Discurso durante a 112ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações ao pronunciamento do Senador Arthur Virgílio, proferido na sessão do dia quatorze de julho, último.

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR. POLITICA PARTIDARIA.:
  • Considerações ao pronunciamento do Senador Arthur Virgílio, proferido na sessão do dia quatorze de julho, último.
Publicação
Publicação no DSF de 19/07/2005 - Página 24765
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR. POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • PROTESTO, PRONUNCIAMENTO, ARTHUR VIRGILIO, SENADOR, INCOMPATIBILIDADE, DECORO PARLAMENTAR, ACUSAÇÃO, ORADOR, FALSIDADE, DECLARAÇÃO INDIVIDUAL, DESPESA, CAMPANHA ELEITORAL.
  • REGISTRO, TENTATIVA, OPOSIÇÃO, ACUSAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MEDIAÇÃO, LIDERANÇA, GOVERNO, SENADO.
  • ESCLARECIMENTOS, DECLARAÇÃO INDIVIDUAL, ORADOR, DESPESA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), DISPONIBILIDADE, ANALISE, OPINIÃO PUBLICA, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE).
  • REGISTRO, DESCONHECIMENTO, ORADOR, DEPOIMENTO, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), VINCULAÇÃO, EMPRESTIMO, PUBLICITARIO.
  • CRITICA, ACUSAÇÃO, AUSENCIA, PROVA, DEFESA, DIVULGAÇÃO, DESPESA, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, CANDIDATO, PRESTAÇÃO DE CONTAS, PARTIDO POLITICO.
  • DEFESA, REFORMA POLITICA, SOLUÇÃO, SITUAÇÃO, CRISE, PARTIDO POLITICO.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicialmente, gostaria de dizer que, em crises como esta, assistimos aos melhores momentos do Parlamento e também aos piores; aos comportamentos mais nobres e aos pequenos comportamentos. É assim a vida pública, e aprendemos com o tempo.

Quero dizer que, na quinta-feira passada, fiquei absolutamente estarrecido com o pronunciamento do Senador Arthur Virgílio. Primeiro, porque conheço S. Exª e somos Parlamentares há mais de dez anos. Sempre tivemos uma disputa dura, acirrada, respeitosa, mas leal. E creio que S. Exª cometeu um ato de deslealdade para comigo.

É verdade que S. Exª me ligou lá pelo meio-dia, dizendo que viria ao plenário, na hora em que eu estava indo ao aeroporto, para embarcar para São Paulo. Tentei dar retorno ao celular duas vezes e não consegui falar com S. Exª. Fui para São Paulo. Infelizmente, na sexta-feira, não houve sessão plenária. Eu tinha compromissos no meu Estado. Depois, li o pronunciamento e fiquei mais impressionado pela forma, pelo tom, pelas expressões, pelo conteúdo e pela direção do seu pronunciamento; sobretudo por S. Exª me haver incluído naquele pronunciamento de uma forma que considero inapropriada e apressada. Se ao menos S. Exª tivesse conversado antecipadamente comigo, seguramente não o teria feito.

Começo pela transparência da minha vida parlamentar, da minha campanha, da minha vida pública. Gosto das coisas que dizem respeito ao meu nome bastante esclarecidas. Sobre o debate daquela quinta-feira, apesar de ter tentado esclarecer com algumas jornalistas da Casa, o que eu disse não foi publicado. Espero que o seja agora.

O Senador afirmou que eu tinha declarado R$710 mil, mais precisamente R$710.483,41, e que, portanto, minha campanha não poderia ter sido feita com esses recursos e que era mentira a minha declaração.

Primeira ponderação: dos 54 Senadores que se elegeram, eu fui o 25º a mais gastar nessa declaração. Portanto, temos atrás de mim: 02 Senadores do PDT, 04 do PFL, 02 do PL, 05 do PMDB, 03 do PSB, 02 do PSDB, 07 do PT e 02 do PTB, que declararam ter gastado menos do que eu.

Portanto, estranho! Por que pinçar o meu nome sem analisar o conjunto das declarações? Mas, entendo; talvez mais um esforço de atingir o Governo pela minha condição de Líder do Governo.

Agora, o que não foi dito deste plenário e o que até agora não foi publicado, porque hoje de manhã, pela CBN, ouvi o Senador Heráclito Fortes, novamente - tratou-me com muito respeito durante todo esse processo, quero destacar isso -, afirmar que R$710 mil são muito pouco para as minhas despesas de campanha.

Na declaração que está no TSE, além da minha declaração pessoal, existem as despesas do Partido dos Trabalhadores no Estado de São Paulo, recursos que outros partidos não fazem, mas o meu Partido faz. Estão declarados lá, pela campanha no Estado de São Paulo, R$3.417.804,13. Além do meu parceiro, na época candidato ao Governo do Estado, José Genoíno, R$2.023.999,47. Portanto, gastamos na campanha, em São Paulo, R$6 milhões. E R$3.417 milhões são as despesas do Partido no Estado, que dizem respeito à campanha do Genoíno, dizem respeito à minha campanha e dizem respeito às campanhas estaduais e federais. No PSDB, em Manaus, Amazonas, não teve essa despesa, pelo que me informei - se tiver havido, gostaria de conhecer.

A maioria dos Senadores não tem a despesa partidária divulgada publicamente. Por que é importante a despesa do partido? Porque parte das despesas de campanha é do partido. Os comícios quem organiza é o partido, não é o Senador. Vou como convidado de uma atividade partidária.

No nosso Partido, todos os candidatos a Deputado Estadual e Federal imprimem nos seus panfletos o nome da chapa majoritária, o número, a cédula. Portanto, não fiz um jornal de campanha meu. Todo o material era feito pelos meus companheiros de Partido. A cédula de campanha que era distribuída tinha Lula, Genoíno, Mercadante e os demais candidatos a Deputado Estadual e Federal. Essas despesas estão contabilizadas e nominadas, além do que cada Deputado Federal e Estadual fez.

Por isso, quero responder também a uma nota que assisti hoje, de um diálogo que jamais existiu. Nunca fui discutir com o Sr. Delúbio Soares o seu depoimento, porque não posso discutir um depoimento que não conheço, informações que jamais me foram dadas.

Não sei por que chegamos a essa dívida. Não sei onde foi tomada a decisão relativa a essa dívida. Não sei por que o partido se endividou dessa forma. Não sei que contratos são esses que foram feitos. Não conheço o Sr. Marcos Valério. Jamais falei com ele, nunca participei de uma reunião. Nunca recebi qualquer apoio de campanha desse cidadão. Portanto, espero, em algum momento, e cobrei isso do Sr. Delúbio Soares, poder ter a informação completa do que aconteceu.

A única coisa que eu disse a ele e repito é: diga a verdade. Porque é o melhor para o Partido e para o País que tenhamos transparência e que possamos apurar tudo isso com todo rigor.

Mas, na minha declaração do Comitê Único do PT, no Estado de São Paulo, pagamos para a publicidade, campanha do Sr. Duda Mendonça, R$1.910 milhão, além do que o Presidente Lula pagou, R$7.085 milhões, da campanha nacional. Foi feito um pacote com o Duda Mendonça em vários Estados da Federação, incluindo São Paulo - era o mesmo estúdio, era a mesma equipe, as mesmas pessoas, e eu tinha apenas 52 segundos de campanha dia sim, dia não, porque a nossa participação no horário eleitoral era bastante pequena. As despesas estão aqui declaradas no TRE. E a despesa de comunicação e publicidade é mais ou menos a mesma em qualquer Estado em televisão, não importa qual o tamanho do eleitorado, a despesa é mais ou menos a mesma. Só de comunicação, no caso da produtora de televisão, gastamos R$1.910.

Estão aqui também R$357.983,00 mil de outdoors, que na maioria das vezes, no nosso Estado, éramos eu, o Genoíno, o Presidente Lula, ou eu e o nosso colega de chapa José Genoíno. Portanto, essa é despesa da campanha da qual participei, é isso que fui informado, é isso que divulgamos. Somados, são R$6 milhões. Acho inclusive muito dinheiro.

Uma das providências que temos que tomar, rapidamente, nessa crise é reduzir os gastos de campanha, reduzir substancialmente os gastos de campanha, porque o problema dos partidos em relação aos gastos de campanha vai muito além do PT. É muito importante que esse debate seja feito, com profundidade, para que tudo seja esclarecido, mas que seja esclarecido também de todos os partidos, para que possamos dar um salto de qualidade em relação ao processo democrático.

Senador Arthur Virgílio, V. Exª levantou o... 

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Vou falar depois, o microfone está nesta posição. Aparte é assim.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PFL - SP) - Vai falar baseado no art. 14?

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Então, vou dar prosseguimento à minha intervenção.

Esclarecido esse episódio que, para mim, era absolutamente indispensável que eu fizesse, volto a afirmar que considerei as expressões utilizadas pelo Senador Arthur Virgílio absolutamente incompatíveis com o decoro parlamentar. Registro o meu protesto nos Anais desta Casa. Não estava aqui naquela oportunidade - gostaria que algum outro companheiro o tivesse feito - mas as reputei absolutamente inapropriadas. Não se pode tratar um debate político com expressões como as utilizadas. Não se pode tratar a figura do Presidente da República da forma como foi tratada. Isso não contribui para a democracia, não contribui para o respeito entre Oposição e Governo, não contribui para o que quer que seja. Isso significa um rebaixamento do debate político, que tenho certeza de que a biografia do Senador Arthur Virgílio nunca patrocinou, e é por isso que peço que não insistamos nesse caminho, porque não ajuda a convivência, o relacionamento respeitoso que nós sempre tivemos ao longo de todos esses anos.

Entendo que a Oposição queira mudar o foco e centrar o seu ataque no Presidente Lula. Não sei se pelo prestígio dele junto ao povo, se pelo fato de as pesquisas eleitorais mostrarem que o povo não só confia no Presidente, como sabe que Sua Excelência não está envolvido. É evidente que não está envolvido, é evidente que esse processo foi feito no PT por algumas poucas pessoas, que sequer a Executiva Nacional tomou conhecimento ou o Diretório Nacional. Pergunte a qualquer membro do Diretório Nacional se, em algum momento, foi discutido esse tipo de financiamento, esse tipo de empréstimo, esse volume de gasto de campanha. Nunca foi informado e nunca foi discutido.

Quero terminar, dizendo aos meus parceiros da Oposição...

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PFL - SP) - V. Exª tem direito a mais cinco minutos de prorrogação.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - ... que espero que consigamos conduzir esse processo com bastante responsabilidade pública; que tudo seja apurado, que não haja prejulgamento, que as informações sejam prestadas, mas que, acima de tudo, façamos um balanço mais profundo.

E pergunto aqui, aos companheiros deste Plenário, se não temos o problema do pagamento em campanha, fora da prestação de contas oficial, como um grave problema da democracia brasileira, que perpassa todos os partidos? Porque a maioria dos empresários não quer hoje financiar e ter seu nome envolvido com essa criminalização recorrente da atividade política no Brasil. Esse é o problema mais grave da democracia brasileira. Não acredito que o modelo de financiamento público exclusivo vá resolver essa questão. A Alemanha estabeleceu o financiamento público exclusivo, como forma de tentar responder a essa questão democrática, e continua tendo problemas de financiamento paralelo. A crise de Helmut Kohl foi exatamente relacionada a financiamento de campanha eleitoral.

Penso que o melhor caminho é o da transparência absoluta. É, a partir dessa crise, darmos um salto definitivo no Brasil e assumirmos que o financiamento de campanha faz parte da atividade política, que os empresários devem assumir a sua responsabilidade nesse processo e eliminarmos definitivamente esse mecanismo, junto com medidas corajosas de redução de custos de campanha: a proibição de showmícios, a redução do tempo da campanha e o estabelecimento de um padrão para os programas de televisão que não leve a esses gastos absurdos que estamos tendo com as agências de publicidade, para que possamos não repetir esse tipo de situação.

É muito melhor explicitarmos os financiamentos de campanha na prestação de contas de cada partido, de cada candidato, do que assistirmos o que temos visto recorrentemente: depois da campanha aparecem gastos que não foram contabilizados, gastos substantivos, significativos, que mostram que a transparência não ajuda o eleitor a tomar decisão. Quando vamos hoje a um congresso médico de oncologia e o médico faz a apresentação de um novo remédio, ele é obrigado a colocar embaixo os conflitos de interesses: quais foram os laboratórios que financiaram a pesquisa, para que cada médico possa tomar decisão se aquela conclusão é exatamente produto da pesquisa científica e da medicina ou se o financiamento do laboratório interferiu no resultado como parte do lobby de uma atividade farmacêutica. E o médico toma a sua decisão olhando para seus pacientes e tendo informação. Acho que na vida pública é assim. Os patrocinadores de campanha são os mesmos patrocinadores da imprensa. Por que um veículo pode ter liberdade editorial e acha que homem público não pode ter liberdade de decisões simplesmente porque recebeu o apoio de campanha? E o eleitor vai avaliar se a decisão de cada homem público está vinculada ou não ao financiamento do partido ou daquele candidato.

Se não resolvermos essa questão democrática de reduzirmos o custo de campanha, de baratearmos o custo de campanha, seguramente, esses problemas vão-se repetir. Se hoje eles são visíveis - e é bom que sejam, do ponto de vista do Partido -, só lamento tomar conhecimento desses fatos pela imprensa. Acho que os companheiros deveriam ter-me dito isso antes de tomar a decisão, aconselhando-se mais de forma democrática e respeitosa com os companheiros de Partido que têm 25 anos de história, como é o meu caso, e que não foram consultados em momento algum sobre as decisões tomadas e que têm de receber informações pela imprensa, como está ocorrendo.

Acredito que tudo foi feito pelo espírito partidário, mas ainda assim não se justifica. Isso não pode acontecer. Um Partido como o PT não podia viver um momento como este. Temos um imenso desafio, não apenas de pedir desculpas à opinião pública, mas de reformar o Partido, corrigir esses erros e permitir uma trajetória em que não se repitam mais episódios dessa natureza.

No entanto, eu diria que essa não é só uma tarefa do PT. Enganam-se aqueles que acham que esse é um problema só do PT. É fácil conduzir isso como se fosse o problema de um único partido, mas não é verdade. Trata-se de um problema da democracia brasileira e está presente em quase todas as legendas partidárias. E eu pediria àqueles que vão continuar esse debate que digam claramente se esse não é um problema dos demais partidos e se não temos despesas partidárias e dívidas de campanha que não são contabilizadas. Essa nova questão precisamos resolver com coragem.

É fácil e rápido criminalizar apenas o PT, mas não será a melhor solução para a democracia brasileira. Teremos de responder pelos erros que cometemos - e espero que tudo seja apurado e esclarecido. Mas essa é uma questão geral da vida partidária, presente em todas as atividades de campanha, e só superaremos isso se tivermos um debate franco, aberto e leal e promovermos uma profunda reforma política no Brasil, porque, sem ela, não superaremos esses episódios.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/07/2005 - Página 24765