Discurso durante a 109ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apelo para aprovação de projeto de gestão de florestas.

Autor
Ana Júlia Carepa (PT - Partido dos Trabalhadores/PA)
Nome completo: Ana Júlia de Vasconcelos Carepa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Apelo para aprovação de projeto de gestão de florestas.
Aparteantes
Jefferson Peres, Sibá Machado.
Publicação
Publicação no DSF de 13/07/2005 - Página 23203
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • ELOGIO, APROVAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROJETO DE LEI, GESTÃO, FLORESTA, ANUNCIO, TRAMITAÇÃO, SENADO, SOLICITAÇÃO, APOIO, SENADOR.
  • ESCLARECIMENTOS, BENEFICIO, PROJETO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, REDUÇÃO, DESMATAMENTO, GRILAGEM, REGIÃO AMAZONICA.
  • DEFESA, AMPLIAÇÃO, DEBATE, CONGRESSISTA, SOCIEDADE, PROJETO DE LEI, GESTÃO, FLORESTA.

A SRª ANA JÚLIA CAREPA (Bloco/PT - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada. Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, senhoras e senhores presentes e aquela população que nos assiste e nos ouve, quero dizer que fiquei feliz porque a Câmara dos Deputados, depois de discutir a matéria na Comissão Especial e aprová-la na Comissão da Amazônia, aprovou por unanimidade o projeto de gestão de floresta, que finamente chega ao Senado da República.

Como paraense, como amazônida, quero fazer um apelo às Senadoras e aos Senadores. O projeto - de vez em quando, recebo uma mensagem, um e-mail - sofre, sim, muitos ataques. O projeto de gestão de florestas é visto por muitos como privatização das florestas brasileiras. Olhem, eu acho que temos de ter tranqüilidade e racionalidade para discutir essa questão sob a ótica do que está acontecendo hoje no Brasil.

Primeiro, alardeia-se que o desmatamento aumentou na Amazônia. Senador Sibá Machado, que é do Acre, da nossa Amazônia, nós sabemos que o desmatamento não aumentou na Amazônia. Aumentou em dois Estados brasileiros: Mato Grosso e Rondônia. Nos outros Estados, diminuiu. No meu Estado, o Pará, que era campeão de desmatamento, houve, nos últimos dois anos, uma redução de 20% no desmatamento. Houve, sim, uma ação mais firme de órgãos ambientais como o Ibama.

Não podemos deixar de encarar o problema da grilagem de terras. Precisamos separar o joio do trigo. Hoje, aqui, escutei parte do pronunciamento do Senador Valdir Raupp, que falava da preocupação com o setor de produtores florestais, conhecidos como madeireiros, que fazem, sim, o manejo florestal de forma correta, que são, sim, pessoas sérias. Não podemos colocar todos como sendo grileiros, como sendo predadores da floresta. Existem os grileiros, os predadores da floresta? Existem. E esses nós vamos denunciar sempre. V. Exªs estão acostumados a ouvir e a ver da tribuna o meu mais veemente repúdio a essa forma predatória de exploração da nossa floresta.

Vamos encarar também a situação da forma como ela existe: o tamanho do nosso País, o tamanho da nossa Amazônia e o que aconteceu nos Governos anteriores, quando praticamente acabaram com os órgãos públicos. Agora, o Ibama fez concurso público para que possa ter melhores condições. Nós temos condições reais de fiscalizar toda a nossa floresta? Não temos. E o que é melhor? Fazer um processo licitatório, dando oportunidades para as empresas brasileiras tanto as grandes como as pequenas empresas, para que elas não sejam jamais detentoras da posse da terra. Aquele que quer fazer o manejo florestal não quer ser latifundiário. Quem quer explorar o produto da floresta - como, por exemplo, a madeira -, de forma sustentável, não precisa ser latifundiário. Quem quer fazer o manejo florestal de forma correta não precisa fazer o desmatamento irregular.

E o projeto de gestão de floresta foi aperfeiçoado na Câmara - e eu tive oportunidade de discuti-lo desde a sua fase de discussão na Câmara. Aliás, digo que participei de talvez um dos primeiros momentos de discussão do projeto de Gestão de Florestas Públicas, quando, no final de 2003 ou início de 2004, o Ministério do Meio Ambiente chamou diversos dos setores da sociedade, envolvidos com o assunto, para debater um processo que permitisse a exploração não predatória, a fim de impedir exatamente a grilagem e, por conta dessa grilagem, a violência e as mortes no campo, as quais lamentamos muito. Infelizmente, ainda somos o Estado campeão nesse setor. Não somos mais o campeão do desmatamento, mas o Estado do Pará ainda é o campeão da morte e violência no campo.

Concedo um aparte ao Senador Sibá Machado.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Senadora Ana Júlia Carepa, certamente o Projeto de Gestão de Florestas Públicas já passou por um crivo de avaliação muito profundo. A Câmara dos Deputados foi o palco dos maiores debates. Reiteradas vezes, a Ministra Marina Silva e pessoas de sua equipe de trabalho compareceram às Comissões daquela Casa para esclarecer todas as dúvidas que pairavam sobre o Projeto de Gestão de Florestas Públicas. No meu entendimento, as emendas, as negociações, os pontos que ainda não tinham sido maturados já foram consolidados. O projeto foi votado, para nossa surpresa, com uma representatividade muito grande; não tenho certeza se foi aprovado por unanimidade.

A SRª ANA JÚLIA CAREPA (Bloco/PT - PA) - Foi por ampla maioria, pelo menos.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Foi por ampla maioria, com absoluta certeza. E eis que o projeto chega a esta Casa, fato importante nesta hora, tendo em vista o calor decorrente do assassinato da irmã Dorothy e dessa agenda muito brutal que aconteceu, a devassa no interior do Ibama, com a prisão de pessoas e com o trabalho da Polícia Federal. O que esse projeto pode trazer de salutar para aquela nossa região? Deixo muito claro, como V. Exª já citou com bastante ênfase, que muitas pessoas perguntam se essa medida não seria uma privatização. Na Amazônia, é preciso que consideremos muito claramente a diferença entre o conceito que aquela sociedade tem sobre terra e floresta e a concepção do restante do País. Em qualquer outro lugar do Brasil, as pessoas lutam pela propriedade privada do solo. Vi que, na Amazônia, não é bem assim. O morador da floresta luta pela propriedade da floresta. Como ela não fica suspensa no ar e tem um chão para segurá-la, ele, então, é obrigado a brigar pelo chão, porque existe lá a floresta. Muitas vezes, se se retirar a floresta, aquele morador vai embora. Então, nesse caso, a gestão de florestas públicas vem no sentido de evitar a grande grilagem de terras estabelecida naquela região. São muitos pontos daquela área, que é enorme - 60% do território brasileiro. Imagine como se pode chegar em tempo real para coibir uma apropriação indébita de uma área daquela região! Nesse caso, devo dizer a V. Exª que foi de muito bom proveito ter tocado nesse assunto hoje. Vamos rogar para que todos os Partidos com representação no Senado Federal e suas Lideranças possam compreender a extrema necessidade de votarmos esse projeto e de que ele seja aprovado, se ainda possível, antes do recesso - que, segundo estão falando, será de uma semana -, ou seja, ainda no mês de julho. Parabéns pelo pronunciamento!

A SRª ANA JÚLIA CAREPA (Bloco/PT - PA) - Obrigada, Senador Sibá Machado. Também espero que possamos votá-lo e aprová-lo o mais rapidamente possível, até porque há várias contribuições dos diversos setores, inclusive do setor produtivo. Já ouvi de diversas pessoas, inclusive de Partidos de Oposição, que essa é uma luta do setor produtivo florestal há mais de dez anos. Mas esse Governo teve a coragem de fazê-lo, e penso que a Câmara conseguiu aperfeiçoá-lo. Muitos deram contribuição por meio de emendas, que foram aprovadas. Então, acredito que teremos a tranqüilidade, a coerência e a ponderação de discutir esse projeto, para que possamos fazer o que é melhor.

Ouço o Senador Jefferson Péres, que também é da Amazônia.

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Senadora Ana Júlia Carepa, o desmatamento da Amazônia está ocorrendo, por um lado, pela fragilidade do aparelho estatal. A máquina pública brasileira tem sido sistematicamente desmontada há mais de dez anos.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Precisamos urgentemente começar a montar uma burocracia altamente profissionalizada no serviço público, que incluiria, obviamente, o Ibama. Por outro lado, V. Exª tem razão, pois falta um projeto racional de exploração da floresta amazônica, e o projeto enviado pelo Governo vai nessa linha. A única maneira de se compatibilizar a exploração de uma enorme riqueza nossa, que é a madeira, sem dúvida, com a preservação da floresta sem causar impacto ao meio ambiente é por meio do arrendamento de florestas públicas, como o Governo está propondo. Eu sou Senador de oposição, mas não voto contra o Brasil nem faço demagogia. Estão colocando chifre em cabeça de cavalo. Pode contar com o meu apoio ao projeto aqui no Senado, Senadora Ana Júlia.

A SRª ANA JÚLIA CAREPA (Bloco/PT - PA) - Obrigada, Senador Jefferson Péres. Eu não teria dúvida de sua postura em favor do Brasil, pois V. Exª é Senador pelo Estado do Amazonas, e sabemos dessa realidade. Tenho certeza de que essa será a postura da maioria dos Senadores e das Senadoras, que compreendem que precisamos possibilitar a exploração sustentável dos nossos bens, dos nossos recursos naturais, senão, amanhã - quando digo amanhã, não estou falando amanhã, na quarta-feira, mas proximamente -, poderemos até ser processados pelas gerações futuras, porque hoje o Direito moderno já o permite, por não termos tomado as atitudes necessárias para impedir um crime maior contra a região amazônica. Então, acredito nesse projeto, nessa legislação...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

A SRª ANA JÚLIA CAREPA (Bloco/PT - PA) - ...que permite a exploração, porque as empresas pagarão algo como se fossem royalties para o Estado, para os Municípios, para a União. Portanto, vamos transformar o que acontece hoje - porque muitos não pagam um único centavo de imposto, exploram a terra de forma ilegal, grilando-a - em exploração sustentável. É preciso que haja, além do manejo sustentável, a transformação dos recursos desses impostos em mais serviços, em mais educação, em mais saúde, principalmente para as populações que estão na Amazônia, que, sem dúvida, sofrem com o problema da grande diferença regional que ainda existe.

Poderemos voltar depois a esse assunto, porque o meu tempo está concluído, Senadores. Mas quero registrar, Senador Romeu Tuma, com a sua compreensão, que podemos sim dar, na verdade, esse presente. Não tenho nenhum problema por receber amanhã mais e-mails do que os que já recebo, criticando o projeto de gestão. É democrático, é legítimo, e a discussão democrática é importante.

Mas eu, que sou do Estado do Pará, eu, que sou da Amazônia, eu, que vivo essa realidade no campo, inclusive a da violência, posso testemunhar para todos aqueles que nos assistem e nos ouvem: essa é uma alternativa real e concreta para que impeçamos mais violência e para que possamos fazer, isto sim, a exploração sustentável dos nossos recursos naturais, de forma que a população também possa usufruir dessa riqueza, que é de todos nós.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/07/2005 - Página 23203