Discurso durante a 105ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Alerta para os problemas enfrentados pelas reservas indígenas em Mato Grosso do Sul. (como Líder)

Autor
Juvêncio da Fonseca (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MS)
Nome completo: Juvêncio Cesar da Fonseca
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA. POLITICA FUNDIARIA.:
  • Alerta para os problemas enfrentados pelas reservas indígenas em Mato Grosso do Sul. (como Líder)
Aparteantes
Augusto Botelho, Mozarildo Cavalcanti, Osmar Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 07/07/2005 - Página 22347
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA. POLITICA FUNDIARIA.
Indexação
  • GRAVIDADE, VIOLENCIA, CONFLITO, INDIO, COLONO, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), LEITURA, TRECHO, NOTICIARIO.
  • DENUNCIA, INFERIORIDADE, EXTENSÃO, TERRAS INDIGENAS, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), SUPERIORIDADE, POPULAÇÃO, CRITICA, ATUAÇÃO, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), INCENTIVO, INVASÃO, PROPRIEDADE PRODUTIVA.
  • PROTESTO, OBSTRUÇÃO PARLAMENTAR, BANCADA, GOVERNO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, AUTORIZAÇÃO, DESAPROPRIAÇÃO, PROPRIEDADE RURAL, OBJETIVO, EXPANSÃO, RESERVA INDIGENA, DENUNCIA, NEGLIGENCIA, GOVERNO FEDERAL, SOLUÇÃO, LITIGIO, TERRAS, ATUAÇÃO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), PRESIDENTE DA REPUBLICA, INCONSTITUCIONALIDADE, CONFISCO, AREA.

O SR. JUVÊNCIO DA FONSECA (PDT - MS. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Senador Mozarildo, parece até uma sina estar sempre nesta tribuna, falando da questão indígena e, principalmente, da questão indígena de Mato Grosso do Sul. Vou repetir aquilo que sempre falei desta tribuna: há muita gente falando no indígena, e muita gente que fala explorando o indígena.

No meu Estado, Mato Grosso do Sul, a questão indígena é diferente da existente na Região Norte, porque nesta, no Amazonas, o indígena precisa da demarcação da área já existente. São milhões de hectares para poucos índios. No Mato Grosso do Sul, a questão fundiária é grave. As aldeias estão confinadas. Volto a repetir: campos de concentração de índios!

Essa situação não pode continuar. Estou hoje aqui para dizer aos meus Pares que, se continuar a situação como está, com a ausência da União na questão de Mato Grosso do Sul, haverá, dentro em breve, derramamento de sangue, violência - como se ainda não estivessem acontecendo essas violências e essas mortes.

Há duas ou três semanas, numa invasão indígena, morreu um índio, e cinco ficaram feridos.

Vejo aqui jornais de Mato Grosso do Sul que trazem fotografias e dizem o seguinte:

Surge novo foco de conflito entre brancos e índios. Menos de uma semana depois do confronto que resultou na morte de um indígena em Sete Quedas, índios e colonos de Dourados entraram em confronto na madrugada de ontem, durante tentativa de invasão a propriedades vizinhas às reservas. Percebendo a ação, os agricultores enfrentaram os invasores [índios]. Por conta do conflito, a MS-56 permaneceu interditada durante 17 horas.

Noticiaram ainda os jornais:

Índios brigam com produtores. Confronto da madrugada deixou vários feridos de ambos os lados. Índios querem levantamento em um mês.

A cada dia que amanhece, temos notícia de um novo conflito de terras em Mato Grosso do Sul.

Gostaria que o Senado observasse que precisamos, sim, dar terra para os indígenas, principalmente em Mato Grosso do Sul e também em Mato Grosso. No entanto, a questão fundiária nesses dois Estados está consolidada. As aldeias estão confinadas, e não há mais possibilidade de expandi-las nas áreas devolutas da União. O que acontece? Junto dessas aldeias conflitadas, existem as terras tituladas, terras produtivas, trabalhadas por famílias que lá estão.

O que está acontecendo para que esses conflitos estejam cada vez piores? Falo com segurança que a Funai e algumas ONGs, ferindo o problema do indígena, que é grave, pegam os indígenas dessas aldeias confinadas, colocando-os em cima de quatro, cinco ou seis caminhões, e os derramam na porta das fazendas tituladas. Estabelece-se o conflito. Estabelece-se a invasão. A reação dos proprietários é cada vez mais determinada, dizem eles, em legítima defesa da sua propriedade e da integridade física de seus familiares.

Em resumo, o que está acontecendo: injustiça cometida contra os indígenas e injustiça cometida contra os proprietários de terra.

A Funai e algumas ONGs - que o Senador Mozarildo Cavalcanti conhece muito bem - fazem com que o conflito se agrave cada vez mais. E, em se agravando, a União não entra para dirimir a questão, porque, se tiver de desapropriar terras para assentar índios e aliviar as aldeias, não tem autorização legislativa.

Já darei um aparte a V. Exª, Senador Mozarildo Cavalcanti.

Não tem autorização legislativa como tem para a reforma agrária. Já cansei de repetir isso aqui. Os Srs. Senadores já o sabem de cor e salteado.

Entramos com uma PEC, uma proposta de emenda à Constituição, para que a União tenha autorização legislativa para desapropriar áreas tituladas pagando um régio preço aos proprietários e compor a questão dos indígenas.

No Senado, minha PEC está sendo obstruída pelo PT, que não permite, por engenhosa obstrução nas comissões, que a PEC caminhe. Inclusive o Ministro Márcio Thomaz Bastos, em uma audiência pública aqui no Senado, disse-me: “A PEC de V. Exª é boa, mas sou contra”, Perguntei-lhe o porquê, e S. Exª me disse: “Porque vai gerar despesas para a União.”

Meu Deus do Céu, será que a União não pode dispor de recursos em favor da população? Para que serve o Estado? Para fazer com que, em seu território, haja uma sociedade justa. Para que haja uma sociedade justa, nunca haverá prejuízo para o Estado naquilo que despender em favor da harmonia dos brasileiros. O Ministro da Justiça dizer isso, Senador Mozarildo Cavalcanti!

Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Senador Juvêncio da Fonseca, compreendo-o perfeitamente, porque acompanhei passo a passo esse conflito indígena no seu Estado, eu, como Presidente da Comissão Externa do Senado e o Senador Delcídio Amaral como Relator. V. Exª acompanhou a Comissão, assim como os Senadores Augusto Botelho e Jefferson Péres. Levantamos todos os problemas existentes e apresentamos um relatório, indicando claramente ao Poder Executivo a solução para Mato Grosso do Sul, que passava principalmente pela sua proposta de emenda à Constituição, como também por outras soluções. No entanto, o Ministro da Justiça se julga professor de Deus, julga-se acima da verdade. Então, uma comissão do Senado estudou o problema, com apoio de uma consultoria legislativa que se debruçou sobre a questão, que aconselhou a aprovação da emenda constitucional de V. Exª, isso não foi levado em conta. Também não foram levadas em conta as sugestões de Santa Catarina, que tem um problema igual ou pior do que o de Mato Grosso; a questão de Rondônia, que também examinamos; e a questão de Roraima. O Presidente, nessa matéria, está muito mal assessorado, porque o Ministro Thomaz Bastos tem um viés fundamentalista. É agregado ao pensamento do Conselho Indigenista Missionário, que é um braço da Igreja Católica. Então, não tem isenção nessa questão. Lamento que isso esteja acontecendo com os índios e com os proprietários que estão lá há séculos, colocados pelo Governo. Portanto, manifesto minha solidariedade a V. Exª, dizendo que precisamos continuar tendo a coragem de denunciar essas coisas. Antigamente, muita gente não tinha coragem, porque as ONGs, que se transformaram numa espécie de entidade sacrossanta, dominavam a mente daqueles que se achavam politicamente corretos.

O SR. JUVÊNCIO DA FONSECA (PDT - MS) - Senador, agradecendo o seu aparte, o que mais nos preocupa é o fato de o Ministro da Justiça e o Presidente da República assinarem demarcações de terras tituladas como se fossem terras indígenas. Em Mato Grosso, está acontecendo essa questão hoje. No Município de Antônio João, o Presidente da República, ao arrepio da Constituição Federal e da Súmula nº 650 do Supremo Tribunal Federal, homologou por decreto uma demarcação de terra. Quando o Presidente homologa uma demarcatória, a sua homologação já é título de matrícula de registro no Registro de Imóveis, como se fosse uma área indígena. A legislação é assim e permite que esse decreto seja registrado, porque só pode haver demarcatória em relação a terras devolutas, que são terras da União, nunca no que se refere a terras particulares. Isso foi feito em Antônio João, após invasões propiciadas pela Funai e pelas ONGs que conhecemos lá.

Agora, vejam o que está acontecendo outra vez: portaria do Ministro da Justiça foi publicada ontem no Diário Oficial da União, reconhecendo que a terra em Japorã pertence aos indígenas.

            Foi publicada ontem, no Diário Oficial da União, a declaração de que os 9.455 hectares da área em litígio entre índios e fazendeiros, entre a Aldeia Porto Lindo, o Córrego Guaçuri e o Rio Iguatemi, no município de Japorã, são indígenas. A portaria autoriza posse definitiva aos índios - uma portaria! - guarani ñandeva, que estão acampados em parte do território em litígio. A notícia da publicação da portaria 1.289, baixada pelo ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, pegou de surpresa os fazendeiros e a comunidade envolvida.

É mais um ato de confisco que está praticando a União mediante a assinatura do Ministro da Justiça e do Presidente da República. Terras tituladas não são terras indígenas, o Supremo já cansou de afirmar isso - marcou sua posição em treze julgamentos.

Ultimamente, o Presidente da República vem sendo interpretado como um homem alheio ao que se passa nas ante-salas de seu gabinete, alheio aos problemas que afligem a República brasileira. Além disso, parece que o Presidente, bem como o Ministro Márcio Thomaz Bastos, estão alheios ao que se passa no Supremo Tribunal Federal: se Sua Excelência manuseasse a jurisprudência do Supremo Tribunal, não cometeria esse erro grave de assinar uma demarcatória; não expropriaria, através de um decreto, terras tituladas.

Infelizmente estamos sentindo que o nosso Presidente da República está deixando correrem soltas muitas coisas. É por isto que enfrenta hoje essa crise política: porque não tem parâmetro para governar. Na área fundiária a lei é desrespeitada todos os dias, o trabalho dos ruralistas e dos indígenas é desrespeitado todos os dias. Será que o nosso Presidente, por sua insensibilidade, por sua falta de vocação para a gestão pública, não percebeu ainda que o agronegócio é que está sendo a salvação da economia nacional?

Já disse hoje aqui, num aparte ao Senador Osmar Dias, que a insensibilidade do Presidente é tão grande que ele não ouviu sequer o ronco dos tratores no “tratoraço” que houve aqui. Para acalmar a pressão dos agricultores, prometeu e não cumpriu. É como se não entendesse também que o processo da economia passa pelo agronegócio, que sustenta a Balança de Pagamentos, que sustenta o maior número de empregos neste País.

Concedo aparte a V. Exª, Senador Osmar Dias.

O Sr. Osmar Dias (PDT - PR) - Senador Juvêncio, é um orgulho para o PDT ter V. Exª nos nossos quadros, que atua no Senado com seriedade, representa o Estado do Mato Grosso do Sul com muita dignidade. Além de minha admiração, pode ter certeza, V. Exª tem a admiração do seu Estado, pois defende o que é correto, o que é justo. Quanto ao caso que V. Exª menciona agora, vou dizer de forma objetiva e rápida: o nosso representante na Comissão de Orçamento, o Senador Augusto Botelho, já está de acordo com a nossa posição, a posição da nossa bancada, de não votar a LDO enquanto o Governo Lula não cumprir as promessas que fez para os agricultores na semana passada. Estão brincando com gente séria. Aquele “tratoraço” pode se repetir em todas as rodovias deste País, caso o Governo não cumpra o que prometeu na semana passada.

O SR. JUVÊNCIO DA FONSECA (PDT - MS) - Obrigado, Senador Osmar Dias, pelas boas palavras.

Agora concedo um aparte ao Senador Augusto Botelho.

O Sr. Augusto Botelho (PDT - RR) - Senador Juvêncio, apenas gostaria de alertá-lo para algo que as ONGs costumam fazer relativamente à questão indígena lá em Roraima. Fizeram a “satelização” das aldeias: pegavam uma família, colocavam num lugar onde não havia caça nem água e diziam que era uma nova aldeia. Quando eles não tinham mais gente para fazer isso, começaram a trazer indígenas da Guiana e da Venezuela, que querem vir para cá porque aqui têm direito a aposentadoria, a previdência social, a assistência médica. O Estado dá isso aos indígenas - não a Funai, que faz seu trabalho precariamente -; o Estado e os Municípios dão essa assistência aos indígenas. Alerto, portanto, V. Exª, porque vão começar a levar índios de países vizinhos para o seu Estado; farão isso, com certeza, para aumentar a população indígena, para reivindicar mais e, depois, quando forem definidas duas áreas, a mais ou menos uns cinqüenta quilômetros uma da outra, vão querer fazer a união entre elas. Um antropólogo inventou essa história de área única, foi por isso que aconteceu o que aconteceu com a Raposa-Serra do Sol. A maloca da Serra do Sol está numa ponta e a Raposa está a quase 150 quilômetros. Resolveram unir as duas e deu no que deu: o meu Estado está passando por um problema grave; se a cultura de arroz irrigado for prejudicada em função da atitude do Presidente Lula, iremos perder quase seis mil empregos - isso, num Estado pequeno, de 340 mil habitantes. Alerto, portanto, V. Exª, os pecuaristas, os produtores de seu Estado: fiquem alertas para o movimento de indígenas de outros países para cá, para o Mato Grosso. Era o que gostaria de dizer a V. Exª e aos produtores do seu Estado. Muito obrigado.

O SR. JUVÊNCIO DA FONSECA (PDT - MS) - Muito obrigado pelo alerta, Senador Augusto Botelho. Isto já está ocorrendo: índios da república vizinha, do Paraguai, já estão atravessando a fronteira, isso é público e notório.

Agora, o que tenho de deixar claro aqui, para a nação brasileira inteira, para que amanhã ou depois ninguém diga que Mato Grosso do Sul se omitiu nesta hora, é que a violência está crescendo na zona rural de Mato Grosso do Sul com essas invasões absurdas. Isso é culpa da Funai, das ONGs que instigam as invasões e, principalmente, culpa do Governo Federal, que não quer, de maneira alguma, que uma PEC como a nossa prospere no Senado para promover a desapropriação e a composição social desses dois segmentos sociais que estão sofrendo injustiças, que é o indígena e proprietário rural.

Essa insensibilidade está aí, essa falta de visão é evidente. Até quando? Como diz o Senador Mão Santa: “Acorda, Presidente!” A Nação precisa da sua consciência alerta. Fique um pouco mais no território brasileiro, viaje menos, visite o interior, visite as tabas indígenas, visite os proprietários rurais, visite aqueles que laboram esta terra e querem construir uma pátria que não seja dirigida por omissos e irresponsáveis como acontece agora.

Fico indignado quando toco nessa questão fundiária do meu Estado. Causa-me indignação ver a União abandonar os indígenas do meu Estado e causar o prejuízo que causa à propriedade rural, aos proprietários rurais. Até quando? Até quando essa insensibilidade vai infelicitar tantas famílias que perecem pela beira das estradas, nas invasões absurdas? A Funai e as ONGs colocam os índios dentro de um caminhão e depois os despejam nas fazendas particulares como se isso fosse um procedimento jurídico - nem moral é!

Senhor Presidente da República, afague o seu povo, pense no seu povo, fale com o seu povo, ouça o seu povo, visite o seu povo. Nós estamos precisando da sua presença para aliviar os nossos espíritos e evitar a hecatombe social que está prestes a chegar. Nós falamos sempre que não queremos quebrar, de forma alguma, as instituições e a normalidade jurídica deste País. Mas 99%, Senador Antonio Carlos Magalhães, dependem especialmente do Governo Federal, depende do nosso Líder, que se chama Luiz Inácio Lula da Silva, que está absorto, andando pelo mundo e esquecendo a sua Pátria, abandonando seus filhos, principalmente os indígenas e os proprietários rurais.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/07/2005 - Página 22347