Discurso durante a 127ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Criação dos fundos nacionais de desenvolvimento científico e tecnológico. Críticas ao contingenciamento de verbas orçamentárias.

Autor
Marco Maciel (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Criação dos fundos nacionais de desenvolvimento científico e tecnológico. Críticas ao contingenciamento de verbas orçamentárias.
Publicação
Publicação no DSF de 06/08/2005 - Página 26681
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • REGISTRO, REUNIÃO, SUBCOMISSÃO, CIENCIA E TECNOLOGIA, SENADO, OBJETIVO, DISCUSSÃO, FUNDOS, SETOR, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO.
  • ESCLARECIMENTOS, CRIAÇÃO, FUNDOS PUBLICOS, SETOR, CIENCIA E TECNOLOGIA, BENEFICIO, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, ATIVIDADE CIENTIFICA, ECONOMIA NACIONAL, APRESENTAÇÃO, DADOS, UTILIZAÇÃO, RECURSOS.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, INFERIORIDADE, LIBERAÇÃO, RECURSOS, FUNDOS, DESTINAÇÃO, ATIVIDADE CIENTIFICA, PREJUIZO, DESENVOLVIMENTO, CIENCIA E TECNOLOGIA, BRASIL.
  • COMPARAÇÃO, INVESTIMENTO, CIENCIA E TECNOLOGIA, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, INDIA, COREIA DO SUL, APRESENTAÇÃO, DADOS.
  • SOLICITAÇÃO, PROVIDENCIA, SENADO, QUESTIONAMENTO, GOVERNO FEDERAL, LIBERAÇÃO, TOTAL, RECURSOS, DESTINAÇÃO, CIENCIA E TECNOLOGIA, DEFESA, PRIORIDADE, TRAMITAÇÃO, PROJETO DE LEI, REFORMULAÇÃO, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO E TECNOLOGICO (FNDCT).

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Exmo Sr. Presidente desta sessão, Senador Tião Viana, Srªs e Srs. Senadores, realizou-se anteontem a reunião extraordinária da Subcomissão Permanente de Ciência e Tecnologia do Senado Federal em atendimento ao requerimento assinado pelo Senador Roberto Saturnino e por mim com o objetivo de discutir os Fundos Setoriais nas Áreas de Ciência e Tecnologia. Os participantes da audiência foram o Dr. Odilon Antonio Marcuzzo do Canto, Presidente da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), entidade responsável pelo gerenciamento dos Fundos Setoriais; o Professor Ênnio Candotti, Presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), instituição aliás muito reputada da comunidade científica brasileira, e o Professor Roberto Nicolsky, Diretor-Geral da Protec (Sociedade Brasileira Pró-inovação Tecnológica).

Sr. Presidente, os Fundos Setoriais de Ciência e Tecnologia foram criados pelo Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Os recursos são gerados pelas contribuições dos setores da economia objeto da desestatização promovida na economia, uma espécie de royalties sobre as receitas obtidas na exploração da atividade econômica a que esses fundos se dedicam, e se constituem, a meu ver, numa notável alavanca para o desenvolvimento científico e tecnológico do País, pois o patrimônio desses fundos destina-se a fomentar o desenvolvimento científico e tecnológico, inclusive inovações, o que é fundamental e extremamente relevante para as respectivas áreas de atividade.

Cada fundo, como dispõe lei sobre o assunto, está voltado para uma área tecnológica como aeroespacial, agronegócio, biotecnologia, telecomunicações, saúde, Amazônia, energia, entre outros. Hoje são 15 ao todo, cabendo destacar o Fundo Verde-Amarelo, cujo objetivo é mais genérico, qual seja, proporcionar recursos para promover integração da universidade e dos centros de pesquisa científica com o setor produtivo.

Interessante destacar que a destinação dos recursos é feita por meio de projetos aprovados por um Comitê Gestor, associado ao respectivo Fundo, que é composto de representantes do Governo (ministérios e agências reguladoras pertinentes), da comunidade científica e da iniciativa privada, que ainda tem no Brasil uma baixa participação na alocação de recursos para a promoção da atividade científico-tecnológica. Se compararmos com outros países, ainda é pequena, muito pequena, a participação, infelizmente, das empresas nessa área. Essa composição do Comitê Gestor é também estabelecida em lei e deve fazer com que os recursos tenham uma destinação objetiva e socialmente produtiva.

A instituição dos Fundos Setoriais de Ciência e Tecnologia representou, não podemos deixar de reconhecer, efetivamente, uma das iniciativas mais importantes no que se refere ao esforço de estimular o desenvolvimento científico e tecnológico do País, inclusive na área da inovação. A necessidade de realizar investimentos substanciais e crescentes nessa área demanda, como é de conhecimento público, somas crescentes de recursos financeiros, e o advento dos fundos significou considerável incremento nas perspectivas de desenvolvimento das atividades na área de ciência e tecnologia do nosso País.

Para darmos apenas um exemplo, Sr. Presidente, a CT-Petro (Fundo Setorial do Petróleo e Gás Natural) implementado em 1999, investiu mais de R$37 milhões em variadas atividades do setor científico-tecnológico. Em 2002, praticamente com todos os fundos em operação, esses recursos haviam evoluído para R$275 milhões no total e, baseado em dados de 2004, ano passado, portanto, o volume total de recursos investidos por esses fundos já se aproxima de R$600 milhões.

Alguém poderá dizer que ainda é pequeno o volume de recursos, mas ninguém pode deixar de reconhecer que já representa um salto significativo nessa área estratégica para o País. É bom lembrar que talvez a grande questão estrutural brasileira seja o tripé educação, ciência e tecnologia, porque o mundo, sobretudo este que brota do Século XXI, é caracterizado por uma grande revolução nas tecnologias da informação e do conhecimento, e, se o Brasil deseja - é uma postulação legítima - , promover o bem-estar do seu povo e ter uma maior participação na sociedade internacional, é importante estar atento à imprescindibilidade de alocar mais recursos e ter políticas consistentes nos campos da educação, ciência e tecnologia. Sempre me preocupei com essa questão, pois se olharmos as sociedades afluentes do nosso tempo, vamos verificar que elas são também as mais influentes, posto que tiveram cuidado em investimentos maciços nessas áreas, sem os quais uma nação não se afirma, um país não cresce.

Dr. Odilon do Canto, Presidente da Finep, mencionou a criação dos fundos setoriais como “uma feliz engenharia financeira” da gestão do então Ministro Ronaldo Sardenberg, hoje, Embaixador do Brasil, na ONU, que trouxe não apenas maior soma de recursos, mas também maior estabilidade no provimento de recursos disponíveis para o setor científico-tecnológico.

Eis aí outra questão que eu acho importante. Os projetos nessas áreas não podem sofrer descontinuidade no fluxo de liberação dos recursos, porque, na medida em que isso ocorre, são retardados na sua conclusão. E a descontinuidade dos projetos na área da educação, na área de ciência, tecnologia e inovação, pode representar não somente perda substancial de tempo , mas até o comprometimento de uma própria geração.

Também não se pode deixar de destacar os efeitos sociais dos investimentos em ciência e tecnologia. Eles aparecem, por exemplo, nas relações de comércio internacional. Relatório da Unctad, de 2004, instituição cujo Secretário-Geral, até recentemente, era o Embaixador Rubens Ricupero, demonstra que, no período de 1980/2003, a deterioração das relações de troca entre os países em desenvolvimento e os desenvolvidos foi da ordem de 1,3% ao ano, o que é atribuído à incorporação de conhecimento nos produtos exportados pelos países desenvolvidos, o que significa dizer que, na medida em que agregamos valor às nossas exportações, aumentamos de forma muito precisa nossa participação no comércio internacional, hoje mais competitivo, porque uma das características desse processo de globalização, é certamente a competitividade.

Sr. Presidente, como pode ser observado, a agregação do conhecimento das novas tecnologias aos produtos manufaturados deve ser utilizada como fator de incremento de renda à economia de países como o Brasil em processo de crescimento, constatamos que ainda desconsideramos esse fator, a despeito dos mecanismos institucionais estarem disponíveis.

O Presidente da SBPC, Professor Ênio Candotti, cientista reputado em todo o País, tem insistido no fato de que os desembolsos nos fundos disponíveis têm ficado aquém de sua capacidade e necessidade de investimentos para que o setor cresça a taxas mais significativas. Sabemos que esses recursos estão ainda, infelizmente, sendo objeto de contingenciamento por parte do Governo. Isso tem levado a que, embora os recursos existam não estão sendo apropriados pelos órgãos incumbidos da promoção da ciência e da tecnologia que se voltam para a inovação, atividade que o Brasil também precisa estimular em função, friso, do contingenciamento feito pelo Governo para gerar o famigerado superávit primário. Isso, a meu ver, não deveria ocorrer, porque, se há um setor que deveria estar preservado pela sua essencialidade, é justamente esse, núcleo mais sensível de um crescimento sólido e firme, não somente da economia, mas, também da melhoria das condições sociais do nosso povo.

Daí por que considero que a realização dessa audiência teve o sentido de deixar bem precisa a importância de evitar os contingenciamentos de recursos nessas áreas.

Nesse sentido, os dados mostram que, em 2004, os fundos setoriais obtiveram a receita total de R$1 bilhão e R$400 milhões e o Governo empenhou apenas pouco mais de um terço disso, ou seja, R$593 milhões.

Estima-se que os valores contingenciados, acumulados até hoje, somam cerca de R$3 bilhões. O ideal seria, como propõe o Professor Candotti, que fossem criados novos fundos, uma vez que há muitos setores que, pela grande importância, ainda não dispõem de um mecanismo que dê sustentação ao setor. São áreas em que o País, por não existirem fundos específicos, não contam com recursos em volume necessário para transferir às nossas universidades, aos seus centros de pesquisa; enfim, a criar um clima de fato de promoção desse setor.

Apesar da criação dos fundos, Sr. Presidente, é bom lembrar que o Brasil ainda investe muito aquém dos recursos gastos em Ciência e Tecnologia pelas nações desenvolvidas. Mesmo quando comparado com países em desenvolvimento, observa-se que as verbas são relativamente pequenas para as necessidades de investimento de país como o Brasil, caracterizado por uma grande população, por uma excepcional biodiversidade, o que faz aumentar os desafios com que se defronta. A biodiversidade faz com que devamos ter especialistas para diferentes áreas, num espaço quase continental, como é o território brasileiro.

Com efeito, se tomarmos como exemplo um país como a Índia, que promove investimentos da ordem de R$600 milhões somente em seu programa espacial, e constatarmos que esse é o valor aplicado pelo Governo brasileiro em todos os programas de fomento de ciência e tecnologia com os recursos arrecadados pelos fundos estabelecidos, a partir de 1997, se não estou enganado, pelo Governo Federal. Cabe perguntar: que futuro teremos? Além disso, como destacou o Dr. Odilon do Canto, Presidente da Finep, recentemente empossado, a questão dos recursos constitui apenas uma parte da questão. Há problemas estruturais e aspectos de gestão que devem ser também analisados.

A esse respeito o Prof. Roberto Nicolsky, Diretor-Geral da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica, chamou atenção para a necessidade de melhorar ou atualizar a compreensão do que vem a ser efetivamente inovação tecnológica, que não deve ser restrita à noção de invenção de algum produto ou processo completamente novo.

Nesse sentido, a gestão do conhecimento se mostra também crucial e oferece um exemplo pitoresco: a introdução dos containers na relação comercial internacional, observou ele, não foi uma invenção de um produto novo, mas uma forma inovadora para um conceito antigo, uma vez que se trata apenas de uma “caixa de aço”, mas que representou algo que deflagrou uma verdadeira revolução no transporte de mercadorias seja pelo modal rodoviário, ferroviário ou marítimo.

O professor Roberto Nicolsky insistiu também na importância de observar a experiência institucional de países como o Japão e a Coréia do Sul, que criaram mecanismos extremamente eficazes no fomento ao desenvolvimento tecnológico e que, no Brasil, a criação dos Fundos Setoriais constituiu-se numa dessas raras iniciativas.

            Sr. Presidente, além do reduzido volume de recursos de que dispõe o País para investimentos nesse setor, precisamos reforçar mecanismos institucionais que melhor operem a existência desses fundos e, também, as aplicações nesse setor tão dramaticamente importante para o desenvolvimento nacional. Mesmo porque precisamos continuar a geração uma ciência e tecnologia, e promover inovação para a solução dos problemas especificamente brasileiros que nos cabe enfrentar. Tomo como exemplo, na minha região, o Nordeste, a questão de um bioma exclusivamente brasileiro: a caatinga. Não há outro no mundo. A caatinga, que se encontra situada em grande parte do Nordeste do Brasil, é um bioma que não tem nenhum outro semelhante no mundo. Daí por que devemos gerar não somente melhor conhecimento com relação a esse assunto, mas também, a partir daí, buscar desenvolver tecnologias e estabelecer a incorporação desse conhecimento que venha a se converter numa inovação que nos permita vencer atacar problemas, especificamente nossas.

            A propósito, convém recordar o papel que a Embrapa está desenvolvendo em todo o País com relação ao que hoje se chama agronegócio. Trata-se de uma instituição que, como Deputado Federal, vi nascer na década de 1970, e de renome pelo trabalho que executa e do conhecimento de nossa biodiversidade.

            Na Coréia - e me refiro especialmente à Coréia do Sul - aplica-se, atualmente, algo da ordem de 5% do seu PIB em pesquisas em Ciência e Tecnologia e Inovação, enquanto no Brasil, infelizmente, continuamos patinando no contingenciamento dos Fundos e investimos apenas 1% do PIB, portanto, cinco vezes menor que o investimento da Coréia no setor.

Em síntese, Sr. Presidente, é fundamental que o Senado Federal gestione junto às autoridades do Governo Federal para que suspendam o contingenciamento de recursos dos Fundos Setoriais e do FNDCT e dê respaldo aos programas voltados para o desenvolvimento da ciência e da tecnologia que, por suas repercussões altamente positivas, são essenciais - friso - para a sociedade como um todo.

Devo até lembrar, Sr. Presidente, que o FNDCT esteve ameaçado de morte anos atrás e, através de um projeto de minha autoria, aprovado pelo Senado e pela Câmara e depois promulgado, o FNDCT recuperou sua vida e é também um instrumento antigo, posto que bem anterior à criação dos fundos setoriais.

Desejo também, Sr. Presidente, acrescentar, adicionalmente, que é necessário que se priorize a regulamentação e o funcionamento desse fundo, do FNDCT - Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, cujo projeto que o reformula se encontra em tramitação já no Senado Federal.

Para finalizar, Sr. Presidente, penso que é chegada a hora de o Congresso Nacional tratar da candente questão de melhorar o processo orçamentário brasileiro. Porque na medida em que não melhoramos a elaboração do Orçamento, lei central com a qual o Legislativo se defronta todo ano, certamente não vamos ter um desenvolvimento sustentado. Somente um Orçamento discutido e votado e que seja efetivamente executado tornará possível evitar que aconteçam coisas, como ocorre agora na área de ciência e tecnologia, com o contingenciamento de recursos, postergando, portanto, o desenvolvimento nacional.

Desejo, portanto, ao encerrar minhas palavras, Sr. Presidente, dizer que a Subcomissão de Ciência e Tecnologia da Comissão de Educação, presidida pelo Senador Flávio Arns, está cumprindo o seu papel de estabelecer a parceria entre o Congresso e as instituições de ciência e tecnologia.

De outra parte, está cumprindo também um papel de ser um grande fórum de debates, para que a sociedade brasileira se conscientize da necessidade de investir em educação, ciência, tecnologia e inovação. Creio e tenho, mais do que convicção, certeza, de que isso é fundamental para que nós cresçamos. E cresçamos reduzindo a nossa dependência de tecnologias estrangeiras.

Com isso, eu não quero dizer que o Brasil não deva fazer intercâmbio de ciência e tecnologia, antes pelo contrário. Diria até que é fundamental esse intercâmbio. Nós devemos aproveitar, inclusive, a experiência acumulada de outros países.

Mas é fundamental, também, que estimulemos cada vez mais a nossa comunidade científica e tecnológica, que é muito boa, para que produza mais e esteja habilitada a gerar solução para nossos problemas. Ou seja, se não formos nós, quem o fará?

Se achamos que esse é o caminho, não tem razão para não darmos a esse setor tão fundamental para o País a prioridade que ele merece.

Agradeço, Sr. Presidente, o tempo que me consignou.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/08/2005 - Página 26681