Discurso durante a 90ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Ineficácia do combate à dengue no Estado de Roraima.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE. ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.:
  • Ineficácia do combate à dengue no Estado de Roraima.
Aparteantes
Augusto Botelho, Wirlande da Luz.
Publicação
Publicação no DSF de 25/06/2005 - Página 20900
Assunto
Outros > SAUDE. ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.
Indexação
  • GRAVIDADE, EPIDEMIA, DOENÇA TRANSMISSIVEL, CONCENTRAÇÃO, CAPITAL DE ESTADO, COMENTARIO, NOTICIARIO, JORNAL, FOLHA DE BOA VISTA, ESTADO DE RORAIMA (RR), DETALHAMENTO, PROVIDENCIA, GOVERNO ESTADUAL, CONCLAMAÇÃO, COLABORAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO FEDERAL, ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL, DENUNCIA, ORADOR, NEGLIGENCIA, PREFEITURA, TRABALHO, PREVENÇÃO.
  • QUESTIONAMENTO, CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO (CGU), SORTEIO, MUNICIPIOS, INTERIOR, ESTADO DE RORAIMA (RR), AUSENCIA, FISCALIZAÇÃO, CAPITAL DE ESTADO, ESPECIFICAÇÃO, GRAVIDADE, NEGLIGENCIA, COMBATE, AEDES AEGYPTI, LEITURA, OFICIO, AUTORIA, ORADOR, DESTINATARIO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAUDE, COBRANÇA, PROVIDENCIA.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, anteontem, estive ocupando esta tribuna para fazer - disse muito mais como médico do que mesmo como Senador - uma grave denúncia sobre o que está ocorrendo em meu Estado no que tange a uma epidemia de dengue que está assolando principalmente a capital Boa Vista. Li, naquela ocasião, matéria publicada no jornal Brasil Norte cuja manchete é “Casos de dengue aumentaram em 42% este ano em relação a 2004”, que informa que mais de 90% dos casos estão na capital. Atualmente, todos os Municípios têm registro da doença, mas Boa Vista concentra 90% dos registros, e é importante que se diga que a capital tem 60% da população. Portanto, a grande maioria da população de Roraima está doente, principalmente a população de Boa Vista. Os Bairros Caranã e Sílvio Botelho são os mais atingidos. Li a matéria e disse que iria encaminhar um expediente ao Ministro da Saúde e ao Presidente da Funasa. Em tese, bastaria ter encaminhado ao Ministro, mas encaminhei aos dois para que um não alegue que a burocracia não fez o assunto chegar ao conhecimento do outro.

O mesmo jornal, ontem, quinta-feira, publicou a manchete “PS vai ampliar capacidade de atendimento”. Diz a matéria:

Epidemia de dengue e malária compromete a qualidade dos serviços; médicos e enfermeiros serão contratados. A Secretaria Estadual de Saúde admite que a quantidade de pessoal e o espaço físico do Pronto-Socorro (...) são insuficientes para atender a demanda crescente. A epidemia de malária e dengue registrada no Estado tem provocado um aumento significativo no número de pacientes. Segundo a diretora do Pronto-Socorro, (...) em maio, houve um aumento de 80% no número médio de atendimento.

Quer dizer, um pronto-socorro que é do Estado está atendendo pacientes cuja doença deveria ter sido evitada pela Prefeitura Municipal.

Diz a diretora do pronto-socorro: “Em junho quase que triplicou o número de pacientes. Nossa capacidade é de 200 atendimentos por dia e temos recebido, diariamente, em média, 450 pacientes”.

A matéria diz que a Secretaria, inclusive, assume, digamos assim, a coordenação do trabalho, convidando a Fundação Nacional de Saúde, as Forças Armadas, a Defesa Civil, o Conselho Estadual de Saúde, o Conselho dos Secretários Municipais de Saúde, a Secretaria de Saúde de Boa Vista, o Conselho Regional de Medicina, o Conselho Regional de Enfermagem, o Ministério Público, a Assembléia Legislativa e o Tribunal de Contas. Quer dizer, é uma verdadeira convulsão que está acontecendo no meu Estado por descaso na prevenção, que é o item principal na área de saúde.

Outra manchete de ontem, publicada no jornal Folha de Boa Vista: “Militares vão ajudar no combate à dengue”. As Forças Armadas estão sendo chamadas para ajudar. Por quê? Porque quem era responsável pela ação preventiva, por evitar que isso acontecesse, que é a Prefeitura Municipal, não o fez.

Temos outra manchete aqui: “Ruas que dão acesso ao Jardim Olímpico estão intrafegáveis”. Na verdade, as ruas da minha cidade, Boa Vista, capital do Estado, tirando as principais, que são bem enfeitadas, todas elas estão intransitáveis, todas elas estão cheias de lagoas e de água para todo lado, onde estão também proliferando o mosquito da dengue e o da malária.

Então, Sr. Presidente, quero aqui registrar que já encaminhei ao Sr. Ministro Humberto Costa e ao Sr. Valdi Bezerra, respectivamente Ministro da Saúde e Presidente da Fundação Nacional da Saúde, ofícios, de semelhante teor, dirigidos a ambas as autoridades. Lerei o ofício que encaminhei ao Sr. Presidente da Funasa, semelhante ao que enviei ao Sr. Ministro da Saúde, com as devidas modificações.

            Com meus cordiais cumprimentos, levo ao conhecimento de Vossa Senhoria cópia do discurso, em anexo, que proferi ontem na tribuna do Senado Federal, manifestando minha preocupação em relação ao acentuado aumento de casos de dengue neste ano, em relação ao ano de 2004, que vem acometendo a população do Estado de Roraima.

            Segundo dados do Diretor de Endemias do Estado, Dr. James Rodrigues, Roraima experimentou neste ano um aumento de 42% nas notificações de dengue, sendo que, destes, mais de 90% dos novos casos estão na capital Boa Vista.

Portanto, Senhor Presidente, diante da gravidade da situação que vem assolando a população do Estado de Roraima, sobretudo no Município de Boa Vista, e visando a reversão desse severo quadro de epidemia, solicito a Veossa Senhoria a premente instauração de uma auditoria no referido Município, a fim de se detectar possíveis falhas na execução do projeto de combate à dengue naquela localidade, bem como requeiro que seja informado o montante de recursos alocados naquele Município destinado ao referido programa.

Não é possível que nós tenhamos a obrigação - e, aqui, por coincidência, estão os três Senadores de Roraima, todos três médicos -, não é possível que tenhamos a responsabilidade de cuidar de todos os problemas de Roraima. Mas esse é prioritário. É importante o combate à doença - alerto a Nação sobre isso - porque essa epidemia de dengue não vai ficar circunscrita a Roraima, ela vai se expandir pelo Brasil afora. Quando chegar no Rio, Senadora Heloísa Helena, com certeza, vão fazer um estardalhaço danado, vão levar as televisões, vai aparecer o Ministro de casa em casa para dizer que está combatendo a dengue.

Quero aqui fazer justiça. Enquanto o Senador Wirlande da Luz era o Secretário Municipal de Saúde, no início deste ano, os casos de dengue estavam mais ou menos sob controle. Mal o inverno começou, em maio, já tivemos esse aumento, em Boa Vista, de 90% de casos em relação ao ano passado.

            O que posso compreender, Senador Wirlande da Luz? Que houve um desmonte na Secretaria Municipal de Saúde, que não se deu prioridade às ações de saúde. Estou fazendo a ressalva, até pelas próprias notícias, de que V. Exª está sendo absolvido, porque no ano passado os casos estavam sob controle. Este ano, quando V. Exª teve que assumir o mandato, passou a haver um desmonte na área da saúde, perdeu-se o foco e a importância. Por quê? Porque a Prefeita nomeou Secretário de Saúde uma pessoa que veio do Paraná, um Estado que talvez nem tenha dengue, e, o que é pior, que está implicado em questões da Justiça, inclusive que está com seus bens bloqueados, que levou a esposa junto, para ser administradora hospitalar, ou vice-versa. Não tenho certeza. O casal que está comandando a Secretaria Municipal de Saúde no Estado é recém-chegado e tem problemas com a Justiça.

Enquanto isso, a população está adoecendo, sobrecarregando o pronto-socorro, que é estadual e que deveria atender emergências mais urgentes. Nós, que somos médicos, sabemos que emergência há em vários graus. Evidentemente, uma pessoa que está com dor e febre se sente numa emergência, mas uma pessoa que, por exemplo, acabou de receber um tiro ou sofreu um traumatismo craniano num acidente está num grau de emergência mais elevado, tem prioridade sobre aquela outra.

Essa convergência desses casos que poderiam não estar indo para o pronto-socorro prejudica toda a população do meu Estado. Então, eu não poderia ficar aqui calado diante...

            O Sr. Wirlande da Luz (PMDB - RR) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Vou conceder, em seguida, com muito prazer, um aparte a V. Exª.

           Quero também trazer mais um dado interessante. A Controladoria-Geral da União vem fazendo sorteios para a escolha dos Municípios brasileiros a serem investigados. Meu Estado tem apenas 15 municípios, com a capital. Coincidentemente, foram sorteados sete municípios, todos do interior. Portanto, 50% dos municípios do interior de meu Estado foram auditados pela CGU. A Prefeitura de Boa Vista não foi sorteada; portanto, a capital, que tem 60% da população, não foi sorteada. Muita sorte dela e muito azar do povo de Boa Vista, porque, com certeza, quem vai a minha cidade, quando chega ao aeroporto e transita nas ruas principais, diz: “Que cidade linda”.

           Realmente é linda. Agora mesmo, acabou de ser liberado pelo Ministério da Integração Nacional cerca de R$500 mil para construir mais uma praça nessa avenida. Isso é integração nacional.

           Quero realmente uma resposta. Nada solicitei à CGU, porque confio muito pouco naquele órgão, mas pedi ao Ministro, por uma deferência, até por ser um colega médico, que me informe e faça uma auditoria sobre essa questão. Vou também pedir ao Tribunal de Contas da União que faça essa investigação, porque não se trata simplesmente de recursos, não. Trata-se de vidas, da saúde da população. Mais sério ainda - vou repetir: lamento muito que o problema esteja ocorrendo em meu Estado, mas pode se expandir para o Brasil todo, porque o mosquito pode ser levado dentro do avião, que todo dia chega e sai de Roraima. O paciente que tenha adoecido em Roraima pode perfeitamente estar assintomático e chegar ao Rio e São Paulo e, no outro dia, ser picado pelo Aedes aegypti, que existe no Brasil todo.

Concedo o aparte ao meu colega médico Senador Wirlande da Luz, que foi Secretário de Saúde durante o ano passado, até o início deste ano.

O Wirlande da Luz (PMDB - RR) - Senador Mozarildo Cavalcanti, existe um problema muito sério na questão das ações contra a dengue e contra a malária no Estado inteiro. Há uma dicotomia nessas ações. O Governo Federal libera o veneno para as ações do fumacê. Quem compra o óleo para misturar o veneno, porque esse veneno é adicionado ao óleo para que permaneça mais tempo no ar e tenha um período de ação residual maior, é a Secretária de Saúde do Estado. Quem faz as ações, quem executa o controle na capital é a Secretária Municipal de Boa Vista, assim como em todos os municípios. Há um problema sério: quando chega o veneno, o Governo não fez a licitação do óleo; quando tem o óleo, o Governo Federal não liberou o veneno. Aí começa a liberar um veneno indissolúvel, que não tem quase ação nenhuma, porque, após o fumacê liberar o veneno, em poucos minutos, ele já desaparece. Ressalto, também, que nos municípios do interior onde o índice de malária é maior, existe um problema muito sério. Essas secretarias não são bem estruturadas, têm poucos recursos, o Governo do Estado tem que liberar - isso foi discutido na bipartite - condições, veículos e óleo diesel. A queixa dos secretários dos municípios do interior é que, quando chega o veículo, não chega o óleo diesel; quando chega o óleo diesel, o veículo está quebrado. Essa é uma questão séria, é uma questão que tem que ser resolvida. As ações de combate a dengue e malária estão em nível dos governos federal, estadual e municipal. Faz V. Exª muito bem encaminhando esse documento ao Presidente da Funasa e ao Ministro da Saúde. Muito obrigado.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR) - Srª Presidente, peço um pouco de tolerância porque o tema é importante não só para o meu Estado, mas - repito - para o Brasil.

A SRª PRESIDENTE (Heloísa Helena. P-SOL - AL) - Tem toda.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR) - Senador Wirlande, fiz bem a ressalva da administração de V. Exª, até porque a conheci de perto durante esses anos até o ano passado. Realmente o sistema municipal de saúde desmontou-se a partir da saída de V. Exª. Vou deixar de lado a questão da malária, que quero abordar num outro pronunciamento. Vamos para a dengue, que é um negócio mais violento. Para a malária - sabemos -, tem remédio, e para a dengue, não há remédio e há evolução para uma fase hemorrágica, que é fatal, geralmente.

Quanto a essa observação de V. Exª, uma vez, quando Serra era Ministro, discutiu-se: o mosquito é municipal, federal ou estadual? Ficamos nesta história: quem compra o óleo é fulano, quem compra o veneno é beltrano, quem tem ação é sicrano. Isso é algo que não dá para o povo entender, que não dá para justificar, até porque recursos para a área de saúde são constitucionalmente definidos. Não se pode dizer que faltou recurso para isso, que faltou recurso para aquilo. Estão faltando realmente interesse e gerenciamento adequado desse setor. Estou fazendo essa denúncia novamente e lendo publicamente o ofício que mandei para o Ministro e para o Presidente da Funasa, e vou enviar, semana que vem, também o mesmo documento ao Tribunal de Contas da União, porque não confio muito nessa ação da CGU. Trata-se de um sorteio meio estranho. De um Estado com 15 municípios, sorteiam-se sete. Proporcionalmente, talvez seja um dos Estados mais sorteados do Brasil e não se sorteia a capital, Boa Vista.

Antes de encerrar, se V. Exª me permitir, Srª Presidente, concedo o aparte do Senador Augusto Botelho, que também é médico e serviu à Secretaria de Saúde do Estado.

A SRª PRESIDENTE (Heloísa Helena. P-SOL - AL) - Com certeza.

O Sr. Augusto Botelho (PDT - RR) - São duas observações. Em relação à CGU, assisti a três sorteios, que me pareceram lícitos, limpos. Mas, quando chegou na metade dos municípios, parou-se de fazer sorteio para Roraima. Com relação à dengue, realmente há na Venezuela o tipo vírus 4, que ainda não temos circulando no Brasil. Nossa fronteira com a Venezuela é aberta, tanto o é que a Polícia Federal passou, deu uma volta - dizem os jornais e as pessoas que viram -, deu uma sobrevoada na fronteira pensando que estava no Brasil. Se passar o vírus 4 para Roraima, vai chegar no Brasil todo. Imaginem, se há no Brasil o vírus 1, 2 e 3, se chegar o vírus 4? O número de casos de dengue hemorrágica vai aumentar muito e o risco de morte vai subir, agravando o problema. Gostaria de fazer a outra observação sobre o que V. Exª falou em relação à assistência dos postos de saúde, que estão deficitários mesmo. Sexta-feira passada, eu estava no Hospital Maternidade e chegou uma mulher jovem com convulsão por eclampsia. Se chega uma mulher nesse estado aos postos de saúde, às unidades, os pré-natais não estão sendo feitos adequadamente. Por coincidência, olhei o cartão de pré-natal, em que constavam seis consultas. Não é possível - pensei - que, mesmo após seis consultas, a mulher esteja toda edemaciada, entrando em convulsão? Os hospitais têm reclamado que a mortalidade materna aumentou nos últimos meses em Roraima.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR) - Agradeço muito a V. Exª o aparte, Senador Augusto Botelho, porque, além de médico, V. Exª foi Secretário de Saúde, como eu, que fui duas vezes Secretário de Saúde do Estado, e como o Senador Wirlande da Luz, que foi Secretário Municipal de Saúde durante muitos anos. Portanto, nós três temos a responsabilidade, sim, de exigir do Governo Federal providências urgentes para que o aporte de recursos chegue na hora certa. Do contrário, o Ministro fará o “showzinho” que fez no Rio de Janeiro, fará a intervenção e dirá que não está aplicando.

Quero saber o seguinte: não dá para tomar uma atitude sem fazer show? Não dá para resolver a questão de um Estado pequeno como o meu, onde há 400 mil habitantes, sem deixar 90% da população da capital com doença? Creio que devemos, inclusive, pedir o afastamento do Ministro se a situação continuar dessa forma e de outras autoridades em nível municipal e estadual que estão deixando a população morrer apenas por descaso. Ficam apenas fazendo um “auêzinho” na televisão, dizendo: “Não deixem pneus nem jarrinhos vazios”.

Onde está a vigilância sanitária? Onde está a visitação domiciliar? Há recursos para isso. Por que deixam para fazer uma convocação geral, tentando resolver a situação, quando toda a população já está doente?

É preciso realmente tomarmos uma providência e irmos às últimas conseqüências para responsabilizar os culpados por esses episódios que estão ocorrendo no meu Estado.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/06/2005 - Página 20900