Discurso durante a 109ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Excesso na edição de medidas provisórias.

Autor
Romeu Tuma (PFL - Partido da Frente Liberal/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MEDIDA PROVISORIA (MPV).:
  • Excesso na edição de medidas provisórias.
Publicação
Publicação no DSF de 13/07/2005 - Página 23232
Assunto
Outros > MEDIDA PROVISORIA (MPV).
Indexação
  • CRITICA, EXCESSO, REMESSA, MEDIDA PROVISORIA (MPV), EXECUTIVO, LEGISLATIVO, HISTORIA, PAIS, REGISTRO, TENTATIVA, CONGRESSO NACIONAL, REGULAMENTAÇÃO, SITUAÇÃO.
  • SOLICITAÇÃO, RETORNO, APRECIAÇÃO, VOTAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS, ESPECIFICAÇÃO, NECESSIDADE, APROVAÇÃO, REAJUSTE, SALARIO, FORÇAS ARMADAS, CUMPRIMENTO, ACORDO, EXECUTIVO, COMENTARIO, INEXISTENCIA, MOTIVO, PARALISIA, LEGISLATIVO.

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o constitucionalismo moderno, que adotou e consagrou a tripartição dos Poderes do Estado a partir da admirável construção teórica de Montesquieu, consumou-se como o garante da convivência independente e harmônica entre o ramo Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Ademais, como que revelando o superlativo grau de sofisticação do modelo, concedeu pela tradição, logo inscrita no próprio texto legal, a faculdade de os outros Poderes, observados criteriosos limites, exercerem tarefas típicas de um terceiro. Caso mais evidente, e certamente polêmico na cena política brasileira dos últimos anos, é a possibilidade, constitucionalmente prevista, de o Poder Executivo emitir normas, com força de lei, por intermédio das chamadas medidas provisórias.

Inscritas em nossa Carta Política pelo constituinte de 1988, em substituição aos então considerados “execráveis” decretos-leis, herança do primeiro Governo Vargas, as medidas provisórias foram buscar inspiração no direito italiano contemporâneo. Trasladadas da bacia mediterrânea - berço e abrigo histórico do Direito - para os trópicos, uma vez perfilhadas, receberam, como não poderia deixar de ser, peculiares adaptações e mitigações, que evoluíram ao longo dos anos. Evoluíram tanto que se tornaram o remédio vulgar para toda e qualquer necessidade do Executivo, a ponto de a missão primordial dos legisladores ficar quase totalmente comprometida. A edição de MPs no Brasil virou uma rotina tão avassaladora que nos vimos na paradoxal iminência de o ordenamento jurídico nacional receber mais normas emanadas do Poder Executivo do que deste nosso Poder Legislativo.

Nos dias que correm tornou-se uma trivialidade jogar pedras no Governo Federal, consideradas as suas notórias e incessantes debilidades administrativas, políticas e, eventualmente, éticas; agora, objeto de apuração pelo Parlamento. Contudo, mesmo a Oposição haverá de reconhecer que o desabusado uso de medidas provisórias não começou em janeiro de 2003. Sabemos todos que lançar mão desse expediente remonta e alcança - em maior ou menor grau - todos os distintos governos que tivemos desde o advento de nossa jovem Constituição, que se prepara para celebrar seus 17 anos, somando já grande volume de reformas. A despeito de os constituintes terem, desde sempre, condicionado a edição das medidas provisórias aos pressupostos de relevância e urgência, esses requisitos constitucionais não são absolutamente respeitados quando compete ao Executivo exercer esse juízo institucional.

Concluindo que a “fúria legiferante” do Executivo não seria, de algum modo, capaz de auto-regulação, tivemos os Senadores e Deputados a sensibilidade de discutir, votar e aprovar, em 2001, emenda constitucional que alterou a sistemática de edição e apreciação das medidas provisórias. Foi uma tentativa, bem-sucedida em certos aspectos, de devolver ao Legislativo, em sua integralidade, a singela prerrogativa de legislar. Tentamos, na verdade, melhorar ou apenas dar alguma efetividade ao nosso sistema de freios e contrapesos nas relações entre este Poder e o Executivo.

Nesse trânsito entre as duas sistemáticas, que tem como divisor a Emenda Constitucional nº 32, de 11 de setembro de 2001, deixou-se no “armário legislativo” um esqueleto capaz de assombrar, de forma recorrente, nosso pródigo ordenamento jurídico. Srªs e Srs. Senadores, exatas 53 medidas provisórias encontram-se no Congresso Nacional, aguardando apreciação. A quase totalidade refere-se a temas de grande e indiscutível relevância para a vida do País, e, conforme estabelece o art. 2º da citada Emenda Constitucional, esse generoso conjunto de normas permanece em vigor “até que medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional”.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que proponho aqui é que o Senado Federal e a Câmara dos Deputados retomem imediatamente a apreciação e votação desses textos, transformando-os em lei ou deliberando por sua rejeição. O que não podemos permitir, sob pena de, ainda uma vez, colocar sob suspeição a capacidade legiferante do Poder Legislativo, é que essas medidas provisórias, por definição normas legais eivadas de precariedade, se perenizem como se fossem leis. Isso seria um desrespeito à sociedade e a nós mesmos, legisladores.

Devo revelar que, como Relator - ainda em meu mandato precedente - da Medida Provisória nº 2.215-10, tenho sido instado, com muita freqüência, por um elevado número de eleitores e cidadãos, acerca dessa inexplicável paralisia congressual, no que se refere à deliberação sobre medidas provisórias, em especial essa de número 2.215-10. Aliás, recordo que essa medida - em cuja relatoria acolhi nada mais, nada menos do que 822 emendas - dispõe sobre a reestruturação da remuneração dos militares das Forças Armadas, alterando lei em vigor.

Como temos acompanhado nas últimas semanas, a caserna vive momentos de altíssima insatisfação, decorrência do descumprimento de acordo firmado pelo Executivo com os militares. Penso que a ninguém aproveita a permanência desse clima. Logo, a rápida deliberação sobre a medida mencionada concorrerá, certamente, para atenuar os justos reclamos dos brasileiros que servem as nossas Forças Armadas e de seus familiares diretos, inclusive, Srªs e Srs. Senadores, o aumento comprometido pelo Comandante-Chefe das Forças Armadas, Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

            Mas quero ainda enfatizar que, além dessa medida de interesse dos militares, existem outras 52 medidas provisórias não menos relevantes no aguardo de nossa deliberação. O exame rápido da pauta que nos espera evidencia matérias como a criação de agências estatais de desenvolvimento para o Nordeste e a Amazônia, mudanças no Imposto de Renda e na Consolidação das Leis do Trabalho, relações financeiras entre a União e o Banco Central, remuneração do policial federal - que presta importantes serviços à sociedade brasileira -, o programa bolsa-renda e a política nacional do cinema, para citar apenas alguns entre tantos outros temas de igual valor.

Encerrando este pronunciamento, Sr. Presidente, quero insistir na necessidade, que me parece impostergável, de, em um verdadeiro tour de force, decidir sobre todas essas 53 matérias pendentes. Não temos o direito de fazer pouco caso de nossa atividade legislativa, deixando que medidas provisórias não apreciadas acabem, de fato, fazendo as vezes de leis - normas discutidas e votadas pelo Congresso Nacional. É evidente que colocar essas medidas provisórias em pauta só será possível no segundo semestre, mas reitero a V. Exª, Sr. Presidente, a prioridade que o assunto exige e espero o melhor empenho de todos nós nesse sentido. É mais uma forma de recuperar e fortalecer a imagem institucional de nossas duas Casas legislativas.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/07/2005 - Página 23232