Discurso durante a 126ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Fundos de Desenvolvimento: sua alta inadimplência e sua importância para a educação e a pesquisa.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA. ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • Fundos de Desenvolvimento: sua alta inadimplência e sua importância para a educação e a pesquisa.
Publicação
Publicação no DSF de 05/08/2005 - Página 26639
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA. ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • ANALISE, CRESCIMENTO, DIVIDA PUBLICA, RELAÇÃO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), MOTIVO, TAXAS, JUROS, ALTERAÇÃO, METODOLOGIA, AVALIAÇÃO, INDICE, DEBITOS, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, REGIÃO NORTE, REGIÃO NORDESTE, DENUNCIA, SUPERIORIDADE, INADIMPLENCIA, CRITICA, ATUAÇÃO, BANCO DO NORDESTE DO BRASIL S/A (BNB), BANCO DA AMAZONIA S/A (BASA).
  • DENUNCIA, BANCO DA AMAZONIA S/A (BASA), FINANCIAMENTO, DESTRUIÇÃO, FLORESTA AMAZONICA, CULTIVO, SOJA, EXPORTAÇÃO, DESRESPEITO, OBJETIVO, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, REGIÃO NORTE, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL.
  • JUSTIFICAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, INDICE, APLICAÇÃO DE RECURSOS, BENEFICIAMENTO, PRODUTO FLORESTAL, MANEJO ECOLOGICO, PESQUISA CIENTIFICA, FLORESTA AMAZONICA.
  • SOLICITAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), LIBERAÇÃO, RECURSOS, PESQUISA.
  • REITERAÇÃO, NECESSIDADE, UTILIZAÇÃO, INTERNET, PRESTAÇÃO DE CONTAS, RECEITA, GASTOS PUBLICOS, AUMENTO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA.

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no mês de junho, a relação dívida/PIB voltou a crescer. Ou seja, a dívida pública brasileira ampliou-se. Essa dívida, que é depositada na conta de cada um de nós, de cada brasileiro deste País, volta a subir. E em função de quê? Não apenas das taxas de juros absurdas de 19,75%, mas pela reavaliação do PIB e por um outro fator alheio a essa taxa de juros escorchante: os débitos podres do Fundo de Desenvolvimento do Norte e do Nordeste.

Senador Mão Santa, esses fundos foram instituídos na Constituição de 1988 para poder desenvolver a economia da Região Norte e Nordeste. No entanto, a forma como vêm sendo gerenciados esses fundos mostra que há um índice de inadimplência alarmante. O índice de inadimplência dos dois fundos, em média, beira 30%. Ou seja, mais de um quarto de recursos emprestados não retornam ao fundo. Os operadores desse fundo, no Nordeste, é o Banco do Nordeste; e na Amazônia, é o Basa - o Banco da Amazônia.

Ora, no mês de junho, foram inscritos na dívida pública da União mais R$6,350 bilhões de créditos podres, ou seja, emprestou-se dinheiro e ele não foi honrado, essas dívidas não foram honradas. Aí cresce a dívida pública. Debita-se na conta de todos nós a má condução na aplicação desses fundos.

Essa é uma situação que merece uma análise desta Casa, do Senado. Mas há uma situação ainda mais grave. No caso específico da Amazônia, esse fundo de desenvolvimento está sendo aplicado para financiar a conversão da Floresta Amazônica em monocultura. O Banco está financiando a conversão de uma floresta biodiversa, de uma floresta que poderia ter um outro destino, e que poderia dar origem a uma nova economia da região, em uma monocultura. Assim, está sendo financiada a sua destruição.

Na instituição do Fundo, além de promover o desenvolvimento econômico, o FNO, na lei que o criou, estabeleceu o objetivo de desenvolver a região e de preservar o patrimônio ambiental e a biodiversidade amazônica. Isso não está ocorrendo, Sr. Presidente. É por essa razão que me manifesto. Estou preocupado com os destinos da nossa região e também consciente de que não há apenas um caminho na construção da economia. Esse é um dilema que não existe. A mesma coisa se diz da política econômica. Ou é essa ou não é nenhuma. Não é verdade. Podemos, sim, estabelecer uma nova política econômica. Não há nenhuma razão para vivermos atrelados definitivamente a uma agenda construída de fora para dentro, pois a Amazônia pode, sim, construir um novo modelo, um modelo de economia sustentável, um modelo socioambiental, com desenvolvimento econômico a partir do desenvolvimento da cadeia produtiva da enorme diversidade animal e vegetal de que dispomos na região.

Mas não. Está lá o Basa financiando soja; está lá o Basa financiando pastagem; está lá o Basa financiando a conversão da floresta biodiversa pela monocultura. Em função de constatar - fiz um levantamento junto ao Basa e junto ao Banco do Brasil para saber os volumes aplicados na agricultura e na pecuária - que são números, são valores impressionantes, é que estou propondo a esta Casa uma racionalidade, Senador Mozarildo Cavalcanti, na aplicação dos recursos do Fundo de Desenvolvimento do Norte. Ou seja, que 50% desses recursos - é necessário que se melhore também a aplicação desses fundos - sejam aplicados para o adensamento da cadeia produtiva das espécies vegetais e animais da Amazônia.

Financiar a cadeia produtiva dos produtos florestais madeireiros, por exemplo. Financiar desde o manejo florestal até à indústria moveleira. Financiar o design, a comercialização desses produtos que resultem do adensamento da cadeia produtiva. Financiar o manejo florestal, até porque a única experiência que o Basa tem de financiamento florestal - aliás, a primeira - foi realizada no meu Estado, com recursos do Fundo de Desenvolvimento Agropecuário do meu Amapá, colocados à disposição do Basa, como operador financeiro, para financiar os primeiros manejos de açaizais.

E vejam que os resultados estão sendo colhidos neste momento. Aqueles financiamentos que fizemos lá atrás estão dando sustentação a centenas de famílias que vivem nas regiões ribeirinhas do rio Amazonas. Portanto, 50% destinaríamos, com clareza, para o adensamento dessas cadeias produtivas; 10% destinaríamos para financiar pesquisas aplicadas na Amazônia, até porque o maior problema na nossa região é o desconhecimento.

Tenho afirmado, aqui, que estamos destruindo a Amazônia mais pela ignorância do que pelo conhecimento. Oitenta por cento das pesquisas do conhecimento, desenvolvidas e acumuladas ao longo dos séculos sobre a Amazônia, estão fora da região.

Nenhum dos fundos de desenvolvimento prevê recursos para investimentos em pesquisa. E, quando não se investe em conhecimento, quando não se investe em pesquisa, obstrui-se o caminho para o futuro. Falo isso porque uma das minhas primeiras preocupações, quando assumi o Governo do meu Estado, em 1995, foi incluir recursos para o desenvolvimento da pesquisa aplicada. Na época, isso não era possível, e não havia recursos suficientes para o financiamento dos projetos de pesquisa básica. Então, iniciamos a pesquisa aplicada e chegamos a produtos como a vela de andiroba, desenvolvida no Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá. Uma vela capaz de afugentar os insetos, desenvolvida a partir de uma espécie, como existem centenas de espécies vegetais na Amazônia capazes de serem transformadas em produtos de consumo, necessários a todos nós.

Portanto, a aplicação de recursos em pesquisa é decisiva. Quero aqui manifestar a minha preocupação, já anunciada pelo Presidente Candotti, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, que observa R$3 bilhões destinados a pesquisas no nosso País retidos no Ministério da Fazenda.

Ora, estamos matando o futuro! Precisamos liberar esses recursos. O Brasil e, particularmente, a Amazônia, mais do que qualquer outra região, necessita desses recursos, até porque há uma grande concentração de competências técnicas e científicas no Centro-Sul brasileiro. Noventa e cinco por cento dos professores doutores estão concentrados na região Centro-Sul. Na Amazônia, há resíduo de 1% dessa competência necessária para o desenvolvimento.

Portanto, é fundamental que o Ministro Palocci, com a responsabilidade que tem com o futuro desta Nação, libere os R$3 bilhões que estão retidos no Ministério da Fazenda para conseguir o tal superávit primário.

Concedo um aparte ao Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Capiberibe, V. Exª traz à luz talvez o assunto mais importante para o País nesta sessão: a educação e a pesquisa. Quis Deus que eu tivesse hoje em mão um folheto de Thomas Jefferson. Ele, que deu grande contribuição aos Estados Unidos, que proporcionou a liberdade religiosa e que foi Presidente daquele país, pediu para que registrassem no seu túmulo: “Aqui jaz o criador da Universidade da Virgínia”. Quero lhe dizer que este Plenário se engrandece quando homens com o espírito de Thomas Jefferson fazem parte dos seus quadros. Faço uma homenagem ao Senador do Maranhão Mauro Fecury. Talvez nenhum outro o tenha excedido em grandeza e por acreditar na educação e no desenvolvimento da universidade do Norte e do Nordeste. S. Exª chega a Brasília como um dos ícones da educação universitária para a mocidade brasileira.

O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Obrigado, Senador Mão Santa.

Para concluir o meu discurso, em que abordo a necessidade da pesquisa e do desenvolvimento tecnológico, eu estava tentando abrir esse laptop, que está sobre a tribuna, para mostrar que vivemos hoje em uma sociedade de informação e de conhecimento. No plenário do Senado, há, em cada bancada, um computador, que nos permite hoje acompanhar o desempenho orçamentário e financeiro de várias áreas do Governo do Estado.

Ora, é por meio da tecnologia, da informática e da rapidez da informação transmitida por intermédio da rede mundial de computadores que estamos conseguindo fazer as investigações que estão em curso. Os trabalhos das CPIs estão sendo desenvolvidos rapidamente em função da grande contribuição da informática, da rede mundial de computadores. No entanto, há algo que me preocupa: o entendimento de que essa tecnologia pode ser utilizada para prevenir a corrupção. Podemos prevenir a corrupção, porque as CPIs investigam o delito cometido, e a minha vontade é a de que possamos aprovar leis para utilizarmos a Internet na prevenção, no combate ao crime.

Estou convencido disso pelas informações de que disponho no meu Estado, pelas informações de que disponho no site do Ministério da Ciência e Tecnologia. Todos os recursos do Ministério da Ciência e Tecnologia estão ali registrados. Hoje, eles estão claros. Bom seria se tivéssemos uma tela aqui, Sr. Presidente. Poderíamos discursar e divulgar, em tempo real, as informações - sei que, talvez, essa tela fosse utilizada para outras finalidades. No entanto, isso demonstraria com clareza a rapidez da informação, e utilizaríamos a tecnologia para combater a corrupção.

Chego a essa conclusão por causa do bairro onde morro. Lá, não há pavimentação e não há rede de esgoto. Quando se faz um balanço do volume de recursos já captados pelo Estado, pela Prefeitura do Município onde vivo, certamente percebo que o meu bairro deveria ser totalmente urbanizado.

Então, posso constatar, por meio da contabilidade, das receitas e das despesas, que a aplicação do dinheiro no nosso País é dirigida a poucos. Essa é a realidade de todas as pequenas, médias e grandes cidades. Existe uma população que mora em um núcleo, em uma ilha com conforto. E ela está longe dos excluídos, que não dispõem de água tratada, que não dispõem do mínimo de infra-estrutura social. Muitas vezes, populações com mais de 100 mil habitantes, que vivem nas periferias dos grandes centros urbanos, não dispõem de uma escola, de uma delegacia de polícia, ou seja, convivem e vivem sem a presença do Estado brasileiro. Isso em se tratando dos grandes centros, sem falar das nossas fronteiras, da fronteira norte com a região da Guiana, que é um departamento da França. Lá, há um funcionário da Receita Federal e três agentes da Polícia Federal, em uma fronteira de 600 quilômetros.

O Estado brasileiro encolheu pela má aplicação dos seus recursos, pela malversação dos seus recursos. E não pela falta deles.

Tiradentes se alçou contra a derrama, que estabelecia que um quinto - não é verdade? - de toda a produção de ouro fosse recolhida para a Coroa. Era um quinto. Hoje, a carga tributária ultrapassou essa quantia, e não nos rebelamos. A carga tributária está em 37%, e estamos observando esse fato sem tomar qualquer medida, sem os instrumentos de controle social capazes de estancar a derrama dos tempos modernos. A CPMI vai correr atrás do malfeito, como já afirmei. É necessário darmos atenção para o uso da informática no controle da corrupção. Portanto, Sr. Presidente, o projeto que divide o Fundo Constitucional de Financiamento do Norte é no sentido de, também, desenvolver a nossa Região a partir da realidade local, porque o desenvolvimento não pode ser transposto ou importado, ele deve ser construído de acordo com as possibilidades, as potencialidades humanas e naturais de cada região. Esse é o objetivo de discutirmos a necessidade de uma divisão mais eqüitativa do FNO, o Fundo Constitucional de Financiamento do Norte.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/08/2005 - Página 26639