Discurso durante a 121ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à postura adotada pelos depoentes na CPMI dos Correios. Considerações sobre as investigações da CPMI dos Correios referentes a transações realizadas entre o Sr. Marcos Valério e o Banco Rural.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT).:
  • Críticas à postura adotada pelos depoentes na CPMI dos Correios. Considerações sobre as investigações da CPMI dos Correios referentes a transações realizadas entre o Sr. Marcos Valério e o Banco Rural.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 29/07/2005 - Página 25852
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT).
Indexação
  • REGISTRO, MANIFESTAÇÃO, BRASILEIROS, COLABORAÇÃO, TRABALHO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO.
  • LEITURA, REGISTRO, ANAIS DO SENADO, OBRA LITERARIA, ASSUNTO, REPUDIO, OCULTAÇÃO, VERDADE, SEMELHANÇA, DEPOIMENTO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT), PRONUNCIAMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • SUSPEIÇÃO, VINCULAÇÃO, CORRUPÇÃO, PUBLICITARIO, BANCO PARTICULAR, DESCUMPRIMENTO, NORMAS, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, REGISTRO, SOLICITAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), FISCALIZAÇÃO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), LAVAGEM DE DINHEIRO, SETOR PUBLICO, EVASÃO DE DIVISAS.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma frase do escritor francês Nicolas Chamfort, que viveu de 1741 a 1794, portanto há muito tempo, aplica-se ao momento de crise que estamos vivendo no Brasil: “Não há como fazer com que a inutilidade do primeiro dilúvio impeça Deus de nos mandar um segundo.”

Essa frase aplica-se ao momento de crise que estamos vivendo no Brasil. Não há como fazer com que a inutilidade do primeiro dilúvio impeça Deus de nos mandar um segundo.

Certamente essa é a preocupação que move os brasileiros que se interessam pela assepsia geral exigida neste momento de investigação pelo Congresso Nacional, pelo Ministério Público, pela Polícia Federal. É certamente essa razão que leva brasileiros a encaminhar permanentemente colaborações importantes à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito. São centenas de e-mails diariamente encaminhados sobretudo aos Senadores e Deputados, Senadoras e Deputadas que integram essa Comissão.

Eu imagino que nunca o País esteve tão atento, como está agora, às ações do Congresso Nacional. É por isso, Senador Mão Santa, que o País quer participar mediante a contribuição que cada um, Senador Romeu Tuma, possa oferecer com peculiaridades marcantes.

            Vou inserir nos Anais da Casa, Senador, o poema “Implosão da Mentira”, por Affonso Romano de Sant’Anna, porque certamente tem provocado indignação o comportamento daqueles que, questionados na CPI, usam a mentira como arma de defesa. Essa parece não ser uma atitude inteligente, porque a mentira acaba se transformando em arma para a acusação.

Leio parte desse poema de Affonso Romano de Sant’Anna, que é mineiro e carioca. É um poema, repito, com o título “A Implosão da Mentira”.

Mentiram-me.

Mentiram-me ontem

e hoje mentem novamente.

Mentem de corpo e alma completamente.

E mentem de maneira tão pungente

que acho que mentem sinceramente.

Mentem sobretudo impunemente.

Não mentem tristes,

alegremente mentem.

Mentem tão nacionalmente

que acham que mentindo história afora

vão enganar a morte eternamente.

Mentem, mentem e calam.

mas nas suas frases falam. E desfilam de tal modo nuas

que mesmo o cego pode ver a verdade em trapos pelas ruas.

Sei que a verdade é difícil e para alguns é cara e escura,

mas não se chega à verdade pela mentira

nem à democracia pela ditadura.

(...)

Mentem partidariamente,

mentem incrivelmente,

mentem tropicalmente,

mentem hereditariamente,

mentem, mentem, e de tanto mentir tão bravamente

constroem um país de mentiras diariamente.

Peço a V. Exª que considere todo o poema lido.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PFL - SP.) - V. Exª será atendido na forma do Regimento.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Creio ser esse poema um retrato da indignação em relação à postura daqueles que compareceram até agora para depor na Comissão Parlamentar de Inquérito, desde o Sr. Sílvio Pereira ao Sr. Marcos Valério, passando pelo Sr. Delúbio Soares e pela Srª Renilda Santiago.

Nós, Sr. Presidente, estamos verificando várias associações, associações criminosas, associações para a corrupção, associação do Poder Executivo com parte do Legislativo, com partidos políticos e com setores empresariais, notadamente setores representados pela figura do Sr. Marcos Valério. Mas seria exagero centralizar sobre os ombros dele a responsabilidade toda pelos acontecimentos que focalizamos nesta investigação. Existem outras associações.

Cito uma associação, para mim visível, já explicitada detalhadamente: das agências, especialmente a SMP&B do Sr. Marcos Valério, com o Banco Rural. A impressão que fica é que o Sr. Marcos Valério é uma espécie de sócio oculto do Banco Rural. A relação é de intimidade absoluta, há uma proximidade incrível. As operações são autorizadas informalmente, não há nenhum respeito às normas que regem o Sistema Financeiro Nacional. E os artifícios utilizados para a liberação de recursos, especialmente na boca do caixa, de forma suspeita, nos induzem a concluir pela possibilidade de existir no Banco Rural uma verdadeira lavanderia de dinheiro em nosso País.

É evidente que os diretores do banco se queixam de que essa exposição enfraquece o banco, de que essa exposição afugenta clientes, mas temos a responsabilidade de denunciar quando os fatos nos convencem de estarmos diante de irregularidades. Através da CPI, já solicitei ao Banco Central uma rigorosa investigação.

Há, Sr. Presidente Romeu Tuma, empréstimos contraídos junto ao Banco Rural que me parecem ser apenas operações contábeis. Os empréstimos são realizados contabilmente como forma de promover o repasse do dinheiro público, como instrumento para a lavagem de um dinheiro que, de forma espúria, é subtraído dos cofres públicos do País através dos contratos superfaturados, não só na área de publicidade, mas também em outras áreas - a própria CGU auditou mais de oitenta contratos e constatou irregularidades diversas, fraudes, superfaturamento. Nós não chegamos ainda às conclusões sobre essas operações contratuais celebradas pelos Correios, mas elas certamente sinalizam para a existência, em outros setores do Governo, das mesmas falcatruas que já identificamos na área específica da investigação da CPI dos Correios.

Refiro-me a essa relação estranha das agências do Sr. Marcos Valério com o Banco Rural. As autorizações para saques são informais demais, são singelas em excesso, são simples bilhetes, alguns até com frase simpáticas, como, por exemplo: “Nesta linda sexta-feira, autorizamos a liberação de R$100 mil a favor do Sr. Davi Rodrigues Alves, na agência do banco em Minas Gerais”. Com antecedência, os bilhetes determinavam o montante de recursos que deveriam ser liberados e anunciavam que, posteriormente, seria encaminhado o nome de quem deveria comparecer para sacar esses recursos na boca do caixa. Depois, outro comunicado, também sempre muito informal, dava o nome de quem sacaria esses recursos e em qual agencia - se na agência de Belo Horizonte, se na agência de Brasília, de São Paulo ou do Rio de Janeiro. E os valores eram sempre arredondados.

Obviamente, esta não é uma operação legal. Não é esse tipo de procedimento que autoriza a norma do Sistema Financeiro Nacional. O que há, na verdade, é uma administração no mínimo precária de várias agências de uma instituição financeira a serviço da desonestidade.

Nesta semana, conferimos, Senador Mão Santa, o repasse de mais de R$6 milhões a uma empresa denominada Garanhuns, localizada no Estado de São Paulo. Verificou-se que, na verdade, é uma empresa de fachada. No local do seu endereço há um terreno baldio. Na outra localidade apontada não há e nunca houve absolutamente nada. O representante da empresa mora numa residência modesta em Santo André. Coincidentemente...

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PFL - SP) - Senador, vou dar mais cinco minutos a V. Exª.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Pois não, Sr. Presidente.

Coincidentemente, em Santo André. Por razões óbvias, não há necessidade de fazer referência ao drama vivido pela população de Santo André diante de denúncias de corrupção e de crimes praticados, até este momento impunemente, que levaram, especialmente, a vida do saudoso prefeito Celso Daniel.

E essa empresa de fachada de São Paulo tem uma sucursal no Uruguai. Aqui não há ninguém que possa ser considerado ingênuo a ponto de não constatar que essa é uma operação de evasão de divisas, já que lá é paraíso fiscal apropriado para essa remessa de dólares através de empresas fantasmas do nosso País. Portanto, há aí uma outra modalidade de Operação Uruguai. Há que se investigar sim.

A contribuição é farta, mas hoje quero deixar no ar algo que reforça a associação espúria a que há pouco me referi. Seria o Sr. Marcos Valério um sócio oculto do Banco Rural? Veja o que manda um brasileiro: “Por que é que a empresa SMP&B permitiu que o Banco Rural fosse a entidade responsável pelo registro de domínio do nome www.smp&b.com.br?” Ora, se o domínio é da agência de publicidade, por que é que consta o nome do Banco Rural como entidade responsável pela solicitação da criação desse domínio na Internet? É mais uma informação que liga, fortemente, o Banco Rural às agências do Sr. Marcos Valério.

É exatamente por esta razão, Sr. Presidente, que reiteramos o pedido que já fizemos ao Banco Central para que investigue o Banco Rural. Suspeitamos que seja um instrumento para evasão de divisas, sonegação fiscal. Suspeitamos que seja um instrumento para lavagem de dinheiro. Temos certeza absoluta de que é um instrumento para operações bancárias desonestas.

Concedo, antes de concluir, um aparte ao Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Alvaro Dias, primeiro queria cumprimentá-lo, porque, ontem, pesquisando aqui sobre os trabalhos no Senado, descobri que V. Exª disputa o maior número de pronunciamentos com o Senador Arthur Virgílio. E quero dar o testemunho de que todos eles são feitos com muito brilho e coragem. V. Exª começou citando um autor e falando de dilúvio. Não sei se foi para lembrar Delúbio - ali era muita água e aqui é muito dinheiro.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Coincidência, Senador. A frase foi escolhida por acaso.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Sim, mas depois V. Exª falou sobre mentiras, e, na minha mocidade, aprendi com Coelho Neto, que retrata tudo isso. V. Exª trouxe um escrito tão belo, mas o dele é sintético e verdadeiro. Fui criado nesta filosofia e crio os meus filhos e meus netos: quem mente rouba. E, por isso, dizemos: é o Governo da mentira.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Senador Mão Santa, não terei tempo para analisar o pronunciamento de ontem do Presidente da República, no Rio Grande do Sul.

Por falar em mentira, veja o que o Presidente afirmou: “...E eu estou pedindo a Deus para chegar o dia 31 de dezembro de 2006 e poder comparar cada coisa que nós fizemos, com os últimos 20 anos, para ver se existiu na história desse país alguém que investiu mais em políticas públicas do que nós temos investido”.

Essa afirmação do Presidente da República não se encaixa bem no tema mentira? O Presidente da República, mesmo sob essa tempestade devastadora dos escândalos da corrupção, ainda encontra tempo para a arrogância?! É impressionante como o Presidente não muda, como o Presidente não aprende.

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma.PFL - SP) - Desculpe-me, Senador. V. Exª tem mais 2 minutos a V. Exª.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Vou concluir.

            O Presidente está investindo como ninguém investiu nos últimos anos? Onde estão esses investimentos? Gostaria que o Presidente os apontasse, sob pena de termos que voltar sempre para ler poemas brilhantes como esse do escritor Afonso Romano de Sant’Anna “A Implosão da Mentira”.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR ALVARO DIAS.

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/07/2005 - Página 25852