Discurso durante a 123ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários ao artigo do correspondente do jornal The New York Times, Larry Rohter, sobre a prática de corrupção no Governo Lula. Especulação da imprensa da existência de acordo com intuito de amenizar as cassações e punições, em virtude das investigações promovidas pelas comissões parlamentares de inquérito em curso no Congresso Nacional.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. :
  • Comentários ao artigo do correspondente do jornal The New York Times, Larry Rohter, sobre a prática de corrupção no Governo Lula. Especulação da imprensa da existência de acordo com intuito de amenizar as cassações e punições, em virtude das investigações promovidas pelas comissões parlamentares de inquérito em curso no Congresso Nacional.
Publicação
Publicação no DSF de 02/08/2005 - Página 26128
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • ANALISE, AUTORIA, JORNALISTA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), CRISE, NATUREZA, POLITICA, BRASIL, AMEAÇA, DEMOCRACIA, AMERICA LATINA, DENUNCIA, FRUSTRAÇÃO, BRASILEIROS, PROMESSA, CAMPANHA ELEITORAL, MELHORIA, ETICA, COMPARAÇÃO, SEMELHANÇA, SITUAÇÃO, PERU, NEGLIGENCIA, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • COMENTARIO, PESQUISA, OPINIÃO PUBLICA, ACOMPANHAMENTO, BRASILEIROS, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO.
  • OPOSIÇÃO, POSSIBILIDADE, ACORDO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, FAVORECIMENTO, IMPUNIDADE, RESPONSAVEL, CORRUPÇÃO.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é evidente que crise política dessa dimensão tem espaço também na grande imprensa de todo o mundo, e o correspondente do jornal The New York Times no Brasil, Larry Rohter, na edição do último fim de semana, fez apurada análise de como a corrupção desponta como uma das maiores ameaças para os ganhos democráticos na América Latina.

            O tema principal da matéria é apresentado na promessa de campanha de Lula, a de que seu Governo “seria ético, honesto e moral, como o Brasil nunca viu”, e na realidade atual: “Atolado no maior - abro aspas também, porque é frase do jornalista norte-americano - e mais audacioso escândalo de corrupção da história do País”. Portanto, não é uma afirmação da Oposição política no Brasil, mas de um jornalista conceituado, de um jornal também conceituado: The New York Times.

            No artigo, o correspondente estrangeiro demonstra ter captado o sentimento do povo brasileiro, quando escreve que foi uma promessa de retidão que “ajudou a conquistar os votos de mais de 50 milhões de brasileiros e um mandato arrebatador”.

A matéria do jornal The New York Times faz um paralelo entre o Presidente Lula e o Presidente do Peru, Alejandro Toledo, que também chegou ao poder com promessas semelhantes de limpar a corrupção e cujo governo se encontra sob suspeição generalizada.

Diz o jornalista: “Enquanto seu governo e sua reputação entram em colapso ao seu redor, Lula adotou no Brasil uma postura semelhante” à do Presidente peruano: ao invés de ações efetivas, frase de efeito”. E cita as seguintes frases do Presidente Lula: “Neste País, está para nascer alguém que venha querer discutir ética comigo”; “Neste País de 180 milhões de brasileiros, pode ter igual, mas não tem nem mulher nem homem que tenha coragem de me dar lição de ética, de moral e de honestidade”.

Há um aspecto na atual crise política, já mapeado em pesquisa de opinião, que merece ser analisado. No último final de semana, a pesquisa Vox Populi*, divulgada pela revista Época, aponta para esta realidade: o brasileiro acompanha muito de perto o escândalo do mensalão e quer punição exemplar para os políticos envolvidos; mostra que 87% da população sabem do escândalo e que mais de 80% conhecem os principais suspeitos. Creio ser esse um índice extremamente promissor em matéria de interesse público pelos acontecimentos da vida pública no País.

A grande maioria dos entrevistados quer ver os responsáveis perderem o mandato e, se possível, na cadeia. É o que a pesquisa conclui. A população, portanto, não aprova a contemporização com os desmandos e o assalto aos cofres públicos.

Creio que o retrato que nos oferece essa pesquisa de opinião pública nos autoriza a rechaçar, de pronto e de maneira contundente, qualquer especulação em torno da hipótese de acordo para finalizar as investigações, oferecendo-se uma resposta sem a isenção necessária às expectativas de toda a população. A imprensa, nos últimos dias, especula essa hipótese de acordo, que queremos repudiar. Seria deplorável. Mais do que isso, seria a destruição definitiva da imagem deste Parlamento. Não haveria forma de nos explicarmos diante da opinião pública, se chegássemos a esse tipo de contemporização, buscando o entendimento, para salvar alguns e penalizar outros. O que se exige é a assepsia geral da forma mais eficiente possível.

Sr. Senador Sérgio Guerra, que preside esta sessão, em entrevista, hoje de manhã, concedida ao Bom Dia Brasil, da Rede Globo de Televisão, o Secretário do Tesouro dos Estados Unidos, John Snow, afirmou que “a corrupção mina a democracia, o mercado e a confiança do investidor”. Ele procurou evitar o assunto, mas acabou pronunciando-se.

Não há como evitar opinar sobre os últimos acontecimentos no Brasil. Os tentáculos da corrupção nas empresas estatais, com ramificações nos fundos de pensão, o envolvimento de membros do Executivo, do Legislativo e dos partidos políticos minaram a gestão do Presidente Lula de forma irreversível.

É importante, portanto, a missão que as CPIs deste Congresso assumem de oferecer respostas à população com uma investigação de profundidade e competência.

O Governo Lula está sitiado. O Presidente se movimenta pelo País sem qualquer compromisso com a realidade que o cerca. Como se não bastasse ignorar as denúncias de corrupção, o Presidente faz declarações sobre política econômica em completa falta de sintonia com seus Ministros, gerando ainda mais apreensão no mercado. A economia brasileira é “muito vulnerável”, declarou Lula numa cerimônia pública no Rio Grande do Sul. Enquanto isso, seus Ministros Luiz Fernando Furlan, Antônio Palocci Filho e Henrique Meirelles sustentam o contrário.

Um dado que a crise política ofuscou e passou despercebido: a economia, no primeiro semestre do ano, para pagar juros de dívidas, foi de R$60 bilhões, o maior superávit primário para o período da série histórica do Banco Central, iniciado em 1991.

No mesmo período, o Governo gastou mais de R$80 bilhões com o pagamento de juros, o equivalente a 8,6% do Produto Interno Bruto. O volume também é recorde na série do Banco Central para o semestre. Esse gasto excessivo com o pagamento de juros, registrado no primeiro semestre, deve-se, principalmente, à política adotada pelo Banco Central, que, apenas entre setembro de 2004 e maio deste ano, aumentou a taxa básica de juros nove vezes.

Portanto, antes de concluir o nosso pronunciamento, ouvimos há pouco, da tribuna do Senado Federal, a tentativa, mais uma vez, de se generalizar na vida pública brasileira a prática da corrupção eleitoral como se, nesta hora, estivéssemos investigando exclusivamente isso.

            É evidente que não somos cínicos para declarar que não há corrupção eleitoral no Brasil, que essa prática não existe, que o caixa dois é ficção nas campanhas eleitorais. Obviamente, não temos o cinismo de alguns para fazer esta afirmação da tribuna do Senado Federal, mas que se investigue isso no âmbito próprio da investigação específica, porque o que estamos investigando é muito mais do que isso. Estamos investigando, como diz o jornal The New York Times, o maior escândalo de corrupção da história brasileira. Estamos investigando, na verdade, aquilo que se chama, no linguajar jurídico, formação de quadrilha para assalto aos cofres públicos do País.

Não existe outra forma de retratar, de desenhar o que estamos procedendo em matéria de investigação neste momento. É por isso que, depois de algumas tentativas, ninguém mais, Senador Sérgio Guerra, ousou delimitar a ação da CPMI dos Correios. Ela é muito mais do que uma Comissão Parlamentar Mista do Inquérito investigando uma estatal.

A força da pressão popular, a exigência da sociedade brasileira fez com que os trabalhos dessa CPMI se prolongassem muito além do que admitiam alguns investigar.

É impossível evitar que se investigue quando há um esquema de corrupção que lançou seus tentáculos para todas as áreas da administração federal. Não há como deixar de investigar a origem do dinheiro escuso repassado por agências de publicidade para políticos que usam assessores e sacam na boca do caixa para alimentar, sem dúvida nenhuma, financeiramente, um projeto político de poder idealizado por alguns.

Tenho exagerado na repetição de que se trata, na verdade, da arquitetura de um projeto de poder de longo prazo, mas creio que esta é a essência da análise a ser feita com a orientação eficiente aos trabalhos de investigação, porque não chegaremos a lugar algum se não ultrapassarmos os limites das pessoas utilizadas nesse esquema de corrupção, na área operacional dele, e chegarmos aos idealizadores do projeto.

Nesta semana, certamente aquela fantasiosa versão, articulada por membros do Governo do Partido dos Trabalhadores e pelo empresário Marcos Valério, estará de forma absoluta desmontada, porque, sem dúvida, a partir dos lances que viveremos com os depoimentos desta semana, veremos o escândalo chegar, de forma muito explícita, ao quarto andar do Palácio do Planalto, não somente porque o Ex-Ministro José Dirceu, colocado no epicentro dessa crise, será alvo de questionamentos no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, mas porque outros depoimentos levam a ele, como o que no dia de hoje deve estar prestando à Polícia Federal a Srª Simone Vasconcelos, que virá à CPMI dos Correios na próxima quarta-feira.

Todos os indícios já reunidos indicam na direção do Deputado José Dirceu como um dos articuladores desse projeto de poder que passou a utilizar o lema de que o fim justifica os meios e admitiu a corrupção na administração pública como forma de captar recursos para a sustentação financeira desse projeto.

E passamos a analisar e a investigar estratégias as mais diversas e espúrias, como essa de se realizar empréstimos bancários suspeitos, que podem ser exclusivamente operações contábeis, simulando empréstimos bancários para o repasse dos recursos públicos com origem em contratos superfaturados não só nos cofres da publicidade, mas também de fundos de pensão e de outras áreas da administração federal.

Portanto, Sr. Presidente, creio estar de forma absoluta destruída essa tentativa de se restringir esse episódio à prática de corrupção eleitoral. Hoje, temos convicção absoluta de estarmos investigando um gigantesco esquema de corrupção, que envolve um número expressivo de pessoas ligadas aos setores privado e público no estabelecimento dessa associação promíscua que misturou o que é privado com o que é público, em uma simbiose condenável que certamente será, ao final dessas investigações, condenada da forma exemplar e rigorosa, como exige a sociedade brasileira, na esperança de que esses fatos não se repitam, essa estratégia não se reconstitua e que possamos realmente construir uma atividade pública com transparência, nova imagem e, sobretudo, resultados mais significativos, na busca de um país próspero, mas onde o povo possa viver com dignidade. Com o fim dessa roubalheira, certamente teremos um país mais rico e mais justo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/08/2005 - Página 26128