Discurso durante a 110ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a crise política vivida no país, e a necessidade de reforma político-partidária, especialmente no que diz respeito aos financiamentos de campanha.

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA.:
  • Considerações sobre a crise política vivida no país, e a necessidade de reforma político-partidária, especialmente no que diz respeito aos financiamentos de campanha.
Publicação
Publicação no DSF de 14/07/2005 - Página 24020
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, POLITICA NACIONAL, ORIGEM, LEGISLAÇÃO ELEITORAL, LEGISLAÇÃO, REPRESENTAÇÃO PARTIDARIA, BRASIL, NECESSIDADE, PRIORIDADE, REFORMA POLITICA, PREVENÇÃO, CORRUPÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, SUPERIORIDADE, CUSTO, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, IMPOSIÇÃO, DIVIDA, PARTIDO POLITICO.
  • AVALIAÇÃO, CRESCIMENTO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), DIFICULDADE, CUSTO, CAMPANHA ELEITORAL.
  • REGISTRO, CONTRIBUIÇÃO, EMPRESARIO, CAMPANHA ELEITORAL, OCULTAÇÃO, NOME, PRESTAÇÃO DE CONTAS, ANALISE, ALTERNATIVA, FINANCIAMENTO, SETOR PUBLICO, SEMELHANÇA, PAIS ESTRANGEIRO, ALEMANHA, QUESTIONAMENTO, APLICAÇÃO, BRASIL.
  • DEFESA, MODELO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, DIVULGAÇÃO, APOIO, EMPRESA, IMPORTANCIA, DEBATE, INDEPENDENCIA, MANDATO PARLAMENTAR.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu gostaria inicialmente de discutir neste plenário - e vou insistir nesta agenda ao longo deste mês - que a origem dessa crise que estamos atravessando é a legislação eleitoral e partidária do Brasil.

Temos hoje uma questão que se não for equacionada com profundidade, episódios como esse se repetirão ao longo da história do País. O problema fundamental do que estamos vivendo é a o financiamento de campanha. É a origem de muitos problemas da gestão do Estado brasileiro. As campanhas eleitorais estão cada vez mais caras, abusivamente caras. Especialmente os programas de televisão, as produtoras de televisão impõem custos incompatíveis com a austeridade que a vida pública exige. Além dos comícios, os showmícios, outdoors, materiais de toda ordem, caminhões de som e tudo o mais que envolve uma questão eleitoral, esses custos acabam impondo aos Partidos que têm um crescimento político no País um endividamento e um comprometimento das suas finanças que leva a situações como a que estamos vivendo.

Não tenho nenhuma dúvida de que o PT cresceu muito eleitoralmente, era o quarto Partido na última eleição municipal, em 2000, passou a ser o primeiro em 2004. Esse crescimento eleitoral significou custos de campanha incompatíveis com a situação financeira do Partido seja com o fundo partidário, seja com a contribuição dos militantes. E somos um Partido em que cada Parlamentar dá 20% do seu salário para contribuir para as finanças do Partido. Mesmo assim o Partido não tem como responder aos custos de campanha; mesmo com as contribuições de campanha, não tem como responder aos custos de campanha. Portanto, a primeira medida que precisamos discutir com profundidade é cortar gastos de campanha, é reduzir o prazo, é enxugar os custos, é estabelecer regras rígidas para que os Partidos e os homens públicos não sejam prisioneiros dessa lógica que está nos colocando numa situação inaceitável politicamente.

Em segundo lugar, é o problema da contribuição de campanha. No Brasil, a maioria dos empresários que contribuem para as campanhas não querem aparecer, não querem estar na prestação de contas. Alguns porque acham que episódios como esses corroem a imagem de responsabilidade social da empresa, a identidade da empresa, e prejudicam os negócios e a credibilidade institucional das empresas de sua propriedade. Outros, porque, ao ocultar o nome, permitem que algumas ações dos seus interesses perante o Estado brasileiro sejam tratadas sem transparência, portanto, sem controle social e institucional.

Por uma ou por outra razão, não podemos mais aceitar esse estado de coisas. Temos dois caminhos: um é o caminho da Alemanha. A Alemanha estabeleceu um fundo partidário público: a campanha é financiada exclusivamente com recursos públicos. Quero dizer, de forma muito transparente, que tenho dúvidas se esse modelo pode existir com eficiência no Brasil. Na Alemanha, instituições mais sólidas, como é o SPD alemão, a Democracia Cristã, e o Partido Social Democrata alemão, que são os dois principais partidos, têm mais de um século, são instituições extremamente fortalecidas. Pois nesse país que tem uma cultura de organização institucional, tivemos episódios como o do Helmut Kohl: havia caixa 2 no financiamento das campanhas. E o Primeiro Ministro que participou da unificação da Alemanha, 11 anos à frente do governo alemão, foi prejudicado na sua trajetória política, pelo financiamento de campanha. Naquela situação, inclusive, pelo próprio peso da cultura germânica, o tesoureiro se suicidou. Ora, se na Alemanha o financiamento público exclusivo não foi eficiente para inibir o Caixa 2 de campanha, tenho grandes dúvidas se, no Brasil, resolverá o nosso problema.

Portanto, a meu ver, essa crise serve como aprendizado. No meu ponto de vista, o modelo mais eficiente é o americano. Depois de 200 anos de democracia, nos Estados Unidos, o financiamento de campanha é absolutamente transparente. O Presidente da República faz financiamento de campanha, pede apoio financeiro, tira fotografia com os doadores, faz jantares. O Partido que mais arrecada aparece como o que tem mais chances de ganhar a eleição. E o eleitor tem a consciência de que aquele homem público que vai ser eleito tem um vínculo com ele, eleitor, e um vínculo com a empresa que o financia.

Hoje, quando, em um congresso, um médico apresenta uma nova droga, por exemplo, na oncologia, para combater o câncer, ele é obrigado a colocar embaixo: conflito de interesses, e colocar os laboratórios aos quais presta serviços ou que financiaram aquela pesquisa, a fim de que cada profissional avalie se aquele remédio de fato é produto de uma pesquisa científica ou se aquilo ali é parte do esforço de vender remédio daquele laboratório. A decisão é do médico, que vai dar ou não aquele remédio aos seus pacientes. Esse modelo da medicina é mais verdadeiro. A transparência é o melhor caminho. Alguns homens públicos serão lobistas de algumas empresas? Serão, mas a maioria não será. Quem financia a campanha dos Senadores, dos Deputados, dos Governadores são as mesmas empresas que patrocinam a mídia. As mesmas empresas que estão nos jornais, nas revistas, na televisão são aquelas que financiam os políticos. Só que lá eles assumem, publicamente, a sua identidade. Aqui, boa parte das empresas ocultam o financiamento de campanha.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª me permite um aparte, se for possível?

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Não sei se é possível o aparte.

O SR. PRESIDENTE (Alberto Silva. PMDB - PI) - Foi feito um acordo.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Não pode haver apartes. Peço-lhe desculpas, Senador Eduardo Suplicy. Tenho certeza de que o aparte de V. Exª ajudaria muito a aprofundar a discussão.

Ora, se são as mesmas empresas, por que a mídia pode ter liberdade editorial e credibilidade institucional e o homem público não? É evidente que pode. O fato de ter o financiamento de uma campanha por uma parte de um empresário, de um grupo de amigos ou de algumas outras instituições não significa, a priori, o compromisso do seu voto, das suas decisões. Ele continua tendo obrigação, pelo vínculo que estabelece com o eleitor, a quem presta contas, senão não voltará à função pública.

Por isso, creio que o grande aprendizado desta crise, depois de tudo apurado, de identificadas as responsabilidades, de punidas as pessoas que devem ser punidas, é a reforma política. Sem a reforma política, não haverá eficiência na gestão do Estado brasileiro; não haverá choque de gestão no Estado brasileiro; não haverá tranqüilidade no exercício da vida pública. Saímos da clandestinidade política do período da ditadura, mas uma parte da atividade política nesta sociedade continua sendo feita sem transparência, sem conhecimento público e, portanto, sem que evolua a cidadania e a consciência dos cidadãos.

(Interrupção do som.)

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - O Estado de direito precisa evoluir no Brasil. A reforma política, a reforma partidária, a fidelidade partidária, as cláusulas de barreira, essa agenda tem que prosperar nesta crise. Sem a reforma política, não daremos resposta aos problemas que estão postos, neste momento, no debate da sociedade brasileira.

Portanto, eu disse isso ao Colégio de Líderes e ao Presidente Renan Calheiros e vou me empenhar muito, ao longo das próximas semanas, para rediscutir reforma política com profundidade, para construirmos uma agenda comum e termos a coragem de reverter a situação que aí está, porque, com ela, vamos continuar repetindo situações como esta. Podemos abanar as moscas, mas não limparemos a sujeira. A reforma política é inadiável para o Brasil!

 

           


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/07/2005 - Página 24020