Discurso durante a 103ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Consternação pelo acúmulo de denúncias de corrupção no Governo. Cobrança de investigações das denúncias de irregularidades na empresa Cobra.

Autor
Heráclito Fortes (PFL - Partido da Frente Liberal/PI)
Nome completo: Heráclito de Sousa Fortes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Consternação pelo acúmulo de denúncias de corrupção no Governo. Cobrança de investigações das denúncias de irregularidades na empresa Cobra.
Publicação
Publicação no DSF de 05/07/2005 - Página 22014
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, GRAVIDADE, CORRUPÇÃO, TRAIÇÃO, ASSOCIADO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), BIOGRAFIA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROTESTO, INCOMPETENCIA, AGENCIA BRASILEIRA DE INTELIGENCIA (ABIN).
  • REGISTRO, FALTA, ATENÇÃO, GOVERNO, INVESTIGAÇÃO, EMPRESA, INFORMATICA, DENUNCIA, AUSENCIA, LICITAÇÃO, IRREGULARIDADE, NEGOCIAÇÃO, COMPUTADOR.
  • COMPARAÇÃO, GOVERNO, FERNANDO COLLOR, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRISE, POLITICA NACIONAL, ATUALIDADE.
  • REGISTRO, CONFIANÇA, IDONEIDADE, JOSE GENOINO, PRESIDENTE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Brasília sempre se caracterizou pelos fins de semana tranqüilos, em que predominava a tão cantada solidão do planalto. A classe política, na sua grande maioria, deslocando-se para seus Estados de origem, os jornalistas recolhidos às suas residências, para um fim de semana com a família, essa sempre foi a grande rotina desta cidade criada por Kubitscheck.

Nas últimas semanas, e de uma maneira muito especial no fim de semana que terminou, tivemos uma cidade completamente mudada, agitada, ansiosa, curiosa para saber exatamente qual era o escândalo da vez. Tive notícia de pessoas varando a madrugada para esperar as primeiras notícias trazidas pelas revistas de final de semana.

O que se viu, Sr. Presidente, em todas essas revistas, foram exatamente notícias, depoimentos e fatos de fazer qualquer um cair de costas. Nunca se imaginou que o Partido dos Trabalhadores carregasse, no seu bojo, pessoas tão corajosas, audaciosas e, acima de tudo - creio eu - com a certeza da impunidade, que tiveram capacidade de ir tão longe. Tenho a impressão, Senador Paulo Paim, de que os que estão envolvidos nessa série de escândalos, embora filiados ou não ao Partido de V. Exª, nunca leram o estatuto do Partido e nunca estiveram presentes nos 20 anos de marcha, de caminhada e de luta para que o Presidente Lula chegasse ao poder.

Basta examinar, em todas as oportunidades, a postura desapontada e cabisbaixa do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva para se chegar à conclusão de que, em parte desse aspecto, o Deputado Roberto Jefferson tem razão. Sua Excelência foi pego de surpresa, foi apunhalado pelas costas. Não é possível, Sr. Presidente, que não tivesse a Abin, os órgãos de Inteligência da Presidência da República, os diretores da área em que ocorriam esses fatos, notado, aos primeiros sinais, que algo estava acontecendo, que não tivessem tido a percepção de verificar com mais detalhes esses fatos e chamado a atenção do Presidente da República.

Muitos, inclusive do próprio Partido de Sua Excelência, se queixam que se criou uma barreira em torno do Presidente para que as pessoas não tivessem acesso e, com isso, a possibilidade de lhe contar o que realmente se passava. Isso é muito comum no poder. Os que chegam à sala e à cozinha do Governo ficam naquele jogo de queda de braço para impedir que outros se aproximem e que por meio de conversa franca possibilitem o governante saber o que de fato acontece. O governante, por sua vez, se protege evitando os incômodos que vêm do pedido de função a nomeações, e então aceita de bom grado essa barreira invisível em que se vê colocado. E o que vemos é isso: o Presidente Lula, de repente, está com toda a sua trajetória, a sua luta e a sua carreira correndo risco por conta dos maus amigos. Acho que o Presidente, num momento como este, em que a decepção, a amargura e a tristeza lhe dominam a alma, não tem outra alternativa senão a de aproveitar este momento e fazer uma limpeza geral onde houver o menor indício de que as coisas não vão bem.

Vejam, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há mais de seis meses ou quase um ano - não sou bem preciso -, o Senador José Jorge, da tribuna desta Casa, alertou o Presidente da República para irregularidades que estariam sendo cometidas na empresa Cobra, vinculada ao Banco do Brasil, uma empresa de computação e informática. Quais as providências tomadas? Aparentemente, nenhuma. Agora começam a aparecer informações de que 63 mil computadores aproximadamente foram comprados sem nenhum processo licitatório, porque aí a empresa atua da seguinte forma: ao comprar, ela é privada, não participa de concorrência, compra de quem quer; ao vender, ela é pública, e ao vender para órgão público também não precisa participar de concorrência. E é um prato cheio - se verdadeiras forem essas informações - para que suspeitas de que algo de muito errado está acontecendo nesse setor.

Esses fatos vêm sendo noticiados já há bastante tempo. E agora então surgiu essa denúncia dessa compra pela Cobra em que inclui algumas empresas, umas tradicionais, conhecidas, outras nem tanto. Estão no rol das que venderam para a Cobra: a Itautec, a Procomp, a Semp Toshiba, a Perto Digicon, a Megaware e a Novadata.

É preciso que esses fatos sejam, na realidade, apurados, apurados antes que o Roberto Jefferson venha aqui e denuncie, porque aí vão demitir todos. É preciso que o Governo se antecipe aos fatos, vá atrás para saber o que realmente está acontecendo na Cobra.

Sou do Piauí, área de atuação do Banco do Nordeste, onde se fala muito de uma grande compra que teria sido feita por aquele banco junto à Cobra. Não sei nada, não tenho maiores detalhes, mas o Governo precisa apurar, até porque nos comentários fala-se do envolvimento de um diretor que teria ligações pessoais familiares com um alto dirigente do Partido dos Trabalhadores. A coisa aí se agrava.

Sr. Presidente, ouvi, com muita tristeza e acima de tudo também surpresa, neste final de semana, o desmentido do Deputado José Genoíno e depois o pedido de desculpas do mesmo Deputado - o ex-Deputado e hoje Presidente Nacional do PT - quando se referia àquele famoso empréstimo do qual ele foi avalista e de que não se lembrava. Para alguns pode representar desconfiança, mas sei como as coisas partidárias acontecem, principalmente para quem está chegando ao poder sem nenhuma estrutura para isso. Creio que foi muito sincera a surpresa do ex-Deputado José Genoino ao dizer que não sabia que aquela transação havia sido feita com a participação solidária do aval do Sr. Marcos Valério, com a assinatura do Sr. Delúbio Soares. Acho que surpresa igual não deve ter o Sr. Delúbio Soares; este, sim, homem de finanças, homem da Tesouraria e, acima de tudo, conhecedor profundo da máquina de arrecadação tão poderosa que o PT montou. Uma vez eu disse aqui, Senador Paulo Paim, há mais de dois anos, que, se o PT continuasse naquele ritmo de arrecadação - somando-se as arrecadações feitas pelos seus dirigentes de prestígio com as participações compulsórias dos servidores filiados ao Partido, obrigados a colaborar mensalmente para vigorar os seus cofres -, ao final de quatro anos, seria o partido mais rico do mundo! E minha previsão estava certa.

            O Deputado Fernando Gabeira, no Programa do Jô, fez uma afirmação que, no primeiro momento, nos parece estapafúrdia, mas que, depois de analisada, tem lógica: de que já há comprovação de arrecadações que superam R$1 bilhão. E como o Partido de V. Exª quer se parecer com o Partido do Presidente Collor. V. Exª se lembra de que, numa noitada aqui em Brasília, um grupo íntimo ligado ao Sr. PC Farias comemorou uma arrecadação de US$1 bilhão, naquela época? Vá gostar de parecer com o governo que não deu certo como o Governo do PT! Eu nunca vi, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma vocação como esta. Todos os erros e todos os vícios do Governo do Presidente Collor estão sendo repetidos com mais perfeição agora. Àquela época também: um governo que chegou ao poder sem experiência, sem estrutura, sem equipe e com arrogância.

Àquela época - e o fato agora se repete, e venho batendo nessa tecla -, tirou-se do Ministério da Previdência, por exemplo, a gestão sobre os bilhões que circulam no Brasil afora pertencentes aos aposentados, ou seja, a gestão dos fundos de pensão. Quem comandava e mandava era o Sr. Pedro Paulo Leoni, que era do Palácio do Planalto, o primeiro diretor da Abin, instalada para que se colocasse no esquecimento o velho SNI.

Foi um escândalo. Os investimentos em empreendimentos imobiliários duvidosos espocaram em todo o Brasil, e o então Deputado Federal Luiz Gushiken foi peça importante, inclusive com participação ativa numa CPI criada para apurar, denunciar e corrigir rumos.

Pois bem; agora, com o Presidente Lula no poder, é o ex-Deputado Luiz Gushiken, que, na Secretaria de Comunicação Social do Governo, comanda com mão de ferro, dando preferência aos seus companheiros de luta sindical, a estrutura de fundo de pensão no Brasil.

Sr. Presidente, por mais amizade que tenha com os seus companheiros de luta desses vinte anos de caminhada, o Presidente Lula não pode deixar que as coisas se misturem. Não é bom para a sua biografia; não é bom para o País.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. PRESIDENTE (Alberto Silva. PMDB - PI) - V. Exª tem dois minutos.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - O isolamento de um Presidente da República, muitas vezes, é cruel, é fatal, mas, às vezes, como diz o ditado popular, antes só do que mal acompanhado.

Sr. Presidente, espero que, nesta semana, possamos pensar um pouco na agenda positiva do Brasil; que a “MP do bem” mostre para o que veio e o que quer e que o Governo comece a tomar rumo, retomando as rédeas administrativas do País. Não podemos ficar parados. A economia até agora vai bem, mas chega o momento em que a paralisia e a desconfiança podem nos causar danos.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR PRESIDENTE (Alberto Silva. PMDB - PI. Fazendo soar a campainha.) - Peço a V. Exª que encerre, Senador.

O SR HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Sr Presidente, encerro aqui as minhas palavras, por dever de justiça, voltando ao que disse ao Senador Paulo Paim no começo deste pronunciamento. Convivi com o Deputado José Genoino na Câmara dos Deputados; é um lutador - e ele tem as suas posições, eu tenho as minhas. O futuro dirá quem está certo. Todavia, não o vejo como corrupto e desonesto. Quero dizer a V. Exª que, entre as decepções que já tive na vida pública, naturais, essa seria, talvez, a maior de todas. Mas não acredito. Vejo o Deputado Genoino pela sua vida modesta, pelo seu comportamento, pela luta que desempenhou na clandestinidade e na atividade política nesta Casa.

O SR PRESIDENTE (Alberto Silva. PMDB - PI. Fazendo soar a campainha.) - Encerre, Senador.

O SR HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Não o vejo incluído neste rol, mas é mais uma vítima que vem provar que o homem é produto do meio.

Rogo que essas coisas fiquem bem esclarecidas, porque ainda tenho esperança de que quadros como este sobrevivam a essa tormenta que assola um partido que um dia fez nascer uma estrela, símbolo de esperança, e que o Brasil aplaudiu e consagrou ao vê-la ser elevada ao mais importante posto da República. Agora, desmorona e cai para a tristeza daqueles que, durante tanto tempo, deram sua vida, confiaram e lutaram para que “a esperança vencesse o medo”. Vemos agora que o medo, que com a esperança conseguiu vencer, toma conta do próprio Partido; o medo de que nessa lama não saiba distinguir os bons e os maus.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/07/2005 - Página 22014