Discurso durante a 109ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Importância de normas para a rotulagem de produtos que contenham alimentos geneticamente modificados.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA. CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.:
  • Importância de normas para a rotulagem de produtos que contenham alimentos geneticamente modificados.
Publicação
Publicação no DSF de 13/07/2005 - Página 23195
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA. CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
Indexação
  • ESCLARECIMENTOS, DECRETO EXECUTIVO, OBRIGATORIEDADE, UTILIZAÇÃO, SIMBOLO, ROTULO, ALIMENTOS, IDENTIFICAÇÃO, EXISTENCIA, ALTERAÇÃO, PADRÃO GENETICO, PRODUTO TRANSGENICO, PROTESTO, DESCUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO, PREJUIZO, SAUDE, POPULAÇÃO.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), EXISTENCIA, POSSIBILIDADE, PREJUIZO, SAUDE, CONSUMO, MILHO, PRODUTO TRANSGENICO, EMPRESA MULTINACIONAL.
  • CRITICA, INEFICACIA, DECRETO EXECUTIVO, ATENDIMENTO, DIREITOS, CONSUMIDOR, PRODUTO INDUSTRIALIZADO.
  • CRITICA, EMPRESA MULTINACIONAL, ALIMENTOS, EXPLORAÇÃO, PRODUTOR RURAL, AUMENTO, PREÇO, SEMENTE, PRODUTO TRANSGENICO, ACUSAÇÃO, IRREGULARIDADE, ATUAÇÃO, EMPRESA, OBJETIVO, OBTENÇÃO, MERCADO, BRASIL.

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os holofotes estão voltados para as CPIs e para as investigações. Estão todos atentos aos depoimentos. No entanto, não nos podemos esquecer dos demais problemas que afetam a vida de todos os brasileiros.

Um dos assuntos que trago hoje à tribuna, inclusive já levantado hoje pelo Senador Osmar Dias, é de extrema gravidade, por se tratar de direito e de questão relacionada à saúde do cidadão. Falo da rotulagem dos produtos que contenham organismos geneticamente modificados. Esse assunto é de interesse de todos nós, que nos alimentamos a partir de produtos que compramos nos supermercados.

Para relembrar, faço aqui um pequeno histórico. No início de 2003, foram editadas duas medidas provisórias: a de nº 113 e a de nº 131. Aquela foi a primeira a liberar a comercialização da safra de soja transgênica, porém manteve o veto ao plantio; esta, a Medida Provisória nº 131, aprovada no fim de setembro, além de liberar a comercialização da safra de soja transgênica (safra 2003/2004), permitiu também o plantio de Organismos Geneticamente Modificados - OGMs, somente para essa temporada.

A exigência de identificação para os consumidores de produtos geneticamente modificados consta do decreto presidencial de 24 de abril de 2003, Decreto nº 4.680, que regulamenta o direito à informação. O art. 2º dessa lei determina que:

Na comercialização de alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal, que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados, com presença acima do limite de 1% do produto, o consumidor deverá ser informado da natureza transgênica desse produto.

O §1º desse artigo determina que, tanto nos produtos embalados como nos vendidos a granel ou in natura, o rótulo da embalagem ou do recipiente em que estão contidos os OGMs deverá constar, em destaque, o símbolo da letra “T”, definido mediante portaria do Ministério da Justiça.

Lembro-me de que há um ano, quando o Ministério da Justiça lançou o símbolo da presença de transgênico nos alimentos, tive a oportunidade de assistir à notícia pela televisão, mas até hoje não encontrei em nenhuma embalagem de supermercado esse símbolo identificando a presença de transgênicos nos alimentos.

Passados dois anos e quase três meses da edição desse Decreto, não vemos em nenhum produto o símbolo “T”. Portanto, os consumidores estão vulneráveis e à mercê dos desmandos das indústrias que descumprem a lei. Também não se soube até hoje que algumas dessas empresas tenham sido multadas, apesar de o descumprimento das regras de rotulagem definidas pela Portaria nº 2.658, do Ministério da Justiça, de dezembro de 2003, implicar o pagamento de multas que podem variar de R$200,00 a R$3 milhões.

Trata-se, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, da saúde do povo brasileiro. Nada existe que comprove que esses OGMs façam bem, muito pelo contrário. Recentes estudos - e aí faço um alerta: secretos - realizados pela Monsanto - a mesma Monsanto que está extorquindo os plantadores de soja do Rio Grande do Sul, como foi denunciado ainda há pouco pelo Senador Osmar Dias - revelam que ratos alimentados por três semanas com o milho transgênico Mon 863, produzido pela multinacional, apresentaram anormalidades nos rins e na composição do sangue.

Ressalto que a mesma notícia repercutiu em vários jornais da Europa e na Folha de S.Paulo, no Brasil. Não me lembro de ter lido essa notícia em outros jornais. A Folha de S.Paulo eu tenho no meu arquivo.

O famoso geneticista molecular Arpad Pusztai, em outra ocasião, já havia apresentado estudos realizados também com ratos, os quais, alimentando-se de batatas geneticamente modificadas, apresentaram redução dos testículos, atrofia do fígado e anormalidades em outros órgãos, além de alergia e resistência a antibióticos.

A Monsanto nega qualquer malefício desses OGMs; no entanto, nega-se a publicar qualquer pesquisa de impacto à saúde humana.

E nós trouxemos pesquisadores da Europa, em 2003, quando estava havendo o debate nesta Casa, que mostraram as raras pesquisas dos impactos provocados pelo uso de organismos geneticamente modificados. Mas, ainda assim, ficamos na dúvida e terminamos aprovando projetos que, agora, geram conseqüências danosas para a economia e, quem sabe, para a saúde. Vamos ver lá na frente.

Apesar do indiscutível avanço, dois aspectos do decreto ainda violam os direitos dos consumidores. O primeiro deles é que produtos altamente processados, como os biscoitos, bolos, massas, chocolates, óleos, margarinas e os derivados, além de papinhas para bebês, não são rotulados, pelo simples fato de que, ao longo do processamento, é destruída a possibilidade do organismo geneticamente modificado ser detectado. O outro é a limitação de 1%, pois, segundo testes já realizados no Brasil pelo Instituto de Defesa do Consumidor - Idec, muitos alimentos, ao serem processados, apresentam menos de 1% e, nestes casos, o consumidor ficará sem qualquer informação. Por isso, a importância do rastreamento desse produto.

O consumidor quer saber sobre a origem dos aditivos e ingredientes e tem esse direito. Todos temos esse direito. Quer saber de onde foi retirado o gene para modificar o organismo. E quer saber o que essa modificação faz. Então, o rótulo frontal tem que informar que o produto foi feito a partir de, por exemplo, soja transgênica. O que o consumidor faz ou não com a informação do rótulo não é assunto para geneticista; é um direito legítimo e legal do consumidor.

Outro grave problema enfrentado pelos produtores gaúchos da soja transgênica Roundup Ready, da empresa Monsanto, problema este muito previsível - e nós alertávamos aqui -, é a cobrança dos royalties desse grão. Vejamos: essa soja foi contrabandeada para o Brasil. Essas sementes de soja transgênica entraram por contrabando, e o Estado brasileiro legalizou o contrabando, fazendo vista grossa com o crime. As medidas provisórias citadas, como disse, legalizaram o crime. Hoje, porém, esses mesmos produtores reclamam da cobrança exorbitante desses royalties. Todos sabiam que, mais cedo ou mais tarde, isso aconteceria.

A Monsanto não introduziria suas sementes no Brasil sem fins lucrativos e ela introduziu de forma clandestina essas sementes. Bancou a clandestinidade e a ilegalidade, porque sabia que, no futuro e conhecendo bem o Estado brasileiro, isso acabaria sendo legalizado.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Vejam: apenas o mercado brasileiro de sementes de soja transgênica pode render mais de R$1 bilhão por ano em taxas de uso dessa tecnologia. Então, ela estava certa na hora em que introduziu as sementes clandestinamente, em que bancou a clandestinidade.

Não contabilizamos nesse R$1 bilhão as vendas casadas do herbicida da Monsanto, que vai junto com a soja a ele resistente. E, por opção, os produtores de soja que usam essas sementes engordam cada vez mais os cofres da Monsanto. Só que isso é uma questão de opção. Os agricultores deixaram de plantar as sementes selecionadas há 30 anos pela Embrapa para trocá-las por sementes geneticamente modificadas. Foi uma troca consciente. Eles optaram por isso.

(Interrupção do som.)

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Essa é uma questão de opção.

O SR. PRESIDENTE (Roberto Saturnino. Bloco/PT - RJ) - V. Exª tem dois minutos para concluir o seu pronunciamento.

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Dois minutos é muito tempo! Obrigado, Sr. Presidente.

O que não podemos fazer é tirar o direito do cidadão de optar pelo que quer consumir. O que não podemos fazer é impor ao consumidor produtos que contenham Organismos Geneticamente Modificados sem lhe dar a opção de escolha, opção essa que os produtores de soja transgênica tiveram. Eles poderiam fazer a opção pelas sementes tradicionais, selecionadas e altamente produtivas, mas fizeram a opção pelas sementes geneticamente modificadas e estão pagando um preço terrível por isso.

Muitos consumidores estão preocupados com os riscos que os transgênicos possam representar à saúde. No entanto, mesmo que um dia fique provado que um certo alimento transgênico não faz mal à saúde, ainda assim tem que ser rotulado, pois inocuidade e valor nutritivo não são os únicos quesitos que interessam ao consumidor. É um direito do consumidor a informação. É um direito do cidadão e da cidadã receberem todas as informações por meio da rotulagem dos alimentos que cada um de nós ingere e compra no supermercado.

O que tem de ser feito é cumprir a lei. Aqui, não há o que discutir. É necessário que a fiscalização entre nos supermercados e exija que se cumpra a lei. Eu me recuso a consumir alimentos em que haja transgênicos. No entanto, não tenho opção de escolha, porque a lei não é cumprida, e o problema do nosso País é fazer cumprir a lei. No dia em que cumprirmos a lei, certamente não viveremos a crise que estamos vivendo neste momento.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/07/2005 - Página 23195