Discurso durante a 121ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Análise da diligência realizada pelo Ministério do Trabalho na Destilaria Gameleira, em Mato Grosso, acusada de utilização de mão-de-obra escrava.

Autor
Serys Slhessarenko (PT - Partido dos Trabalhadores/MT)
Nome completo: Serys Marly Slhessarenko
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. POLITICA PARTIDARIA.:
  • Análise da diligência realizada pelo Ministério do Trabalho na Destilaria Gameleira, em Mato Grosso, acusada de utilização de mão-de-obra escrava.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 29/07/2005 - Página 25842
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • LEITURA, REGISTRO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, ASSUNTO, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, MINISTERIO DO TRABALHO E EMPREGO (MTE), MINISTERIO PUBLICO DO TRABALHO, COMPROVAÇÃO, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, EMPRESA, TRABALHO ESCRAVO, SONEGAÇÃO FISCAL, LOBBY, CLASSE POLITICA, PROTEÇÃO, CRIME DO COLARINHO BRANCO, EMPRESARIO, DESTILARIA, ALCOOL, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), SEMELHANÇA, LOJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ALEGAÇÕES, IMPOSSIBILIDADE, CUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, LEGISLAÇÃO FISCAL.
  • PROTESTO, CONCORRENCIA DESLEAL, EMPRESARIO, SONEGAÇÃO FISCAL, TRABALHO ESCRAVO, IMPORTANCIA, FISCALIZAÇÃO.
  • DEFESA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), EXPURGO, MEMBROS, CORRUPÇÃO.

A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicio o meu pronunciamento fazendo a leitura de um artigo publicado por Leonardo Sakamoto na Agência Carta Maior, que gostaria ficasse registrado nos Anais desta Casa. Logo após, falarei sobre um assunto ainda vigorante, infelizmente, no Estado de Mato Grosso, que é o trabalho escravo.

O título do artigo publicado pelo Sr. Leonardo Sakamoto é “Gameleira: a Daslu do Agronegócio”.

Servidores públicos, cumprindo as suas obrigações previstas em lei, fazem uma diligência surpresa e constatam que as denúncias que haviam recebido sobre as irregularidades em uma determinada empresa eram procedentes. Os proprietários - ricos e respeitados, bem relacionados nas cúpulas do poder - reclamam do tratamento “violento” que teriam recebido da Polícia Federal.

Logo em seguida, surgem reclamações de Deputados, Senadores, pessoas influentes, juristas, corneteiros de luxo em geral. ‘Os investimentos estrangeiros vão secar com esse tipo de fiscalização’, dizem uns. ‘É um ultraje contra o setor que gera empregos’, bradam outros. ‘Mas os funcionários são bem tratados’, reclamam colunistas de jornais. Surge pressão para que o Governo Federal afrouxe as decisões - afinal de contas, é impossível ser um fiel cumpridor da lei neste País, não é?

Federações patronais reclamam no Congresso contra os desmandos do Poder Público, manifestam apoio aos proprietários da empresa e tentam até realizar uma passeata em prol da ‘legalidade’ [Senhores, legalidade! O cidadão não paga imposto, é preso e acha que está dentro da legalidade!] Alguns jornalistas e veículos de comunicação defendem que a violência perpetrada tem cunho político para desviar o foco da crise política.

Daslu? Não, mas bem que poderia ser.

O relato acima não foi das agruras de Eliana Tranchesi, mas das de Eduardo de Queiroz Monteiro, proprietário da Destilaria Gameleira, da qual foram libertados mais de 1.200 trabalhadores, escravizados em meados de junho. Foi a quarta vez que um grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério do Trabalho Público do Trabalho e Polícia Federal realizou uma diligência nessa usina de álcool, localizada no Município de Confresa (MT) [meu Estado].

A similaridade dos casos é surpreendente:

1) Eliana Tranchesi é rica. Eduardo de Queiroz Monteiro é rico.

2) No caso da butique, o senador Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) e o Prefeito José Serra (PSDB - SP), entre outros, saíram em sua defesa [em defesa de Daslu]. Pressionaram o Governo Federal, reclamando de que a ação viria da revanche do Governo petista. Políticos encheram o ouvido do Ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. O Ministro manteve o apoio à ação.

No caso da usina, Deputados Federais ligados a Pernambuco (seguindo o exemplo de Severino Cavalcanti, Presidente da Câmara, que já havia feito lobby pela Gameleira) e o Governador de Mato Grosso, Blairo Maggi, entre outros, saíram em defesa de Eduardo de Queiroz Monteiro. Pressionaram o Governo Federal, reclamando de que a ação viria da revanche do Governo petista. Políticos encheram o ouvido do então Ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini. O Ministro manteve o apoio à ação.

3) Em São Paulo, a toda-poderosa Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) saiu em defesa da Daslu através do seu dirigente Paulo Skaf e ensaiou uma manifestação de protesto. Ressaltou-se que a empresa gera empregos e contribui para o desenvolvimento da região. Empresários lembraram que fiscalizações como essa afugentariam possíveis investidores.

Em Confresa, Estado do Mato Grosso, a toda-poderosa Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA) saiu em defesa da Gameleira através do seu dirigente Rodolfo Tavares e ensaiou uma manifestação de protesto. Ressaltou-se que a empresa gera empregos e contribui para o desenvolvimento da região. Empresários lembraram que investigações como essa afugentariam possíveis investidores.

4) Em São Paulo, os defensores da Daslu dizem que é impossível pagar todos os impostos. No Mato Grosso, os defensores da Gameleira dizem que é inviável cumprir toda a legislação trabalhista.

Há mais pontos de comparação entre ambas. E isso não é aleatório, mas demonstra que é um padrão de comportamento que a elite assume quando sente-se acuada. O instinto de auto-preservação, desenvolvido ao longo de séculos de Casa-Grande e Senzala, surge de forma semelhante, mesmo em ambientes tão diferentes quanto os dos canaviais de Confresa e os cabides da Itaim Bibi.

Exposta a uma situação que considera de risco à sua posição na sociedade, essa elite esquece que tanto a utilização de mão-de-obra escrava, em vez da assalariada, quanto a sonegação de impostos representa concorrência desleal. Esquece que Tranchesi e Monteiro passavam a perna no empresário ao lado e lucravam cometendo um crime.

Ao cobrar que a lei seja totalmente aplicada, os bons empresários estão apenas tomando conta de seus investimentos. Quem não faz isso atua em um corporativismo burro achando que é sua “classe social” que está sendo ameaçada (e, como empresário, perde dinheiro com isso).

Ou faz isso como medida preventiva. Até para evitar devassas na contabilidade ou a verificação da condição social de seus empregados.

            Como eu disse, esse artigo, escrito por Leonardo Sakamoto, foi publicado na Agência Carta Maior. Considero extremamente oportuno deixá-lo registrado nos Anais do nosso Senado da República.

            Tal artigo identifica, como muito bem diz, os cabides do Itaim Bibi com a Gameleira, que produz, sim, no Estado de Mato Grosso, mas produz muito trabalho escravo. Há poucos meses, de lá foram retirados 1.200 trabalhadores em absoluto trabalho escravo. No entanto, os donos se acham injustiçados.

            Um não paga impostos, o outro pratica o trabalho escravo, e se acham injustiçados.

A Polícia Federal deve estar atenta porque, em Mato Grosso, há muito produtor da melhor qualidade, há muitas pessoas que trabalham sério, que produzem, que pagam seus impostos, que lutam para retirar seus produtos, muitas vezes com dificuldades por terem ainda necessidade de melhor infra-estrutura. Trata-se de um Estado eminentemente produtor de matéria-prima, que tem muitas dificuldades. Sua extensão geográfica é gigantesca e seu povo muito trabalhador, gente que diz para que veio.

O Mato Grosso é, hoje, o maior produtor de carne, soja e algodão, e o segundo maior produtor em outros vários setores. Alguns praticam isso, sim, mas acredito que são poucos e cada vez serão menos, até pela ação que relatarei posteriormente.

Também aqueles da área urbana, como a Daslu e outros, têm de pagar impostos, sim, senão seus vizinhos de lado estarão sendo injustiçados e pagarão por isso. Por que alguns podem pagar e outros não? Essa questão deve ser encarada de peito aberto e de cabeça erguida. Deve ser encarada, sim! Sonegador precisa pagar. Não temos de ficar achando que por serem grandes a Daslu e a Gameleira - uma na área rural, praticando trabalho escravo, e a outra na área mais nobre de São Paulo - não precisam pagar impostos. Isso tem de acabar.

Fiz questão de registrar esse artigo porque nada melhor do que ele para embasar a minha fala.

Como tenho ainda dois minutos, Sr. Presidente, quero ler o seguinte:

Justiça repõe empresa de MT na “lista suja” do trabalho escravo

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região suspendeu a liminar obtida pela fazenda Mutum e sua proprietária, a Pinesso Agropastoril Ltdª, garantindo seu retorno à “lista suja” do trabalho escravo. Por voltar a esse cadastro de empregadores, a empresa fica proibida de contrair novos empréstimos no Banco do Brasil ou nos Fundos Constitucionais de Financiamento. Retorna também para as empresas listadas na “cadeia produtiva de trabalho escravo no Brasil” - que serve de alerta à indústria, varejo e exportadores para que apliquem restrições aos produtos com mão-de-obra escrava. O recurso que levou à decisão do TRF coube à Advocacia Geral da União (AGU).(...)

Apesar de a decisão ser do dia 2 de junho, só agora ela chegou ao conhecimento do Ministério do Trabalho e Emprego, que voltou a inserir a Pinesso na lista. Com isso, abre-se um importante precedente para o retorno das outras 12 fazendas suspensas da “lista suja”.

            Espero que, das outras 12, nenhuma volte, que todas, apesar de estarem com liminar por recurso acionado, consigam provar que não têm trabalho escravo, porque, como eu disse, lá tem muita gente que trabalha direito, de forma honesta, de forma séria, mas também há pessoas - e são poucas - que, infelizmente, estão na “lista suja” do trabalho escravo.

Ao mesmo tempo, é uma afirmação da importância desse instrumento para o processo de erradicação do trabalho escravo. E um sinal de apoio da Justiça Federal ao combate a essa prática - uma vez que das 13 liminares concedidas a proprietários rurais para saírem da relação, 10 foram pela Justiça Federal e três pela Justiça do Trabalho.

O grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério Público do Trabalho e Polícia Federal libertou 52 trabalhadores da Fazenda Mutum, em abril de 2002. Localizada em Dom Aquino, Mato Grosso, tem o cultivo de algodão como atividade principal, e também produz soja e milho.

            Eu teria mais o que dizer, mas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vou encerrar minhas palavras, e agradeço pelo tempo, dizendo que, infelizmente, ainda persistem alguns cancros de trabalho escravo em pleno século XXI, em nosso País.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senadora Serys Slhessarenko, V. Exª ainda tem um tempinho.

A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - Pois não, Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senadora Serys, eu queria cumprimentá-la e o Mato Grosso. Não é sem razão que V. Exª chegou a esta Casa, numa luta democrática das mais difíceis e árduas: venceu o líder das Diretas Já. Isso mostrou a força que V. Exª representa. Eu queria cumprimentá-la e parabenizá-la. Meu nome é Francisco, que disse: “Onde houver desespero, que eu leve a esperança”. V. Exª trocou os trajes de ontem - que estavam muito bonitos, pois V. Exª é elegante -, o vermelho, pelo verde, traduzindo ao povo brasileiro que ainda tem esperança. Pelo seu comportamento, V. Exª dignifica o Senado e a classe dos professores, que, não sem razão, são os únicos a serem chamados de mestres, como Cristo. V. Exª tem tido coragem. Estou lendo Saturnino Braga, que diz que não votará mais no Lula, que não quer mais o Lula. Saturnino, já que está assim, eu quero o PT forte, quero combatê-lo frontalmente, de peito aberto, porque entendo que a democracia é forte com partidos fortes. Está aí uma mulher boa para ser candidata pelo PT no lugar do Lula, Saturnino: Serys.

A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - Muito obrigada, Senador, mas nosso candidato à reeleição é o Presidente Lula.

V. Exª ouviu, ontem, o meu pronunciamento, em que deixei bem clara minha posição com relação ao Partido dos Trabalhadores.

Queremos, sim, que tudo seja investigado, apurado, julgado e punido. E reforço, por não sei quantas vezes, a expulsão imediata de meu Partido daqueles que já temos clareza que cometeram crimes, dos que são bandidos. Queremos já a expulsão. Que se limpem o Partido dos Trabalhadores e qualquer outro Partido. Pedimos a expulsão imediata do Sr. Delúbio Soares - outro já saiu - e de outros mais que estão sendo comprovados. Essa é nossa posição.

Quero meu PT das origens de volta!

Muito obrigada.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE A SRª SENADORA SERYS SLHESSARENKO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Gameleira: a Daslu do agronegócio.”


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/07/2005 - Página 25842