um aparte ao Senador Sérgio Guerra.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Senadora Heloísa Helena, rigorosamente os últimos dias têm caracterizado uma situação muito clara: o Governo, as forças que têm hegemonia no Governo, o PT de maneira especial, ensaiam um discurso cuja clareza é óbvia: remeter a crise, a corrupção para o Congresso Nacional, o que nada mais é do que provar a tese do Presidente, dos 300 picaretas.

A SRª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Muitos estão com ele hoje.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Pois é. E o Presidente reitera sua vida pública, o Ministro José Dirceu afirma sua história oposicionista, todos se auto-elogiam, fazem um discurso pretensamente ideológico e não vão ao essencial: por que nomearam essas pessoas, qual o quadro de convivência que têm com essas pessoas, qual o papel desse Dr. Delúbio, cujo nome é tenebroso e a prática parece ser mais ainda, qual é o conteúdo da relação sombria deste Governo, do Partido dos Trabalhadores, com esses aliados? Como é que eles funcionam? Será que só há culpa de um lado? Será que a culpa não é amplamente compartilhada? Quem quer resolver as coisas o que tem a fazer é permitir ampla investigação, e é tudo o que até agora não se desejou fazer. Não se fez isso no primeiro episódio - Waldomiro Diniz - e, na verdade, não se deseja fazer isso agora. A CPMI que estamos fazendo é restrita e seus administradores fazem parte do Governo. Antes de levantar a suspeição - não sou desse tipo -, tenho absoluta clareza e tranqüilidade ao afirmar, corroborando o que está dizendo a Senadora, que os fatos são comprometedores. Este Governo não tem como explicá-los. E toda a ação, toda a sua política, não tem nenhuma sinceridade, cuja finalidade é remeter para outro campo, tirar dele um foco de investigação que tem de começar no Governo. Hoje vai começar no “cara” dos três mil reais, mas ele é a ponta do iceberg, é conseqüência de um processo de formação do poder corrupto, complicado, que não é capaz de governar o Brasil. Está remetendo a vida do Presidente Lula para um questionamento muito mais amplo do que ele imagina. Anteontem, em uma festa de São João no interior de Pernambuco, quando alguém falou em “mensalão”, houve uma indignação geral. Essa indignação não exclui o Presidente da República nem o seu Governo, e inclui de maneira muito clara o que todos percebem: PTB, PL, PP são sublegenda de PT.

A SRª HELOISA HELENA (P-Sol - AL) - Ouço V. Exª, Senador Tasso Jereissatti.

O Sr. Tasso Jereissati (PSDB - CE) - Senadora Heloisa, parece-me que tem havido, principalmente nos últimos dias, uma tentativa muito clara de dividir o que está acontecendo em dois departamentos: um culpado e outro inocente. O Congresso Nacional seria o corrupto e o Executivo seria vítima desta corrupção. Conheço muito bem V. Exª e sei que não vai imaginar que estamos querendo tirar a culpa do Congresso. Hoje a imagem do Congresso está destruída e não há como dizer que, de alguma maneira, não mereça essa imagem que está aí.

A SRª HELOISA HELENA (P-Sol - AL) - Com certeza.

O Sr. Tasso Jereissati (PSDB - CE) - Mas dizer que o Executivo é vítima dessa corrupção me parece uma fantasia, não tem nada a ver com a realidade. Acho que nós, considerando o que V. Exª disse, precisamos reagir dentro do Congresso, primeiro, fazendo o mea culpa e examinando a fundo o que está acontecendo aqui no Congresso; segundo, reagindo e deixando bem claro que a iniciativa desse momento de corrupção vem, claramente, do Executivo e que não apenas partidos pequenos ou alguns Deputados, ou boa parte dos Deputados, foram beneficiários dessa corrupção; partidos grandes também foram beneficiários e tiveram a iniciativa dessa corrupção. Só queria ouvir de V. Exª se concorda com este meu entendimento.

A Srª HELOÍSA HELENA (P-SOL - AL) - Agradeço o aparte de V. Exª.

Vou concluir, Senador Tão Viana, pois sei que estou ultrapassando o tempo. Quero deixar absolutamente claro também que não tenho dúvida de que o Congresso Nacional é uma estrutura desmoralizada perante a opinião pública, e o é porque há parlamentares vendidos e porque há Governo igualmente corrupto para comprar parlamentares e manter a promiscuidade nas relações entre o Congresso Nacional e o Palácio do Planalto.

Não posso deixar a tribuna sem reafirmar que todos os dias ficam discutindo na imprensa que existe um golpe para derrubar o Governo Lula, um golpe da direita. Evidentemente, muitos representantes da direita brasileira fazem oposição ao Governo Lula. Temos de dizer também que o pior da direita brasileira está no Governo Lula, também.

O Governo Lula prevaricou, porque não foi capaz de investigar os indícios relevantes de crimes contra a Administração Pública no processo de privatização do Governo Fernando Henrique Cardoso, que alardeávamos todos os dias nesta Casa. Nunca a pocilga do capital, a direita, carcomida, cínica, parasita sem pátria do capital financeiro, chafurdou com tanta desenvoltura como agora. Muitos delinqüentes de luxo, que vai desde a tropa de choque de Collor a muitos irresponsáveis, amorais, dos tapetes azuis ou dos tapetes verdes, estão dentro do Governo Lula. Então, vamos devagar com o andor.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/06/2005 - Página 20451